Há
diferenças entre o Nordeste e o Sudeste do Brasil. "Afro-brasileiros do
Nordeste têm ancestralidade tanto do Congo quanto da região da Nigéria. No
Sudeste, afro-brasileiros têm ancestralidade sobretudo congolesa",
afirmou, também por e-mail, a pesquisadora Sandra
Beleza, da Universidade de Leicester
por redação BBC Brasil - Sociedade e Afrodescendentes com Casta Brasileira
Imagem site BBC Brasil _ direito
de imagem Reuters Image caption
Mais de 12 milhões de africanos foram
transportados à força de um lado ao outro do Atlântico para trabalhar como
escravos nas Américas
Um estudo
de DNA com descendentes de africanos escravizados nas Américas evidencia como
aspectos desumanos da escravidão - desde maus-tratos e práticas racistas até
estupros - ocorridos entre os séculos 16 e 19 tiveram consequências genéticas
duradouras, além de trazer à tona novas informações sobre a origem desses
pessoas.
Com base
em amostras de DNA de 50,2 mil pessoas nas Américas e na África, coletadas de
um banco de dados de milhões de amostras de empresas e projetos genômicos,
pesquisadores da companhia 23andMe e da Universidade de Leicester (Reino Unido)
traçaram um paralelo entre o perfil genético de descendentes de escravizados e
os documentos históricos disponíveis sobre a escravidão.
Os
resultados foram publicados no periódico American Journal of Human Genetics.
Muitas das conclusões dos pesquisadores se aplicam à população afrodescendente
do Brasil.
Ubuntu: o que significa filosofia africana e como pode
nos ajudar nos desafios do hoje
A maioria
das conclusões é consistente com o que historiadores já sabiam a partir dos
registros históricos dos navios que transportavam os escravizados, mas a análise
genética traz novidades.
"O
deslocamento forçado de mais de 12,5 milhões de homens, mulheres e crianças da
África para as Américas entre 1515 e 1865 teve um significativo impacto social,
cultural, de saúde e genético ao redor das Américas", diz o estudo.
Quase 2
milhões dessas pessoas vieram para o Brasil
Estima-se que cerca de 2 milhões de
homens, mulheres e crianças escravizados tenham morrido nas viagens entre os
continentes africano e americano
"Embora
os registros transatlânticos tenham nos contado uma ampla parte da história,
informações deste estudo, em combinação com outros relatos históricos, jogam
luz sobre detalhes do impacto genético do comércio transatlântico de escravos
na população atual das Américas", diz o texto.
Uma origem improvável
Uma das
descobertas mais importantes é que os pesquisadores encontraram, na população
dos EUA e da América Latina (Brasil incluído), uma série de traços genéticos
típicos da região onde hoje ficam Nigéria e Benin - embora registros
transatlânticos não indicassem um alto fluxo entre essas regiões.
Os
pesquisadores sugerem que isso possa ser explicado pelo tráfico de pessoas
escravizadas dentro do continente americano, em uma época em que o comércio
transatlântico (entre África e Américas) já era alvo de proibições
internacionais.
Ou seja,
para escapar das sanções, os traficantes levavam pessoas do Caribe (onde era
mais comum a procedência da Nigéria) para os EUA e para a América Latina.
"Essas
viagens teriam espalhado a ancestralidade comum no Caribe britânico para outras
regiões das Américas que não estavam em comércio direto com regiões específicas
da África", aponta o estudo.
No caso
do Brasil, a maioria das conexões genéticas é com as populações do centro-oeste
da África, particularmente a região do Congo, "o que não surpreende, uma
vez que os dados estimam que quase 2 milhões de africanos escravizados foram
transportados diretamente (dali) para o Brasil", disseram, por e-mail à
BBC News Brasil, os pesquisadores Steven Micheletti e Joanna Mountain, da
empresa 23andMe.
No entanto, há diferenças entre o
Nordeste e o Sudeste do Brasil.
"Afro-brasileiros do
Nordeste têm ancestralidade tanto do Congo quanto da região da Nigéria. No
Sudeste, afro-brasileiros têm ancestralidade sobretudo congolesa",
afirmou, também por e-mail, a pesquisadora Sandra Beleza, da Universidade de
Leicester.
Estudo de DNA aponta como práticas
subumanas e rotas internas de tráfico moldaram o perfil genético dos
descendentes de pessoas escravizadas
Os impactos genéticos das más condições de vida entre os afrodescendentes
Em
contrapartida a esses fenômenos, também chamou a atenção dos pesquisadores o
fato de haver, entre descendentes de escravizados, poucos traços genéticos da
região onde ficam Senegal e Gâmbia.
