Sociológos,
antropólogos e historiadores se agarram às cadeiras da academia para tentar
evitar que as mesmas sejam tiradas enquanto bradam: “nós fazemos Ciência!
por João
Vitor Santos no portal IHU
Unissinos – Sociedade e Ciências Sociais se afastou da vida real
Vivemos
em um tempo em que ideologia – assim mesmo, no seu sentido mais amplo – parece
ter tomado conta do debate, reduzindo todo o campo das Ciências Humanas a essa lógica. Tudo passa a ser ideológico,
doutrinação ou mesmo apenas o entendimento de uma das inúmeras partes das
complexas relações humanas. De outro lado, antropólogos, historiadores e
sociólogos se agarram às cadeiras da academia para tentar evitar que as mesmas
sejam tiradas enquanto bradam: “nós fazemos Ciência!”. No fim das
contas, ninguém se entende, o mundo da academia parece um, a realidade da vida
cotidiana outro e, em meio a arroubos totalitários
e crises infindáveis, campos como Sociologia, Filosofia e outros são postos como
desnecessários. É diante desse cenário que o sociólogo José de Souza Martins*, ex-professor
do Departamento de Sociologia e
professor Emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo - FFLCH-USP, se coloca a refletir
sobre mudanças sociais e políticas e os desafios para as Ciências Sociais.
José
de Souza Martins: "Talvez, seja chegada a hora de fazer uma revisão
crítica da Sociologia que se tem feito e ensinado nas universidades"
(Foto: reprodução You Tube do IHU)
Para Martins, esse é realmente um
tempo complicado para falar em Ciências
Sociais no Brasil porque estamos vivendo um momento em que não se sabe o
que vai acontecer com essa área de conhecimento. “Não só pelas ameaças, mas
também porque a sociedade brasileira passou por muitas transformações nos
últimos 15 ou 20 anos e as Ciências
Sociais sofreram as consequências”, analisa. José de Souza Martins foi o conferencista
da aula magna do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da
Unisinos, realizada no dia 03 de setembro de 2019. Neste ano, o PPG completa 20 anos. Para a
coordenadora do Programa, Monika Dowbor, a proposta de ouvir
o professor coaduna com os objetivos e emergências de hoje, “de fazer Ciências Sociais enraizada, pensando o
local, com pessoas de carne e osso e suas lutas”. “Esse sentido de Ciências
Sociais que precisamos resgatar para fazer frente àqueles que dizem que nós não
fazemos sentido”, acrescenta Monika.
O
professor José de Souza Martins chama
atenção para um conceito por meio do qual deve se compreender as Ciências Sociais: “são ciências
de diálogos com a realidade, responde à realidade”. E esse diálogo com a
realidade tem de ser franco, não mascarado por vieses ideológicos ou através de
lentes de teorias importadas de outros tempos e lugares. “Talvez, seja chegada
a hora de fazer uma revisão crítica da Sociologia que se tem feito e
ensinado nas universidades. Essa revisão significa voltar à tradição
clássica, ver o que ficou de fora, de lado, o que não foi tratado como
relevante, urgente e necessário”, aponta. Para tanto, o professor propõe um
resgate das formas como o campo se origina e vem se desenvolvendo no Brasil.
Uma Sociologia em “terra brasilis”
José de Souza
Martins recorda que a Sociologia científica brasileira nasce
num momento muito determinado, 1933 [fundação da Escola de Sociologia e Política
de São Paulo], já no final do Governo Provisório de Getúlio Vargas, quase na Constituição de 1934. “Havia
pensadores sociais antes disso, como Euclides da Cunha, que vai se
debruçar a pensar o que é o Brasil e mesmo Gilberto Freyre. Mas não foram
fundadores da introdução da Sociologia
científica do Brasil. Foi a Universidade que fez isso”, contextualiza. Assim,
segundo o professor, as Ciências
Sociais chegam ao Brasil juntamente com a própria ideia, a concepção de
universidade. “A ideia era formar professores que preparariam professores
primários para as escolas normais, aquelas escolas distantes de bairros e mesmo
as da roça”, acrescenta.
