Os tentáculos das redes sociais chegaram a tal
ponto que não estar presente nelas gera questionamentos sobre sua legitimidade
por Amaia
Odriozola no El País Brasil –
Sociedade e Luta Contra Domínio da Rede
Social
Como detectar
que perdemos o controle? A primeira coisa costuma ser o medo de ficar sem
conexão
Não podemos nos surpreender com o fato de um ano
como 2020 ter acelerado as consequências negativas dessa dependência. De fato,
já há estudos que relacionam o uso frequente das redes sociais durante a
pandemia com uma maior prevalência de problemas de saúde mental. Segundo o
Instituto Superior de Estudos Psicológicos da Espanha, a dependência
tecnológica (também chamada
de “dependência sem droga”) atinge especialmente os adolescentes,
que quando abusam das redes sociais experimentam síndrome de abstinência,
mal-estar emocional, disforia, insônia, irritabilidade e inquietação. Isto não
é exclusivo dos mais jovens: em adultos também provoca afastamento da vida
real, ansiedade, redução da autoestima e perda da capacidade de autocontrole.
Instagram e
Twitter, minas para insatisfeitos e inseguros
O gancho é direto: “As redes sociais podem ser
aditivas porque contêm vários elementos que nos atraem muitíssimo: primeiro, o
acesso a informação de outras pessoas que conhecemos, admiramos ou de quem nos
falaram. Somos curiosos por natureza e isso desperta curiosidade. Também
proporciona acesso a informação da qual necessitamos, contato imediato com
outras pessoas e um entretenimento que muda constantemente”, opina Silvia
Congost, psicóloga especialista em dependência
emocional e autoestima, que além disso dá seus conselhos no seu perfil no
Instagram, onde reúne 126.000 seguidores.
Há poucos dias, aliás, o Instagram
completava uma década, transformada em uma rede social
capaz de influenciar e moldar o comportamento de seus usuários, como
bem explica o documentário. Medialdea traçou um perfil das pessoas mais
propensas a se viciarem: “Entre 16 e 38 anos. O coletivo de maior risco costuma
ser o dos adolescentes, por essa necessidade de busca da novidade e de se
sentirem reconhecidos e parte do grupo, própria da idade. Viciam-se graças à
gratificação imediata, ao estímulo positivo e reforço iminente. São perfis que
têm certa vulnerabilidade psicológica como, por exemplo, a busca de emoções
fortes, a impulsividade, a intolerância à frustração… ou inclusive pessoas que
já apresentam um problema clínico prévio de baixa autoestima, rejeição à sua
própria pessoa, timidez excessiva, necessidade de aprovação… Nestes casos, além
disso, o vício em redes
sociais pode representar uma via de escape para não confrontar as
mudanças que precisam ser feitas em sua vida para poder abordar estes
problemas”, explica esta psicóloga.
O Twitter, por sua vez, não
se baseia tanto em ensinar o lado perfeitamente editado da vida, e sim em
expressar sua própria opinião ao mundo. As pessoas podem lançar qualquer ideia:
se receber acolhida, você se transforma em uma estrela por um momento, fazendo
nos sentirmos importantes (ou nos permitindo discutir, se for o que você
gosta); se ninguém comentar, tampouco importa, cai num um ciberuniverso
infinito do qual podemos continuar nos sentindo parte. O scroll pode ser
eterno. “Por ser uma rede social onde os conteúdos costumam ser curtos, gera-se
uma sensação de continuar procurando satisfazer a necessidade de obter outras
respostas ou outras notícias que possam nos agradar mais ou satisfazer mais.
Gera uma urgência de continuar se informando. O perfil mais habitual costuma
ser de pessoas entre 18 e 44 anos”, resume Medialdea.
Como detectar que perdemos o controle? O primeiro
costuma ser ter medo da
desconexão. “As pessoas que sofrem isso realmente têm medo de
perderem algo importante através das redes sociais, de se sentirem excluídos, e
isso as leva a sentirem a necessidade de permanecer conectados. A desconexão
lhes gera muita angústia e costumam estar constantemente se comparando aos
outros”, explica Medialdea. O seguinte passo: a frustração.
O que faço:
desapareço?
Entretanto, a resposta não parece ser o
desaparecimento total. Como bem apontava há algum tempo o The New York Times,
os tentáculos das redes sociais chegaram a tal ponto que não estar presente
nelas gera questionamentos sobre sua legitimidade, popularidade e se você está
atualizado. Em suas páginas, Bruce Mendelsohn, consultor de marketing digital e
redes sociais, recomenda permanecer pelo menos no LinkedIn, o site de redes
profissionais, já que, se você não aparecer, um potencial empregador poderia se
perguntar o que você está escondendo.
Além disso, as redes sociais têm sua função
positiva. Pela sua experiência no Instagram, Congost vê com
clareza: “Quando você a utiliza em nível profissional é uma maravilha, porque
permite que você alcance um número ilimitado de pessoas, coisa que seria muito
difícil de conseguir de outra forma. Tanto pelos produtos que você quer
oferecer como pela informação e ajuda (vídeos, frases, imagens inspiradoras
etc.) que pretende dar aos outros gratuitamente”, diz. Nos últimos meses, o
fenômeno disparou: “Durante o confinamento o uso das redes sociais subiu de
forma extraordinária. Imagino que seja por não poder sair. Estávamos todos
trancados em casa e, como o ser humano é social e precisa se relacionar com os
outros, através das redes nos sentíamos mais perto. Víamos o que faziam os
outros, o que publicavam, o que compartilhavam, e assim não nos sentíamos tão
longe deles. Também houve muitas entrevistas e conferências ao vivo, assim como
shows etc., que as pessoas aproveitaram para se distrair e não pensar na
situação tão complexa da qual não podíamos sair…”, opina Congost.
