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11.27.2013

TV corrói o cérebro das crianças

Por Kiko Nogueira, no blog Diário do Centro do Mundo:

No século passado, antes de as crianças ficarem reféns de games, smartphones e iPads, havia outro inimigo dos pais: a televisão. Acreditava-se que ela fazia mal para a visão, para a educação, para o comportamento. Logo se passou a acreditar que era lenda urbana.

Não era.

Uma nova pesquisa da Universidade de Ohio constatou que meninos em idade pré-escolar que tinham uma TV no quarto, ou cujos pais deixavam o aparelho ligado de maneira inercial, tiveram um desempenho pior nos níveis mental e emocional. Sua compreensão dos sentimentos de outras pessoas era superficial - crenças, desejos, intenções etc.

O estudo foi com 107 crianças na faixa entre 38 e 74 meses. A capacidade cognitiva estava prejudicada. A faculdade de “ler” os demais, dizem eles, um passo fundamental para a maturidade, estava comprometida.

“Tanto a TV ligada sem ninguém assistir quanto sua simples presença no quarto têm um impacto negativo”, afirma o relatório. “A TV expõe as crianças a personagens e situações sem profundidade e que requerem um processo superficial de entendimento”.

Isso acontece, entre outras razões, porque é uma mídia muito menos interativa do que, por exemplo, a Internet ou os videogames. É feita sob medida para o chamado couch potato.

A boa notícia é que ela está morrendo. De acordo com um levantamento do Citi Research, tanto as emissoras abertas quanto fechadas tiveram, em 2013, seu pior ano na história nos EUA. Todos os principais canais a cabo perderam pelo menos 113 mil assinantes no terceiro quadrimestre deste ano — é o fenômeno dos cord-cutters. No Brasil, a tendência não é diferente (o Ibope bate recordes negativos há 13 anos).

Sim, ainda é possível ver coisa boa por assinatura. Mas a situação se complica quando você tem a possibilidade de, com serviços de streaming na Internet, como o Netflix, assistir o que quiser, como quiser e na hora em que quiser.

Ou seja, quando seu filho estiver ali, em seu mundo, com o laptop e o iPad abertos, trocando mensagens ao mesmo tempo, não se desespere. Ele podia estar vendo o Big Brother, tornando-se um pequeno robô anti-social e comentando sobre o próximo capítulo da novela das 9.
http://altamiroborges.blogspot.com.br/2013/11/tv-corroi-o-cerebro-das-criancas.html

11.23.2013

Alimento é Saúde ou é Comércio?



‘Apenas 5% dos consumidores brasileiros podem ser considerados conscientes’.
Entrevista com Moacir Darolt



"Atualmente o cultivo de alimentos está dominado pela semente transgênica (no caso da soja e do milho). O princípio da precaução não foi observado no caso do Paraná e do Brasil. As consequências, saberemos no futuro próximo", afirma o pesquisador e agrônomo. 
O cultivo de alimentos orgânicos, sem produtos químicos está muito prejudicado.



No primeiro momento da chegada dos transgênicos no Brasil, ainda no final da década de 1990, o Paraná se mostrou um estado bastante resistente à entrada dessas sementes, especialmente com a atuação do então governador Roberto Requião. No entanto, com a liberação dos transgênicos no território brasileiro, em 2003, o estado logo se tornou um dos maiores produtores brasileiros em matéria da tecnologia. Para o pesquisador e agrônomo do Instituto Agronômico do Paraná – IAPAR, Moacir Darolt, "a liberação levou em conta apenas a questão produtiva e econômica, passando por cima das questões de saúde e riscos ambientais”. E continua: "O princípio da precaução não foi observado no caso doParaná e do Brasil. As consequências, saberemos no futuro próximo”.
Uma resposta a este movimento hegemônico são as produções alternativas, orgânicas e agroecológicas. Além disso, há também o movimento do consumo consciente, que busca valorizar produtos desenvolvidos em condições sociais e ambientais adequadas e sem risco à saúde humana. No entanto, ainda que o interesse sobre o tema venha crescendo, Darolt estima que "apenas 5% dos consumidores brasileiros podem ser considerados conscientes”. Há várias dificuldades envolvidas nesse tipo de produção, especialmente na forma como a cadeia produtiva sem rastreabilidade oferece pouca segurança para o consumidor. Ainda assim, em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, ele ressalta: "É preciso acreditar que a capacidade do consumidor em mudar hábitos de consumo tem reflexos em outros segmentos da economia, construindo mercados locais mais fortes”. E conclui: "Nós somos o reflexo de nosso sistema de produção”.
Moacir Roberto Darolt é graduado em Agronomia pela Universidade Federal do Paraná – UFPR, possui especialização no Institut de l'Elevage, na França, com um trabalho sobre engenharia de projetos e desenvolvimento rural, e doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural também na UFPR. Atualmente é agrônomo do Instituto Agronômico do Paraná – IAPAR. Darolt é autor de vários livros que abordam a agricultura orgânica e a ecologia, muitos voltados para leigos ou para o público infantil. Destacam-se, entre outros, Alimentos Orgânicos: um guia para o consumidor consciente (Londrina: IAPAR, 2007) e Conexão Ecológica: novas relações entre agricultores e consumidores (Londrina: IAPAR, 2012).

Confira a entrevista.
IHU On-Line – Você acredita que a produção orgânica ou agroecológica é capaz de substituir a produção convencional?
Moacir Darolt - Pelas projeções mundiais de crescimento da produção orgânica, que ainda é muito baixa (cerca de 2% das áreas cultivadas no mundo são orgânicas), tão logo não deve haver substituição, mas pode haver uma complementariedade e dar oportunidades de escolhas às pessoas para que tenham uma melhor qualidade alimentar. Não podemos ficar reféns do modelo industrial de agricultura, que padroniza sabores, diminui a diversidade biológica e destrói nossa cultura alimentar. Nosso desafio é saber de fato qual o papel dos produtores, dos consumidores e do estado (como regulador) nessa busca por um alimento de qualidade. Será preciso criatividade para manter as especificidades e diversidade dos produtos de cada região agrícola, evitando uma padronização e preservando os valores, a cultura e a tradição de cada local.

