Todas as últimas guerras
iniciadas pelos Estados Unidos foram contra países grandes produtores de
petróleo
por Michele de Mello no Brasil de Fato – Sociedade e EUA
querem “roubar” petróleo venezuelano
,
Empresa adquirida pela Venezuela
nos anos 1980 vem sofrendo uma série de sanções desde 2017, quando foi proibida
de enviar lucros a Caracas / Foto: Saul Loeb/AFP
Em
janeiro deste ano, o deputado opositor Juan Guaidó se
autoproclamou presidente da Venezuela, um ato que já sinalizava
a intenção da oposição venezuelana de tomar o poder à força, o que se
tornou explícito ao mundo com a fracassada tentativa de golpe de Estado
liderada por Guaidó na última terça-feira (30/abr).
Assim que
foi divulgada a autoproclamação de Guaidó, o secretário de Segurança
Nacional dos Estados Unidos, John Bolton, confirmou a intenção da Casa Branca
com o “novo governo”. Em entrevista para a FOX News ele admitiu:
"Estamos olhando para os ativos de petróleo. Esse é o fluxo de renda mais
importante para o governo da Venezuela. Estamos olhando o que fazer com isso.
Estamos conversando com grandes empresas americanas agora. Isso fará uma grande
diferença para os Estados Unidos economicamente se pudermos ter companhias
petrolíferas americanas realmente investindo e produzindo as capacidades
petrolíferas na Venezuela".
A
Venezuela é o país com maior reserva de petróleo do mundo: 309 bilhões de
barris.
O
primeiro ataque do governo Donald Trump foi contra a Citgo Petroleum
Corporation – filial da Petróleos de Venezuela (PDVSA) nos Estados Unidos. Os EUA bloquearam cerca de US$ 7 bilhões (R$ 28
bilhões) em ativos da estatal venezuelana e reconheceram uma nova diretoria, nomeada pelo
opositor Juan Guaidó.
Mas a história não começa aí. As sanções contra a
empresa estatal venezuelana iniciaram em 2017. Em agosto daquele ano,
Donald Trump assinou um decreto proibindo a Citgo de enviar lucros
à empresa matriz, em Caracas.
Entre 2015 e 2017, a Citgo teve um lucro de
cerca de US$ 2,5 bilhões (R$ 10 bilhões). Ao total, a filial da PDVSA tem três
refinarias (nos estados de Texas, Illinois e Lousiana), três pontos de
abastecimento de combustível e vários postos de gasolina na costa leste dos
EUA. É responsável por 4% do refino de petróleo no país e um dos principais
provedores de combustível para a aviação civil.
A Citgo refina petróleo da Venezuela, do México
e dos Estados Unidos e revende para esses mesmos países, totalizando
cerca de 759 mil barris diários. Outra penalidade da sanção aprovada em 2017 é
justamente o cancelamento das vendas de petróleo cru para ser refinado pela
empresa, impedindo que suas atividades centrais fossem mantidas.
"Primeiro o bloqueio da compra de petróleo;
depois o bloqueio dos seus fundos financeiros; e, por fim, o bloqueio das
contas bancárias venezuelanas em solo estrangeiro são o conjunto de ações que
deixaram clara a intenção e a tentativa dos EUA de se apropriar da Citgo”,
analisa Franco Vielma, sociólogo e analista do portal venezuelano Misión Verdad.
PDVSA
minada por dentro
Em novembro de 2017, seis diretores da
Citgo foram presos em Caracas depois de uma denúncia do Ministério Público
venezuelano que atribuía a eles a responsabilidade por negócios da filial da
PDVSA nos EUA com financeiras que faziam uso de fundos de investimento de alto
risco – os chamados "fundos abutres" – sem o consentimento da
direção central da empresa.
No caso
denunciado, os diretores haviam pedido um empréstimo de US$ 4 bilhões (R$
16 bilhões) para o investimento nesses fundos. Como garantia, hipotecavam
a própria sede da empresa.
Todos os
funcionários tinham dupla nacionalidade, o que fez com que a Justiça
estadunidense fosse acionada para defendê-los da prisão.
Para
Vielma, esse episódio escancara a presença de infiltrados do Pentágono na
empresa, com objetivo de desestabilizá-la por dentro.
Todas
as últimas guerras iniciadas pelos Estados Unidos foram contra países
grandes produtores de petróleo.
Mesma tática, personagens
diferentes
Ao
contrário do que poderia esperar a oposição, a tentativa de endividar e
hipotecar a Citgo fracassou. Mas, em 2019, a empresa volta a ser alvo de
ataques.
Uma das
primeiras ações de Carlos Vecchio, advogado nomeado como embaixador da
Venezuela nos EUA pelo opositor Juan Guaidó, foi solicitar um novo financiamento, para endividar a
empresa, dando as ações da Citgo-PDVSA na bolsa de valores como garantia.
A manobra só pôde ser realizada porque tanto o
Executivo quanto o Legislativo dos Estados Unidos
reconhecem Juan Guaidó e seus nomeados como representantes oficiais da
Venezuela no país.
Enquanto isso, todos os ativos da Citgo-PDVSA estão
sob intervenção do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, devido a outro
decreto, aprovado em 2015, pelo presidente Barack Obama, definindo a Venezuela como uma “ameaça
inusual e extraordinária à segurança dos Estados Unidos”. De acordo com o decreto,
as propriedades venezuelanas dentro do território estadunidense devem
receber o mesmo tratamento de qualquer tipo de propriedade de
organizações consideradas terroristas pela Casa Branca, ou seja, podem ser
confiscadas.
O consumo
diário mundial de petróleo em 2018 foi de 98,82 milhões de barris, segundo
dados da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP).
"É
muito difícil que a Venezuela possa retomar a Citgo diante das condições
atuais. O mais provável é que a Citgo se converta em uma empresa de capital
aberto nos Estados Unidos. Essa, provavelmente, será a ação dessa nova
diretiva nomeada pelo Guaidó: vender as ações da empresa, impedindo que o
Estado venezuelano as recupere", comenta o analista Vielma.
Histórico
A Citgo Petroleum Corporation foi comprada
pelo Estado venezuelano, nos anos 1980, como parte de um processo de
internacionalização do petróleo da Venezuela. A expectativa era que a compra
desse grupo de refinarias iria alavancar a indústria petroleira
nacional. No entanto, desde aquela época, já se denunciava que as
estruturas dessa empresa estariam obsoletas.
"Apesar de sua compra ter sido parte de um
episódio de corrupção da antiga PDVSA, a Citgo serviu para comercializar
petróleo refinado para o México e os Estados Unidos", explica Vielma.
Papel
social
Desde 2006, o governo venezuelano provê diesel para
abastecer o sistema de calefação de famílias de baixa renda dos Estados Unidos. O combustível é distribuído nos
postos de gasolina e refinarias da Citgo e atende a centenas de famílias
de Chicago e Nova York. Estima-se que são distribuídos cerca de 100
mil barris de diesel durante os quatro meses de inverno.
Edição: Rodrigo Chagas
https://www.brasildefato.com.br//2019/05/02/como-trump-quer-se-apropriar-da-empresa-estatal-petrolifera-da-venezuela-nos-eua/