Quem
corteja e promove um Presidente como Bolsonaro, para manter os cordéis do
poder nas suas mãos, é capaz de tudo. Quem sabe até mesmo transferir para
ele o poder real, através de uma ditadura, daí sim abertamente fascista
por Tarso Genro * no Sul 21 –
Sociedade e Armadilhas Contra a Luta Popular Brasileira
Divulgação no Sul 21
“Acordo com a Europa exigirá renovação
industrial no RGS. Aproximação entre Mercosul e União Européia é vista com
otimismo pelo setor e deve estimular modernização, para que as fábricas
possam competir no mercado externo”( 2 de jul. ZH); “Indústria perde
fôlego e fecha vagas no Estado” (6,7 de jul. ZH); “Deca e Nestlé demitem
500 no Estado” (2 jul. C. do Povo); “Mercosul ganhou?”. (Juremir, 3
de jul. C.do Povo); “Brasil é a virgem que todo o tarado quer”. (Pres. Bolsonaro,
Globo, 7 jul). Estas notícias são meias notícias e como tal meias
informações que distorcem a realidade para quem as lê sem atenção para o
seu contexto.
O acordo
que exige renovação industrial é visto com otimismo porque estimula a
modernização no RS? Estimular a modernização é causa de
otimismo? Para quem? Para quem já é moderno ou para quem quer se
modernizar sem meios? (Como, se foram liquidados os órgão de
produção, inovação e pesquisa, em todos os poros do Estado?) A indústria
perde fôlego e fecha vagas no estado? (Porque isso ocorre?) Não será porque foi
arquivada a primeira experiência de política industrial e desenvolvimento
econômico do Estado, de forma combinada com a ausência de uma politica
industrial no país?) Porque a Deca e a Nestlé demitiram 500, se o Estado
está sendo salvo pelas privatizações que irão financiar nosso
desenvolvimento? Perderam a confiança? Mercosul ganhou? (Enfim uma
pergunta séria, que está vinculada a todas as demais.)
Sugiro,
por oportuno, a leitura do livro “Remando contra Maré”, cuja foto
ilustra este artigo, para que possamos fazer um debate sério sobre o
futuro industrial e econômico do Rio Grande, livres dos especialistas que
fazem a apologia do desastre.
As
informações acima destacadas, transmitidas por jornais da grande imprensa,
através de manchetes que conectam apreensões e fatos – aqui do Rio Grande
– com o Brasil e com o mundo, são significativas para entender o que hoje
ocorre no país. Elas são simbólicas da manipulação midiática que
a Globo vem promovendo, “batendo” e “assoprando” em Bolsonaro, em
nome de um projeto bem concreto: passar para controle dos bancos
e agências financeiras uma futura poupança dos trabalhadores, captada
no sistema de capitalização, hoje já adernando no Congresso Nacional. Somos reféns
de Bolsonaro porque ele derrotou Haddad (e isso era a solução para o
Brasil crescer) e ele, Bolsonaro, é refém da Globo (que pode derrubá-lo
quando quiser), tanto se ele fizer, ou se não fizer, a reforma da
Previdência.
As
matérias referidas e ora criticadas como incompletas e sem nexo mostram
que, de um lado, o grau de manipulação da informação que assola o país é
assustadoramente “científico”, aliás processado normalmente não pelos
jornalistas que as assinam, mas pelas editorias que organizam o
“conjunto da obra”, diretamente articulados com os donos da grande
imprensa no país. Cada uma destas matérias -lidas de maneira isolada- não
dizem nada demais, nem informam nada de maneira alarmante. Vistas,
todavia, dentro de cada etapa que o extremismo de direita percorreu até
agora – com a complacência do
oligopólio da mídia – elas têm um enorme significado: consagram como “normal” o nosso país ter um Presidente que diz que o “Brasil é a virgem que todo o tarado quer.”
oligopólio da mídia – elas têm um enorme significado: consagram como “normal” o nosso país ter um Presidente que diz que o “Brasil é a virgem que todo o tarado quer.”
