por JESSÉ SOUZA para Carta Capital e DCM –
Sociedade e Domínio da Classe Popular no Brasil
‘Vale a fórmula fundamental de Brizola: na dúvida sobre qualquer tema,
escolha o lado contrário da Rede Globo’. Foto: Rovena Rosa / Agência Brasil
Hoje em
dia não resta nenhuma dúvida ao leitor atento que o Brasil está sendo vítima,
desde 2013, de um ataque dirigido pelo capitalismo financeiro
internacional na sua ânsia de saquear as riquezas nacionais e se apropriar
do trabalho coletivo. Mas este ataque não tem as mesmas consequências em todos
os lugares. Daí ser fundamental inquirir pela forma especificamente nacional
que este ataque assume.
No Brasil
a instituição que incorpora à perfeição o espírito do capital financeiro é
a Rede Globo. A mentira tem que ser dita não só como se verdade fosse, mas
tem de dar a impressão de ser luta moral e emancipadora. Essa é a sofisticação
demoníaca do capital financeiro que a Globo materializa e interpreta tão bem. O
ponto essencial é a criminalização da política e das demandas
populares com o propósito de legitimar a rapina da população.
A
criminalização da política como forma de possibilitar o governo diretamente
pelo “mercado” e sua rapina, teve entre nós eficácia inaudita. Nossa elite já
havia produzido, com base na construção de uma imprensa venal e na cooptação da
inteligência nacional, como denuncio no meu livro A Elite do Atraso,
toda uma interpretação preconceituosa do pais como uma raça de vira latas
inconfiáveis e corruptos.
O lugar
institucional da roubalheira do vira-lata brasileiro seria, no entanto, apenas
o Estado patrimonial tornado o mercado, raiz e fonte real de todo roubo, o
lugar paradisíaco do trabalho honesto e do empreendedorismo. Todo o ataque da
rede globo e da lava jato para criminalizar a política foi grandemente
facilitado por este trabalho prévio de distorção da realidade, que literalmente
invisibiliza os interesses dos donos do mercado aqui e lá fora.
O outro
ponto fundamental nesta estratégia é a suposta superação das demandas por
igualdade pelas demandas por diversidade que o capital financeiro internacional
defende desde os anos 90. Desse modo se cria não apenas uma divisão artificial
nas demandas populares como confere um verniz emancipador ao capitalismo
financeiro (domínio econômico) que, na realidade, passa a poder explorar indistintamente mulheres e
homens, negros e brancos, gays e heterossexuais como se defendesse seus
interesses. A apropriação da rede globo do assassinato de Marielle
Franco mostra as consequências praticas desse engodo.
Mas a
Globo não parou por aí. Criminalizou a própria demanda por igualdade (justiça social e distribuiçào de renda) que é a
maior causa da cultura do ódio que grassa impune no país. A narrativa da Rede
Globo, logo depois assumida pela própria Lava Jato, de tratar o PT como
“organização criminosa” e de apenas “fulanizar” a corrupção dos outros
partidos (investigar alguns elementos e não todo o partido), significou rebaixar a demanda por igualdade, que o PT representava,
de seu caráter de fim para mero meio de assalto ao Estado.
Sem a
possibilidade de conferir racionalidade política à raiva justa que se sente
pela injustiça social, parte do povo cai nas mãos da raiva e da violência em
estado puro representada por Bolsonaro e pela onda de assassinatos políticos
que grassa no país. Não ver a relação íntima entre a guerra cultural comandada
pela rede globo e o clima de ódio e assassinato de lideranças (movimentos sociais) que se alastra no
país é cegueira.
O conluio
com a Lava Jato, levando ao Estado de exceção e da suspensão das garantias
legais, reforça a sensação de impunidade para a violência e ódio generalizado.
O resultado é uma histeria punitivista (interenção no Rio de Janeiro, por exemplo) com moralidade de fachada que promete
impunidade para o ódio aberto e assassino. Os ataques com conivência
policial à caravana de Lula, o assassinato de líderes do MST no hospital ou a
chacina de jovens da periferia são todos consequência da lógica cultural de um
capitalismo do saque e da rapina do qual a globo é a expressão máxima entre
nós. A série de José Padilha na Netflix, com padrão global de qualidade,
é mais um capítulo dessa distorção monumental da realidade.
O
diretor, um boçal com virtuosidade técnica, imagina que compreende o mundo ao
chamar de “mecanismo” aquilo que não conhece e nem consegue explicar. Como
descaradamente refaz a história com intuito de falseá-la seu oportunismo é
leviano e irresponsável.
Como o
conluio Globo e Lava Jato, antes tão dominante, perde credibilidade a cada dia
e é percebido crescentemente como braço do neo-colonialismo americano, a
escalada de violência explícita tem a marca do desespero e é ai que reside o
perigo para toda a sociedade. A batalha no STF adquire importância a partir
disso.
A Globo,
como o ministro Gilmar Mendes denunciou, tem também, não só a Lava Jato nas
mãos, mas a sua própria bancada no STF, punitivista e moralista de fachada como
ela. Ainda que os interesses em jogo nesse embate não sejam de todo
transparentes, vale a fórmula fundamental de Brizola: na dúvida sobre qualquer
tema, escolha o lado contrário da rede globo.
https://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-rede-globo-e-a-cultura-do-odio-e-da-mentira-por-jesse-souza/