O WhatsApp amplificou
nossa capacidade de fofocar
por Edson Pistori*
para GGN e
Contexto Livre – Sociedade
e Comunicação Social Dominante
Atualmente, o Whatsapp é o aplicativo dominante na
comunicação instantânea. Ele é uma das principais ferramentas de interação
entre pessoas e de distribuição de conteúdos de todos os tipos.
O app foi desenvolvido por uma empresa estadunidense que
leva o mesmo nome do produto que criou, fundada em 2009 pelos veteranos do
Yahoo, Brian Acton e Jan Koun.
Em 2014, o Facebook adquiriu a empresa por $ 16 bilhões de
dólares e incorporou os fundadores do Whatsapp ao Conselho de
Administração da gigante das redes sociais.
Segundo dados de maio de 2017, o aplicativo de mensagens
instantâneas chegou a marca de 120 milhões de usuários mensalmente ativos no
Brasil e mais de 1,2 bilhões em todo planeta.
As funcionalidades de mensagens escritas, envio de áudios,
vídeos, imagens e documentos, além das ligações também por áudio e vídeo via
internet alteraram o uso da telefonia móvel. E, praticamente, eliminaram as
mensagens de SMS (Short Message Service), assim como reduziram as ligações
telefônicas convencionais.
Apenas no tocante a ligações de vídeo, o whatsapp registrou
uma média de 55 milhões de chamadas por dia. São números impressionantes.
Essa abrangência de número de usuários deu uma enorme
relevância ao WhatsApp, pois ele tem sido um recurso importante para
dinamizar as relações de convivência, criando novas formas de interação,
organização e produção social, especialmente devido as funcionalidades de
criação de grupos e de listas de transmissão (envio massivo de mensagens
individuais).
Há quem diga que a praticidade introduzida
pelo WhatsApp pode vir a levar ao desuso do e-mail como instrumento de
troca de mensagens institucionais ou laborais.
No Brasil, já há casos de tribunais que fazem comunicações
oficiais por meio do aplicativo. Há jurisprudências que consideram a troca de
mensagens no WhatsApp como provas jurídicas válidas em processos civis
e criminais.
Vários analistas têm apontando que o WhatsApp será
uma ferramenta crucial na ação política nos próximos anos.
Seus diversos usos podem potencializar a difusão de
discursos e narrativas, a organização de ativistas e de bases eleitorais e a
interação direta entre eleitores e candidatos.
Por isso, entender a dinâmica de funcionamento do WhatsApp
será fundamental para quem deseja influenciar os processos políticos
contemporâneos.
A
Teoria da Fofoca e os grupos de WhatsApp
No livro Sapiens, o israelense Yuval Harari defendeu a ideia de que a fofoca ajudou
os nossos ancestrais arcaicos a formarem bandos maiores e mais estáveis. Por
meio dela (a fofoca), construíam-se amizades e hierarquias que viabilizaram a
caça, a proteção e a luta pela vida em grupos.
Harari também apontou os limites da fofoca para a
sociabilidade. Segundo ele, pequisas demonstram que o tamanho natural de um
grupo unido por fofoca é em torno de 150 indivíduos.
Esse número mágico, ainda hoje, vale para as dimensões das
organizações humanas funcionais tais como: comunidades, negócios, unidades
militares e de aprendizado.
O WhatsApp adotou essa premissa. No início, o app
possibilitava apenas 99 membros num grupo. Depois esse número aumentou para
149. Em nova atualização foi para 199 e agora fixou o limite é de 249.
O que se percebe na prática é que num grupo
de WhatsApp numeroso há uma quantidade de indivíduos que nunca
conseguem participar ativamente das conversas. No dia a dia, as discussões
giram em torno de 30 a 40 pessoas que interagem com mais frequência.
Não há estatísticas confiáveis divulgadas, mas se estima que
adultos com um circulo social de raio médio tem cerca de 10 grupos temáticos no
seu smartphone: família, igreja, trabalho, amigos e outros interesses diversos.
O WhatsApp amplificou
nossa capacidade de fofocar
As dinâmicas de interação em cada um são distintas, mas elas
mais ou menos definem certos perfis de usuários:
O postador frenético (spanner) que dispara conteúdo sem
parar. Ele acha que o app é uma metralhadora de informação.
O comentarista que está sempre a postos para dar um feedback
aos posts dos outros.
O provocador de polêmica (troll) que em todo assunto
encontra um jeito de inflamar uma discussão, muitas vezes pelo prazer de
“causar”.
