Militares dominam a Amazônia na América do Sul, pois grandes capitalistas globais exigem o extrativismo na América Latina
por Raúl Zibechi* no IHU Unisinos – Sociedade e Homus
Demens na Terra?
Figura em https://static.todamateria.com.br/upload/he/nf/henfildesenho.jpg
“Governo Federal e
Presidente estão sendo encurralados pela aliança militar-empresarial-política-judicial
que não buscam derrubá-lo, mas lhe impor condições. A principal delas, segundo
a professora da Escola Florestan
Fernandes do MST, Silvia Adoue, é manter o controle militar da Amazônia,
a principal fonte de recursos do Brasil e base das cadeias de valor e
acumulação de capital em escala global na atualidade”, escreve Raúl Zibechi
Nada menos do que
o conhecido jornal estadunidense The Washington Post trouxe
a manchete, em 14 de janeiro: “Exército
do Brasil bloqueou a prisão dos agitadores do ex- presidente derrotado nas eleições de 2022”. O
jornal afirma que o general da ativa e ex-ministro do exército, Júlio César de Arruda, disse aos altos
funcionários do governo do atual Presidente, entre eles o ministro da Justiça, Flávio Dino: “Aqui, vocês não vão
prender as pessoas”.
Essa demora deu
tempo para que milhares de acampados em frente ao quartel de Brasília se
retirassem, evitando a prisão. O jornal aponta um “padrão preocupante” no
“conluio de militares e policiais” com os invasores das principais instituições
da República. Inclusive, afirma que um alto oficial da Polícia Militar dava ordens no
momento da invasão.
“Antes do domingo (8 de janeiro), em duas ocasiões, os militares tinham impedido que as autoridades desocupassem o acampamento em frente ao Quartel Geral em Brasilia”, explica The Washington Post, com base no depoimento de um ex-comandante da Polícia Militar da capital.
No entanto, o
jornal opera na mesma direção que os meios de comunicação brasileiros e o
próprio governo federal atual, ao atribuir a invasão a personagens isolados dentro do exército, do empresariado e dos políticos de oposição.
O ministro Dino, ex-integrante
do PCdo B e atualmente no PSB, afirma que a tentativa de golpe não
foi financiada por instituições, mas por atividades econômicas ilegais, como a mineração e o agronegócio ilegais, e os
que traficam com agrotóxicos e
fertilizantes e ocupam terras
indígenas e públicas.
Nada mais longe da
realidade. As Forças Armadas estão
envolvidas como instituição na invasão
em Brasília. O antropólogo Piero Leirner, que há 30
anos pesquisa as Forças
Armadas do Brasil,
em uma entrevista ao jornal Folha
de São Paulo, afirma que “comparar os ataques em Brasília ao Capitólio oculta o
papel dos militares”.
Fornece muitos dados
concretos: entre os invasores havia militares da reserva e parentes de militares. Milhares
ficaram meses acampados em frente a quartéis e próximos ao Centro de Inteligência do Exército,
em Brasília. O
general Villas Bôas (que
divulgou um tuíte no dia em que Lula seria
julgado, quando iria assumir ministério no governo Dilma, para que fosse preso)
passou de carro pelo acampamento de Brasília.
Por isso, conclui que “os militares davam direção a esse movimento e apoiavam os acampamentos”. Se em algum momento o Exército tivesse declarado que as eleições foram legítimas, o movimento já teria sido dissolvido em novembro, quando começaram os acampamentos. Mais ainda, afirma que se eles não tivessem interesse, “as invasões não teriam ocorrido”.
O que existe,
enfatiza Leirner, é um
projeto de longo prazo para gerar um centro político fraco, que possibilite preparar “uma arquitetura
legal que permita a efetiva blindagem dos militares”, já que os fardados
observaram com horror o que aconteceu na Argentina, após a ditadura,
quando as juntas foram julgadas e processadas, havendo vários militares presos
naquele país até hoje.
Nesse
sentido, Bolsonaro e
o bolsonarismo são
bonecos de palha destinados a absorver as críticas à gestão que, concretamente,
correspondeu às Forças Armadas que ocuparam milhares de cargos em seu governo.
Acreditam, inclusive, que podem promover uma nova lei anti-terrorista, ainda mais dura do que a aprovada por Dilma Rousseff, em 2016, com o
objetivo de bloquear os movimentos sociais.
Os exemplos
de Peru, Colômbia, Equador e Chile deveriam
ser abordados como novas manifestações do “terrorismo”,
como vem afirmando a presidente Dina
Boluarte, em Lima.
Os empresários também estão cerrando fileiras contra a democracia e o novo governo federal. No dia 16 de janeiro de 2023, ocorreu um golpe na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), a principal associação empresarial do Brasil. Uma assembleia de sindicatos empresariais destituiu o presidente, Josué Gomes da Silva, por ter se manifestado a favor da democracia, durante a campanha eleitoral, que concretamente foi um apoio ao então candidato a presidente, Lula.
Segundo o jornal
conservador Folha de São Paulo,
o articulador da destituição foi Paulo
Skaf, que dirigiu a Fiesp por
17 anos e foi um dos principais apoiadores das manifestações pós-2013 contra o PT e pela
destituição da presidente Dilma
Rousseff, em 2016.
Em suma, Lula está sendo encurralado
pela aliança militar-empresarial-política-judicial que
não busca derrubá-lo, mas lhe impor muitas condições. A principal delas,
segundo a professora da Escola
Florestan Fernandes do MST, Silvia Adoue, é manter o controle militar da Amazônia, a
principal fonte de recursos do Brasil e base das cadeias de valor e acumulação
de capital em escala global.
Em toda a América Latina, estamos transitando para um novo modelo de sociedade. “As Forças Armadas brasileiras mapearam e abriram o território à exploração intensiva na Amazônia, seja da agropecuária ou da mineração”, destaca Adoue. Os militares garantiram na democracia o controle desses territórios e, durante os quatro anos da administração do governo federal anteiror, “o controle militar sobre a Amazônia aumentou, organizando e garantindo a atividade extrativa, tanto a legal como a ilegal”.
Portanto, precisamos de dois passos dos movimentos sociais de esquerda brasileiro:
- o primeiro é esclarecer como o poder militar, através do “partido
militar” atua no Brasil.
- o segundo é debater o que vamos fazer diante
disto, porque possuem as armas, são o poder por trás do trono presidencial e
não vão se sujeitar (nunca se sujeitaram) à inexistente “legalidade democrática” no Brasil, na
América do Sul ou mesmo na América Latina.
*Raúl Zibechi, jornalista e analista político uruguaio, em artigo enviado pelo autor ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU
Tradução: Cepat
Publicação IHU Unissinos: 20 Janeiro 2023
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