IHU On-Line – O que é o consumo consciente? Que tipos de pessoas buscam esta alternativa?
Moacir Darolt - Uma alimentação consciente tem relação direta com a forma de produção sustentável, com hábitos alimentares saudáveis e de consumo responsável. Busca mais do que uma alimentação isenta de aditivos químicos, procura observar técnicas de plantio sustentáveis, realçando o problema dos agrotóxicos, dos produtos transgênicos e dos problemas sociais. Observa com atenção os rótulos de produtos industrializados, preocupa-se com a forma de conservação dos alimentos, enfatiza a importância da hora das refeições e da diversidade na elaboração do prato. Em suma, a alimentação consciente preocupa-se com o alimento desde a sua produção até o momento de ser consumido.
As pessoas que buscam essa alternativa, normalmente, são pessoas com bom nível de formação e informação, que fazem suas escolhas alimentares preocupadas com a saúde e com a qualidade de vida, assim como com aspectos ambientais e sociais. Todavia, apenas 5% dos consumidores brasileiros podem ser considerados conscientes. Essas pessoas se diferenciam da maior parte da população por transformar em prática valores com os quais se identificam, têm uma preocupação com a comunidade onde vivem e exercem o seu poder de escolha como consumidores cidadãos.
IHU On-Line – Você acredita que o consumidor e mesmo o produtor paranaense são conscientes do tipo de alimento que consomem ou produzem?
Moacir Darolt - A grande maioria não conhece a procedência do alimento que está levando à mesa. A maior parte dos consumidores e também produtores abastece a sua cozinha em um supermercado, com alimentos prontos e altamente processados, num distanciamento cada vez maior entre quem produz e quem consome. A maioria não sabe que quase todos os derivados de milho e soja consumidos no país já são transgênicos, por exemplo. A letra T em um triângulo amarelo (indicando presença de pelo menos 1% de ingredientes transgênicos) não tem sido eficiente para informar os consumidores. Mesmo em relação a outros alimentos consumidos cotidianamente como hortigranjeiros, a maioria dos produtos a granel não é identificada em relação ao local de origem. Numa cadeia longa, a identidade do alimento (quem produziu? como e onde foi cultivado?) se perde, de modo que a única informação comunicada entre consumidores e produtores é o preço.
Em relação a quem produz, é mais fácil ser um produtor convencional do que ser um orgânico, por exemplo. Um produtor orgânico passa por um rígido processo de certificação e inspeção da propriedade, tudo é fiscalizado. Um produtor convencional não precisa declarar quantas pulverizações fez com agrotóxicos, se está causando erosão do solo ou se planta transgênicos, porque isso é o normal. Nós somos o reflexo de nosso sistema de produção.
A educação para o consumo deveria começar na escola básica, e esse é um dos grandes desafios desse século e uma das premissas para tornar o consumidor protagonista e elemento articulador de mudanças. É preciso acreditar que a capacidade do consumidor em mudar hábitos de consumo tem reflexos em outros segmentos da economia, construindo mercados locais mais fortes.
IHU On-Line – Pensando pelo lado da produção: todo produtor rural é capaz de produzir alimentos orgânicos ou de forma alternativa? Existe algum perfil para quem deseja escapar da produção de transgênicos?
Moacir Darolt - Quem busca esse caminho, considero "produtores conscientes”. Normalmente, são produtores inovadores, que buscam conhecer os processos ecológicos envolvidos na sua produção e estão sempre se atualizando. Para quem deseja fazer a conversão de um sistema convencional para um orgânico, é necessário promover a mudança estrutural da propriedade considerando-se alguns aspectos:
1) Informação e treinamento: dizem respeito ao aprendizado, por parte dos agricultores e dos funcionários, dos conceitos e técnicas de manejo que viabilizam a agricultura orgânica;
2) Instruções normativas: as normas da agricultura orgânica precisam ser seguidas para que o produto final possa receber o selo orgânico de qualidade;
3) Ajustes técnicos: pelo menos dois ajustes são fundamentais: o dos insetos, doenças e invasoras (que acontece num período mais curto); e a melhoria da fertilidade do sistema (que é um trabalho de prazo mais longo). O prazo máximo para a conversão é de quatro anos;
4) Aspectos comerciais: sendo um mercado diferenciado, convém que os canais de comercialização sejam definidos anteriormente à produção. O ideal é optar pelos circuitos curtos (feiras, cestas em domicílio, vendas para governo, pequenos mercados) e formar uma clientela fiel.
IHU On-Line – Que dificuldades um produtor que opta pela produção alternativa enfrenta tendo em vista financiamento, qualidade do solo, distribuição e outros elementos da cadeia produtiva?
Moacir Darolt - No Brasil todo agricultor enfrenta dificuldades, sobretudo os pequenos produtores familiares. Em todo caso, seguem algumas sugestões para quem quer produzir organicamente e minimizar os problemas: visite outras experiências bem-sucedidas na sua região ou proximidades antes de começar a produzir e escolha uma cultura ou criação que tenha afinidade; saiba que a fase mais difícil é o período de conversão, que pode durar de um a quatro anos, por isso, tenha uma reserva financeira e faça um bom planejamento nesta fase inicial, quando os produtos ainda não podem ser vendidos como orgânicos; siga corretamente as normas de produção, processamento, envase e comercialização da produção orgânica; tenha um bom controle administrativo e planejamento técnico de sua produção; saiba que a transformação agrega valor ao produto e aprenda a comercializar parte de sua produção de forma direta; faça contato com associações ou grupos de produtores orgânicos da sua região, tentando fazer um trabalho de divulgação em conjunto para venda e promoção da produção; tenha pelo menos dois a três canais de comercialização, preferentemente de venda direta, fazendo uma boa investigação dos melhores canais antes de começar a produzir; dê preferência à certificação participativa ou à certificação por auditoria em grupos, que tem custo mais acessível.
IHU On-Line – Existe espaço mercadológico para uma produção alternativa de produtos orgânicos? É possível escoar a produção, ou é uma opção mais indicada para a segurança alimentar?
Moacir Darolt - O espaço para esse tipo de produção é crescente. A tendência é de valorização dos produtos ecologicamente corretos, tanto que tem despertado o interesse econômico de empresas do "negócio verde ou biobusiness”, que se organizam em todo o planeta. É notório o espaço para a produção ecológica também em escala. Do outro lado, cada vez mais agricultores familiares, comunidades rurais e pequenas cooperativas de produtores defendem uma agricultura tradicional e tipos de sistemas agroecológicos que privilegiem a produção com uma dimensão humana, respeitando a biodiversidade e a soberania alimentar. Esse embate entre a produção industrial e a artesanal ou tradicional é uma disputa política que impõe regras na qual os pequenos produtores tradicionais encontram dificuldades em responder às exigências legais em termos de estrutura sanitária e aspectos fiscais, por exemplo.
É incoerente aplicar critérios semelhantes para a produção em larga escala e a produção artesanal, visto que as práticas tradicionais de produção de alimentos estão enraizadas socialmente e vinculadas a uma cultura e um modo de vida específico. Assim, a melhor alternativa para produtores familiares é optar por circuitos curtos de comercialização, mercados locais e de proximidade. Existem várias alternativas, como feiras do produtor, lojas especializadas, programas de governos, merenda escolar, restaurantes, vendas na propriedade, vendas em circuitos de turismo rural, entregas em domicílio, além de lojas virtuais pela internet

IHU On-Line – Em 2013, completam-se dez anos da entrada das sementes transgênicas no Brasil. Neste primeiro momento o Paraná foi um Estado que resistiu bastante à entrada deste tipo de cultivo. Por que isso aconteceu?
Moacir Darolt - O tema causou muita polêmica entre o final dos anos 1990 e início do novo século no Paraná e continua sendo alvo de discussões acaloradas, sobretudo por parte de entidades da sociedade civil organizada que rejeitam os transgênicos. Na época houve uma posição contrária do governador do Paraná, Roberto Requião, que através da Secretaria da Agricultura e Abastecimento montou um esquema de fiscalização para barrar a comercialização de sementes transgênicas no Estado, que vinham sendo contrabandeadas da Argentina desde o fim dos anos 90. Os plantios clandestinos (não autorizados) levaram à interdição das lavouras e dos produtos pelos órgãos de defesa vegetal a partir de 2001.
As lavouras transgênicas no Sul do Brasil no período foram implantadas com material desconhecido, grãos não adaptados ao solo e ao clima brasileiro. A primeira medida do governo do Paraná para desestimular o uso do grão contrabandeado foi obrigar o comércio e a circulação de soja a vir acompanhados de certificado atestando a inexistência de sementes transgênicas. A medida foi importante, mas não conseguiu barrar a entrada dos transgênicos no Paraná a partir de 2003. Atualmente o estado está dominado pela semente (no caso da soja e do milho). O princípio da precaução não foi observado no caso do Paraná e do Brasil. As consequências, saberemos no futuro próximo.
IHU On-Line – Hoje a briga contra os transgênicos arrefeceu e já há várias áreas no Estado onde se planta com o uso de sementes transgênicas. O que levou a esta mudança?
Moacir Darolt - A liberação de uso pelo Supremo Tribunal Federal, em 2003, estimulou o plantio de sementes transgênicas no Paraná e no Brasil, a ponto de haver um domínio absoluto das sementes transgênicas, totalizando mais de 90% da área plantada com soja, com tendência similar para o milho. Apenas as áreas próximas a parques e reservas naturais, de agricultores orgânicos ou de produtores convencionais que comercializam produtos livres de transgênicos é que escapam dessa invasão. A liberação levou em conta apenas a questão produtiva e econômica, passando por cima das questões de saúde (houve liberação sem testes definitivos que provassem a segurança dos OGMs) e riscos ambientais; portanto, desconsiderando o que se entende por sustentabilidade, que busca um equilíbrio entre diferentes dimensões (produtiva, econômica, social e ambiental).
As promessas de redução de custos de produção com transgênicos não se confirmaram e hoje quem paga é o produtor, que ficou refém das sementes transgênicas. Para quem deseja produzir livre de transgênicos, o problema é ainda maior, em função de possíveis contaminações desde a lavoura até a limpeza e o armazenamento. O risco é todo por conta do produtor que deseja "ser ecológico”, como os orgânicos! A facilidade de manejo de invasoras com o glifosato, grande trunfo inicial dos transgênicos, vem se perdendo (nesses últimos anos), com o surgimento de problemas com ervas e pragas mais resistentes. Resultado é o uso de mais agrotóxicos! A mudança foi muito boa para a indústria e grandes empresas, mas continua uma incógnita para os produtores e ruim para os consumidores, que são reféns de alimentos transgênicos à base de soja e milho.
IHU On-Line – Ao mesmo tempo, o Paraná é um dos maiores produtores de orgânicos do país. Como convivem estes dois tipos de lavoura? A transgênica, com alto uso de agrotóxicos, e a agroecológica?
Moacir Darolt - Diante do monopólio dos transgênicos, os produtores interessados em produzir no sistema orgânico e mesmo no convencional (livre de transgênicos) podem garantir um mercado interessante, sobretudo para a Europa e países onde os consumidores são mais conscientes. Normalmente, para produtos orgânicos, existe um prêmio médio na venda de 30% a mais em relação ao convencional para compensar os custos — que são maiores, sobretudo em função de maior gasto com mão de obra. A concorrência é desleal, com vantagens para quem usa produtos químicos. Acho que quem polui deveria, no mínimo, pagar por isso, como no caso do poluidor-pagador. Ao contrário, no caso dos orgânicos, poderiam receber um prêmio por serviços ambientais prestados.
Com a supremacia dos transgênicos, quem perde são os consumidores, reféns de uma dieta alimentar baseada em milho, soja, trigo e arroz, mercado dominado por uma dezena de empresas no mundo. Em breve os consumidores poderão não encontrar nas prateleiras de supermercados opções (de milho e soja, por exemplo) sem transgênicos. Produtos à base de amido de milho, por exemplo, muito utilizado para mingau de criança, só serão encontrados na versão transgênica. Isso é um risco não calculado para a saúde dos consumidores.
IHU On-Line – Deseja acrescentar mais alguma coisa?
Moacir Darolt - Aderir a uma cadeia alimentar curta talvez seja a melhor garantia da qualidade de um alimento limpo, saudável e justo. Não há dúvida de que isso irá exigir mais esforço de produtores e consumidores, mas está em jogo a nossa saúde e a preservação da nossa cultura alimentar.
http://site.adital.com.br/site/noticia.php?lang=PT&cod=78718