O distraído que não presta atenção nas postagens e está
sempre replicando o conteúdo já postado. Esse também vive barriquelando as
discussões, ou seja dando opiniões quando o assunto já saiu de pauta.
O sem noção que posta conteúdo nada a haver com o tema ou
perfil do grupo.
O carente que reclama de ninguém prestar atenção no que ele
posta.
O voyeur que lê tudo, mas raramente expõe sua opinião.
O magoado que por uma mera desavença se retira do grupo. Uma
atitude muitas as vezes infantil, pois o autoexilado espera ser convidado a
voltar.
É claro, que esses perfis são apenas ilustrativos, pois o
universo de psiquês humanas é ilimitado, contudo os padrões de comunicação vão
se aproximando de determinados tipos, especialmente nas redes sociais.
O tipo de interação dos grupos também varia com o propósito
do usuário.
Há quem sinta apenas vontade de postar conteúdo próprio ou
alheio, sem se preocupar com o feedback dos que lêem. Usa o grupo
como terapia para a ansiedade.
Há aqueles que usam a ferramenta para a promoção pessoal com
diversos objetivos. Para esses, em geral, o estímulo é o exibicionismo ou
narcisismo. Muito comum em políticos que ocupam posições de destaque, que
postam apenas conteúdos sobre si.
Há outros que usam o espaço como ambiente de convivência, desenvolvendo
identidades e afetos em meio a troca de informações.
Independentemente do tema ou vínculo que gerou o grupo,
basicamente os bandos de humanos organizados no WhatsApp giram a sua
comunicação em torno de fofocas, sejam elas sobre notícias do mundo político,
situações do cotidiano da família, relacionamento entre colegas de trabalho,
participantes de uma festa ou admiradores de uma tipo de arte, dentre outros.
Os grupos de whatsapp tem tido uma grande audiência e
passaram a ser uma referência de informação diária aos seus usuários, mesmo
para aquelas notícias mais relevanates.
Há estudos recentes que apontam os grupos de famílias no
whatsapp como sendo os maiores propagadores de fake news, memes de
humor sarcástico e imagens de degradação humana.
Capa do Livro, O Novo Poder: Democracia e Tecnologia. Alê
Youssef. 2017
A Interação política
via whatsapp
A virtualidade é uma realidade em expansão. As mídias
sociais serão cada vez mais influentes na socialização das pessoas e
comunidades.
A profusão de informações atingiu níveis de alcance e
velocidade nunca antes imaginados pela humanidade.
O futuro dessas interações comunicativas são especulados de
diferentes formas, mas a relação humano-máquina se aperfeiçoa a passos largos.
No campo da disputa do poder, a internet traz o paradoxo da
liberdade para a difusão de ideias a um custo reduzidíssimo e, por outro lado,
é o mecanismo de localização e controle de indivíduos mais sofisticado já
existente.
Para uso em campo aberto, ou seja, para fins públicos e
democráticos, a internet tem servido de ambiente de competição das narrativas
em que vencem os grupos que mais difundem e engajam usuários nas suas teses
discursivas e nas representação de signos imagéticos.
Ao tempo que em se crítica o Facebook pelo algorítimo que
induz acesso ao conteúdo por afinidade, formando “as bolhas”, também
intensificam os questionamentos sobre o uso de micro dados de perfil para
influenciar a comunicação por técnicas psicológicas e psicométricas de criação
de nano targets (alvos minúsculos), o que não ocorre com
o WhatsApp.
Nessa seara vale ressaltar que um dos efeitos da
virtualidade é a profusão de informações e a consequente dispersão.
A sensação que se tem é de estar a deriva numa maré de
notícias. Por isso, os grupos de Whatsapp formados entres pessoas com
afinidades equivalentes servem de mecanismo de produção de confiança nas
informações que circulam na rede mundial.
Neste sentido, o recurso de “moderação das interações” tem
crescido como ferramenta que ameniza essa tendência a dispersão e torna mais
efetivos os grupos de Whatsapp que se formam dirigidos a ação
política.
Sem dúvida, o ativista político dessa quadra do século XXI
terá que assimilar no seu rol de habilidades algumas técnicas de curadoria de
grupos virtuais e desenvoltura em se comunicar nesse ambiente.
Manejar bem o WhatsApp é um ativo político. Se no início do
século 20, o panfleto e o rádio foram os grandes meios de convocação e
informação, no século 21, o post de WhatsApp é que tem o poder de influenciar e
organizar as massas.
Edson Pistori* é
advogado
http://www.contextolivre.com.br/2018/04/o-poder-do-whatsapp.html
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