Observatório de Olho nos Ruralistas identifica 42 políticos brasileiros com fazendas em terras indígenas
Mato Grosso do Sul com 17 casos lidera lista de áreas invadidas, em
seguida aparecem Mato Grosso e Maranhão, com sete, cada
Entre os nomes que aparecem em destaque com a divulgação do relatório
estão o senador Jaime Bagattoli (PL-RO) e o deputado federal Dilceu Sperafico
(PP-PR). Bagattoli integra, atualmente, a Comissão de Meio Ambiente, a Comissão
de Agricultura e Reforma Agrária e a Comissão Parlamentar de Inquérito das
Organizações Não Governamentais - ONGs.
Sperafico é membro da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e
Desenvolvimento Rural, na Câmara dos Deputados, e publicou um vídeo, em sua
conta no Instagram, comemorando a aprovação do Projeto de Lei 490/2007 na
Câmara, que contou com seu voto favorável.
No vídeo, ele justificou o voto, dizendo que proprietários rurais têm
tido suas fazendas ameaçadas por processos de demarcação "indevida"
de terras indígenas, em Mato Grosso do Sul e no Paraná.
E é justamente em Mato Grosso do Sul - estado com fama de violência no
campo e assassinatos de indígenas, documentados por entidades como a Comissão
Pastoral da Terra (CPT) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) - onde
Sperafico tem uma fazenda, a Maracay, no município de Amambai. A propriedade de
que é dono tem mais de quatro mil hectares, de acordo com o observatório De
Olho nos Ruralistas, e fica sobre a Terra Indígena Iguatemipeguá, dos guarani
kaiowá.
No caso de Bagattoli, a fazenda em situação irregular é a São José, que
fica no município de Corumbiara, em Rondônia. A porção que está sobreposta é de
2,5 mil hectares em relação à Terra Indígena Rio Omerê, local habitado pelos
povos akuntsu e kanoê, que vivem em isolamento voluntário.
O patrimônio declarado por Jaime Bagattoli ao Tribunal Superior
Eleitoral, que inclui diversos lotes rurais, ultrapassa R$ 55 milhões. O de
Sperafico supera R$ 46 milhões.
Invasores de territórios de povos originários também foram os
responsáveis por bancar 29 campanhas de candidatos à eleição ou reeleição à
Presidência da República, ao Congresso Nacional, a governos estaduais e
assembleias legislativas. O montante de doações ultrapassou R$ 5,3 milhões.
Considerando somente pessoas ligadas à Frente Parlamentar da
Agropecuária, o que se observa é que 18 integrantes receberam R$ 3,6 milhões em
doações de campanha, desembolsados por fazendeiros ligados a
sobreposições.
A Agência Brasil tentou contato com o
deputado federal Dilceu Sperafico e o senador Jaime Bagattoli, mas nenhum deles
respondeu os questionamentos da reportagem.
Observatório Identifica 42 Políticos com Fazendas em Terras Indígenas
No Brasil, 42 políticos e seus familiares de primeiro grau são titulares de fazendas que ficam dentro de terras indígenas, o que constitui uma irregularidade do ponto de vista legal, e ameaça os direitos constitucionais de povos originários que ali vivem.
É o que denuncia a segunda parte do dossiê Os invasores, elaborado pelo
observatório De Olho nos Ruralistas. O documento lançado em 14.jun.2023, no
Cine Petra Belas Artes, em São Paulo, acompanhado de debate sobre a temática e
de exibição do premiado documentário Vento na fronteira, que retrata um
conflito entre fazendeiros e indígenas guarani kaiowá na fronteira entre Brasil
e Paraguai.
A primeira parte do relatório foi divulgada durante o Abril Indígena
deste ano, mês em que se procura dar maior projeção para as inúmeras lutas da
causa indígena em todo o país. No documento já se havia informado a
identificação de 1.692 sobreposições, das quais se destaca agora a porção pelas
quais respondem clãs políticos.
O observatório detectou terras com sobreposição a partir da análise de dados
fundiários do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), mais
especificamente, das bases do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), do Sistema
Nacional de Cadastro Rural (SNCR) e do Sistema Nacional de Certificação de
Imóveis (SNCI). Os políticos e sua rede têm em suas mãos 96 mil hectares, o
equivalente à soma das áreas urbanas de Rio de Janeiro e Belo Horizonte.
