O professor Pedro Santander faz uma avaliação* sobre o crescimento dos discursos de ódio pela ultra-direita no Brasil e Chile, conta como se dá a relação dos meios de comunicação tradicional e contra-hegemônicos nesses paises e explica que, ao contrário do Brasil, as fake news não terão grande impacto nas eleições presidenciais do próximo domingo (21/nov) no Chile, será ?
Um grupo de jornalistas, engenheiros e linguistas
se debruça desde 2016 no Chile sobre as redes sociais em contexto eleitoral.
Esse trabalho de investigação** é coordenado pelo professor de jornalismo da
PUC de Valparaíso Pedro Santander. Desde agosto de 2021, o trabalho ganhou uma
amplitude a partir dos ataques ao processo de elaboração da nova Constituinte e
que tem na presidência a acadêmica mapuche Elisa Loncón
por Agência
Saiba Mais, para o Comunica Sul* e blog Barão de Itararé – Sociedade,
Eleições 2022 e Fake News
Notícias falsas se disseminam rapidamente pela internet. Imagem no site do UOL
Os
mapuches são um dos 9 povos originários do Chile e serão representados pela
primeira vez na futura Carta Magna. O novo texto substituirá a
Constituição criada em 1980 pelo governo chileno, sem participação popular, ainda
sob a ditadura de Augusto Pinochet.
De acordo
com o censo mais recente, o Chile possui 19,1 milhões de habitantes, uma
população 11 vezes menor que a do Brasil, assim como quanto ao território, as
proporções são enormes.
Nesta
entrevista especial concedida à agência Saiba Mais/Comunica Sul em Valparaíso,
litoral chileno, o professor Pedro Santander faz uma avaliação sobre o
crescimento dos discursos de ódio pela ultra-direita no Chile, conta como se dá
a relação dos meios de comunicação tradicional e contra-hegemônicos
(comunicação livre) no país, explicando
que, ao contrário do Brasil, as fake news não terão grande impacto nas eleições
presidenciais do próximo domingo (21/nov) em razão do processo de politização
radical da população local após as grandes manifestações que sacudiram o país a
partir de outubro de 2019.
Segue
abaixo entrevista com o professor Pedro Santander:
O estopim
para as chamadas jornadas de junho de 2013 no Brasil (manifestações populares)
também foi um reajuste na tarifa de transporte público, assim como o detonador
dos protestos de outubro de 2019 no Chile. Porque você acha que as revoltas
populares nesses dois países tomaram rumos tão distintos ?
Há uma
variável. A importância geopolítica do Brasil não é a mesma importância
geopolítica do Chile. O Brasil tem uma importância mundial. Se o Brasil vira à
esquerda todo o continente vira à esquerda. E se o Brasil vira à direita todo o
continente vira à direita. Se o Brasil estabelece tratamentos soberanos e
anti-imperialista (administrar com o povo), todo o continente lucraria com
isso. Se o Chile faz não é a mesma coisa, salvo no histórico caso de Salvador
Allende (uma das poucas administrações federais chilenas democrática) . Então,
o que ocorreu em 2013 poderia girar a esquerda, mas o imperialismo (elites
mundiais) não iria permitir. Jamais isso aconteceria no Brasil, por isso terminou
num golpe de estado em 2016.
O
imperialismo global apoia a força mais extrema que existir na sociedade brasileira
para impedir qualquer mudança para a esquerda ou centro-esquerda na América
Latina. O fim da ALCA na América Latina teve participação do Hugo Chavez,
Nestor Kirchner, mas fundamentalmente foi Lula. E isso provocou um grande
retrocesso às forças imperialistas (elites) no continente. O imperialismo
(elites) é capaz de qualquer coisa para frear esse movimento à esquerda ou
centro-esquerda no Brasil. E tem também o fato do Partido dos Trabalhadores ter
perdido o apoio popular e suas conexões com a base histórica ou popular. Falam
que a direita estava dando impressão de que não faria golpe de estado. Isso é
mentira. A direita sempre faz golpes de Estado. Lugo no Paraguai, Evo na
Bolívia, Dilma no Brasil.