11.21.2013

Como A Elite Brasileira Consegue Enganar A População


POR CLÓVIS GRUNER
Alguns eventos precisam acontecer; outros, precisam não ter acontecido. Eleito pela primeira vez em 1994, FHC chegou ao governo como principal protagonista de um projeto de “20 anos de poder”, nas palavras do então ministro Sérgio Motta. A um ano da eleição de 1998, no entanto, um dilema: como manter-se duas décadas no poder sem um candidato forte para substituir o presidente? Os tucanos enfrentavam o mesmo problema do PT anos depois, porque cometeram exatamente o mesmo equívoco, apostar todas as suas fichas em um único carisma.
A solução encontrada por “Sérjão”, uma espécie de José Dirceu do governo tucano, foi simples. Como a Constituição de 1988 não previa a reeleição, o governo FHC comprou parte do Congresso e aprovou a emenda da reeleição. Em bom português, ao mudar a Constituição em seu benefício, deu um golpe branco que custou aos cofres públicos milhares, talvez milhões de reais. Os detalhes, como em todo caso de corrupção, são sórdidos. Estima-se que foram comprados cerca de 150 parlamentares, pagos em dólares. “O pessoal votava a favor e na saída do plenário já tinha gente esperando para acertar o pagamento junto a doleiros. Não tinha erro”, confidenciou recentemente a um jornalista um dos deputados beneficiados com o “mercado da reeleição”. O resultado da farra? Nenhum. Com maioria no Parlamento, FHC conseguiu barrar a instalação de uma CPI. O procurador Geraldo Brindeiro – não por acaso chamado à época de “Engavetador Geral da República” – encarregou-se de enterrar a denúncia. Sérgio Motta morreu em 1998, poucos meses antes de ver seu chef-d'œuvre concluído, com a reeleição de FHC no final daquele ano, em primeiro turno.
 
Do roteiro acima, a maioria se lembra apenas da reeleição, como se ela tivesse acontecido em clima de normalidade. O esquecimento, como a lembrança, não é natural. Desde 1997 e ao longo dos anos seguintes, houve um esforço conjunto, orquestrado pelas lideranças tucanas e seus aliados – fora os demos, basicamente os mesmos que hoje apoiam o PT, incluindo José Sarney –, além obviamente dos meios de comunicação, para condenar ao limbo este episódio. Não nego ao governo tucano seus méritos. Esse é um deles: FHC e seus asseclas construíram um “não evento”. Claro, as tentativas de produzir o olvido, por eficientes que sejam, só conseguem resultados provisórios. Há sempre um espírito de porco disposto a lembrar que uma mentira contada mil vezes não se torna uma verdade, mas apenas uma mentira contada mil vezes.
 
EU VEJO PESSOAS CORRUPTAS – Tudo muito diferente de outra narrativa, protagonizada também por um governo envolvido em denúncias e práticas de corrupção. Desde o nome, “Mensalão”, quase toda a trama foi tecida de maneira a produzir um evento que precisava ter acontecido. Um dos pontos altos veio na semana passada, com as primeiras prisões dos condenados. Não me sinto particularmente comovido ao ver presos José Dirceu e José Genoíno: se todo aprisionamento é em si absurdo e violento, esse não deveria me deixar mais ou menos indignado. Por outro lado, não se trata de uma prisão qualquer, e que ela tenha ocorrido no simbólico 15 de novembro e sob os holofotes da chamada grande mídia, é apenas um dos elementos do espetáculo midiático.

Não se trata de uma prisão comum porque Dirceu e Genoíno não são prisioneiros comuns: gostemos deles ou não, ambos são figuras emblemáticas na trajetória da esquerda brasileira e particularmente do PT. Não sei a extensão da responsabilidade de ambos e do PT no processo em que foram condenados – e, pessoalmente, penso que a verdade está em algum lugar intermediário entre o discurso de ódio da direita e a defesa exasperada dos governistas. Mas é notório que o STF e particularmente Joaquim Barbosa, serviram particularmente neste episódio a interesses que não necessariamente os da justiça.
 
Fosse assim, junto com Dirceu e Genoíno ou mesmo antes deles, outros já teriam sido punidos. Fernando Henrique Cardoso usou dinheiro público para salvar da falência o banco onde seu filho era sócio-diretor. Paulo Maluf está na lista de procurados da Interpol. Eduardo Azeredo, do PSDB, deu início em Minas, e com o mesmo Marcos Valério, ao esquema que condenou Dirceu e Genoíno. Demóstenes Torres, ex-senador Democrata, e seu cúmplice Carlinhos Cachoeira, enriqueceram fazendo da política uma extensão do crime organizado. José Serra, Geraldo Alckmin e Gilberto Kassab impediram que nos últimos anos quase meio milhão de reais entrassem nos cofres do estado de São Paulo. Estão todos livres e, suspeito, continuarão exatamente assim.
 
QUEM CONTROLA O PRESENTETodo mundo tem o direito de aplaudir a prisão dos dois Zés do PT, mas daí a acreditar que se está a combater a corrupção vai uma distância: nunca se prendeu corruptos nesse país, e o reality show dirigido pelo Ministro Barbosa mantém a tradição. Ao prender Dirceu e Genoíno, não se pretendeu dar uma “lição aos corruptos”, como afirmou um dos ministros do STF, fazendo coro à capa de uma revista semanal. O alvo era outro, era o PT. Mas com que propósito?
 
Tenho dúvidas se os fins são exatamente eleitorais. Em 2006, ano em que explodiu o escândalo, o máximo que a oposição conseguiu foi levar a eleição para o segundo turno, e amargou o vexame de ver Geraldo Alckmin ganhar menos votos do que no primeiro. No ano passado, e apesar do providencial ajuste na agenda do STF para fazer coincidir o julgamento com a campanha eleitoral, o PT conseguiu eleger Fernando Haddad, o que parecia ainda mais improvável que a eleição de Dilma Rousseff. E embora ainda seja muito cedo para prognósticos seguros, pesquisas indicam que ela mantém hoje larga vantagem sobre seus virtuais opositores.

Na falta de um projeto para o país, a oposição pode continuar a apostar no discurso moralizante, embora ele já não convença muita gente. Particularmente, acho que o propósito é outro. Em uma passagem emblemática de “1984”, de George Orwell, o personagem O'Brien afirma, a um impotente Winston Smith, que “quem controla o passado, controla o futuro; quem controla o presente, controla o passado”. O que está em jogo não são apenas as eleições presidenciais, mas qual interpretação sobre os acontecimentos políticos passados e coevos prevalecerá. Na “novilingua” forjada pela oposição e por parte da mídia nativa, seus colunistas e blogueiros, a urgência não é moral a nenhum deles interessa combater a corrupção e os corruptos, nenhum deles está preocupado com a coisa pública –, mas narrativa. Fazer o acontecimento e produzir o não acontecido. E ao menos por enquanto, quem continua a escrever a história são os vencedores.

