Os trabalhadores rurais não seriam pagos apenas com salários, mas também mediante “remuneração de qualquer espécie”, como oferta de moradia e alimentação
por Frei Betto* para Brasil 247 - Sociedade e o Congresso Nacional Descontrolado
Não
satisfeito com a reforma trabalhista que retira direitos dos trabalhadores e
favorece interesses dos patrões, o deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT),
líder da bancada ruralista, encaminhou projeto que reintroduz no Brasil a
neoescravatura.
A
proposta é de estarrecer: os trabalhadores rurais não seriam pagos apenas com
salários, mas também mediante “remuneração de qualquer espécie”, como oferta de
moradia e alimentação.
Esse
descaso com os direitos humanos é um retrocesso civilizatório. Se aprovado o
projeto, fazendeiros que só têm olhos para suas contas bancárias dirão ao
empregado: “Vou lhe fornecer casa e comida. E este será o pagamento pelo seu
trabalho, uma vez que vai morar e comer de graça.”
O projeto
prevê ainda que a jornada diária poderá se estender por 12 horas! Anula-se
assim o 1º de Maio, data na qual os trabalhadores comemoram a conquista das 8
horas diárias. E só haverá dia de descanso após 18 dias de trabalho
consecutivo. Ou seja, além de o trabalhador jamais desfrutar de aposentadoria,
devido à desumana reforma previdenciária em pauta, teria sua morte antecipada
por exaustão. Quem nunca pegou no cabo de enxada não tem ideia do que significa
lidar com a terra sob sol ou chuva, no inverno ou no verão.
O
deputado do PSDB, sem nenhum pudor diante da Declaração Universal dos Direitos
Humanos e da Constituição Cidadã de 1988, propõe ainda: o que negociarem patrão
e empregado valerá mais que a legislação trabalhista; a CLT não mais protegerá
o trabalhador rural; autoriza-se trabalho aos domingos e feriados sem necessidade
de laudos; empregado que morar no local de trabalho poderá vender integralmente
as férias; revogam-se as normas do Ministério do Trabalho sobre saúde e
segurança no campo; as regras sobre agrotóxicos não mais serão definidas pelos
ministérios do Trabalho e da Saúde.
O Brasil
acelerou o seu retrocesso com o governo Temer. Fala-se que a Previdência é
deficitária e se reduzem os direitos dos trabalhadores de baixa renda, sem no
entanto tocar nas gordas aposentadorias de políticos que exerceram dois
mandatos, e de membros das Forças Armadas e do Poder Judiciário.
Há muita
grita de “fora Temer” e repulsa a parlamentares favoráveis às reformas
trabalhistas e previdenciárias. Nenhum deles, porém, entrou no Congresso
Nacional pela porta dos fundos. Foram todos eleitos nas urnas.
Ano que
vem termina o mandato de todos os deputados e de 27 senadores. Novos deputados
e 54 senadores serão eleitos. E em 2018 não será fácil utilizar o caixa
dois. Portanto, a questão que se coloca não é apenas em quem cada eleitor
votará. É iniciar, desde hoje, campanha em prol de candidatos que sejam
comprovadamente éticos e comprometidos com os direitos dos segmentos mais
pobres e discriminados de nossa população.
Como canta Geraldo Vandré, “quem
sabe faz a hora, não espera acontecer.” Tomara que deputados e senadores
eleitos em 2018 não possam entoar, ao tomarem posse, o verso de Belchior:
“Ainda somos os mesmos!”
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Frei Betto é escritor, autor de “Batismo de
Sangue” e “Hotel Brasil” (Rocco), entre outros livros
http://www.brasil247.com/pt/colunistas/geral/294211/Revogue-se-a-lei-da-
Aboli%C3%A7%C3%A3o!.htm