No
Brasil, desde 2016, a partir do golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, há
uma máquina estruturada de disparos em massa de fake News (notícias falsas)
pelo whats app, facebook, tweeter, google, instagram, tik tok, telegran. Por
que o whats app ou outras mídias não entraram no monitoramento de vocês ?
Porque é
impossível monitorar o whatsapp ou outras mídias.
Mas não
há uma disseminação de notícias falsas por esses aplicativos no Chile ?
Não no
nível de vocês. No caso do Brasil, já em 2014 alguns especialistas alertavam
sobre o que poderia acontecer com o uso do whats app. Com Bolsonaro,
principalmente, em virtude da magnitude do que Bolsonaro fez, o que não ocorreu
em nenhum país da América Latina, pois teve apoio de Steve Bannon e outras
fontes imperialistas (contra o povo).
Nos EUA a
interferência na eleição que elegeu Trump foi a partir do facebook, já no
Brasil via whats app…
É porque
nos EUA se usa pouco o whats app, lá é mais facebook. Vocês já haviam
experimentado em 2014 essas notícias falsas com whats app e foi um escândalo o
que aconteceu em 2018. Depois disseram que o whats app fez alguma regulação,
mas não adiantou ou foi só para
disfarçar nas mídias sociais. No Chile a direita usa as fake news, mas aqui
temos menos problema com boots (robôs). Até temos boots, mas não é tão
significativo.
No Chile
o whats app não é tão popular ?
O whats app
é popular, tem uma penetração altíssima, algo em torno de 80% da população, mas
aqui não se usa esse aplicativo com fins políticos eleitorais como Bolsonaro
fez nas eleições de 2018. Creio que seja um problema de falta do dinheiro.
Bolsonaro é isso, comprou milhares de números telefônicos em Portugal nos EUA e
em outros países, sem falar nas contas falsas que foram infiltradas nas mídias
sociais. Multiplica isso por dólares! Depois a quantidade de boots, gente para
administrar isso… A campanha macabra de 2018 foi a continuidade do golpe de
2016. O Brasil é um dos países mais importantes da América Latina e se empregou
todo dinheiro da estrema direita mundial para que o fascismo tomasse o poder.
No Brasil
se fala muito que a esquerda não dá importância à comunicação, ao contrário da
direita. É assim aqui no Chile e em outros países da América Latina ?
Sim. Hugo
Chávez dizia que “a comunicação era a falha tectônica da revolução”. E Fidel
Castro, nos anos 1990, já falava que agora, o que se trata, é a batalha das
ideias. Então creio que tudo isso é correto, mas creio também que já chegou ao
seu limite, terá que ser dado um basta, não se sabe os vários caminhos que se
utilizarão para isso. É evidente que a batalha da comunicação é de primeira
ordem para os movimento da América Latina, tanto para mantermos como para nos
defendermos dos ataques do imperialismo (direita extrema). Sempre nos atacaram
militarmente, politicamente, mas não como agora nesse ataque nas redes sociais,
como se fosse uma guerra híbrida. Nunca nos atacaram sob esse ângulo. Cada
estágio tecnológico tem sua própria expressão de ataque imperialista. Esses
ataques se centram muito nessa guerra híbrida. Comunicação (ou linguística)
como arma de ataque político. Não há muito o que discutir. Ou nos metemos nisso
ou nos despedimos desse ciclo histórico e aceitemos a derrota.
A
constituição brasileira proíbe a propriedade cruzada de comunicação, ou seja,
um mesmo empresário não pode ter jornal, rádio e TV. Mas como esse trecho da
Carta não foi regulamentada, a fiscalização é branda. Como é no Chile ?
