A pesquisadora Karine Lima Lourenço responde às principais perguntas sobre os resultados, prazos e
benefícios do imunizante contra o coronavírus
"Não é possível que uma
vacina funcione se meia dúzia de gatos pingados receberem e o
restante não. É necessário que o maior número de pessoas possível
seja vacinado", pontua Karine
por Nara Lacerda no Brasil de
Fato – Sociedade e Imunização contra
o coronavírus
Morador de comunidade no Rio
Moju (PA) mostra frasco da dose que tomou; imunização precisa chegar ao maior
número de pessoas possível para dar certo – foto de João Paulo Guimarães/AFP
Quase três meses após o
início do Plano Nacional de Imunização contra o coronavírus, o Brasil
caminha a passos lentos na distribuição de doses, mas com avanço de informações
mentirosas, as fake news.
Até esta sexta-feira (9/abr),
o país conseguiu imunizar pouco mais de 11% da população,
segundo dados da plataforma Our World in Data (Nosso mundo em dados, na
tradução).
O crescimento das fake
news parece seguir na direção contrária, se
aproveitando de casos reais para criar desinformação e colocar em dúvida a
efetividade e a segurança das vacinas.
Um exemplo foi a morte do
cantor Agnaldo Timóteo, no sábado passado (3/abr). Ele foi internado com
sintomas da covid dois dias depois de tomar a segunda dose do imunizante.
No mesmo dia, o presidente
da Argentina, Alberto Fernández, comunicou que testou positivo para o
coronavírus. Ele foi vacinado entre os meses de janeiro e fevereiro de 2021.
Esses são apenas dois casos usados por negacionistas e defensores do movimento antivacina
para endossar as mentiras anticientíficas propagadas com frequência
preocupante em redes sociais e aplicativos de mensagem.
Mas por que esses dois casos
aconteceram mesmo após a imunização? Qual é o funcionamento esperado das
vacinas no corpo humano? Que diferença faz o número total de imunizados na
propagação?
A pesquisadora Karine Lima
Lourenço, doutora em virologia e que atua no CT Vacinas da Universidade Federal
de Minas Gerais, conversou com o Brasil de Fato sobre essas dúvidas e respondeu
aos questionamentos.
Quanto tempo a vacina demora
para fazer efeito?
Karine explica que
existem pontos que precisam ser esclarecidos sobre o tempo entre a
aplicação da vacina e a produção da resposta imune do corpo. Ela comenta o caso
do cantor Agnaldo Timóteo.
"Ele havia acabado de
tomar a segunda dose. Mesmo ele tomando as duas doses dentro do prazo
estipulado, não significa que, automaticamente, ao aplicar a vacina no braço,
ele já teria uma resposta pronta frente à covid-19", explica ela.
Ela relata que "Alguns
estudos mostram que as células de defesa são produzidas depois de duas a quatro
semanas após a segunda dose. É importante que as pessoas entendam que após
receber a vacina, elas precisam continuar com as medidas de proteção"
A pesquisadora reafirma,
"Infelizmente, o que aconteceu com o Agnaldo Timóteo, é que ele não tinha
uma resposta totalmente pronta. As doses precisam de um tempo para que o corpo
consiga montar uma resposta."
A vacina vai impedir que o
vírus entre no meu corpo?
Não é dessa forma que as
vacinas funcionam. O que elas fazem é criar mecanismos para enfraquecer o
efeito das doenças no organismo. Nenhuma vacina cria um escudo de proteção que
impede a contaminação.
Ao comentar o caso do
presidente da Argentina, Karine esclarece, "De fato ele pode ter contraído
o vírus e manifestado a doença. Mas o que gente tem observado, nos casos das
pessoas vacinadas, é que essas pessoas apresentam sintomas leves da
doença".
Um dos principais efeitos
das vacinas é justamente atuar para que o vírus não leve a casos médios, graves
ou óbitos. Com isso, o impacto nas redes de saúde diminui amplamente, o que
evita colapsos e crises sanitárias.
Quem tomou a vacina pode
transmitir o vírus se for contaminado?
Segundo Karine Lima
Lourenço, essa é a pergunta de "um milhão" na ciência atualmente,
"Tudo na covid é muito novo. Isso ainda não foi de fato esclarecido, está
sendo pesquisado."
A dúvida traz ainda mais
importância à manutenção dos cuidados preventivos enquanto a vacina não chega a
maior parte da população, já que ainda não foi descartada a possibilidade de
transmissão.
"As pessoas que estão
vacinadas podem ser infectadas e logo o vírus é neutralizado. Mas nenhuma
vacina tem 100% de eficácia e essas poderiam não responder, contrair o
vírus e transmitir", alerta a pesquisadora.
Ela explica ainda que
"Com base na bagagem que a gente tem na virologia em relação a outras
vacinas, se a pessoa recebeu a vacina e tem a forma leve da doença, sim, ela
poderia transmitir o vírus. Mas ainda não há como afirmar com
certeza".
A gente vai ter que se
vacinar todo ano?
Essa dúvida também ainda não
foi totalmente respondida, mas já há indicativos de que será necessário
garantir a vacinação posteriormente.
"Algumas formulações já
estão em adaptação no protocolo para novas variantes. Diversos estudos têm
mostrado que as vacinas que utilizamos aqui no Brasil são eficazes frente às
variantes que circulam aqui", afirma Karine Lima Lourenço.
A pesquisadora explica que
"É importante a gente trabalhar, não só na produção de vacinas, mas na
caracterização dessas novas variante. Porque nós conseguimos mudar o protocolo
vacinal ao longo do tempo".
"Provavelmente, o que
vai acontecer é que a vacina contra a covid-19 vai ser como da da gripe. Nós
tomaríamos essa vacina por muito tempo, uma ou duas vezes no ano. É uma vacina
que deve nos acompanhar durante um tempo ainda".
Precisa vacinar todo mundo
mesmo?
Para a ciência, esse assunto
não deveria nem mesmo ser objeto de dúvida. Na história da humanidade,
todas as doenças que foram controladas com vacinação precisaram de
adesão coletiva.
"Não é possível que uma
vacina funcione se meia dúzia de gatos pingados receberem e o
restante não. É necessário que o maior número de pessoas possível
seja vacinado", pontua Karine.
Ela explica que a adesão
coletiva protege quem não pode receber o imunizante por alguma questão
alérgica, por exemplo. No caso da covid, como ainda não há estudos finalizados
em menores de 18 anos, esse publico também precisa de proteção coletiva.
"Para que uma vacina
funcione é necessário que o maior número de pessoas tome essa vacina. Para que
a gente tenha uma imunidade coletiva contra esse patógeno", finaliza a
pesquisadora.
Publicado no BdF: 09 de Abril de 2021
Edição: Vinícius
Segalla
Fonte: https://www.brasildefato.com.br/2021/04/09/cinco-duvidas-sobre-a-vacina-contra-a-covid-que-voce-precisa-tirar-agora