A operação lava jato foi crucial para enfrentar a corrupção e deve deixar um
legado de melhores práticas nas empresas e nos governos
Uma das mais sensatas análises sobre a lava jato
Por redação do jornal 247 - Sociedade e Justiça na Política (fonte no final)
Ela foi produzida pelo economista Gesner Oliveira e
seus sócios na GO Associados; embora apontem que a operação reduziu o
PIB em dois pontos e a massa salarial em R$ 42 bilhões, os autores
afirmam que a Lava Jato foi crucial para enfrentar a corrupção e deve
deixar um legado de melhores práticas nas empresas e nos
governos; Gesner faz uma defesa enfática dos acordos de leniência e diz
que as empresas devem ser preservadas, como ocorreu com a Siemens, pivô
do maior escândalo corporativo da história; "Não basta trocar o governo.
O país precisa de um salto de governança que exige uma mudança cultural
na sociedade e os acordos de leniência certamente são um poderoso
instrumento para isso".
Jornal
247 – Na mais
sensata análise sobre a Operação Lava Jato produzida até hoje, o
economista Gesner Oliveira e seus sócios na GO Associados F. Marcato,
Andrea Curi e Andrea Vasconcelos defendem de forma enfática o acordo de
leniência e a preservação das empresas envolvidas em corrupção, como
ocorreu com a Siemens, pivô do maior escândalo corporativo da história.
"Do ponto de vista técnico e de interesse público, condenar o
fortalecimento dos acordos de leniência pouco agrega à solução do
problema", dizem. "Não basta trocar o governo. O país precisa de um
salto de governança que exige uma mudança cultural na sociedade e os
acordos de leniência certamente são um poderoso instrumento para isso",
acrescentam.
Recentemente, a assinatura pela presidente Dilma Rousseff da MP 703,
conhecida como MP da Leniência, gerou polêmica e críticas do Tribunal de
Contas da União, que pediu explicações ao governo. Os autores do artigo
são favoráveis à medida. "Em vez de longos processos, é melhor para
todos que haja um final mais rápido dentro dos marcos legais e com os
órgãos competentes", argumentam.
Embora apontem que a operação da Polícia Federal reduziu o PIB do
Brasil em dois pontos e a massa salarial em R$ 42 bilhões, os autores do
artigo, publicado nesta quarta-feira 6 no jornal Valor Econômico,
afirmam que ela foi crucial para enfrentar a corrupção e deve deixar um
legado de melhores práticas nas empresas e nos governos.
Abaixo a íntegra do texto:
Futuro e legado da lava-jato
O futuro da lava-jato é chave para determinar como e em que condições
a economia brasileira pode superar a atual crise. Os anos de 2015 e
2016 deverão ser a primeira vez desde 1930 em que o Brasil registrará
dois anos consecutivos de recessão. 2015 fechará com a maior taxa de
contração do PIB desde 1990.
Ninguém questiona a legitimidade da investigação e a condenação de
eventuais culpados. Há, porém, duas questões que não estão bem
respondidas. A primeira é como a sociedade pode atenuar o custo que a
investigação tem no curto prazo. Qual é o futuro da lava-jato?
A
segunda, como os resultados da operação histórica poderão ser revertidos
em ganhos institucionais duradouros que eliminem a possibilidade de
malfeitos serem repetidos. Qual é o legado da Lava-Jato?
Em relação à primeira pergunta, é incorreta a tese de que a
investigação não teria gerado custo em termos de emprego e produção. É
claro que ela não é o único, nem o mais importante fator explicativo da
crise. Mas é certamente relevante.
Mesmo sob hipóteses conservadoras,
que levam em conta que uma parcela do investimento da Petrobras e de
grandes construtoras nacionais teria diminuído independentemente da lava-jato, os efeitos diretos, indiretos e os impactos na renda são
expressivos. Quase 2% do PIB, 2 milhões de empregos e mais de R$ 42
bilhões em massa salarial.
Quer dizer que a lava-jato deve ser inibida? Ao contrário, deve ser
aprimorada para gerar mais resultados com menores custos. E isso é
possível.
A redução de seus custos passa por três pontos. Primeiro, pela
blindagem da capacidade de financiamento, investimento e de produção e
geração de emprego das empresas envolvidas. Milhões de trabalhadores
nada têm a ver com os crimes eventualmente cometidos por suas empresas.