11.14.2013

Adolescência e Rebeldia

Por Angelo Medina

Suzana Herculano: 'A adolescência é uma fase de aprendizado intenso, onde - ainda bem - o adolescente tem direito a vários erros no caminho'
Suzana explica por que o adolescente tem o direito de errar e responde uma série de questões sobre seu comportamento como: por que se trancam no quarto, se apaixonam loucamente, gostam de adrenalina, adoram quebrar regras, querem distância dos pais, se esquecem de ligar para casa, sentem tédio e por que é tão bom ser adolescente.

Vya Estelar - O que acontece no cérebro quando entramos na adolescência?
Suzana Herculano - Uma imensa reorganização que começa com uma fase de produção de matéria-prima, ou seja, mais conexões entre os neurônios, seguida da eliminação das conexões que não servem. Essa é a base do aprendizado intenso que ocorre ao longo de toda a adolescência.
As grandes mudanças específicas são as seguintes:
- O sistema de recompensa, que nos faz sentir prazer e querer mais do que é bom, passa por grandes mudanças logo no começo da adolescência que provavelmente causam os sinais mais característicos da nova fase: o tédio, o gosto por riscos, a busca de novidades.
- O córtex pré-frontal amadurece durante a adolescência e passa a permitir o raciocínio abstrato, melhora a memória e a concentração, e começa a permitir o controle de impulsos (aquele de contar até dez antes de xingar a mãe...)
- O córtex órbito-frontal somente amadurece no final da adolescência e possivelmente permite, só então, o raciocínio conseqüente, ou seja, o comportamento responsável, que leva em consideração as conseqüências possíveis dos próprios atos antes da ação. Até então, adolescentes não sabem pensar sozinhos nas possíveis conseqüências ruins dos seus atos.
- O circuito social somente amadurece no final da adolescência, quando permite que o adolescente se torne uma pessoa sociável, empática, solidária, capaz de se colocar no lugar dos outros e usar esta informação na hora de agir.
Vya Estelar - Cérebro de garotos e garotas funcionam de modo diferente nesta fase?
Suzana Herculano - As mudanças costumam começar primeiro nas meninas. Ou seja, elas começam a fase de transformação cerebral antes deles, e passam a adolescência inteira mais ou menos 'na frente' deles.
Vya Estelar - De que forma isto se repercute no cotidiano ou no comportamento dos jovens?
Suzana Herculano - A conseqüência da diferença no tempo da adolescência entre meninos e meninas é conhecida: meninas de 14 anos podem ser moças bastante maduras, enquanto meninos de 14 anos são... ahn... meninos de 14 anos.
Vya Estelar - A partir do funcionamento do cérebro, que dicas de autoconhecimento a senhora daria para que garotos e garotas levem esta fase da vida com mais tranqüilidade?
Suzana Herculano - Conhecer e aceitar seus limites é fundamental, e é um autoconhecimento que a neurociência hoje traz para o adolescente. É importante saber que precisamos de estímulos novos; que o cérebro se torna capaz de encontrar esses estímulos na literatura, no cinema, na música, no esporte, nas amizades; que usar drogas na adolescência é uma péssima idéia, porque o sistema sobre o qual elas agem está em uma fase crítica de sua formação; que somos impulsivos na adolescência e isso nem sempre é bom; que ainda não somos capazes de encontrar sozinhos todos os fatores, ou ao menos os mais importantes, a pesar na hora de tomar decisões, simplesmente porque a parte necessária do cérebro ainda não está pronta; que, mesmo assim, precisamos tomar nossas próprias decisões, porque é só assim que se aprende. Os pais e outros adultos confiáveis são ótimos consultores nessas horas, porque seu cérebro já aprendeu a enxergar todas as conseqüências possíveis dos nossos atos; que a adolescência é uma fase de aprendizado intenso, onde - ainda bem - o adolescente tem direito a vários erros no caminho.
Vya Estelar - Em quais pontos esse cérebro em transformação ajuda e prejudica os jovens?
Suzana Herculano - O interesse recém-descoberto pelo sexo aliado à impulsividade e à incapacidade de antecipar as conseqüências dos próprios atos é uma das misturas mais potencialmente explosivas da adolescência, e é tudo fruto das transformações no cérebro. Mas essas transformações também trazem coisas ótimas: raciocínio abstrato, raciocínio lógico aguçado, grande capacidade de concentração e aprendizado, idealismo, sede de novidades, disposição para correr riscos, vontade de realização e relacionamentos sociais cada vez mais bem sintonizados.
Vya Estelar - Uma série de questões merecem uma breve reposta. Gostaria que a senhora por gentileza as respondesse.
Por que os adolescentes
Se trancam no quarto
Há uma mistura de desinteresse pelo familiar/procura do novo que faz com que o adolescente se afaste do ambiente e das pessoas familiares. Uma maneira de fazer isso é sair de casa; se isso não é uma alternativa, resta passar o máximo de tempo possível fora de casa, e o resto do tempo... trancado no quarto, onde ele pode se cercar das novidades do seu mundo novo.
Se apaixonam loucamente
Sexo - e isso inclui beijos e carícias - é uma das melhores maneiras de ativar o sistema de recompensa que entra em baixa no começo da adolescência. Some-se a isso a impulsividade e a falta de discernimento do 'circuito social' do cérebro sobre quem é ou não é um(a) bom(a) candidato(a) a parceiro(a), e tem-se... paixões e mais paixões, todas intensas, muitas pouco duradouras.
Gostam de adrenalina - velocidade, rock pesado, raves, esportes radicais
Mais uma vez, a 'culpa' é do sistema de recompensa em baixa, necessitado de estímulos novos e fortes. Novidades, barulho intenso grave, e o estresse voluntário de esportes radicais são ótimas maneiras - embora não exatamente seguras - de dar a estimulação necessária ao sistema. Há alternativas menos arriscadas: academias, esportes menos radicais e estímulos intelectuais como música, cinema e literatura.
Adoram quebrar regras
O cérebro adolescente está aprendendo a tomar decisões, e isso envolve saber até onde é possível empurrar limites e ignorar regras. Isso é particularmente importante quando se lembra que várias regras da infância eram arbitrárias, estipuladas pelos pais segundo seus valores particulares. O adolescente está descobrindo seus próprios valores para tomar decisões, então quebrar regras é uma maneira de saber se aquilo é realmente uma regra sensata, ou apenas uma arbitrariedade ignorável.
Querem distância dos pais
Além de serem parte do 'mundo velho' da infância que perde a capacidade de ativar o sistema de recompensa, pais geralmente cometem o erro de querer continuar a tomar todas as decisões pelos filhos adolescentes. A distância dos pais pode ser apenas um efeito colateral da necessidade do novo (novos ambientes, novas amizades, novas atividades), combinada ou não a uma necessidade de espaço para aprender a tomar decisões.
Se esquecem de ligar para casa
Memória ainda em desenvolvimento + festa animadérrima + cérebro ainda incapaz de pensar que os pais devem estar morrendo de preocupação em casa: não pode dar em outra, não é? Mas o celular resolveu esse problema da minha geração: os jovens agora devem estar permanentemente acessíveis ao celular...
Sentem tédio
Culpa do sistema de recompensa que sofre uma perda da sua capacidade de ativação logo no comecinho da adolescência. Por conta disso, tudo o que antes era bom (porque ativava o sistema de recompensa) deixa de ser, e é preciso encontrar coisas novas para despertar o interesse do adolescente. O que é ótimo, porque é assim que se larga o mundo da infância para se descobrir um interesse pelo mundo adulto.
E por que é tão bom ser adolescente?
Por causa das transformações no cérebro, adolescentes vivem graaaaandes paixões. Eles entendem melhor e mais rápido do que os pais como usar equipamentos novos, em parte pelo prazer de usar suas recém-descobertas habilidades de raciocínio lógico e intelectuais. É uma fase de grandes descobertas literárias, musicais, políticas e intelectuais de uma maneira geral, quando estantes e mentes começam a se encher de novas idéias. O fascínio recém-descoberto pelo abstrato leva o jovem não só a descobrir filosofias, como também a criar a sua própria. E aqui os adolescentes levam uma enorme vantagem sobre adultos: livres ainda de grandes responsabilidades sobre os ombros, eles têm tempo só para curtir isso tudo. O ajuste aos novos prazeres e a aquisição de controle sobre os impulsos fazem com que a impaciência da infância vá dando lugar à habilidade de se esperar pelo que se quer, até que um dia a expectativa da festa passa, de sofrida, a ser no mínimo tão curtida quanto a própria festa. Ao mesmo tempo, a empatia adquirida com o amadurecimento da porção pré-frontal do cérebro faz o adolescente descobrir uma 'sintonia' com os amigos até então inusitada. É o começo da identificação com o outro, chave de bons relacionamentos e da vida em sociedade de uma forma geral.
Vya Estelar - Por ser um trinômio tão antigo não têm muitos cinqüentões e quarentões ligados nessas ondas. O que muda na relação com este trinômio dos mais maduros em relação aos adolescentes? Ou esses senhores estariam tendo um comportamento 'adolescentóide'?
Suzana Herculano - A adolescência é um período de descoberta de novos prazeres, e o trinômio sexo, drogas e rock and roll os ilustra bem. Nossa relação com esses e outros prazeres se torna mais tranqüila e menos impulsiva/compulsiva à medida que o cérebro amadurece e sai da adolescência. Mas esses continuam a ser prazeres pelo resto da vida, mais ou menos importantes para cada indivíduo.
http://www2.uol.com.br/vyaestelar/entrevista_suzana.htm

