- O grupo BRICS, organização jovem, mas internacionalmente vital
- O importante recente encontro dos BRICS na Índia
Por Adam
Garrie do The Duran, para blog do Alok, traduzido
pelo Coletivo Vila Vudu - Sociedade
e Geopolítica dos Brics (fonte no
final)
A reunião de cúpula dos BRICS em Goa reuniu os
líderes de três dos sistemas de alianças da era da Guerra Fria: o Bloco
Soviético, o Bloco Chinês e o Movimento dos Não Alinhados. EUA e o bloco
ocidental ficaram de fora, isolados e desarticulados.
A reunião de cúpula dos BRICS em Goa é evento
que a grande mídia-empresa ocidental com certeza ignorará. Mesmo assim, marca
um dos pontos altos do realinhamento em curso, do poder e da influência
geopolítica.
O fato de Rússia, China, Índia, Brasil e
África do Sul falarem como uma só voz sobre a Síria não é feito corriqueiro,
sem importância.
Ainda que o Brasil tenha-se distanciado das
questões importantes, naufragado num golpe de estado contra a presidenta
Rousseff, uma declaração conjunto sobre a Síria, emitida por potências dessa
importância não pode ser subestimada, por mais que políticos fracassados em
alguns países se esforcem por diluí-la o mais que possam.
Mas a importância da reunião ultrapassa a
declaração conjunta sobre a Síria.
Para compreender isso, é preciso compreender
que, durante a Guerra Fria, as coisas nunca foram simples questão de 'Leste x
Oeste', 'Oriente x Ocidente', 'URSS x EUA'. Na Guerra Fria não havia apenas
dois lados: havia quatro. E hoje essas divisões são mais importantes do que em
nenhum outro momento desde 1991. Explico.
Os quatro blocos eram os seguintes:
– Bloco dos Aliados dos Soviéticos;
– Bloco dos Aliados dos
Norte-ameridanos;
– Bloco dos Aliados dos Chineses; e o
– Movimento dos Não Alinhados.
Depois da morte de Stálin em 1953, China e
URSS derivaram em direções diferentes e separaram-se cada vez mais. A cisão
formal e a subsequente criação de grupos à parte foi formalizada em 1961,
quando os chineses denunciaram como revisionismo e traição, as políticas
anti-Stálin de Khrushchev.
Isso não levou só à criação de um novo bloco
comunista centrado na China, mas, de fato, levou também à formação do Movimento
dos Não Alinhados.
Os catalisadores do Movimento dos Não
Alinhados têm raízes nas diferenças que se aprofundavam entre a União Soviética
de Stálin e a Iugoslávia de Tito, cujas relações começaram a deteriorar já no
início dos anos 1940s.
Em 1961, Tito, com Nasser do Egito, Nehru da
Índia, Sukarno da Indonésia e Nkrumah de Gana, criaram o Movimento dos Não
Alinhados, uma liga de estados que conscientemente decidiram construir relações
globais, sem estarem ligados a nenhum dos dois blocos comunistas então
emergentes, nem à OTAN.
À altura dos anos 1980s, o Movimento dos Não
Alinhados já seduzira a maior parte do mundo árabe, a maior parte dos estados
africanos e grande parte do sudeste asiático.
Claro que houve algumas anomalias.
Cuba alistou-se como membro fundador do grupo,
apesar da relação íntima com os soviéticos.
O Paquistão, em geral aliado da OTAN, uniu-se
ao grupo em 1979, como fez também o Irã, depois da Revolução Islâmica.
A Albânia, que abandonou o Pacto de Varsóvia
liderado pelos soviéticos transferindo-se para o bloco chinês em 1968,
permaneceu isolada do movimento, mesmo depois que rompeu relações com a China,
depois da entente de Nixon com Mao.
Outra notável exceção foi a África do Sul,
cujo regime do apartheid pôs o país em conflito com os emergentes estados
asiáticos independentes e com grande parte do restante da África. A África do
Sul afinal se uniu ao Movimento dos Não Alinhados em 1994, na presidência de
Mandela.
Hoje, os BRICS representam membros chaves de
cada um daqueles blocos.
Rússia e China estão novamente próximas como
aliadas, na geopolítica e no comércio.
Índia sempre foi parceira chave da União
Soviética e, mediante os BRICS, Índia e China podem vir a se tornar parceiras
mais próximas, em oposição a rivais regionais.
Brasil é observador no Movimento dos Não
Alinhados, e é potência econômica cada vez mais importante numa América Latina
que está acordando – e, isso, apesar do recente tumulto político e econômico
que, circunstancialmente, infelicita aquele país.
A África do Sul moderna pós-apartheid é um
farol de esperança para o continente africano, atacado sempre pela praga do
subdesenvolvimento. É especialmente verdade agora, depois que a Líbia, que foi
a economia mais forte da África, foi destruída por Hillary Clinton & OTAN.
Tudo isso resulta num grupo BRICS com
capacidade para congregar a maioria dos povos do mundo. Hoje, os que se veem
mais e mais isolados a cada dia são EUA e seus aliados na OTAN.
Claro, muito depende da vontade política dos
países BRICS e de seus aliados naturais de falar a uma só voz, unificada,
sobretudo em temas de segurança global.
Como já era na Guerra Fria do século 20, o
mundo árabe será o fulcro em torno do qual oscilará o pêndulo do sucesso ou
fracasso dos BRICS.
Se a maioria do mundo árabe não wahhabista
aproximar-se mais dos BRICS que do bloco da OTAN – que se tem dedicado a
dizimar um estado árabe secular depois do outro – é possível que aí se
configure o triunfo definitivo, o maior triunfo, para o grupo BRICS,
organização jovem, mas internacionalmente vital.
Também configurará um vasto, importantíssimo
triunfo geopolítico de Vladimir Putin da Rússia.*****
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