Com 17 casos, Mato Grosso do Sul
lidera a lista. Em seguida, aparecem Mato Grosso e Maranhão, com sete, cada.
Pessoas com Poder Aquisitivo Alto Invadiram Terras Indígenas e Áreas Públicas
no Brasil
De acordo com o coordenador de projetos do observatório, pesquisador
Bruno Bassi, os atores que protagonizam a prática ilegal e que ameaçam os povos
indígenas são tanto políticos como pessoas com poder aquisitivo, que financiam
tais ações e se mantêm em determinada teia de relações.
"Apesar de a gente ter um número relativamente reduzido de
políticos identificados com sobreposição direta, é interessante observar que,
na verdade, não é um número tão pequeno quando a gente pensa que é, um [total]
que corresponde a uma porcentagem relativamente alta desse número, pensando que
se esperaria que a imagem que se tem, normalmente, dos fazendeiros que disputam
áreas em terras indígenas, e isso é um discurso bastante reforçado pela mídia
corporativa, é que são pessoas desconhecidas, que o promotor desses conflitos é
o pequeno grileiro, um cara que ninguém conhece, que está lá no interior do
Brasil, promovendo esse tipo de ação", diz Bruno.
"O avanço do território, sobretudo do agronegócio, sobre
territórios indígenas ou reivindicados pelos povos indígenas é promovido, de um
lado, pelo capital, pelas grandes empresas e corporações, por multinacionais,
grandes empresários, e tem uma interface política, que abarca desde a posse
direta por pessoas que se envolvem nesse universo político. A gente tem
governador, deputados federais, um senador, cinco prefeitos e vice-prefeitos
com mandato atual e 23 ex-prefeitos, o que demonstra o tamanho dessa esfera
municipal, do poder local, na posse de terras. A gente tem deputados estaduais",
acrescenta.
O coordenador faz outra observação sobre as sobreposições: "A gente
tem desde casos declarados de invasão, ou seja, são em áreas [indígenas]
homologadas, que são tentativas de grilagem, como o caso do senador Jaime
Bagattoli, feita pelo antigo proprietário da área e que foi mantida nos
registros fundiários do SNCI, e há casos em que essa sobreposição impede,
muitas vezes, a própria demarcação do território", acentua Bruno.
O Congresso, a Mídia , Redes Digitais Mentem e Escondem a Verdade Sobre
Invasões de Terras Públicas
Ele diz que "vários dos processos de Mato Grosso do Sul se
desenrolam por mais de uma década até que se chegue a uma decisão. E esses
prazos têm sido ainda maiores em função do avanço político, na Câmara [dos
Deputados], especialmente, em se aprovar o marco temporal para a demarcação de
terras indígenas, que é a base de contestação de vários desses processos, uma
tese que ignora que esses indígenas foram expulsos continuamente dessas áreas,
principalmente durante os anos 40, 50 e 60, atrás das frentes de colonização,
em que o próprio Estado brasileiro, através do Serviço de Proteção aos Índios
(SPI), expulsava essas comunidades e realocava em áreas extremamente diminutas,
em relação ao território anteriormente ocupado pelos indígenas".
"Quem são os reais invasores de terras no Brasil? Os movimentos
populares que lutam pela reforma agrária e pela demarcação de terras indígenas,
direitos consagrados na Constituição de 1988? Ou os grileiros que invadem
milhões de hectares na Amazônia, no cerrado e nos demais biomas?" Essas
são algumas das pontuações que constam do relatório.
Nessa linha, que critica a criminalização dos movimentos sociais, Bruno
Biassi finaliza dizendo que o que o observatório propõe, com o documento, é a
inversão da lógica sempre disseminada. "Vamos também pautar a invasão de
terras pelo agronegócio", argumenta.
Publicado
no Brasil 24/7: 15 de junho de 2023
Fonte: https://www.brasil247.com/meioambiente/observatorio-identifica-42-politicos-com-fazendas-em-terras-indigenas-1ty16e39
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