Não é
proibido. Na Constituição chilena atual, ainda da época da ditadura, a única
proibição prevista no artigo 19 é sobre o monopólio estatal de meios de
comunicação. Sei que a brasileira proíbe, a venezuelana, boliviana, argentina,
uruguaia, mas no Chile não.
O avanço
da extrema-direita tem relação com a importância que damos à comunicação (ou
linguística) ?
A
extrema-direita global tem em comum três coisas: é anti-globalista,
contracultural e o uso da comunicação digital. A extrema-direita brasileira, a
mexicana, a chilena usam as redes sociais de forma muito similar.
Os
veículos de mídias tradicionais do Chile também dão sustentação ao discurso de
ódio e podem ser co-responsabilizados pelo avanço dessa extrema-direita no país
?
Lenin (político
e pensador russo) dizia que o fascismo é uma etapa superior. Creio que o
capitalismo, às vezes, necessita do fascismo, uma etapa onde a democracia
liberal não rende mais muito frutos a extrema direita, né ? Para proteger a
plutocracia (democracia do terror, se assim se pode descrever) eles necessitam
do fascismo. E uma maneira de recorrer a eles são usando os meios de
comunicação social. O twitter, facebook, os algorítimos, a imprensa
tradicional, a semiótica contracultural (cinema, revistas, vídeos, etc)… é
muita coisa. Os meios de comunicação tradicional sempre foram fascistas. A
Globo por exemplo, nunca viu problema em apoiar golpes de Estado. Isso para mim
já mostra como é a ação deles. O diário El País, da Espanha, apoiou todos os
golpes de países da América Latina. Isso é fascismo. As vezes nós, de centro esquerda,
acreditamos que eles não são tão mal como são (risos), mas são fascistas sim.
No Chile, durante o plebiscito, o jornalismo oligopólico (tradicional), como
gosto de chamar, apoiou a posição de rechaço à nova Constituinte, no que
avaliamos como um apoio ao pinochetismo, ao fascismo. Apoiaram a constituição
de Pinochet.
Há formas
de controlar e fiscalizar fake news nas redes sociais sem resvalar para o
discurso da censura ?
Quem mais
avançou nisso foi o Brasil com o Marco Civil da Internet aprovado no governo
Dilma e uma referência para a América Latina. Claro que quando veio Bolsonaro
isso foi letra morta, simplesmente foi como se o Marco Civil não existisse. Há
várias formas de regular a mentira na internet. A inteligência humana nos
permitiu chegar a Marte. Como não vamos usar essa inteligência para controlar
isso ? Não é censura. É necessário para o bem global. Um grupo na Espanha
sugeriu que numa campanha presidencial se demonstra que um candidato divulga
fake news não pode participar do debate presidencial. Perfeito. E eficaz. Há
formas.
Mas o que
aconteceu no Brasil, em relação ao whats app, serviu para vocês se protegerem
mais ?
Não
creio. Lamentavelmente o Chile está muito desconectado dos demais países da
América Latina. É o país mais desconectado do que qualquer outro. Não só porque
estamos no final do continente (risos), mas porque a classe política chilena,
nos últimos 30 a 40 anos, não mira a América Latina. É o que chamamos de
neoliberalismo progressista. Ricardo Lago, Michele Barchelet, todos miraram a
Europa. A Argentina tem uma estampa mais europeia, mas está muito mais
relacionada com a Bolívia, o Brasil, o Uruguai… agora isso foi depois do golpe
de 1973 (Pinochet). Até Salvador Allende era diferente. Então, antigamente
éramos muito conectados com a América Latina, hoje não mais.
Como se
dá a concentração dos veículos de imprensa no Chile ?
