Frei Betto - Adital - O Brasil e os brasileiros
A crise
brasileira traduz o esgotamento de um modelo neodesenvolvimentista que
sacramentou, no macro, o capitalismo neoliberal e, no micro, o paternalismo
populista de benefícios aos mais pobres.
O capitalismo
neoliberal favorece o consumo, e não a produção, o que explica, nos últimos 12
anos, a facilidade de crédito, as desonerações tributárias, o aumento anual do
salário mínimo corrigido pela inflação, o maior acesso dos brasileiros ao mercado.
No entanto, não se criaram as bases de sustentabilidade para assegurar o
acesso, a longo prazo, aos bens de consumo.
Imagem: Roberto Parizotti
O paternalismo
populista teve início quando se trocou o Fome Zero, um programa emancipatório,
pelo Bolsa Família, meramente compensatório. Passou-se a dar o peixe sem
ensinar a pescar.
Embora 36
milhões de pessoas tenham saído da miséria, nada indica que, com o atual ajuste
fiscal, número igual de brasileiros não resvalará para a carência extrema,
sobretudo impelidos pelo desemprego.
O governo
facilitou o acidental, não o essencial. O acesso aos bens pessoais, como
produtos da linha branca (geladeira, máquina de lavar, fogão, micro-ondas
etc.), não foi complementado com o acesso aos bens sociais: educação, saúde, transporte
público, segurança e moradia.
Por paradoxal
que possa parecer, o PT despolitizou a nação. E a oposição, que tanto ecoa
protestos, carece de propostas.
O debate
político desceu do racional para o emocional. Sabe-se o que repudiar, não o que
almejar. Como se o sentimento de ódio e desprezo tivesse consistência política.
Os anos de
prisão, sob a ditadura militar, me ensinaram que o ódio destrói, primeiro, quem
odeia, e não quem é odiado. Shakespeare bem definiu: "Odiar é tomar veneno
esperando que o outro morra.”
Ainda que Dilma
sofresse impeachment, quem a substituiria? Michel Temer? Trocar o PT pelo PMDB
na presidência da República seria um avanço? E se viesse o PSDB, o que só seria
possível com nova eleição, evitaria essa política econômica recessiva e lesiva
aos direitos dos mais pobres?
A luz no fim do
túnel está na face mais democrática do Brasil: as ruas. Este o palco da
soberania nacional, se estamos de acordo que democracia é governo do povo para
o povo e com o povo.
Somos nós,
cidadãos e cidadãs, que escolhemos os políticos que ocupam a estrutura do
Estado. Em nosso nome eles governam. Somos nós que, via impostos, financiamos
toda a administração estatal, das obras do PAC às passagens aéreas de deputados
e senadores. Nós somos a autoridade. Eles, nossos servidores.
Portanto, cabe
ao povo brasileiro se manifestar, mobilizar, organizar, criar uma ampla frente
de propostas para as mudanças que o nosso país tanto necessita, como o fim do
financiamento de campanhas eleitorais por empresas e bancos; a reforma política;
a reforma tributária onerando mais quem ganha mais; a reforma agrária nesse
território de dimensões continentais.
Governo é como
feijão, só funciona na panela de pressão.
Frei Betto é escritor,
autor de "Calendário do Poder” (Rocco), entre outros livros.
http://www.freibetto.org/>
twitter:@freibetto.
http://site.adital.com.br/site/noticia.php?lang=PT&cod=84821
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