O problema está se a ansiedade aparecer. Mas
existem várias práticas simples que ajudam a desconectar e encontrar alívio
emocional para evitar o conhecido FOMO, sigla em
inglês para “medo de perder algo”, o temor em ficar de fora do novo
mapa social.
1. Desative as
notificações
Este conselho vem de Justin Rosenstein, criador do
famoso “like”, que trabalhou no Google e Facebook e é cofundador da Asana, um
aplicativo de melhora da produtividade, numa entrevista à BBC Mundo.
Se você evitar que as
notificações atrapalhem sua rotina, ficará mais fácil se concentrar
no que estiver fazendo. Estes balõezinhos são um constante aviso de que algo
está acontecendo no mundo online, e isso nos faz sentirmos que estamos
perdendo algo. “É como se você carregasse o tempo todo no bolso uma deliciosa
bolacha de chocolate. Se a comesse, ganharia peso que não quer. Trata-se de se
afastar de algo altamente aditivo”, afirma este programador na sua entrevista.
A vantagem de desligá-las, primeiro, é que quando entrarmos na rede social a
experiência será mais emocionante e gratificante, porque encontraremos mais
novidades; e, segundo, que controlaremos melhor nosso tempo (e o que os
aplicativos tiram dele).
Além disso, Congost recomenda tentar entrar na rede
social “estando conscientes do que vamos procurar ou do que queremos ver, já
que há tantos estímulos que o mais provável é que você entre procurando algo,
mas se distraia com outra coisa, vá de um perfil a outro e após meia hora
(perdida) perceba que já não lembra mais o que se interessava em encontrar”.
2. Ponha limites
A técnica do tomate ensina a organizar o tempo que
destinamos a uma tarefa. Foi concebida para fomentar a produtividade, mas tem,
no fundo, uma explicação psicológica. Estabelecer um tempo determinado para
estar nas redes sociais pode ser uma prova de força de vontade, mas vale a pena
para se livrar dos maus hábitos, como a necessidade constante de olhar o
celular. Um primeiro conselho é estabelecer limites para si mesmo: “Definir
momentos do dia em que é ‘proibido’ mexer no celular ou entrar nas redes”,
recomenda Congost. Medialdea enxerga do seguinte ponto de vista: o tempo que
deixemos de usá-las será um momento de “liberdade digital”.
Outra boa ideia é estabelecer um tempo e pôr um
temporizador: escolha um limite diário ou semanal em função de sua necessidade
de desconexão, e ative-o cada vez que entrar em uma rede social. Quando chegar
ao limite, seja forte. Como referência, você pode tomar um recente estudo da
Universidade Estadual de San Diego (Califórnia), segundo o qual as pessoas mais
felizes são aquelas que passam menos de uma hora por dia conectadas. Se você
precisar de um descanso digital maior, dizem alguns especialistas que, para que
seja efetivo, precisa durar no mínimo três dias. Uma coisa que pode ajudar é
focar em estar mais presente, com práticas como a
meditação e o mindfulness (atenção plena).
3. Procure um
hobby
Assim como
acontece quando alguém para de fumar, ou de comer para satisfazer
emoções, ao cortar as redes sociais é possível que a pessoa não saiba o que
fazer com esse tempo. Procurar uma ocupação concreta que nos agrade ajudará a
manter a atenção nela e dar uma satisfação mais saudável ao nosso cérebro, de
modo que não sentiremos tanta falta de entrar nas redes sociais.
4. Transforme-as
em um pequeno luxo
Da mesma maneira como de vez em quando nos
premiamos com uma ida à manicure, um doce ou qualquer outra experiência
prazerosa, é possível transformar o uso das redes sociais em uma pequena
recompensa quando tiver conseguido algo produtivo. Esse hábito mudará sua forma
de pensar sobre elas.
5. Apague
aplicativos que não usar
Um dos mecanismos da ansiedade nos faz ter medo de
nos desprendermos de coisas. Ocorre, por exemplo, com a roupa: como é habitual
isso de ter o armário cheio e nada para vestir. No plano digital ocorre algo
semelhante. Mas, como bem diria Marie Kondo, guru da ordem
doméstica (e também de como enfrentar o caos), se faz um ano que você não usa,
jogue fora. Vários especialistas que falam em O Dilema das Redes
concordam: faz meses que você não olha o Twitter? Tire-o do celular e elimine a
sensação de necessitar dele.
E, já que é para apagar, Congost propõe um
exercício: analisar se há alguns perfis que seguimos e nos geram angústia ou
mal-estar. Se isto acontecer, a reação é direta: “Parar de segui-los”.
Medialdea concorda: “Você estabelece prioridades, faz uma limpeza de pessoas
que segue nas redes e fica só com aquelas contas que contribuam com algo e
alimentem você como pessoa”.
Fonte: https://brasil.elpais.com/estilo/2020-10-12/vicio-em-redes-sociais-dispara-na-pandemia-cinco-jeitos-de-recuperar-o-controle-e-se-desintoxicar.html