Os
estudos sérios mais recentes da política econômica da comunicação social são de
sete ou oito anos e indicam que o Chile é o país com a maior taxa de
concentração de veículos de comunicação da América Latina, junto com a Colômbia
e Guatemala. Mais até que no Brasil, porque somos um país unitário, e não uma
federação. Isso também se reflete. Nossa estrutura de propriedade
de jornal, radio e televisão é a mesma que tínhamos na ditadura. O que se
configura na farsa do que estamos vivendo em termos de mercado midiático. No
âmbito da comunicação digital se aprofunda a diversidade, não só na oferta, mas
na audiência também. Ademais, se triplicaram depois das revoltas populares de
2019. Foi muito importante ver isso. Após as manifestações de outubro de 2019 o
consumo dos meios digitais não-hegemônicos se triplicou no Chile. Passou também
a abrigar outras idades. Os maiores de 60 anos entraram na audiência de uma
forma nunca antes vista no Chile. E eram quem menos liam. E depois dos
protestos de outubro, os idosos e outras pessoas se converteram como segundo
maior público. Ou seja, chegou gente nova.
Agência
Saiba Mais: Você coordena um grupo de monitoramento de redes sociais na PUC
Valparaíso. Pode explicar melhor como funciona esse trabalho ?
Pedro
Santander: Coordeno
uma equipe de investigação multidisciplinar com jornalistas, engenheiros e
linguistas e analisamos as redes sociais em contexto eleitoral e discurso de
ódio. Esses são os campos do nosso estudo, de nossa observação. Em âmbito
eleitoral estamos monitorando os 7 candidatos e basicamente medindo interações
e volume de ações que eles têm no facebook, instagram e twitter. Em outro
âmbito, monitoramos o discurso de ódio, a violência línea ou comunicação
violenta, contra a convenção constitucional (em processo de elaboração). E
especificamente contra a presidenta da convenção, a acadêmica mapuche Elisa
Loncón, e sua condição de mulher e mapuche.
O que
levou você a criar esse grupo, houve um fato específico ?
O grupo
de investigação é anterior, nasceu em 2016, quando constituímos o DEEP,
Demoscopia Eletrônica de Espaço Público, um ramo da sociologia e estudo de
opinião pública. Mas em agosto deste ano a presidenta da Constituinte Elisa
Loncón nos contatou. Ela é linguista, nos conhecemos da universidade e se
mostrou muito preocupada com os ataques que a Constituinte estava recebendo de
usuários, do conselho de ultra-direita, dos meios de comunicação da
ultra-direita. E pediu que ajudássemos a monitorar e a identificar essas
pessoas. Principalmente no twitter porque é onde há mais discurso de ódio e
violência, embora no facebook e instagram também tenha.
Porque o
discurso de ódio contra a Constituinte ?
Quem está
construindo a nova Constituição, de forma inédita, não é o governo do Chile.
Pela primeira vez, a Constituição está sendo debatida democraticamente. Nunca
havia ocorrido isso no Chile, e com paridade de gênero, representação dos povos
originários e com certa composição de classe trabalhadora. Isso é muito
preocupante para o status quo e para quem manda no Chile. Esse grupo está realizando
uma série de manobras políticas, econômicas e discursivas para que a
Constituição não seja aprovada. É uma aposta política pelo boicote e por uma
violência discursiva nas redes sociais. São manobras para cansar e para que
plebiscito não seja favorável em julho de 2022.
Os atores
envolvidos nesse ataques não gostam da democracia ?
Claro. E
por duas razões: a primeira é que os atores que estão atuando contra a
Constituição apoiaram a opção do rechaço no plebiscito do ano passado e
decidiram manter a Constituição de Pinochet. São setores não-democráticos. E o
segundo motivo: o Chile, assim como outros países da América Latina, não vive
uma democracia plena, vive uma plutocracia. Tampouco temos uma ditadura, mas
vivemos uma plutocracia, um governo dos ricos. Como a Argentina teve com Macri,
como vocês têm no Brasil com Bolsonaro, o Equador com Guillhermo Lasso, Piñera
aqui no Chile… são banqueiros que estão no comando desses países. Todos são
multimilionários com dinheiro em paraísos fiscais, sem pagar imposto. Estamos
sendo governados por regimes plutocráticos e talvez isso, com uma nova
constituição e talvez com um governo de Gabriel Boric, chegasse ao fim. Isso é
o que se vê no grupo dominante do Chile.
