Ø Brasil usa mais agrotóxicos que Estados Unidos e China juntos
Ø Agência da ONU FAO indica que Brasil aplica mais de 720 mil toneladas de veneno contra pestes em lavouras
Ø Entre os 10 mais vendidos no Brasil, cinco são proibidos na União Europeia, profa. Larissa Bombardi-USP
por Vinicius Konchinski no Brasil de Fato – Sociedade e Pais Colônia do Sub-desenvolvimento
Intensificação da pulverização aérea com agrotóxicos é uma das preocupações nos territórios vizinhos às plantações - Alberto César Araújo/Amazônia Real
O Brasil já usa mais agrotóxicos em suas lavouras do que a China e os Estados Unidos juntos. Isso é o que mostra um levantamento da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, na sigla em inglês).
Os dados divulgados pela FAO são referentes a 2021. Naquele ano, segundo a agência, foram aplicadas 719,5 mil toneladas de venenos contra pestes em lavouras nacionais. No mesmo ano, a China, que tem quase sete vezes mais habitantes que o Brasil, aplicou 244 mil toneladas. Já os EUA aplicaram 457 mil toneladas. Juntos, eles usaram 701 mil toneladas.
De acordo com os dados da FAO, o Brasil é o país que mais usa agrotóxicos no mundo. É seguido justamente pelos EUA. A Indonésia, que usou 283 mil toneladas de veneno em suas lavouras – menos da metade do Brasil –, vem em terceiro lugar.
Dados do Banco Mundial indicam quais países mais usam fertilizantes por área de lavoura / Reprodução/elaboração Gerson Teixeira (Abra)
O Brasil usa 10,9 kg de agrotóxicos para cada hectare de lavoura (10 mil m2). Já os EUA usam 2,85 kg/ha; a China, 1,9 kg/ha.
Em 2021, foram usados no Brasil 3,31 kg de agrotóxicos por pessoa. Nos EUA, foram 1,36 kg per capita; e na China, 0,17 kg per capita.
Modelo do agronegócio
Para Gerson Teixeira, engenheiro agrônomo e diretor da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra), dados como esse mostram como a agricultura brasileira tem se tornado dependente dos agrotóxicos devido a escolhas de métodos de produção.
Em entrevista ao Brasil de Fato, Teixeira explicou que o Brasil, décadas atrás, optou por um modelo de produção agropecuária voltado à exportação, principalmente de soja. Isso tornou o país o segundo maior exportador de produtos agrícolas do mundo, segundo a FAO, atrás só dos EUA.
Acontece que lavouras de soja são altamente dependentes do uso de fertilizantes e agrotóxicos, ressaltou Teixeira. Isso aumentou o consumo desse tipo de veneno no Brasil.
Em 1990, segundo a FAO, o Brasil consumia 51,1 mil toneladas de agrotóxicos por ano. Em 31 anos, essa quantidade aumentou 1.300% (um mil e trezentos porcento).
Dados do Ibama mostram aumento da importação de agrotóxicos pelo Brasil desde 2008 / Reprodução/elaboração Gerson Teixeira (Abra)
"A agricultura brasileira pensava que a soja transgênica reduziria a necessidade do veneno e dos fertilizantes", afirmou Teixeira. "Na verdade, aumentou a dependência dos dois (veneno e fertilizantes)."
Dados do Banco Mundial tabulados por Teixeira apontam que o Brasil também já é o 2º. (segundo maior) consumidor de fertilizantes do mundo quando considerados a quantidade de quilos aplicados por hectares de lavouras, ficando atrás da China.
Do total de fertilizantes utilizados na agricultura brasileira, 87% é importado, de acordo com a Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda). Segundo a FAO, o Brasil é o maior importador de fertilizantes do mundo. Consome 18% das importações mundiais. Os EUA consomem 13% e a China, 5%.
Dados do Banco Mundial indicam quais países mais usam fertilizantes por área de lavoura / Reprodução/elaboração Gerson Teixeira (Abra)
O Brasil também é líder nas importações de agrotóxicos. Foram 283 mil toneladas importadas durante o ano de 2022, segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Venenos do Agro(Ogro)-Negócio e Riscos à saúde
Por conta do uso crescente de venenos usados pelo agro(ogro)-negócio no país, a cada 2 (dois) dias, uma pessoa morre por intoxicação por uso desse tipo de veneno no Brasil. Uma (1) a cada 5 (cinco) vítimas é criança ou adolescentes de até 19 anos. Esse dado consta num relatório publicado em 2022 pela rede ambientalista europeia Friends of the Earth Europe.
De acordo com a entidade Friends of the Earth Europe, empresas agroquímicas europeias como a Bayer e a Basf trabalham conjuntamente com o agro-negócio brasileiro para disseminar o uso de veneno no Brasil, des-considerando os malefícios causados pelos venenos à população.
Larissa Bombardi, professora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP), escreveu em seu livro Agrotóxicos e Colonialismo Químico (editora Elefante) que a Europa concentra um terço (aproximadamente 33%) da produção de agrotóxicos no mundo. Autoridades europeias, porém, já proibiram o uso de 269 (duzentos e sessenta e nove) tipos de defensivos por conta dos danos causados por eles à saúde. Em países como Brasil, os banimentos não chegam a 30 (trinta).
Entre os 10 (dez) mais vendidos no Brasil, 5 (cinco) são proibidos na União Europeia, ressaltou a profa. Bombardi. "Enquanto a área plantada no país cresceu 29% (vinte e nove porcento) de 2010 a 2019, o uso de agrotóxicos cresceu 78% (setenta e oito porcento)", disse ela, na palestra feita em Curitiba, no ano passado.
"Essa forma de agricultura faz mal à população e ao planeta", disse ela. "Só a reforma agrária com foco na agroecologia oferece uma solução" citou a profa. Bombardi.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) participa da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida e tem várias ações em parceria com a sociedade civil organizada e movimentos sociais para alertar para o perigo dos agrotóxicos e para buscar aumentar o controle e reduzir seu uso.
Edição BdF: Nicolau Soares
Publicado: 05 de fevereiro de 2024