Afastados os responsáveis pelas irregularidades, a sociedade tem
interesse que tais empresas continuem a produzir e gerar empregos.
Vale citar a experiência do maior caso de corrupção corporativa do
mundo, envolvendo a Siemens. Autoridades alemãs e americanas promoveram,
com o apoio do comitê de auditoria da empresa, ampla investigação dos
desvios encontrados em várias jurisdições de diversos países. Ao final
impuseram obrigações de melhoria institucional e de governança à
empresa, sem puni-la de maneira desmedida e sem interromper as suas
atividades.
Segundo, pela não exclusão destas empresas do mercado de obras
públicas e do crédito. O país precisa de mais concorrência e, portanto,
de um maior número de companhias disputando a oportunidade de fornecer
bens e serviços. Excluir empresas de licitações públicas significa
maiores custos ao Governo.
Terceiro, pela agilidade na negociação de acordos que estabeleçam
multas adequadas à gravidade dos danos causados. Em vez de longos
processos, é melhor para todos que haja um final mais rápido dentro dos
marcos legais e com os órgãos competentes, como a Controladoria Geral da
União (CGU), o Ministério Público Federal (MPF) e o Cade.
O primeiro grande passo foi dado com a Medida Provisória nº 703,
publicada em 21.12.2015. A medida altera a Lei Anticorrupção - nº
12.846/2013 - para dispor sobre acordos de leniência com empresas
investigadas em casos de corrupção.
Há, porém, setores da sociedade
que não apoiam a medida. Em 23/12/2015, o jornalista Elio Gaspari
critica a MP no artigo "Dilma aderiu aos Oligarcas". Segundo ele, com a
MP, a presidente estaria enfraquecendo punições às empresas envolvidas
na Lava-Jato.
Do ponto de vista técnico e de interesse público, condenar o
fortalecimento dos acordos de leniência pouco agrega à solução do
problema. Diferentemente do que ocorria no século XIX, na Era Vitoriana,
o direito penal moderno prevê instrumentos de colaboração entre
investigadores e investigados, os quais têm servido em vários países
como uma forma efetiva de desmantelar organizações criminosas e concluir
processos rapidamente.
Mas como assegurar que no futuro não haverá novas Lava-Jatos? Como garantir um legado em termos de melhor governança ao Brasil?
A MP oferece algumas respostas ao obrigar as empresas que firmarem os
acordos de leniência a implantar ou aprimorar programas de compliance.
Trata-se de procedimento aderente às práticas internacionais que
consideram a existência desses programas como parte das obrigações de
uma companhia condenada por corrupção.
Casos internacionais mostram
que a criação e a constante melhoria desse tipo de programa devem ser
consideradas como atenuantes na aplicação de penas por corrupção.
Cada empresa deve criar seu programa de compliance adequado às suas
características e porte, o qual deve refletir os princípios da
governança: transparência, equidade, prestação de contas e
responsabilidade corporativa. A aplicação efetiva do compliance
diminuiria não só a chance de nova lava-jato, mas também melhoraria o
desempenho das instituições.
Não basta trocar o governo. O país precisa de um salto de governança
que exige uma mudança cultural na sociedade e os acordos de leniência
certamente são um poderoso instrumento para isso.
Por trás da crítica contra as oligarquias empresariais não se pode
embutir um ranço ideológico contrário à atividade empresarial. Dela
dependem os empregos de milhões de brasileiros. Garantir tais postos
passa necessariamente pela saúde financeira das empresas, que só se
perpetuarão com uma política sustentável e transparente de
relacionamento como governo. Forjar essa política pode ser o principal
legado da lava-jato.
Gesner Oliveira, ex-presidente do Cade e da Sabesp, é professor de economia (FGV) e sócio da GO Associados
Fernando S. Marcato, professor de direito na FGV-SP e sócio da GO
Associados, atuou no caso Siemens, assessorando o departamento de
Justiça americano
Pedro Scazufca, mestre em economia pela FEA-USP, é sócio da GO Associados
Andrea Curi, doutora em economia pela FGV-SP, é coordenadora de projetos da GO Associados
Andrea Vasconcelos é advogada da GO Associados
http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/212236/A-mais-sensata-an%C3%A1lise-sobre-a-Lava-Jato.htm