11.13.2013

Para Entender por que O Mundo do Dinheiro está em Crise

Um estudo de grande importância, mostra pela primeira vez de forma tão abrangente como se estrutura o poder global das empresas transnacionais. Frente à crise mundial, este trabalho constitui uma grande ajuda, pois mostra a densidade das participações cruzadas entre as empresas, que permite que um núcleo muito pequeno (na ordem de centenas) exerça imenso controle. Por outro lado, os interesses estão tão entrelaçados que os desequilíbrios se propagam instantaneamente, representando risco sistêmico.
 Ladislau Dowbor
 Fica assim claro como se propagou (efeito dominó) a crise financeira, já que a maioria destas mega-empresas está na área da intermediação financeira. A visão do poder político das ETN (Empresas Trans-Nacionais) adquire também uma base muito mais firme, ao se constatar que na cadeia de empresas que controlam empresas que por sua vez controlam outras empresas, o que todos "sentimos" ao ver os comportamentos da mega-empresas torna-se cientificamente evidente. O artigo tem 9 páginas, e 25 de anexos metodológicos. Está disponível online gratuitamente, no sistemaarxiv.org

Um excelente pequeno resumo das principais implicações pode ser encontrado no New Scientist de 22/10/2011 (e está publicado a seguir).


(*) O gráfico em forma de globo mostra as interconexões entre o grupo de 1.318 empresas transnacionais que formam o núcleo da economia mundial. O tamanho de cada ponto representa o tamanho da receita de cada uma

A rede capitalista que domina o mundo
Conforme os protestos contra o capitalismo se espalham pelo mundo, os manifestantes vão ganhando novos argumentos.

Uma análise das relações entre 43.000 empresas transnacionais concluiu que um pequeno número delas - sobretudo bancos - tem um poder desproporcionalmente elevado sobre a economia global.

A conclusão é de três pesquisadores da área de sistemas complexos do Instituto Federal de Tecnologia de Lausanne, na Suíça

Este é o primeiro estudo que vai além das ideologias e identifica empiricamente essa rede de poder global.

"A realidade é complexa demais, nós temos que ir além dos dogmas, sejam eles das teorias da conspiração ou do livre mercado," afirmou James Glattfelder, um dos autores do trabalho. "Nossa análise é baseada na realidade."

Rede de controle econômico mundial
A análise usa a mesma matemática empregada há décadas para criar modelos dos sistemas naturais e para a construção de simuladores dos mais diversos tipos. Agora ela foi usada para estudar dados corporativos disponíveis mundialmente.

O resultado é um mapa que traça a rede de controle entre as grandes empresas transnacionais em nível global.

Estudos anteriores já haviam identificado que algumas poucas empresas controlam grandes porções da economia, mas esses estudos incluíam um número limitado de empresas e não levavam em conta os controles indiretos de propriedade, não podendo, portanto, ser usados para dizer como a rede de controle econômico poderia afetar a economia mundial - tornando-a mais ou menos instável, por exemplo.

O novo estudo pode falar sobre isso com a autoridade de quem analisou uma base de dados com 37 milhões de empresas e investidores.

A análise identificou 43.060 grandes empresas transnacionais e traçou as conexões de controle acionário entre elas, construindo um modelo de poder econômico em escala mundial.

Poder econômico mundial
Refinando ainda mais os dados, o modelo final revelou um núcleo central de 1.318 grandes empresas com laços com duas ou mais outras empresas - na média, cada uma delas tem 20 conexões com outras empresas.

Mais do que isso, embora este núcleo central de poder econômico concentre apenas 20% das receitas globais de venda, as 1.318 empresas em conjunto detêm a maioria das ações das principais empresas do mundo - as chamadas blue chips nos mercados de ações.

Em outras palavras, elas detêm um controle sobre a economia real que atinge 60% de todas as vendas realizadas no mundo todo.

E isso não é tudo.

Super-entidade econômica
Quando os cientistas desfizeram o emaranhado dessa rede de propriedades cruzadas, eles identificaram uma "super-entidade" de 147 empresas intimamente inter-relacionadas que controla 40% da riqueza total daquele primeiro núcleo central de 1.318 empresas.

"Na verdade, menos de 1% das companhias controla 40% da rede inteira," diz Glattfelder.

E a maioria delas são bancos.

Os pesquisadores afirmam em seu estudo que a concentração de poder em si não é boa e nem ruim, mas essa interconexão pode ser.

Como o mundo viu durante a crise de 2008, essas redes são muito instáveis: basta que um dos nós tenha um problema sério para que o problema se propague automaticamente por toda a rede, levando consigo a economia mundial como um todo.

Eles ponderam, contudo, que essa super-entidade pode não ser o resultado de uma conspiração - 147 empresas seria um número grande demais para sustentar um conluio qualquer.

A questão real, colocam eles, é saber se esse núcleo global de poder econômico pode exercer um poder político centralizado intencionalmente.

Eles suspeitam que as empresas podem até competir entre si no mercado, mas agem em conjunto no interesse comum - e um dos maiores interesses seria resistir a mudanças na própria rede.

As 50 primeiras das 147 empresas transnacionais super conectadas

Barclays plc
Capital Group Companies Inc
FMR Corporation
AXA
State Street Corporation
JP Morgan Chase & Co
Legal & General Group plc
Vanguard Group Inc
UBS AG
Merrill Lynch & Co Inc
Wellington Management Co LLP
Deutsche Bank AG
Franklin Resources Inc
Credit Suisse Group
Walton Enterprises LLC
Bank of New York Mellon Corp
Natixis
Goldman Sachs Group Inc
T Rowe Price Group Inc
Legg Mason Inc
Morgan Stanley
Mitsubishi UFJ Financial Group Inc
Northern Trust Corporation
Société Générale
Bank of America Corporation
Lloyds TSB Group plc
Invesco plc
Allianz SE 29. TIAA
Old Mutual Public Limited Company
Aviva plc
Schroders plc
Dodge & Cox
Lehman Brothers Holdings Inc*
Sun Life Financial Inc
Standard Life plc
CNCE
Nomura Holdings Inc
The Depository Trust Company
Massachusetts Mutual Life Insurance
ING Groep NV
Brandes Investment Partners LP
Unicredito Italiano SPA
Deposit Insurance Corporation of Japan
Vereniging Aegon
BNP Paribas
Affiliated Managers Group Inc
Resona Holdings Inc
Capital Group International Inc
China Petrochemical Group Company 

Fonte: http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/Matematicos-revelam-rede-capitalista-que-domina-o-mundo/7/17736

11.12.2013

Crianças Aprendendo o Presente, o Passado e o Futuro

Entender as características da própria existência e das várias fases da vida colabora para a compreensão do que é passado, presente e futuro

Gabriela Portilho (novaescola@fvc.org.br)
Perguntas banais para os adultos, como "Onde e quando você nasceu?", podem suscitar muitas descobertas para crianças na faixa dos 7 e 8 anos. Pensando nisso, as professoras Elaine Bisinelli Rios de Castro e Sandra Mara Stanytchyi conduziram suas turmas de 2º ano da EM Newton Borges dos Reis, em Curitiba, por uma sequência de aulas que contribuiu para dar aos pequenos a compreensão das fases da vida. Eles avançaram na noção sobre em que momento histórico de sua existência estão (a infância), o que aconteceu antes de chegarem até aqui e o que está por vir.