O
objetivo, no momento desse Brasil, era criar uma espécie de ponte entre o mundo
culto e republicano e o mundo que estava ainda muito perto da escravidão. “A
intenção da Sociologia era civilizatória. E isso funcionou”, avalia. “Quando
fui para a universidade, fui porque queria ser professor de Sociologia
numa escola dessas”, ainda recorda. O sonho de Martins era ser professor
numa escola de roça como a que cresceu. Por ser alguém da roça, chegou a supor
que poderia compreender melhor a função da escola primária numa sociedade
rural. Nisso, mal sabia ele, já residia algo tão caro a sua forma de fazer Sociologia:
a conexão direta com a realidade local. Mas ele acaba ingressando na USP.
“A intenção da Sociologia era
civilizatória. E isso funcionou”, José de Souza Martins no Tweet
Depois
dessa primeira fase, em que se visava à formação de “professores dos
professores”, os anos 1960 são marcados pelo desinteresse dos acadêmicos de Ciências
Sociais pelo magistério. Assim, há uma espécie de virada e as atenções se
voltam a pensar no desenvolvimento econômico social do Brasil. Chegamos à
fase do desenvolvimentismo. “Nesse sentido há
certa compreensão do que seria o desenvolvimento. Ele teria de ser econômico e
social e não apenas pensado para educar, mas para dirigir um sistema de
economia e também social”, observa.
Mas, quando isso parece formulado mais claramente,
começam os problemas. O professor Martins recorda que tudo parecia que ia
bem, indicava que o Brasil e o pensamento intelectual brasileiro estavam no
caminho de uma autonomia na relação com o centro de decisão da economia
internacional, mas chegava-se a 1964 e o golpe vinha trazer um novo revés. “Os
rumos do Brasil e da própria Sociologia ficam completamente alterados”,
pontua. “Nasce aí a época do confronto da ditadura militar. O regime se opõe à
área de Ciências de Sociais, à universidade e à ideia de nacional
desenvolvimentismo e começa a perseguição”, aponta.
A emergência de
uma força ideológica e suas marcas na Sociologia brasileira
Diante de tamanha repressão dos “anos de chumbo”, carregar-se de ideologia
era quase inevitável para quem queria fazer resistência ao regime. É em 1968,
lembra o professor José de Souza Martins, que o movimento estudantil é associado
a uma ideia de subversão. Logo no ano seguinte, 1969, ocorrem as primeiras
condenações desses “grupos de subversivos”. “Se entendia que o subversivo tinha
algumas características. Para eles, o comunista. E essa figura não sabia cantar
o hino nacional, também não sabia descrever a bandeira nacional”, recorda,
destacando a detenção, à época, de professores como Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, João Cruz Costa, entre outros.
Assim,
nesse contexto, a história da Sociologia
nacional começa a passar por um momento em que o pensamento contestador passa a
ser elementar e não mais apenas uma alternativa. “O regime foi empurrando esses
jovens nesse sentido”, acrescenta. E, com isso, a Sociologia vai se aproximando
das ideias de militância política, que chegou a compreender luta armada e morte
de quem se alinhava a essas fileiras de militantes. “Conhecidos meus, que via
na faculdade, desapareceram”, recorda o professor.
Entretanto,
mesmo atravessados por toda essa experiência, o professor Martins lembra que o desenvolvimento
das Ciências Sociais fica em
suspenso, como se a resposta para a pergunta ‘para que mesmo serve a
Sociologia?’ ainda estivesse pendente. Foi um período de muita confusão, porque
muitos chegavam da escola secundária achando que no curso de Ciências Sociais
seriam ensinados a como ser revolucionários. “Era um custo explicar para os
alunos que não era bem assim”, brinca. E detalha: “e era um custo dizer isso e,
ao dizer isso, não estávamos apoiando o regime, apenas fazendo constatação
real. A Sociologia não faz
nenhum revolucionário. A origem de toda a sociologia é conservadora. Mesmo em Marx, a origem da sociologia e dos
valores vem de concepção conservadora”.
"As pessoas passaram a
confundir Sociologia e militância", José de Souza Martins no Tweet
Ou seja,
pela emergência de uma conjuntura política a ciência sociológica fica
mergulhada na atmosfera ideológica e militante. Para o professor Martins, são marcas que ficam por
muito tempo e com uma imensa dificuldade em se demonstrar que, embora muito
importante, a resistência não é o todo da Sociologia enquanto ciência. “As
pessoas passaram a confundir Sociologia e militância. Chegou a se falar em
sociologia militante ao se referir a Florestan. Mas isso não é verdade”, destaca.