Quais os
resultados práticos desse monitoramento ?
De
resultados concretos detectamos que 8.048 contas de usuários únicos que, só em
agosto, participaram dos ataques são de ultra-direita e participaram do rechaço
ao plebiscito. E isso não é pouco porque participam de forma constante,
incisiva. Nesses três meses vemos permanentes ataques à convenção, com alguns
picos e acaba entrando na agenda da imprensa tradicional.
O que
mais chamou sua atenção ?
O
objetivo dos ataques contra Elisa Loncón é sua condição de mapuche e de mulher.
A convenção representa os 9 povos orginários, mas só atacam os mapuches, não
atacam os demais. É um discurso de ódio com caráter misógino e racista.
Há mais
menções e interações negativas do que positivas sobre a Constituição ?
As
negativas são maiores. O que passa é que os que defendem a convenção são menos,
mas quando se ativam são mais. A negativa é mais frequente porque é todo dia.
São contas que já estavam operando desde o plebiscito, em julho deste ano. São
militantes, ativistas atacando. São ligados à ultra-direita, hoje apoiando a
candidato do José Antonio Kast (Partido Republicano do Chile).
Pedro Santander, foto Alana Souza
A
quantidade de usuários de ultra-direita te surpreendeu ?
Sim, num
mês apenas é muito para o Chile. Somos um país pequeno, 19 milhões de
habitantes, temos menos usuários em redes sociais e, para nossa realidade, é um
numero bem alto.
O que
vocês pretendem com esses dados, esse trabalho de monitoramento ?
É um trabalho
científico, queremos entender. Estamos gerando algorítimo próprio, de maneira
automática e em tempo real identificar discurso de ódio contra a convenção. E
politicamente queremos apoiar a Constituição. Como investigadores temos
convicção de que esse organismo está criando um novo Chile. Um Chile real,
diverso, com setores populares, com diversidade, povos originários com homens e
mulheres. Estamos criando um pequeno grão de areia para denunciar o discurso de
ódio.
Dá para
dizer que outubro de 2019 foi um divisor de águas também para a comunicação
social no Chile ?
Mudou
tudo, até porque a comunicação social é parte da dinâmica política. Outro dado
interessante: a audiência da televisão aberta perdeu 400 mil pessoas entre
novembro e dezembro de 2019, ou seja, em dois meses. A principal hipótese
levantada é porque a televisão criminalizou as manifestações. 400 mil pessoas
se foram. Depois veio o Covid e a audiência na televisão aberta aumentou. Mas
foi um castigo em uma audiência que nunca havia se visto. Nasceram meios
digitais novos também.
A que se deve o descrédito da imprensa tradicional
não só aqui no Chile, além da criminalização de revoltas sociais ?
É como
parte do protocolo da plutocracia. Você vê de que lado está a comunicação da plutocracia
quando se há revoltas como a de 2019. O Mercúrio (principal conglomerado
empresarial de comunicação do Chile), quando cobria o povo mapuche nos anos
1980 o chamavam de bêbados, vagabundos, vândalos, delinquentes, turvos, agora é
a mesma coisa. Isso não é novo, passa no Chile, Brasil, Honduras, México,
protesto social é sempre criminalizado. Mas vem de trás. É uma continuidade
histórica inaugurada pelos espanhóis, de que nós somos os bárbaros. É uma
continuidade histórica de quem se opõe ao poder estabelecido que foi se
sofisticando à medida que foi sofisticando a atuação dos meios de comunicação social
também.
O tema “regulação da mídia” também é um tabu no
Chile ?