A linha
dos jornais que venderam a alma ao liberal-rentismo, obedeceram as
seguintes etapas, dentro das quais podem ser entendidas matérias que às
vezes parecem ser ingênuas ou piegas, mas que distorcem informações
relevantes ou suprimem – elegantemente – as causas de cada “problema” que
estão noticiando. Para entender as mencionadas “ingenuidades”, as matérias
devem ser compreendidas que trajeto a imprensa tradicional percorreu, para
nos legar esta tragédia humana e política na Presidência da República.
Na
primeira etapa -na qual ajudaram eleger Bolsonaro como
Presidente- assumiram a tese velada ou explicitamente dos dois
radicalismos, como se Haddad e Bolsonaro fossem a “mesma coisa” com
sinais inversos. Aqui nesta etapa ajudaram – por exemplo – a
tornar irrelevante a gravidade da famosa manipulação da “mamadeira de
piroca” – decisiva para a derrota de Haddad – e consagraram que a
“guerra” era entre a “extrema-esquerda” e a “extrema direita”;
na segunda etapa -depois da eleição- promoveram a “naturalização” dos
surtos de psicose autoritária e violenta do Presidente eleito,
colocando em primeiro plano a necessidade da reforma da
previdência, pois sem ela seria o caos. Nesta etapa também convenceram as
próprias vítimas da reforma que elas seriam responsáveis pelo caos do
país, se a reforma não passasse.
Finalmente,
numa terceira etapa -mascarando a brutal crise que vive o país- foram
diluindo as promessas de crescimento e emprego, a ponto de jogar no lixo
as suas previsões de que bastaria prender
Lula e afastar o PT, que o Brasil seria encaminhado para bonança. A dura realidade é bem outra: os fragmentos de informação que hoje publicam – combinados com as grossuras nacionais e internacionais que o Presidente “desregulado” comete- mostram que o sofrimento dos pobres recém começou e o enriquecimento dos 0,5% de ricos vai aumentar.
Lula e afastar o PT, que o Brasil seria encaminhado para bonança. A dura realidade é bem outra: os fragmentos de informação que hoje publicam – combinados com as grossuras nacionais e internacionais que o Presidente “desregulado” comete- mostram que o sofrimento dos pobres recém começou e o enriquecimento dos 0,5% de ricos vai aumentar.
O Governo
real do Brasil não é Bolsonaro. Ele é um “exército” de personalidades da
grande mídia, articulados com os setores capitalistas mais atrasados e
ignorantes (como o “véio da Havan”), os donos de agências
financeiras privadas com suas ligações políticas, burgueses rentistas,
grupos de parlamentares ligados aos partidos tradicionais, quase
sempre vinculados aos magnatas evangélicos das religiões do dinheiro.
Este é o Governo real que controle, forma a opinião e faz pauta dos
fetiches necessários da transição proto-fascista a que estamos submetidos.
As
informações da Intercept podem não derrotar este exército político que
controla o país, mas seguramente causará nele uma sensação derrota, porque
a sua desmoralização já é gigantesca. Sebastian Heffner no livro “A
Revolução Alemã” (Edição da Perseu Abramo,2018) lembra que a
liderança de um exército derrotado (ou que se pensa derrotado) “não pensa
mais no interesse do país que não pode mais protegê-lo, mas pensa apenas
em si mesmo e em como manter a sua honra militar intacta. Foi assim
na França de 1940. Foi assim na Alemanha de 1918.”
Se este
Governo real que funciona como um exército armado de argumentos
manipulatórios se sentir derrotado, não vai conciliar. Vai radicalizar. Quem corteja e promove um Presidente
como Bolsonaro, para manter os cordéis do poder nas suas mãos, é capaz de
tudo. Quem sabe até mesmo transferir
para ele o poder real, através de uma ditadura, daí sim abertamente fascista.
para ele o poder real, através de uma ditadura, daí sim abertamente fascista.
(*) Tarso Genro foi Governador
do Estado do Rio Grande do Sul, Prefeito de Porto Alegre, Ministro da Justiça,
Ministro da Educação e Ministro das Relações Institucionais do Brasil.
https://www.sul21.com.br/colunas/tarso-genro/2019/07/governo-real-e-exercito-politico/