No caso
de Florestan Fernandes, Martins recorda que tem uma origem trotskista, mas que acaba sendo
transformada porque o pensador chega à conclusão de que não poderia, ao
mesmo tempo, ser o cientista e ser o militante que deseja. “O Florestan se desligou do trotskismo e
se libertou. Esse foi o melhor período da vida. É curioso o papel libertador
que essas desvinculações têm na carreira intelectual das pessoas”, avalia.
Vinculações, desvinculações e a experiência de
Lefebvre
Acompanhando
o raciocínio do professor José de Souza Martins, pode-se pensar que
a contaminação da ideologia de resistência ao regime militar no Brasil transforma
e inebria a constituição da Sociologia
enquanto campo científico, fazendo dela muito mais um espaço de militância. O
próprio professor destaca que, naquele momento, essa ideologização e militância
eram necessárias. Contudo, quem sabe, o que teria faltado no momento posterior
é a desvinculação, bem como recorda que Florestan
Fernandes fez com relação à militância trotskista.
Henri Lefebvre (Foto:
reprodução/Wikipédia)
Mas como
fazer essa desvinculação sem que se perca toda essa historicidade do campo?
Para o professor Martins, outro
pensador que fornece chaves interessantes é o filósofo e sociólogo francês Henri Lefebvre (1901-1991). “Lefebvre é o grande nome da sociologia marxiana, é o homem que de fato
traz Marx, como sociólogo, para o século
XX”, destaca. O pensador foi membro do Partido
Comunista francês, mas, como bem lembra Martins, foi censurado pelo Partido e acabou sendo expulso.
“Quando é expulso, produz suas melhores obras, porque é libertado desse
constrangimento do politicamente correto”, acentua o professor.
Martins faz questão de esclarecer de não se tratar de
apagamento de convicções políticas e partidárias. Entretanto, reconhece que a
carga dessas convicções constitui um problema real quando se fala em análises
mais científicas. “Por exemplo, eu não posso desenvolver determinado tipo de
análise se colidir com minha religião, com a ideologia de meu partido político.
Então, fica difícil fazer ciências nessas condições”, detalha. “Quando falo no
Brasil ideológico e desatento, estou falando nessa desatenção que de fato
prejudicou muito os estudos e trabalhos científicos da Sociologia em
nossas universidades no último 20 anos, pelo menos”.
O doutor
em Ciências Sociais, o professor do PPG
da Unisinos, José Rogério Lopes, ainda vai além
e aponta outras contribuições de Lefebvre.
Para ele, há pelo menos mais dois destaques que se fazem necessários: “a
compreensão que o autor expõe sobre a importância do cotidiano, da vida
cotidiana, para desvendar os processos de reprodução social do capitalismo; e o
método dialético atualizado pelo autor, que o prof. José de Souza Martins descreveu sucintamente em sua conferência na
abordagem regressiva-progressiva”.
Sociologia e transformação social (e real!)
Retomando
a historicidade da Sociologia
brasileira, o professor José de Souza
Martins lembra que desde a década de 1960, a Sociologia vinha dando
ênfase para a transformação social, a produção de nova sociedade, nem que para
isso fossem necessárias reformas sociais. “E havia quem falasse em revolução”,
acrescenta. Assim, acredita ele, numa extensa medida, abriu-se mão dos temas
relativos à reprodução social. Por isso, o professor indica, mais uma vez,
o pensamento de Lefebvre, pois esse revela que o processo do capital é de
produção, “produção da coisa nova, e reprodução daquilo que já existe”.
José Roberto Lopes: "a
Psicologia Social tem utilizado o método de Lefebvre para elaborar análises de
experiências urbanas contemporâneas, com ênfase na vivência subjetiva de crises
sociais, na apreensão coletiva do espaço urbano, em seus componentes físicos ou
simbólicos" (Foto: reprodução You Tube)
Para Martins, “esse é o grande dilema do
capitalismo contemporâneo”, pois “abrimos mão dos temas relativos à
reprodução social. Fechamos os olhos para a força histórica na sociedade
moderna e na pós-moderna da reiteração social”. Para ele, a Sociologia não
levou em conta que a experiência marxiana traz a contradição, que permeia e
determina as relações sociais. “É o repetitivo e o novo, observados por Lefebvre, que constituem
reciprocamente na descontinuidade de que lhes é próprio. Nascem juntos e
convivem contraditoriamente, tendo de ser e não ser aquela realidade social ao
mesmo tempo”, analisa.