Apesar de
Bolsonaro e do golpe, estamos muito mais atrasados que vocês. Aqui não só não
há restrição legal, mas se eliminou a regulação completamente. Daniel Jadue,
candidato comunista que participou e perdeu as primárias para o candidato da
Frente Ampla Gabriel Boric, propôs regular os meios de comunicação e foi um
escândalo. É um tema tabu, vedado e quando tocam saltam todos. Agora a mim me
dá a impressão de que falta preparação para defender o tema aos
candidatos de esquerda e os líderes de esquerda. Jadue era um excelente
candidato preparado nos temas econômicos, ecológicos, mas não estava preparado
para debater comunicação social. Boric é a mesma coisa, falta preparação nesse
terreno. A comunicação é a falha tectônica da revolução, como dizia Hugo
Chavez.
Falta
preparação para o povo também ?
Eu penso
que os povos estão preparados para discutir todos esses temas. Após as revoltas
sociais os veículos tradicionais não podiam sair na rua. É causa do descrédito.
A audiência castiga. Acho que o povo está preparado, mas nossos candidatos não
estão. O que mostrou Venezuela, Uruguai e Argentina ? Que quando você envolve a
população as pessoas participam e de forma forte.
As fake
news podem decidir as eleições no Chile ?
Não.
Primeiro porque no Chile se usa fake news, mas não de forma pandêmica, como no
Brasil, a exemplo do kit gay de Bolsonaro. No Brasil foi outro nível, mundial.
Mas há outro ponto: na raiz das manifestações de 2019, o povo chileno viveu um
processo radical de politização. E isso a esquerda tem que considerar sempre,
essa luta é assimétrica. Quando o povo está politizado, a campanha de fake
news, de boots, de montagens são mais difíceis. Uma maneira de enfrentar essa
máquina que vocês viveram tão terrivelmente de conspiração política
comunicacional, de fake news, de concentração de meios, utilizada pela extrema
direita global.
As fake
news tiveram grande penetração no meio evangélico no Brasil. Há uma preocupação
maior com esse segmento no Chile ?
Há
também, mas não com a força do Brasil. Lá vocês tem uma bancada evangélica,
aqui tem um ou outro no Senado. O contato da direita chilena com os setores
mais populares são através dos evangélicos. Quem trabalha o mundo social mais
profundo é o Partido Comunista do Chile e o segmento evangélico. Os evangélicos
são um canal de comunicação das oligarquias com o povo. Isso, nos últimos 30 ou
40 anos, por isso são tão corruptas. No Chile não tem a força do Brasil, nem a
força da igreja Católica.
Chama
atenção a pouca participação dos chilenos em eleições…
É que no
Chile o voto é voluntário e participa muito pouca gente.
Dá pra
mudar essa realidade usando as redes sociais ?
Sim. O
plebiscito foi o momento em que mais gente participou, foram 51%, ou seja,
ainda assim foi pouca gente. Temos no Chile esse problema de que pouca gente
participa. Mas já aumentou . Entre os jovens de 18 a 29 anos pouca gente vota,
mas para o plebiscito foi muita gente.
*Esta
reportagem integra o projeto Saiba Mais/Comunica Sul no Chile e está sendo
financiada pela Intersindical, Sindicato dos Bancários do RN, Sicoob,
Sintrajufe/RS, Apeoesp Sudoeste Centro, Sinjusc, Carta Maior, Hora do Povo,
Diálogos do Sul, Agência Sindical, Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão
de Itararé e mais 136 pessoas que apoiaram individualmente esta cobertura
colaborativa e acreditam no jornalismo independente.
**Para
conhecer o trabalho de monitoramento coordenado por Pedro Santander acesse aqui
Publicado: 16 novembro 2021
Fonte: https://baraodeitarare.org.br/site/noticias/internacional/por-que-as-fake-news-nao-vao-influenciar-as-eleicoes-no-chile