Tenho um alinhamento com a Rede. A esquerda não gosta de pensar no meu nome porque eu de fato sou liberal. A direita me aceita porque sabe que tem que fazer alguma concessão em termos de distribuição de renda, e rápido
por Talo Nogueira da Folha para revista IHU – Unisinos – Sociedade e Lutas Sociais
Foto do blog de Firmino Junior
As reformas trabalhista e da Previdência, bem como os ajustes nas contas do Rio, são urgentes.
Mas alterações tão profundas deveriam aguardar a eleição de 2018
para que fossem tomadas por Legislativos mais "representativos".
A avaliação é da economista Eduarda La
Rocque *, 47, que ainda se considera neoliberal, embora divirja de
colegas da mesma linha ideológica.
"Existe um 'trade-off'. A cada ano, o rombo
se estende muito. Mas eu preferiria negociar reformas tão necessárias com um
Congresso mais representativo. Senão corre o risco de não ser duradouro",
disse ela, primeira doutora formada pela PUC-Rio -escola
conhecida pelo viés liberal.
Ex-sócia do banco BBM,
especialista em gestão de risco, a economista deixou o setor privado para
assumir a Secretaria Municipal de Fazenda do Rio em 2009. Em
2013, passou a presidir o Instituto Pereira Passos, da prefeitura, onde
conduziu o projeto da UPP Social.
Atualmente, conduz uma editora independente, além
de planejar fundos para investimento socioambiental.
Rocque diz que ainda se
considera neoliberal, mas se classifica como "ex-banqueira e
ex-economista". Embora defenda o controle rígido dos gastos dos governos,
demonstra preocupação com a falta de debate sobre como evitar prejuízo aos
serviços públicos.
"A elite não está precificando corretamente o risco de caos
social. [] A economia é uma ciência que se especializou em demasia e se
distanciou muito da realidade", disse.
Eis a entrevista.
Qual sua avaliação sobre o socorro
federal ao governo do Rio?
É positivo. Nós temos que diminuir o tamanho do Estado. Não dá para continuar do jeito que está. A galera
mais de esquerda não tem noção de restrição orçamentária. É importante impor a
restrição do teto de gastos. A questão é como vai redistribuir o bolo.
Meus amigos economistas estão impondo um teto e uma necessidade de arrumação.
Sou favorável porque as contas mostram. A gente precisa de uma nova Constituinte
porque não demos conta de atender os direitos que lá estão expostos. Mas não
com esse Congresso. Não podemos redistribuir o bolo com setores não
representativos da sociedade.
Em termos práticos, o que seria essa
redistribuição?
Não afetar tanto as áreas sociais, não garantir direitos dos militares
eternamente, dos servidores públicos, dos governadores e suas previdências, não
permitir a flexibilização do teto [salarial]. Numa época em que se precisa
diminuir e redistribuir o bolo, a voz dos mais vulneráveis não se faz ouvir.
Tínhamos que nos preparar para 2018, decidirmos quem vai pagar a conta, com um Legislativo
mais representativo tanto no Rio como no governo federal.
O Tesouro sinalizou com privatizações,
até da Uerj. Como vê isso?
A sociedade tem que fazer escolhas. Gosto do
desenho financeiro da operação, mas não cabe ao Tesouro Nacional
dizer onde tem que cortar. Cabe ao governo estadual gerar transparência, e à
sociedade, fazer suas escolhas. A crise do Rio chegou a um estágio em que o governador Pezão
não tem representatividade para negociar em nome da sociedade. Deveria ter uma
espécie da câmara de arbitragem, mas não só com representante do Tesouro, que
olha só as contas públicas. Economista gosta muito de fazer conta de valor
presente, mas não pode cortar 30% de salário de uma pessoa de um mês para o
outro.
A privatização da Cedae foi discutida o
suficiente?
Ela deve ser mais debatida, mas sou favorável.
Resumindo: a despesa com pessoal aumentou enormemente, isso é uma sobrecarga
para o governo do Estado, e algo precisa ser feito. Não dá para manter todos os
direitos. As escolhas têm que ser claras. Mas é possível com mais eficiência,
com foco em justiça social, diminuir o tamanho do Estado, privatizar
serviços respeitando as metas sociais e gerar melhor qualidade na ponta.
