Em
documento interno do governo americano que foi vazado pelo Wikileaks, os EUA
mostram como treinaram agentes judiciais brasileiros, entre eles Sérgio Moro. O
documento, de 2009, pede para instalar treinamento aprofundado em Curitiba.
Alguma suspeita com a atualidade?
por André Augusto*
para Diário Esquerda – Sociedade
e Golpe 2016
O Wikileaks revelou o informe enviado ao Departamento de
Estado norteamericano do seminário de cooperação, realizado em outubro de 2009,
com a presença de membros seletos da PF, Judiciário, Ministério Público, e
autoridades norteamericanas, no Rio de Janeiro. O Wikileaks é um site
especializado por vazar documentos internos do governo americano.
O
seminário se chamava “PROJETO PONTES: construindo pontes para a aplicação da
lei no Brasil”, em que se tratava de consolidar treinamento bilateral de
aplicação das leis e habilidades práticas de contraterrorismo. Promotores e
juízes federais dos 26 estados brasileiros participaram do treinamento, além de
50 policiais federais de todo o país. A delegação tupiniquim era a maior dentre
os participantes, que contava com participantes do México, Costa Rica, Panamá,
Argentina, Uruguai e Paraguai.
O
memorando relata o "grande entusiasmo" com que os promotores e juízes
federais brasileiros se dissiparam dos temores que o termo
"contraterrorismo" desperta em amplos setores – nada mais nada menos
o novo discurso com que George W. Bush buscava revestir o direito inalienável
do imperialismo norteamericano como "polícia do mundo", depois da
queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria com a restauração capitalista na
ex-União Soviética, e que fundamentou intervenções militares em todo o Oriente
Médio na década de 2000 e a reacionária intervenção norteamericana para frear
as primaveras árabes de 2011.
Vê-se
perfeitamente a intimidade com que a casta jurídica brasileira trata os termos
do chefe imperial.
Vai senão
quando, e meio ao informe para o Departamento de Estado, entra relato de
ninguém menos que Sérgio Moro, que discorre sobre os "cinco pontos mais
comuns acerca da lavagem de dinheiro no Brasil". Sem detalhes particulares
sobre a exposição do chefe da "República de Curitiba", o informe
mostra que houve acalorados debates em que a equipe de treinamento ianque,
virtuosos na patifaria, ensinam os pupilos brasileiros e estrangeiros os
segredos da "investigação e punição nos casos de lavagem de dinheiro,
incluindo a cooperação formal e informal entre os países, confisco de bens,
métodos para extrair provas, negociação de delações, uso de exame como ferramenta,
e sugestões de como lidar com Organizações Não Governamentais (ONGs) suspeitas
de serem usadas para financiamento ilícito".
Na seção
“Resultados”, o informe da equipe lembra a harmonia que se estabelece quando o
tutor dedicado se depara com o aprendiz atento. Lê-se que “os participantes
requisitaram treinamento adicional, sobre a coleta de evidências, entrevistas e
interrogatório, habilidades usadas nos tribunais”. Este interesse subserviente
se explicaria pelo fato de que
a
democracia brasileira não alcança 20 anos de idade. Assim, os juízes federais,
promotores e advogados brasileiros são iniciantes no processo democrático, não
foram treinados em como lidar com longos processos judiciais [...] e se
encontram incapazes de utilizar eficazmente o novo código criminal que foi
alterado completamente
Haveria
que verificar a opinião dos participantes sobre esta cortês acusação de
estupidez por parte dos chefes ianques. Se damos crédito ao informe, aos
juristas e promotores brasileiros pouco importava a desconsideração vinda do
norte, contanto que “consentissem em ensinar as novas ferramentas, que estão
ansiosos em aprender”. Duas metades se completavam. Como dizia o russo
Tchernichevsky, um fósforo é frio, assim como o lado de fora da caixa em que é
riscado, mas juntos produzem o fogo que aquece a humanidade. Essa é a síntese
das relações entre os Estados Unidos e o Poder Judiciário brasileiro.
E para
completar a trama atual se desenvolvendo em determinada passagem do documento o
informe pede para ministrar cursos mais aprofundados nos seguintes locais:
Curitiba, São Paulo e Campo Grande. É de estranhar agora os procedimentos dá
chamada “República de Curitiba”?
O
relatório se conclui com a idéia de que “o setor judiciário brasileiro
claramente está muito interessado na luta contra o terrorismo, mas precisa de
ferramentas e treinamento para empenhar forças eficazmente. [...] Promotores e
juízes especializados conduziram no Brasil os casos mais significativos
envolvendo corrupção de indivíduos de alto escalão”. Não admira que,
durante estes últimos anos, a cooperação com os Estados Unidos, e mesmo sem
ela, tenha incrementado o conhecimento do Judiciário e do Ministério Público
acerca dos principais casos de corrupção no país.
Com
tamanha rede de investigação, é possível acreditar que o Judiciário e a Polícia
Federal não sabiam de nada no esquema da Petrobrás? Só descobriram agora?
Parece inverídico. O próprio desespero de Moro nesta quarta-feira em colocar
sob sigilo os mais de 300 nomes dos políticos envolvidos na delação da
Odebrecht sinaliza que ela poderia traçar o rastro para pistas que envolvam
membros proeminentes de outros poderes para além do Legislativo. Então, surge a
pergunta: quem vai investigar a PF? Quem vai julgar os juízes?
A farsa das instituições democráticas
Seguramente
a responsabilidade pelo fortalecimento da direita e das instituições
autoritárias do Estado capitalista recaem sobre Lula, Dilma e o PT. Por outro
lado, as manobras de Sérgio Moro e encampadas pelo Supremo Tribunal Federal
representam a preparação de um “golpe institucional” deste Partido Judiciário,
e devem ser denunciadas contundentemente.
Os juízes
não são eleitos por ninguém. Pelo contrário, são escolhidos pelos donos do
poder. Como muito, são funcionários de carreiras cheias de filtros sociais,
para que seus cargos sejam ocupados só pela elite. Gozam dos mais altos
privilégios da “república dos ricos”, alguns deles vitalícios. E entretém todo
tipo de laços com o imperialismo e as potências estrangeiras, que se encontram
documentadas em arquivos de estado como este.
É
lamentável a posição da esquerda, que se alinham atrás da superstição da Lava Jato e de que Moro pode revolver o solo da corrupção
burguesa, ou revestidos da política de "Fora Todos" e
"Eleições Gerais", uma verborragia que termina representando a política de impeachment da direita, quando é
necessário unir forças para exigir das direções burocráticas que rompam sua
colaboração com o governo e encabecem uma luta séria contra os ajustes e a
impunidade.
É preciso
questionar todos os privilégios do Poder Judiciário, exigir que cada juiz seja
eleito por sufrágio universal e seja revogável, perdendo suas verbas de auxílio
e exigindo que recebam o mesmo salário de uma professora(o). Nem o PT, que
fortaleceu esta instituição durante todos os seus governos, nem a direita
reacionária do PMDB e do PSDB, podem fazer isso. É necessário que a população,
em base a um movimento nacional contra os ajustes e a impunidade, impulsione
uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana que imponha estas medidas,
decidindo a revogabilidade de todos os mandatos, que todos os funcionários do
Estado recebam o mesmo que uma professora, e que se revertam todos os acordos
com o capital estrangeiro.
Veja
abaixo a primeira página do informe vazado, o link do arquivo completo
encontra-se no começo deste artigo.
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Diário Esquerda
* André Augusto - @AcierAndy Natal RN
http://www.esquerdadiario.com.br/Wikileaks-EUA-criou-curso-para-treinar-Moro-e-juristas