Há,
assim, no diagnóstico do professor Martins,
mudanças de fato que vêm se impondo à Sociologia. “Com o término da II Guerra, o produtivo e o improdutivo
se impuseram, o novo e o repetido. A possibilidade das transformações sociais
se deslocaram para a vida cotidiana. A revolução ganhou outras e diferentes
determinações”, propõe.
A
revolução legou a ideia de que é nela que reside a grande transformação, a
ruptura. Mas o mundo mudou. “Provavelmente essa revolução não existe mais e não
há condições sociais e históricas para tal. Foi Lefebvre quem estudou minuciosamente esse processo de
transformação da sociedade contemporânea. Descobriu a imensa revolução da
crítica da vida cotidiana”, pontua. Ou seja, da vida cotidiana é que emergem as
tensões sem que necessariamente haja um ponto zero de revolução. “Ele fez o
diálogo direto com os operários, dava cursos aos operários”, recorda, ao
pontuar a ancoragem no real que Lefebvre
acaba encontrando.
Depois, o
francês vai olhar para a cidade e vê que nela, quase que silenciosamente, há
formas de constrangimento que subjugam o operário sem pegar em armas. “As
cidades são feitas para enquadrar as pessoas, a cidade moderna é isso. Brasília
é isso. Numa manifestação na Praça dos três poderes, as pessoas são diminuídas,
perdem a visibilidade”.
O
professor José Rogério Lopes, a
partir da fala de Martins, endossa a emergência da retomada do pensamento de Lefebvre. Autor que, aliás, como
lembra Lopes, tem sido mais usado pela Psicologia do que pela própria
Sociologia. “Sobretudo, a Psicologia Social tem utilizado o método de Lefebvre
para elaborar análises de experiências urbanas contemporâneas, com ênfase na
vivência subjetiva de crises sociais, na apreensão coletiva do espaço urbano,
em seus componentes físicos ou simbólicos, ou na interpretação de ações
coletivas e lutas sociais pelo direito à cidade, entre outros enfoques”,
explica.
Além de Lefebvre, outros pensadores mais
contemporâneos vão se prender no real. É o caso de Ágnes Heller (1929-2019), que, como
lembra Martins, também foi
expulsa do Partido Comunista.
“Ela chama atenção para o fato de que a revolução hoje é o fator para mudar a vida,
o que envolve uma ação consciente. A práxis desloca-se para o hábito da
viscosidade do fenomênico e dos elementos do cotidiano”, aponta. “Na nova
realidade Sociológica, a revolução está acontecendo todos os dias, todos os
espaços. O problema é que as pessoas não sabem disso. E a Sociologia não tem pensado nisso”,
sintetiza.
Marilene Maia: “A ênfase
apresentada pelo professor para que as Ciências Sociais deem conta da vida cotidiana,
iluminada pelas referências de Lefebvre e Heller, tem correspondência aos
desafios do Serviço social” (Foto: Ricardo Machado/IHU)
A
professora do curso de Serviço Social da Unisinos Marilene Maia percebeu que essa
provocação do professor Martins tem nexo direto com o seu campo de
atuação. “A ênfase apresentada pelo professor para que as Ciências Sociais
deem conta da vida cotidiana, iluminada pelas referências de Lefebvre e Heller, tem correspondência aos desafios
do Serviço social”, observa. Assim, para ela,
fica claro que é na observação do cotidiano que se revelam os problemas e os
caminhos para uma possível saída. “Nossa área de conhecimento e profissão tem
como objeto de trabalho a Questão Social, que se desvela nas diferentes
expressões da vida cotidiana com as quais estamos desafiados a trabalhar. A
atualização da dialética como método é potente para este tempo, para as Ciências Sociais, para o Serviço Social e para a sociedade”,
pontua.
Desafios
Assim, o professor José de Souza Martins compreende que “a Sociologia se vê diante do desafio de
voltar aos clássicos e não de inventar nomes para coisas já conhecidas”. Para
ele, voltar aos clássicos significa voltar ao método explicativo dos clássicos.
E, mais uma vez, Lefebvre é
referência porque desenvolve o método regressivo progressivo, aquele lembrado
por José Rogério Lopes. É o que Martins compreende como “uma evolução
da dialética como meio de compreender a realidade na sociedade que já está
transformada na comparação daquilo que era na época de Marx”.