Se o corte for basicamente na ponta, como
se sinaliza, qual será o preço disso?
A elite não está precificando corretamente o
risco de caos social. Esta é a hora de ampliar projetos sociais, não de cortar.
As pessoas acham que com condomínios e segurança privada conseguem ter uma
cidade maravilhosa.
Setores de esquerda costumam criticar a
Lei de Responsabilidade Fiscal por excesso de rigidez. Qual sua avaliação?
Ela é um excelente parâmetro. Estou à direita da
esquerda e à esquerda da direita. Então, sou criticada pelos dois lados. É uma
pena para nós que tenhamos entrado nesse nível de polarização. Me
orgulho de ter tido o Fernando Henrique e o Lula
como presidentes. Perdi todo o respeito pelo PSDB quando ele votou contra a reforma tributária que a [ex-presidente] Dilma
[Rousseff] apresentou. Vira uma polarização em que a honestidade
intelectual se perdeu no debate.
E qual sua avaliação sobre a atual
reforma trabalhista?
Gosto muito da equipe do [ministro da Fazenda] Henrique Meirelles. Do ponto de vista das propostas
iniciais, devem ser as melhores possíveis. Mas, quando negociadas por este
Congresso, que não é representativo e só quer se defender, tudo se deteriora.
Acho que seria melhor para o país, em vez de insistir nas reformas, colocar as
pautas e discutir com um novo Congresso. Existe um "trade-off". A
cada ano, principalmente com a reforma da Previdência, o rombo se estende muito. Mas eu
preferiria negociar reformas tão necessárias com um Congresso mais
representativo. Senão, corre o risco de não ser duradouro.
É uma avaliação de um ex-banqueira?
Sim, uma ex-banqueira e uma ex-economista. Acho
que a economia é uma ciência que se especializou em demasia e se distanciou
muito da realidade, dos problemas práticos reais do dia a dia.
Quando a sra. mudou?
Sempre tive sucesso, e muita gente associa isso a
ter muito dinheiro. Quanto mais, melhor, o que também é uma falácia. A partir
do momento em que você fica tão rico que precisa contratar um segurança
particular, seu nível de bem-estar cai substancialmente.
Pensa em seguir a carreira política?
Eu me considero de esquerda, mas a direita me
quer. O Partido Novo e meus amigos de PUC,
volta e meia, pedem que eu me candidate. Eu gosto de trabalhar com política no
Executivo, mas prefiro cargos técnicos e acompanhar quem eu acredite.
A sra. apoiou um candidato do PSOL [Marcelo
Freixo, à Prefeitura do Rio de Janeiro].
Recebi [em razão do apoio] milhões de mensagens
de amigos: "Pelo amor de Deus, você vai acabar com a credibilidade que
ainda te resta". Tem três coisas que precisamos buscar: justiça social,
eficiência na gestão dos recursos econômicos e naturais e governança, que é
ética, transparência e mecanismos de participação efetiva. Desde que tenha um
alinhamento ético mínimo, estou disposta a conversar. O problema é que, com o
acirramento político, as pessoas perdem a honestidade intelectual.
Isso é um pouco Marina Silva...
Isso é um pouco Marina Silva...
Tenho um alinhamento com a Rede.
A esquerda não gosta de pensar no meu nome porque eu de fato sou liberal. A
direita me aceita porque sabe que tem que fazer alguma concessão em termos de distribuição de renda, e rápido.
*
Eduarda La Rocque : RAIO-X
FORMAÇÃO
Doutora em economia pela PUC-Rio
Doutora em economia pela PUC-Rio
CARREIRA
PRIVADA
Sócia do banco BBM; presidente da comissão de riscos da Febraban; sócia-fundadora da Riskcontrol
Sócia do banco BBM; presidente da comissão de riscos da Febraban; sócia-fundadora da Riskcontrol
CARREIRA
PÚBLICA
Secretária municipal da Fazenda do Rio (2009-2012); presidente do Instituto Pereira Passos (2013-2015)
Secretária municipal da Fazenda do Rio (2009-2012); presidente do Instituto Pereira Passos (2013-2015)
http://www.ihu.unisinos.br/571773-a-elite-nao-esta-precificando-o-risco-de-caos-social-diz-ex-banqueira
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