O que
explica isso, se a chamada Senegâmbia também era a origem de um número
significativo de africanos escravizados levados às Américas - inclusive ao
Brasil, durante um período do século 16?
Para os
estudiosos, os motivos dessa subrepresentação genética parecem ser sombrios.
Primeiro,
de lá saiu, a partir dos anos 1700, grande quantidade das crianças
escravizadas, que muitas vezes não resistiam às terríveis condições sanitárias
e de desnutrição nos navios negreiros.
No total,
estima-se que cerca de 2 milhões de homens, mulheres e crianças escravizados
tenham morrido nas viagens entre os continentes africano e americano.
Outra
possível razão é que "uma grande proporção dos escravos da Senegâmbia
trabalhava em plantações de arroz nas Américas, onde havia geralmente
(contaminação) desenfreada por malária", diz o estudo.
Dessa
forma, as pessoas escravizadas dessas regiões teriam sido expostas a
"condições de trabalho que ameaçavam suas vidas", diminuindo suas
chances de perpetuar seus traços genéticos.
Estupro e 'branqueamento' na escravidão
Apesar de
mais de 60% dos escravizados trazidos para as Américas terem sido homens, as
análises genéticas apontam que uma grande parte dos genes de descendência
africana vêm das mulheres.
Isso é
ainda mais forte na América Latina: segundo a pesquisa, para cada homem, entre
4 e 17 mulheres contribuíram para o conjunto genético dos descendentes.
Direito
de imagem Getty Images Image caption O tráfico de pessoas da África para as
Américas durou mais de três séculos
Mais uma
vez, os motivos por trás disso são subumanos. Primeiro, isso é atribuído à
prática de estupro de mulheres africanas escravizadas, tanto por seus
"senhores" quanto por outras formas de exploração sexual.
Em
segundo lugar, verificou-se uma "mortalidade mais alta de escravos homens
na América Latina".
O
terceiro motivo, dizem os pesquisadores, é a prática conhecida como
"branqueamento" racial, "que envolvia mulheres se casando com a
intenção de produzir crianças de pele mais clara. Políticas nacionais de
branqueamento foram implementadas em múltiplos países latino-americanos,
financiando e subsidiando imigrantes europeus com a intenção de diluir a
ancestralidade africana por meio da reprodução com europeus de pele
clara".
Estudos de
historiadores e antropólogos afirmam que esse fenômeno ocorreu também no
Brasil.
Essas
práticas teriam feito com que genes femininos africanos se perpetuassem mais do
que os masculinos.
Na
contramão disso, os pesquisadores identificaram uma menor prevalência de genes
de origem feminina em antigas colônias britânicas, por exemplo nos EUA.
Uma
causas disso pode ser "a prática de coagir africanos a terem filhos, como
forma de manter (um número maior de) trabalhadores escravizados, já perto da
abolição do tráfico transatlântico". Essa prática pode ter aumentado a
participação de homens negros na formação genética de seus descendentes.
"Em
alguns locais, como os EUA, mulheres escravizadas eram incentivadas a
reproduzir, sob a promessa de libertação após o nascimento de muitos filhos.
Mais tarde, ideologias racistas nos EUA levaram à segregação de descendentes
africanos, em oposição à promoção da miscigenação com europeus", diz a
pesquisa.
No geral,
porém, "as práticas desumanas associadas à escravidão institucional,
embora divirjam entre as Américas, todas resultaram em uma propensão (à
predominância genética) africana feminina".
Migrações escravagistas entre as Américas
A análise
genética também mostrou que a ancestralidade africana não variava, em grande
escala, entre as diferentes partes dos continentes americanos. Isso é atribuído
pelos cientistas ao transporte interno de escravos entre uma região e outra e à
extensa migração interna dessa população.
"Por
exemplo, o comércio doméstico de escravos nos EUA entre 1790 e 1860 levaria ao
transporte de 1 milhão de pessoas escravizadas pelo sudeste americano",
dizem os pesquisadores, citando também os movimentos migratórios da população
negra do Nordeste ao Sudeste e Centro-Oeste do Brasil.
Publicado BBC Brasil: 1 agosto 2020
Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-53534656
Texto interessante na relação entre afro-descendentes e população brasileira, que formou a sociedade pós-tupy/guarany
ResponderExcluirA busca do conhecimento humano em suas mais profundas entranhas, leva a desígnios marcantes e convincentes quanto ao enfrentamento a distorções de credos, raça,ideologias verdadeiras, e o ser em sua plenitude conseguirá se libertar verdadeiramente ...
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