A entrada da gestão privada nas universidades e a parceria com empresas,
que querem retorno a curto prazo, pode levar a cobrança de mensalidade em cursos de
universidades públicas, como aconteceu no Chile
por Juca Guimarães no Brasil de Fato – Sociedade e Educação
Brasileira sob Risco Bolsonaro
A defesa pela educação pública de
qualidade mobilizou milhares de pessoas em todo o país, que protestaram contra
o Future-se / ANPG-Associação Nacional de Pós-Graduandos
A
proposta do atual governo para o financiamento do ensino superior público no
Brasil, com o projeto "Future-se", que aposta na iniciativa privada
como solução para a educação, esconde riscos graves para a manutenção de
uma produção científica sólida e inovadora. Além disso, pode gerar crises
profundas em diversas áreas do conhecimento. Essa é a opinião da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG),
que irá se reunir nos próximos dias para apresentar um projeto alternativo ao Future-se, baseada no fortalecimento
do investimento público.
“O projeto é muito prejudicial para as universidades
públicas. No
fundo, ele busca na iniciativa privada resolver um problema estrutural das
instituições que é ter acesso ao financiamento público de forma robusta. Mais
de 90% da produção científica se dá na pós-graduação e, portanto, é sediado nas
universidades”, aponta Flávia Calé, presidente da ANPG.
O modelo
de produção de pesquisa de ponta nas universidades e institutos de pesquisa, na
maior parte dos países desenvolvidos, é focada no financiamento público com
percentuais que giram em torno de 3% do Produto Interno Bruto (PIB). “Cada real gasto em pesquisa gera outros onze em retorno”, diz Calé.
A
proposta do governo abre espaço para uma gestão de Organizações Sociais
(OS) e financiamento direto do mercado nas pesquisas acadêmicas. Na prática,
essas medidas vão afetar a diversidade das pesquisas e enfraquecer algumas
áreas de conhecimento, como a de humanas, que têm pouco potencial de lucro a curto prazo.
O projeto
do governo é inspirado no modelo de financiamentos por fundos privados como
acontece em Harvard, nos EUA, mas até lá, analisa Calé, é uma alternativa
de cheia de riscos,.
“Os
fundos que financiam essas universidades [como Harvard] tiveram um declínio
muito grande depois da crise de 2008. O Brasil vive um processo de
desindustrialização crônica, que remonta ao período pré anos 1950, de uma
indústria que não tem cultura de inovação. O sinal que o governo dá quando
deixa de investir em pesquisa é ‘se o Estado não investe, porque o mercado vai
investir?'. Esses financiamentos, no Brasil, tendem a ser muito oscilantes”,
disse.
Impactos
A
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) elaborou um estudo
com os principais impactos da implementação do plano Future-se, como foi
apresentado pelo governo.
Como
consequência grave, o estudo aponta para uma gradativa privatização e
sucateamento da educação superior. Principalmente por conta da entrada das
OS na gestão das instituições de ensino e pesquisa, o que poderia causar
uma grande perda na diversidade.
Para Iago
Montalvão, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), o governo
Bolsonaro apresentou o plano Future-se sem detalhar o que seria exatamente a participação das
OS.
“Não
ficou claro o papel das OS, o MEC não explicou, fugiu desse tema que na nossa
opinião é o tema central do plano porque ataca a autonomia das universidades”,
disse.
A entrada
da gestão privada nas universidades e a parceria com empresas, que querem
retorno a curto prazo, poderia levar a cobrança de mensalidade em cursos de
universidades públicas, como aconteceu no Chile.
A UNE
quer que o governo abra uma discussão para ampliar o investimento de recursos
públicos na educação, que foram reduzidos desde a criação do teto de gastos com
o setor, ainda no governo Temer, e com os seguidos congelamentos promovidos
pelo governo Bolsonaro.
Edição: Pedro Ribeiro Nogueira
https://www.brasildefato.com.br/2019/08/15/pesquisa-cientifica-mensalidade-e-qualidade-conheca-os-riscos-do-future-se/
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