A viagem no tempo começou com a análise de um documento histórico que todos da classe possuem: a certidão de nascimento. Antes de propor a atividade, porém, Elaine coletou as percepções dos alunos sobre onde eles tinham nascido. Uns consideravam que havia sido em um hospital, outros, em sua residência, e teve até quem acreditasse ter vindo de uma semente. A professora pediu então que com a ajuda de familiares cada um avaliasse sua certidão e coletasse uma série de dados: o próprio nome, o do pai, da mãe e do hospital, além da data e do horário em que nasceu.

Na aula seguinte, todos compartilharam as informações encontradas. Alguns estudantes relataram ter notado que não viviam na mesma cidade em que nasceram. Teve quem ficasse espantado por possuir o mesmo sobrenome de colegas da classe, apesar de não serem parentes. A maior surpresa, no entanto, foi descobrir que a data de nascimento era igual ao dia do aniversário.

Elaine buscou conhecer a noção dos alunos a respeito do seu próprio passado. Para isso, pediu que elencassem fatos que haviam acontecido quando eram menores. "A ideia que eles possuíam do que já passou se referia a acontecimentos muito recentes: um dente que caiu, as primeiras pedaladas de bicicleta e o fim de semana com os pais, por exemplo. Havia uma grande lacuna de eventos entre a data de nascimento e os dias atuais."
http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-1/tempos-infancia-toda-crianca-tem-732319.shtml#ad-image-0

11.06.2013

Jogadores do Bom Senso FC Dão Novas Esperanças ao Futebol Brasileiro, mas ...


Por Giulia Afiune
Jogadores do Bom Senso FC Dão Novas Esperanças ao Futebol Brasileiro, mas Ainda Tem Muitas Pedras no Caminho Longo a Ser Percorrido ...
Bom Senso FC se reúne hoje com CBF, TV Globo e outros "chefes" do futebol, para debater situação de atletas, calendário dos jogos e exigir transparência de clubes e entidades

"Abrimos uma porta na qual nós temos que entrar”, diz Alex (Foto: Divulgação)
O zero a zero no empate entre Coritiba e Internacional, no Couto Pereira, foi muito mais importante para o futebol nacional do que o resultado sugere. Ao fim daquele jogo, no dia 1o de setembro passado, Alex, o craque do "Coxa” [Coritiba], na troca de camisas com Juan, zagueiro do Inter, seu colega de longa data, teve com ele uma conversa que deu origem a uma movimentação entre os jogadores brasileiros que não se via há muito tempo.
Os astros tinham uma reclamação em comum: a sequência extenuante de jogos imposta pelo calendário de jogos, que chamava a atenção de ambos, que estavam de volta ao Brasil há cerca de um ano depois de um longo período fora do país. Juan, por exemplo, considerava absurdo o seu time fazer quatro jogos em quatro cidades diferentes em 10 dias, estressante para qualquer atleta, pior ainda para um veterano como ele.
A partir dessa conversa, outros atletas se mostraram interessados em discutir o calendário do futebol brasileiro, como o zagueiro Paulo André, do Corinthians, que procurou Alex para falar do tema dias depois. Os boleiros formaram um grupo no Whatsapp, aplicativo de mensagens instantâneas no celular, e abriram o debate com o objetivo de organizar as ideias antes de discuti-las com o que consideram o comando do futebol brasileiro: a CBF, que organiza os jogos profissionais no Brasil, e a TV Globo, que financia os campeonatos com o pagamento do direito de transmissão.
Foi nesse momento de articulação inicial entre os atletas que Alfredo Sampaio, vice-presidente da Fenapaf (Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol), sindicato de jogadores profissionais de futebol, ligou para Alex com uma proposta que havia negociado com a CBF: a de reduzir as férias de 30 dias ao fim da temporada de 2013 para 17 dias no fim do ano e tirar os 13 restantes durante a Copa do Mundo do ano que vem. Alex recusou de pronto, falando por si, e disse que queria consultar o seu recém-formado grupo de atletas. Três dias depois, a CBF divulgou o calendário de 2014 e, em seguida, a Fenapaf declarou encerradas as negociações sobre férias.
Foi quando o "sindicato paralelo” decidiu pela dissidência e ganhou nome: Bom Senso Futebol Clube, que hoje já tem 870 adesões de jogadores profissionais. Também construiu um dossie comparando os calendários dos jogos entre o Brasil e outros países, levantando os prejuízos físicos que o excesso de jogos trazia para os atletas e lembrando a legislação que protege os trabalhadores. Baseados nesses argumentos, os atletas apresentaram cinco reivindicações: três referentes ao calendário – 30 dias corridos e irrevogáveis de férias, um período de quatro a seis semanas para pré-temporada, e um limite máximo de sete jogos por mês; e duas mais políticas, exigindo a transparência e o controle das finanças dos clubes e a inclusão de atletas, treinadores e executivos de futebol no conselho técnico das competições e entidades.
Entregue à Globo e à CBF no último dia 7 de outubro, que pediram tempo para analisá-lo, o documento será foco de uma nova reunião na sede da CBF no Rio de Janeiro, hoje, às 14h, reunindo a Globo, a CBF, o conselho de clubes, os sindicatos, árbitros e o Bom Senso FC. Confira o papo que a Pública bateu com uma das lideranças do movimento, o craque Alex (ex Palmeiras, Cruzeiro, Seleção Brasileira), atualmente no Coritiba.


Agência Pública
Alex e outros atletas do Bom Senso FC se reunem hoje com a Globo e a CBF (Foto: Divulgação)

Apesar de alta taxa de adesões ao Bom Senso FC, são os jogadores veteranos que estão à frente do movimento. É difícil engajar os jogadores mais jovens?

Na verdade, não. Os mais velhos, que têm uma experiência maior, eles se colocam. Mas tem muitos jogadores de 25, 26 anos, que estão no meio das suas carreiras [no movimento]. Mas a ideia com certeza é essa: passar para os mais jovens que eles têm condição de se fazer ouvir. Existe algum tipo de recomendação dos clubes para jogadores não se posicionarem politicamente?
Não, muito pelo contrário. Inclusive, na segunda-feira vai ter reunião com a CBF e eu vou com o presidente do meu clube [ o Coritiba Foot Ball Club ] que, por coincidência, é o presidente da associação dos clubes. Outros diretores e presidentes de clubes se colocaram à disposição para o que fosse necessário. Eu acredito que, até o momento, a aceitação está sendo boa. Até porque nossa ideia não é confrontar ninguém, é agregar valor, e criar uma situação para que nós sejamos ouvidos. Nós vamos para dentro do campo para fazer o momento final desse produto todo que é o futebol e, em momento algum, a gente foi ouvido. Então a nossa intenção, quando nos reunimos, é agregar valor.

Agencia Publica
Bom Senso FC surgiu a partir de uma conversa de fim de jogo entre Alex e o zagueiro Juan, do Inter (Foto: Divulgação)
Muitas reivindicações do Bom Senso FC são trabalhistas. Você acha que os jogadores devem ser vistos como profissionais, e não como "celebridades”?

Eu vou falar por mim. Eu não me sinto celebridade em momento algum. Nunca me senti, nem quando fui campeão da Libertadores com o Palmeiras. Eu sempre fui pra treinamento e pra jogo encarando aquilo como a minha profissão. Sabendo que é diferente, que tem uma exposição grande na mídia, que todo mundo está comentando, que você é julgado diariamente… Mas nunca me senti celebridade em momento algum. Fora isso, existe uma realidade que é bem maior do que essa, que é a dos jogadores que jogam em equipes menores, sem essa situação de ser toda hora noticiado na mídia. E o pessoal muitas vezes chega ao fim de suas carreiras com muitas dificuldades. Então essa situação trabalhista é e tem que ser sempre [ pensada ] porque o futebol não é diferente de outras profissões. Tem a sua regulamentação. E o que a gente busca é o que toda classe, independente de qual seja, sempre buscou.
No dossiê do Bom Senso vocês denunciam o atraso ou a falta de pagamentos de salários, até mesmo o desemprego de jogadores de clubes de menor porte. Por que se preocupar com a saúde financeira desses times?
Porque, na verdade, o futebol gira muito, mas a gente só olha para os grandes centros. E o Brasil é enorme, tem várias equipes, vários níveis de jogadores de futebol. E isso varia muito. Tem jogadores que assinam contrato de 2, 3 anos e eles têm a garantia de estar 2, 3 anos em um clube que tem uma situação melhor no sentido geral. Agora, tem jogadores que assinam contrato por três meses. E muitas vezes ele acaba nem recebendo esses três meses. Então, quando a gente começou a discutir, a gente tinha várias preocupações, mas a maior delas sempre foi que essas equipes menores tenham um calendário melhor. Se isso acontecer, os seus empregados, não só os jogadores, vão ter emprego por mais tempo. E aí vai ter uma tranquilidade, maior para tocar o seu dia a dia com a família. Então nesse sentido, também é importante que a gente olhe com melhores olhos para quem não tem essa exposição tão grande quanto os membros de outras equipes que a gente conhece.
Em entrevista à ESPN, você falou que o Bom Senso FC não quer choques desnecessários entre os jogadores e os responsáveis pela organização do futebol brasileiro. É possível mudar o futebol só costurando acordos? Não seria necessária uma dose maior de enfrentamento por parte de vocês?
Depende. Porque, na verdade, a repercussão foi boa, a gente tem sido bem recebido, a CBF e a Rede Globo nos receberam. Na próxima semana [ hoje ] vai ter uma reunião grande com as duas e com outros setores do futebol. Então nesse momento não existe situação nenhuma para criar um confronto. Realmente não passa isso pela nossa cabeça porque até o momento a recepção tem sido positiva.
O advogado do Bom Senso, João Chiminazzo, disse em uma entrevista que, caso as reivindicações dos atletas não sejam ouvidas, "eles irão ao extremo se for necessário”. O que vocês pensam em fazer? Vocês cogitam, por exemplo, fazer uma greve nos campeonatos estaduais?
Não, a gente não chegou nesse ponto de discutir ainda porque a repercussão tem sido boa. Então as nossas conversas giram todas em cima das situações que estão acontecendo. Nós nos encontramos, tivemos várias ideias, depois disso a Globo e a CBF nos atenderam. A gente vai passo a passo, agindo em cima daquilo que eles colocam na mesa. A única coisa que temos em mente é o seguinte: abrimos uma porta na qual nós temos que entrar. Não podemos ficar titubeando, esperando pra ver o que vai acontecer. Mas o princípio do que a gente pensou está acontecendo, que é o comando maior do futebol brasileiro nos receber e poder conversar na boa.
Qual a sua expectativa acerca dessa nova reunião (de hoje)?
Nenhuma. Vou para lá ouvir, ver o que vai acontecer, mas eu não crio expectativa positiva nem negativa. Sei lá o que a CBF vai dizer, o que a Globo vai falar, como os clubes vão se posicionar. Eu não fico pensando muito nessas coisas. Eles já receberam o dossiê no nosso último encontro. Vamos lá ouvir, discutir se for necessário, colocar o nossos pontos. Um encontro saudável em torno do bem do futebol brasileiro.
Na nota mais recente do Bom Senso FC, está escrito que "os integrantes do Bom Senso FC não reconhecem a legitimidade da Fenapaf [sindicato que representa os atletas profissionais de futebol], ou de qualquer outro sindicato convocado para a reunião, para representá-los nesse âmbito”. Por quê?
Porque em setembro eles lavaram as mãos de todas as negociações. Então a partir do momento que eles lavaram as mãos, não tem porque a gente reconhecer, né? Foram eles que abriram mão de estar nas negociações, não fomos nós.
O que você acha do vice-presidente da CBF, Marco Polo Del Nero ter se reunido com os sindicatos e uma comissão de clubes para discutir o calendário na semana passada, uma das reivindicações centrais do Bom Senso FC? Você vê nisso algum sinal de que a CBF quer deixar o movimento de escanteio?
Não, eu não acredito que tenham nos deixado de lado. Tanto que na segunda-feira (hoje) vai acontecer a reunião e nós fomos convidados. Não me senti deixado de lado em momento algum. Eles têm o direito de se encontrar com quem eles quiserem, com quem acharem que têm que se encontrar.
Além do calendário, quais são, na sua opinião, os grandes problemas estruturais do futebol brasileiro?
As pessoas falam muito no calendário, mas não é só isso. A gente tem discutido o fair-play financeiro, temos preocupação com os jogadores e com os profissionais que trabalham em equipes menores, que não têm o ano todo para ser trabalhado. Os focos principais são esses, para que comece a haver uma reestruturação e fique bom para todo mundo. Quando a gente fala em calendário não é só questão de jogar quarta e domingo, mas é uma questão mais complexa que está sendo discutida.
Em entrevista ao Lance, você afirmou que a Globo manda no futebol brasileiro. Por que?
A Globo comanda porque a Globo paga a conta. As cotas televisivas são todas da Globo, a emissora detém os direitos do Campeonato Brasileiro e a CBF administra isso. Esse é um fato que todos nós conhecemos. As pessoas levaram como crítica, mas em nenhum momento eu critiquei. A dona dos direitos é a Globo e a CBF é a coordenadora de tudo isso. Uma coordena e a outra paga o valor que sempre pagou. E comanda o futebol brasileiro nesse sentido do pagamento das cotas já há muito tempo. Mas eu não vejo problema nenhum.
Nem a questão dos horários dos jogos?
Aí é uma questão da grade da televisão. Eu particularmente não gosto, mas eu não posso interferir nisso.
E o Bom Senso pretende criticar isso também?
Não, em momento algum nós colocamos isso em discussão.
Você acha que o futebol brasileiro é pouco profissional?
Eu acho o futebol brasileiro um produto mal aproveitado que pode ainda melhorar bastante. É o que todo mundo quer, é o que a Globo quer, o que os jogadores e treinadores querem, o torcedor quer e o que vocês da imprensa querem também. Essa discussão toda é salutar nesse sentido.
Mas dá um exemplo desse anti-profissionalismo.
Vamos dar um exemplo. Vamos supor que eu assine um contrato com você, você vai trabalhar para mim e eu não te pago. Isso é profissional? Esse é um fato que acontece no futebol brasileiro. Você assina um contrato, joga e não recebe. Isso já acontecendo, já não é futebol profissional.
Em uma entrevista recente, você disse que o futebol brasileiro na sua volta, em 2013, estava tecnicamente muito abaixo do que quando você saiu, em 2004. E do ponto de vista de organização, como você avalia?
Acho que evoluímos um pouco. Não dá para generalizarmos, mas evoluímos sim. Ainda podemos evoluir muito mais. Mas comparando com aquela época, acredito que tenhamos evoluído sim. Vejo, por exemplo, o que o Corinthians está conseguindo fazer. O Corinthians com o retorno do Ronaldo teve um ganho absurdo, coisa que a gente não conseguia ter lá atrás. O próprio Coritiba também passava por dificuldades absurdas e foi evoluindo, melhorando. É um contexto que, no geral, mostra uma evolução.
E a questão do fair-play financeiro que vocês defendem entra nesse sentido…
Sim, entra nesse sentido. Porque todo trabalhador contratado tem direito a receber. E se o empregador por alguma razão não está fazendo, temos que buscar para que ele faça, né? E isso não é um pedido nosso, é um pedido dos próprios clubes. Conversando com o presidente da associação dos clubes ele me disse que o pedido dos clubes foi algo parecido com relação a isso. Eles também querem o fair-play financeiro.
E como envolver o torcedor nas reivindicações do Bom Senso FC?
O torcedor tem o papel mais importante porque ele está super envolvido no negócio. Aliás, essa discussão toda começou a surgir porque a gente achava que o produto do futebol a ser oferecido para o torcedor poderia ser melhor. Estamos fazendo isso principalmente para ele, o torcedor. O que eu costumo dizer sempre é que, por exemplo, a minha carreira está chegando ao fim. A única coisa que eu tenho certeza agora é que eu vou continuar sendo um espectador e um torcedor de futebol. Então eu acredito muito que o que a gente vê hoje pode ser melhor. O torcedor também tem que acreditar que esse movimento de hoje é um movimento para que as coisas melhorem, principalmente naquilo que ele gosta, que é ver o time dele sempre bem em campo.
O dossiê do Bom Senso FC também aborda a questão do esvaziamento dos estádios. Você acha que a questão é a baixa atratividade dos jogos?
Não. É um contexto bem amplo. Tem a qualidade das equipes, tem o valor dos ingressos, tem a dificuldade de se chegar aos locais dos jogos, pois nós sabemos das dificuldades que os torcedores enfrentam com o transporte público principalmente para se voltar dos estádios. Existe também o problema social da violência. É um fator mais amplo, não acho que seja por conta de um fator apenas, mas um conjunto de situações que faz com que o número de torcedores nos estádios seja menor. Quando a gente começou a levantar as nossas reivindicações, muita gente achou que a gente só estivesse focado no fator calendário. "Ah, os jogadores estão reclamando porque estão jogando quarta e domingo”. E não é isso. Lembra aquela história que existia nas passeatas, de que não era só por vinte centavos? Nós também temos outras propostas de calendário. Por exemplo, para ajudar o pessoal das equipes menores, para que eles tenham um calendário melhor também e possam jogar o ano todo, ao invés de três meses. Melhorando esse produto, você pode também fazer com que mais pessoas venham aos estádios. Então é um contexto grande que a discussão estáaberta e eu só espero que o futebol brasileiro ganhe.
Você acha que os estádios que estão sendo construídos para Copa em Cuiabá, Manaus e Brasília, por exemplo, pode ajudar a desenvolver o futebol nesses lugares?
Eu acredito que sim, mas não só construindo estádios. É preciso também que se organize as federações, os campeonatos estaduais. Agora, a questão da Copa do Mundo ter ido para locais onde praticamente não há futebol é uma questão mais do país em si. Ela já sai um pouco do futebol. Ela entra em outras áreas e aí a discussão tem que ser longa. Agora, eu acredito que ter um estádio num lugar sem uma boa atuação da federação o futebol não se fortalece em nada. Agora, ter um estádio onde tem uma federação tentando se organizar melhor já é um ponto a favor.
E em relação à Copa ser quase que inteiramente bancada com dinheiro público. Qual a sua opinião a respeito?
Quando eu penso na Copa do Mundo, penso o seguinte: a Copa do Mundo tem que deixar algo para depois. É claro que nós poderíamos entrar aqui numa discussão e dizer que o dinheiro que foi posto na Copa poderia ter sido colocado em saúde, em educação, em segurança pública, em outras vertentes e necessidades da sociedade. E não adianta que nós vamos ficar dando murro em ponta de faca. A Copa é aqui, o dinheiro já foi colocado, agora a gente tem que ter a expectativa de que as coisas corram bem e que, com a Copa do Mundo, as coisas possam ficar mais interessantes, com um legado que a própria sociedade possa usar. Agora, é inegável que o nosso país tem problemas sociais enormes e esse dinheiro todo que foi posto na Copa do Mundo poderia ter sido utilizado em outras áreas.
http://site.adital.com.br/site/noticia.php?boletim=1&lang=PT&cod=78444

11.03.2013

O Brasil Vive uma Pequena Guerra Civil, Muito Pequena ...

3 de Novembro de 2013 - 8h29

Por Rafael Zanvettor*, na Caros Amigos


Boaventura de Sousa Santos/ Foto: Isabela Sanginés Franco

Estudioso da sociedade brasileira, o cientista português Boaventura Santos falou à revista Caros Amigos sobre a democracia. Confira abaixo:

Caros Amigos: Como o senhor avalia as manivestações de junho e o processo que elas abriram no Brasil?
Boaventura de Sousa Santos: Para mim os protestos não foram propriamente uma surpresa, assistimos desde 2011 protestos caracterizados pela ocupação de ruas e praças de forma pacífica como a Primavera Árabe, os Indignados na Espanha e o movimento Occupy nos Estados Unidos. Para quem acompanha a situação brasileira como eu, era possível ver um certo mal-estar na sociedade civil brasileira, o que eu não podia prever e ninguém poderia prover, é que iria começar desta forma.

O mal-estar tem a ver com dois fatores, o primeiro é que a a presidenta Dilma ter se afastado de uma maneira forte do estilo do governo do presidente Lula, que era muito mais próximo dos movimentos sociais. Não que isso oferecesse uma resposta aos anseios desses movimento. A presidenta Dilma demostrou uma atitude de hostilidade em relação aos movimentos sociais e aos povos indígenas, uma mudança drástica em relação ao seu antecessor.

Mas Dilma, por outro lado, manteve uma política de distribuição de riqueza baseada em uma política econômica neoliberal. Portanto este mal-estar, resulta do fato de que essas políticas de inclusão social, compensatórias, não permitiram uma inclusão política, que fizesse com que as pessoas pudessem se sentir cidadãos ativos parar propor uma segunda geração de reivindicações, no sentido dos direitos universais, como na educação, na saúde, na previdência e no transportes público. Havia uma expectativa de uma sociedade mais inclusiva. O que houve foi uma inclusão social sem inclusão política. Eu tenho notado o envelhecimento dos participantes de políticas partipativas, os jovens não entraram nessa democracia participativa.

Estas duas razões foram as que estiveram na origem desse mal-estar, que foi como uma centelha que se incendiou no caso o aumento dos transportes. Como na Tunísia, que tudo começou com autoimolação de um trabalhador que lutava pelo direito do comérico de rua e acabou se transformando em uma manifestação contra a ditadura de Ben Ali. Os movimentos hoje se distinguem pela sua negatividade, sabem bem o que não querem, mas não sabem o que querem, e são movimentos que eu não considero movimentos sociais; eu chamo-lhes de presenças coletivas. O que há no mundo atualmente é uma guerra civil de baixa intensitade.

No que se distinguem as manifestações que aconteceram na Primavera Árabe, que não viviam sob regimes democráticos e os que aconteceram no Brasil, uma das maiores democracias do mundo?
A Primavera Árabe tem uma genealogia diferente. Ela nasce na degeneração dos governos nacionais populares. O Occupy foi nos países mais neoliberais do mundo, onde já há poucos direitos políticos e econômicos, pouca democracia. O caso do Brasil é o caso das jovens democracias, que saíram recentemente da ditadura, como Portugal, Espanha e Grécia, e que tiveram incrementos recentes nos direitos ao trabalho, ao transporte, à educação. No Brasil tudo isso aconteceu depois da ascenção do governo Lula. Esses jovens ainda têm uma esperança que uma democracia real possa ceder às suas reivindicações. Mas acham que a democracia atual não é real, porque a democracia atual está sendo derrotada pelo capitalismo. O dinheiro tomou conta das câmaras. E cada vez mais parece que a democracia, ao invés de limitar o capitalismo, está sendo limitada pelo capitalismo. No meu trabalho eu vejo que o que eles querem é que a democracia representativa seja apenas uma parte da democracia. Mas que além disso haja mais níveis de democracia participativa.

É possível viver em uma sociedade onde o capitalismo e a democracia possam coexistir de forma equilibrada?
Não acredito que haja equilíbrio entre democracia e capitalismo. Não haverá sociedade democrática enquanto houver capitalismo. O que se pode tentar é limitar o poder do capitalismo, com uma democracia mais robusta, que possa segurar o avanço do capitalismo até que o socialismo volte à agenda política, pois foi colocado pra fora da agenda desde 1989, e os partidos de esquerda foram isolados. No Rio Grande do Sul , o governo de Tarso Genro está a tentar uma democracia participatica no governo, que funcione a nível estadual, não só nos níveis municipais e federais, como acontece hoje. Temos de tentar criar uma democracia mais robusta.

As novas configurações politicas, como por exemplo o surgimento de uma esquerda forte na Grécia marcam um periodo fértil para a esquerda?
Sim, mas os partidos que crescem mais na Europa nesse momento são os de extrema-direita, portanto há aqui uma dinâmica nova, por isso digo que estamos entrando em uma guerra civil de baixa intensidade. Estamos entrando em um período que eu chamo de pós-institucional, as instituições estão aí, mas não funcionam direito. Como podemos ver ao que temos em relação às polítcas dos direitos dos povos indígenas e camponeses.

Estamos no momento da bifurcação, que pode tanto ir para um lado, quanto ir para o outro. E os cidadãos devem pressionar o governo para que tenham seus direitos respeitados. E para isso temos que ir para a rua. Daqui pra frente acredito que vamos ter democracias mais instáveis. E acho que cabe à classe política encontrar as soluções. Obviamente as populações nas ruas não fazem formulação política, mas a classe política, que o faz, tem o dever de escutar as revindicações das ruas e fazer formulações política sobre elas.

A presidenta Dilma viu isso e anunciou uma reforma política para a população, mas obviamente isso não acontenceu. Os setores conservadores da classe política barraram esse projeto. E, como estamos em um momento pré-eleitoral e os partidos voltaram a fazer a velha política, a dstribuir recursos para obras pelo País, e assim continuam a não atender às necessidades de inclusão política da população.

*é jornalista.

Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=228325&id_secao=7