Para o
professor, o método é simples. Qualquer um pode descrever a realidade, mas, na
sugestão de Lefebvre, nem tudo
aquilo que descrevemos tem a mesma data, a mesma idade. Ele exemplifica: “aqui
nessa sala [sala em que proferia sua conferência], se quisermos fazer um exame
sociológico ou antropológico do vestuário, veremos que cada um de nós tem
idades diferentes”. No método de Lefebvre,
cada detalhe das vestimentas é examinado. Cada um desses elementos que compõem
a vestimenta, segundo a leitura de Martins, é carregado de uma data, um idade,
um lugar, um atmosfera de onde foi concebido. “Feita essa regressão das datas
vem o progredir no atual. Já não será um atual descrito na primeira vez. Será
um atual explicado nas suas descontinuidades que pressionam novas mudanças
sociais”, completa.
Outro
ponto importante em que Lefebvre
analisa a sociologia de Marx é a
práxis. Segundo Martins,
a práxis não é revolucionária, mas sim multidimensional. “Em Marx é ainda inovadora,
transformadora, repetitiva e mimética. Estamos cada vez mais mergulhados em
práxis miméticas, que está presente em nossa vida cotidiana”. Conforme aponta o
professor, o resultado é que essas imitações vão reduzindo o vocabulário, as
visões de mundo. “Quando se fala em pobreza, é necessário também falar nessa
pobreza, que é expressão de visão e compreensão do mundo contemporâneo”,
acrescenta.
Sem ideologias e com atenção
Por fim, José de Souza Martins ainda destaca
a forma com que Lefebvre chama
atenção para o método científico. “Em geral, lida com o indutivo e o dedutivo.
Existe todo um debate se a Sociologia
é indutiva ou dedutiva. A Sociologia
é uma ciência empírico-dedutiva”. Para ele, consiste em fazer observação da
realidade, fazer pesquisa de campo, decifrar o real, descrever o real para
compreender o real. “Não adianta usar o esquema dos sociólogos famosos de
outros países – que se faz muito aqui no Brasil – e aplicar o Brasil para
explicar o que nós somos”, dispara.
Ou seja,
depois da despressurização ideológica que ele sugere, inclusive a partir da
experiência do próprio Lefebvre,
José de Souza Martins diz que é preciso estar atento à
realidade. Mas não qualquer realidade: uma realidade local, com as suas
particularidades. Por isso, se torna inviável a simples aplicabilidade de
teorias importadas. “Não dá para aplicar, porque somos outras sociedades. As
sociedades têm originalidade. E o Brasil tem a sua”, reitera.
Para José Rogério Lopes, do PPG em Ciências Sociais da Unisinos, o
que fica das provocações de José de Souza
Martins é a emergência de se pensar “acerca do papel da Sociologia e do pensamento sociológico
na compreensão dos problemas sociais”. Para Lopes, é preciso um misto de ousadia e criatividade no olhar e na
análise da vida social. “De forma a superar a tendência às repetições
interpretativas legitimadas, que pouco acrescentam às possibilidades de
transformação social. Aqui, opera a importância da imaginação sociológica”,
acrescenta.
*José de Souza Martins - Graduado
em Ciências Sociais, é mestre e doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo - USP. Foi
professor-visitante da Universidade da
Flórida e da Universidade de
Lisboa e membro da Junta de Curadores do Fundo Voluntário da ONU contra
as Formas Contemporâneas de Escravidão, de 1998 a 2007. É professor da Cátedra Simón Bolívar, da Universidade de Cambridge e atualmente
é professor titular aposentado da USP. Entre suas obras, destacamos Exclusão
social e a nova desigualdade (São Paulo: Paulos Editora, 1997), A
sociabilidade do homem simples: cotidiano e história na modernidade anômala
(São Paulo: Contexto, 2000), Linchamentos: a justiça popular no Brasil
(São Paulo: Editora Contexto, 2015) e Do PT das lutas sociais ao PT do poder
(São Paulo: Editora Contexto, 2016).
Fonte: http://www.ihu.unisinos.br/592432-a-desatencao-e-as-ideologias-que-inebriam-entendimento-de-um-brasil-real
Integra da conferência de José de Souza Martins: