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5.28.2023

Ibama x Petrobrás: Governo Federal Evita Trabalhar as Questões para o Futuro

 Antes de o mundo científico acordar para os imensos riscos para o planeta provocados pelo crescimento econômico sem limites, a visão desenvovimentista ainda podia ser discutida. Hoje em dia, ela é um anacronismo perigoso, por Jean Marc Von Der Weid

Estamos vivendo no limite de um processo que já provoca efeitos devastadores em todo o mundo e que promete ampliar seus impactos até a destruição irreversível das condições de manutenção da civilização tal como nós a conhecemos, Jean Marc

por Jean Marc Von Der Weid* no A Terra é Redonda e Brasil 24/7 – Sociedade e Manter a Vida na Terra

 Foto: Petrobrás

Em março/2023 escrevi dois textos sobre a crise energética e a crise do aquecimento global, sob o título geral de “Tudo o que não discutimos nestas eleições, mas que vai cair sobre nós no curto prazo”. Ambos podem serem lidos no site A Terra é Redonda. Talvez por já ter tratado estes temas com profundidade, não os incluí na série, publicada entre abril e maio/2023, “A armadilha”. Os títulos são: “A crise energética” e a “Crise climática”. Na verdade, não esperava que tivéssemos um impasse tão pesado e tão cedo, com a Petrobras pedindo a concessão de pesquisas, visando explorar petróleo na foz do Amazonas e recebendo uma recusa técnica do IBAMA.

O conflito entre desenvolvimentistas e ambientalistas, simbolizado nas pessoas de Marina Silva e um renque de políticos e técnicos do governo, vai ter que ser arbitrado pelo presidente Lula e o histórico de posições passadas deste último não prenuncia a adoção da solução correta, a do IBAMA, na minha opinião.

Infelizmente, o corpo político e técnico do governo assume uma posição dita desenvolvimentista, mas é preciso qualificar este conceito. Por muito tempo, adotou-se uma visão da economia voltada para a busca do crescimento econômico como a meta da sociedade, aquilo que eu chamo de “pibismo”. Nesta concepção, tudo o que favorece o crescimento do PIB é visto como positivo, independentemente de seus impactos ambientais, sejam eles o aquecimento global, a contaminação de águas e solos, a destruição da biodiversidade, entre outros. Antes de o mundo científico acordar para os imensos riscos para o planeta provocados pelo crescimento econômico sem limites, tal visão ainda podia ser discutida. Hoje em dia, ela é um anacronismo perigoso.

Estamos vivendo no limite de um processo que já provoca efeitos devastadores em todo o mundo e que promete ampliar seus impactos até a destruição irreversível das condições de manutenção da civilização tal como nós a conhecemos. A imensa maioria dos políticos, entretanto, e não só no Brasil, mantém o seu olhar nos efeitos de suas decisões no curtíssimo prazo, evitando enfrentar os perigos que vem se acumulando sobre nós, mas que o eleitorado não percebe. Ao invés de abrir o debate educativo com a sociedade e apresentar os problemas de forma a ampliar a consciência social da catástrofe iminente, prefere-se privilegiar o “mais do mesmo” no desenvolvimento econômico. De olho nas próximas eleições, o governo evita trabalhar as soluções para o futuro, um futuro que já bate nas nossas portas, e insiste em fórmulas que nos levam mais celeremente para o desastre.

O verniz “verde” adotado pelo governo Lula, além de genérico e pouco concreto, não resiste à primeira investida dos interesses tradicionais do grande capital. Sem programa de governo discutido com a sociedade antes, durante e depois das eleições, Lula acena com o desmatamento zero em todos os biomas, com a promoção do uso de energias renováveis e com um vago plano de reflorestamento das “áreas degradadas”. E só.

E, ao mesmo tempo, discute a intensificação da exploração de petróleo (e não só na foz do rio Amazonas), o estímulo ao uso de gasolina e diesel com o barateamento de seu preço, o investimento em produção de gás de xisto na Argentina, a exploração de potássio em terras indígenas na Amazônia, a produção de carros populares e o estímulo às formas insustentáveis de produção agropecuária. São sinais contraditórios e não deixarão de ser vistos como tal, não só entre nós como no plano internacional.

É possível que o cinismo de dirigentes dos países que estão insistindo na preservação da Amazônia (um dos poucos casos de questão ambiental amplamente conhecido do público na Europa, Estados Unidos e Japão) permita que eles fechem os olhos para a ampliação do uso de combustíveis fósseis no Brasil, desde que o desmatamento zero seja adotado. É uma incoerência, onde se seguram as emissões de gases de efeito estufa na Amazônia e, paralelamente, se aumentam as emissões dos mesmos gases na queima de gasolina, diesel e gás. Mas como os dirigentes políticos em todo o mundo praticam as mesmas incoerências, o governo brasileiro pode sair ileso. Mas o planeta pagará o preço destas incoerências. E todos nós e nossos filhos, netos e bisnetos mais ainda. Muito mais.

Há, entretanto, um processo já em curso e que pode afetar todo o sistema capitalista mundial nos próximos anos de forma devastadora. Trata-se exatamente do petróleo e, secundariamente, dos outros combustíveis fósseis. E não estou falando do impacto ambiental, sabidamente catastrófico, do uso destes combustíveis, mas da iminente indisponibilidade dos mesmos.

Há muitos anos que se discute o que se apelidou de “pico” do petróleo. Trata-se do momento em que a expansão do consumo ultrapassa o nível de renovação das reservas destes insumos. A expressão foi crismada pelo geólogo americano Marion King Hubert, nos anos 1950. Estudando os índices de extração e os de descobertas de novos poços nos Estados Unidos, Marion King Hubert predisse que o pico da produção americana ocorreria em 1970, o que de fato ocorreu. O mesmo cálculo foi feito por outros dois geógrafos, Colin Campbell, inglês e Jean Laherrère, francês, em 1998. A previsão era que o pico mundial da produção do que se chama de petróleo convencional ocorreria em 2008, o que de fato também ocorreu.

Chama-se de petróleo convencional aquele mais abundante e facilmente acessível com uma alta relação entre energia obtida em relação àquela investida na pesquisa de novos poços e na sua exploração, conhecida por EROI, na sigla em inglês. E é também o tipo de petróleo de melhor qualidade, identificado tecnicamente como o Brent. É considerado petróleo não convencional o obtido em águas profundas (golfo de México, Noruega) e ultra profundas (Brasil) ou do tipo pesado como o da Venezuela (foz do Orenoco). O petróleo não convencional tem EROI muito mais baixo e um custo de obtenção muito mais alto.

Todo mundo se lembra da crise financeira de 2008, cuja mais importante expressão simbólica foi a falência de um dos maiores e tradicionais bancos americanos, o Lehman Brothers. O controle desta crise custou trilhões de dólares aos bancos centrais nos Estados Unidos e na União Europeia. Essa crise foi atribuída ao excesso de exposição do sistema financeiro nos empréstimos imobiliários do chamado “subprime”. Entretanto, pouca atenção foi dada ao fato de que o preço do petróleo vinha subindo ano a ano desde 2002 (19,00 dólares por barril) até 2008 (130,00 dólares na média anual, com um máximo de 150,00 dólares em julho).

Estudos mais recentes indicam que o aumento dos preços do petróleo foi o que provocou a alta da inflação e das taxas de juros e a queda do valor dos imóveis, levando os tomadores de créditos imobiliários à insolvência. Prosaicamente, a explosão do preço da gasolina levou estes endividados, em uma sociedade onde a mobilidade é essencialmente via automóveis, a ter dificuldades em pagar suas dívidas quando seus gastos com combustíveis dispararam em 500% em poucos anos.

Os preços caíram destes patamares elevadíssimos, mas nunca voltaram aos níveis do final do século passado, longe disso. E eles só caíram porque ampliou-se a produção do petróleo não convencional, cujos custos mais altos foram cobertos pela alta dos preços do convencional. Outras fontes alternativas de “petróleo” também ficaram rentáveis e foram intensamente exploradas, desde as areias betuminosas até o gás de xisto ou shale gas. Com a exploração destas fontes, os americanos voltaram a ser autossuficientes em petróleo, mas com custos muito mais altos não só pelas operações de extração em si mesmas, como também pela necessidade de liquidificar o produto. Não entram nestas contas os imensos custos ambientais destas formas de produção.

Mas estas boas notícias não enganam os especialistas, já que a taxa de identificação de novos poços é baixa e os já em operação se esgotam rapidamente. Os mesmos Campbell e Laherrère preveem que o pico de todos os tipos de petróleo, convencionais e não convencionais (incluído o pré-sal), deverá ocorrer até o fim desta década, mais provavelmente no entorno de 2025, dada a queda nos investimentos em pesquisa de novos poços provocada pela crise da COVID. Daqui a menos de dois anos!

O que acontece quando se chega no pico? A oferta de petróleo vai começar a cair? Não foi assim com o pico do petróleo convencional. Com um imenso esforço de raspar o fundo do taxo e incrementar as técnicas de extração para sugar “até a última gota de cada poço”, o que ocorreu foi a manutenção instável do volume de petróleo extraído no pico. Como não há nenhuma expectativa entre os cientistas e os donos das grandes empresas de petróleo do mundo de que novas descobertas de jazidas consideráveis possam acontecer e como as formas não convencionais estão em esgotamento acelerado, manter o ritmo de extração no seu ponto máximo significa apenas que há uma equivalente aceleração do declínio das reservas.

Aliás, o nível destas reservas (de todo tipo de petróleo) está estagnado desde 1964, sendo que o nível das reservas do petróleo convencional está estacionado desde 1960! Ao mesmo tempo, a demanda por petróleo triplicou neste intervalo. Isto quer dizer que as reservas vão sendo esgotadas cada vez mais rapidamente e aproxima-se um ponto em que, simplesmente, o volume ofertado vai começar a cair de forma vertiginosa, ao invés de pouco a pouco se não houvesse essa política de “sugar até a última gota”.

O impacto de uma crise súbita na oferta de petróleo não pode ser desprezado quando se sabe que em todo o mundo: praticamente todas as atividades produtivas, mais de 30% da geração de eletricidade para aquecimento ou para iluminação, mais de 90% do transporte terrestre, marítimo e aéreo, dependem deste combustível.

O impacto em termos de desorganização econômica se desdobraria em desorganização social, em guerras pelo acesso aos recursos minguantes, em falência de estados, em miséria, fome, doenças. Um cenário de desolação com os quatro cavaleiros do apocalipse galopando impávidos. Pensem em multiplicar a crise de 2008 por cem e ainda seria um cenário moderado para o que pode vir. Lembremos que aquela crise foi debelada, mas que mesmo assim quase 180 milhões de novos famintos ingressaram no mapa da fome da FAO naquele ano, que revoltas populares ocorreram em mais de 30 países e que em lugares mais críticos, como no Oriente Médio e norte da África, vários regimes foram derrubados.

Crises de corte repentino no acesso ao petróleo ocorreram em dois países, Cuba e Coréia do Norte, no final do século passado e são um exemplo do que pode ocorrer em escala planetária. Em ambos, os mais de 10 anos de restrições severas em acesso a bens de consumo essenciais como comida, roupas e remédios e a serviços como transportes, saneamento e eletricidade só foram atravessados pelo fato de que se tratava de regimes autoritários e com forte controle da população.

Se não queremos que este quadro dantesco caia sobre nós, temos que parar com a tergiversação de curto prazo e nos lançarmos corajosamente no debate para uma saída rápida da dependência do petróleo.

Desde logo, energias verdes vão ser importantes, mas a eólica e a solar tem limites e não deixam de ter impactos ambientais, sobretudo na escala necessária para se constituírem em uma parte significativa da solução. Seria mais importante um plano de painéis solares urbanos em escala nacional do que as atuais “fazendas elétricas” que ocupam áreas onde nada mais pode ser produzido. E deixemos o discurso da bioenergia para os bobos. Mesmo a cana de açúcar tem um balanço energético no limite do negativo. Enquanto não houver avanços na produção de biomassa marinha em grande quantidade não se pode discutir produção de álcool sem que ela substitua produção de alimentos.

Fala-se em hidrogênio verde como uma alternativa tecnológica perfeita em termos de balanço energético e sustentabilidade, mas ainda não vi cálculos do potencial em grande escala e dos seus riscos ambientais.

Enquanto isso, temos que agir para reduzir a demanda de energia. Reduzir as perdas e desperdícios é um passo importante, mas apenas arranha o problema. Substituir o transporte individual por transporte coletivo terá que ser feito e isto significa simultaneamente um investimento na melhoria dos sistemas urbanos de mobilidade e na restrição ao uso do carro individual. E vamos esquecer esta abobrinha do “carro popular”. No imediato vai ser preciso subir e não descer o preço da gasolina e do diesel, subsidiando setores estratégicos nesta transição: os caminhoneiros, taxistas, huberistas, entregadores de todo tipo.

E investindo pesado na mudança da matriz de transporte de cargas com vistas a acabar com o transporte de carga pesada intermunicipal e substituí-lo por trens, hidrovias e cabotagem. O agronegócio produzindo alimentos básicos também poderá ser subsidiado durante uma transição energética nos sistemas de produção rural. Mas o agronegócio exportador não precisa disso.

O BNDES e a Petrobras deveriam financiar a produção industrial descentralizada no Brasil, dentro de uma estratégia de encurtar a distância entre produção e mercado. E este estímulo deveria ser voltado para produtos essenciais para o bem-estar da população. É muita coisa a ser mudada e o que apontei não é mais do que exemplos da linha a seguir. Seja como for, é preciso repensar o papel da Petrobras, e ele certamente não deverá ser o de perfurador de poços em todo e qualquer ponto do país e produtor de petróleo até a última gota.

  *Jean Marc Von Der Weid, ex-presidente da UNE (1969-71). Fundador da organização não governamental Agricultura Familiar e Agroecologia (ASTA).
 *Jean Marc Von Der Weid, ex-presidente da UNE (1969-71). Fundador da organização não governamental Agricultura Familiar e Agroecologia (ASTA).

 Publicado no Brasil 24/7: 26 de maio de 2023

 Fonte: https://www.brasil247.com/blog/ibama-x-petrobras

5.20.2023

Mães Reais, um retrato da maternidade no Brasil (estudo)

“No report Mães Reais: um Retrato da Maternidade no Brasil como a comunicação contribui para a cultura da maternidade compulsória”, ver em https://t.co/jmWbFraplm" / Twitter

 

  

 


             

 

   

  

     
 Fonte: maesreais.meiacincodez.com.br

O Governo Federal Precisa de Muito Mais Pressão Para Atender o Social e Econômico dos Humildes Brasileiras(os) ?

A frágil democracia brasileira é sequestrada ao mesmo tempo pelo Centrão e pelos rentistas (grande capital). Margem do Executivo é limitada e tende a encolher. Só há uma resposta possível: sacudir o tabuleiro viciado da política, por meio de mobilização cidadã (nas ruas e espaços públicos), com os movimentos sociais brasileiros

por Cândido Grzybowski* no blog Sentidos e Rumos** e  OutrasPalavras – Sociedade e Reconstrução Brasileira Pós-ditadura 64 e Golpe 2016

  Manifestantes lotam Avenida Paulista (Foto: Wikimedia Commons)

Não foi necessário muito tempo para o Centrão mostrar a sua capacidade de encurralar a democracia que foi re-conquistada com Lula e a complexa frente formada para a vitória eleitoral de 2022. Trata-se de uma espécie de maioria parlamentar no Congresso Nacional sem nenhum compromisso com a democracia enquanto tal, mas que se articula em torno à primazia de interesses pessoais, paroquiais (seus redutos eleitorais) e de bancadas corporativas, acima de qualquer compromisso programático e partidário brasileiro. São parlamentares que agem, se articulam e votam sempre em busca de vantagens. Nunca se pautam pelo bem comum ou aportam algo a ele.  Foram fiéis bolsonaristas enquanto convinha. Agora são lulistas enquanto convier. Mas não dá para menosprezar seu poder no Congresso Nacional.

O mal político, uma espécie de câncer de sete vidas, vai mudando de posição, conforme as conjunturas, para garantir que nada de essencial mude. Até parece que está no próprio DNA de nossa República. Como Arena – Aliança Renovadora Nacional  (que ironia na ditadura de 1964!) – foram forças de apoio à ditadura militar no que se manteve como Parlamento expurgado e manietado pela Ditadura Militar e seus Atos Institucionais. Seu líder, o Sarney, até se tornou o presidente da Nova República, em 1985, marcando o fim da ditadura militar (outra ironia que nossa história nos pregou, pois Sarney como civil, foi mais sórdido que muitos militares!).

Mas, como Centrão se conformou pela primeira vez no processo que gerou a Constituição Democrática de 1988, a base constitucional que temos até hoje. Com grandes virtudes e conquistas de direitos constitucionais, diga-se de passagem (Uf, novamente o Ulysses Guimarães e frente política). Mas também com o câncer da governabilidade conciliadora embutido nela. Como já afirmei muitas vezes, temos uma jovem democracia encurralada e até aqui não soubemos encontrar brechas de saída democrática que não seja o “brete” estreito e sofrido do curral … do Centrão no Congresso Brasileiro em pleno 2023 (século XXI).

Desde então, o Centrão tem mantido os governos federais que se sucederam como reféns de seus interesses. A proliferação de partidos e o troca-troca partidário são as maneiras de acomodar interesses que são, acima de tudo, nada republicanos e democráticos. Acontece, sem dúvida, alguma renovação em termos de pessoas e até de métodos de agir, mas sempre cobrando favores para si ou seus redutos eleitorais e financiadores. É um modo de ser e agir que muda para nada mudar. Sem dúvida, não são todos os membros eleitos do Parlamento que, sob nomes  partidários diversos e mutantes, acabam compondo o Centrão. Existe claramente uma esquerda e uma direita, mas minoritárias. É Centrão que aglutina a maior bancada, com poder de veto em iniciativas de leis e mudanças no Congresso Nacional. Como governar em tal situação? Eis o desafio para quem comanda o Poder Executivo Federal.

É importante que fique claro algo próprio de democracias: as disputas acirradas nos Parlamentos são partes constitutivas do método democrático de fazer governo. Esta é, inclusive, sua virtude maior em contraposição a qualquer autoritarismo. Na dúvida, sempre existe o Poder Judiciário autônomo, como garantia da ordem constitucional vigente, para dirimir dúvidas e impasses em termos legais. O Executivo é um grande poder propositivo e operativo, mas para mudanças mais significativas depende de leis debatidas e votadas pelo Parlamento (ou Congresso Nacional), assim como da aprovação do próprio orçamento federal para executar as políticas propostas.

Mas, se temos Centrão e aquela profusão de siglas partidárias (20 siglas partidárias no Congresso Nacional), sem compromisso democrático e programático real, onde está a sua origem? A lei estabelece regras, mas quem vota e tem poder instituinte e constituinte somos nós, cidadanias com direito ao voto.  Nós delegamos, pelo voto, poder a todos os membros do Parlamento, assim como ao Presidente e Vice-Presidente. Somos nós, os milhões com direito ao voto –  votando ou nos abstendo – que fazemos nossas escolhas e conferimos mandatos de tempo definido. Sempre é possível a renovação, assim como a reeleição, mas sempre através do voto dado por eleitoras e eleitores.

Não é o caso aqui de entrar mais a-profundadamente nas artimanhas constitucionais que enviesam o peso dos votos. Não temos distritos eleitorais pulverizados pelo território nacional, mas temos – no caso da Câmara e do Senado, que conformam o Congresso Nacional – grandes distritos que são os Estados (no Brasil tem 26 Estados). Cada Estado da Federação elege um mínimo de 8 deputados federais, como Roraima e outros pouco populosos, e um máximo de 70, em São Paulo. Todas as bancadas estaduais ficam dentro de tais limites mínimo e máximo. Em Roraima, em 2022, menor colégio eleitoral do país, bastaram menos de 46 mil  para eleger um deputado. Na prática é menos que isto, pois só valem os votos válidos, sem as abstenções ou nulos. Em São Paulo, o maior colégio, para eleger um deputado federal o quociente foi de mais de 494 mil, na prática menos que isto, mas dá para ter ideia do tamanho da diferença. Além disto, não importando o tamanho do colégio eleitoral estadual, cada Estado tem direito a 3 senadores. No caso, 3 para Roraima e 3 para São Paulo. Dada a distribuição extremamente desigual em tamanho populacional dos Estados, dá para ver a distorção na expressão do voto da cidadania para um dos poderes maiores e mais representativos da democracia brasileira: o Congresso Nacional.

Não sei se algum dia poderemos alterar isto, mas é dentro destas bases constitucionais que elegemos os congressistas brasileiros. Não dá para negar que são representantes legítimos, porque eleitos segundo as leis, mas que distorção da vontade das cidadanias que votam! Todas as múltiplas e diversas cidadanias deste país acabam mascaradas por regras e poderes nada democráticos, esta é a verdade.  Felizmente, tais regras não valem para a eleição da Presidência da República, onde decidem os votos majoritários em eleição nacional, permitindo refletir melhor a composição da diversidade social e política cidadã do Brasil.

O problema concreto para governar a partir do Executivo é que se faz necessário compor politicamente com o Congresso assim conformado. Não indo muito longe e ficando no período inaugurado pela Constituição de 1988, a conciliação com o Congresso é uma regra que limita o poder do Governo eleito. E, ainda pior, há o Centrão fisiológico, onde quase nada se aprova sem ele. O Centrão é, em termos institucionais, uma baliza delimitadora do que é possível negociar com sucesso em votações no Congresso.

Não tenho dúvidas que o desempate, nessas condições de qualquer proposta que tem que passar pelo Congresso, supõe concessões por parte do Executivo ou, então, uma espécie de paralisia no Parlamento. Felizmente, nem tudo precisa passar pelo Congresso, ou seja, pelo Centrão. Mas, se alguma possibilidade existe, ela depende e muito de nós cidadanias ativas, exercendo nosso papel político, a partir da sociedade civil, para além do voto em eleições periódicas (majoritárias a cada 4 anos). A vitalidade da democracia pressupõe, em última análise, o quanto a democracia em si é ou não uma proposta hegemônica na sociedade. Se o Congresso pressiona por concessões, nós com debates e ativismo social, ecológico ou econômico, podemos definir os limites para concessões. É assim que funcionam as democracias: nós não nos desobrigamos do ativismo contínuo por votar periodicamente. Pelo contrário, precisamos exercer pressão cidadã para fazer valer o voto majoritário concedido na eleição do Executivo mor, no caso o Presidente Lula. Simples e complexo assim.[1]

Mas isto não é tudo, enquanto limites para a democracia. Temos um sujeito político sem cara nem voto, mas é de pessoas da classe dos 1%, que se apresenta como “mercado” e veta tudo que pode significar algo menos para tal classe. Claro, tem um representante como presidente do Banco Central “autônomo” (melhor dito, não sujeito à política e à vontade da cidadania), mas com muito poder real para produzir o impasse total num país como o Brasil. Aí o osso é duro e o ministro Haddad não parece estar conseguindo grande coisa nas suas muitas conversas reservadas com aqueles pouquíssimos representantes dos que gostam de se chamar “mercado”. Que mercado é este que impõe tais limites para a democracia no Brasil? O Lula tem falado grosso, mas o “mercado” não tem ouvidos, só poder real de veto, sem voto para tanto. O problema é que retomar o caminho de uma democracia um pouco mais virtuosa em sua capacidade de promover o cuidado de gente e da natureza (como venho enfatizando) colide com uma economia voltada essencialmente à acumulação privada de uma fraçãozinha de gente. Este tal mercado é um fantasma, mas real. E os lobistas do Centrão são por ele financiados. Temos que encontrar formas de peitá-lo algum dia. Novamente, uma questão para a cidadania enfrentar, gerando força política com capacidade de levar a uma democracia eco-social transformadora que precisamos, que precisa passar por mudanças profundas na economia.

Vale a pena dar uma olhadinha na nossa volta, na América do Sul, nos governos com propostas minimamente progressistas. Os problemas que enfrentam são semelhantes, mas do que sei não posso afirmar que se manifestam do mesmo modo. Pela proximidade maior, vale a pena acompanhar o caso argentino, com Fernandez Presidente, totalmente encurralado pelo mercado, de forma particular pelo FMI/BM e os “fundos abutres” nacionais e internacionais por trás. Ele já anunciou que não vai buscar a reeleição, pois não vê saídas para o impasse.

O caso chileno é emblemático, que precisamos avaliar para aprender onde a cidadania errou. Não vou entrar em detalhes, mas foi o país com a maior insurreição cidadã da região nestes tempos recentes. Conquistou uma Constituinte Exclusiva, ganhou a maioria na sua composição, propôs uma fantástica Constituição e… perdeu no voto majoritário que precisava referendá-la. Isto que tinha eleito um jovem presidente, o Bóric, vindo da militância, desde o movimento estudantil, contra tudo o que o ditador Pinochet impôs ao Chile,  no que se tornou então o mais radical experimento neo-liberal da região (ou América do Sul). Pior, agora, numa nova eleição para redigir outra Constituição, a direita chilena acabou de ganhar a maioria. Tudo voltou a estaca zero. Tem que ser assim? Não, mas temos que aprender a nunca deixar de ser vigilantes e ativos como cidadanias.

O caso da Colômbia é, talvez, mais parecido ao da gente. A vitória de Petro foi um marco de grande significado democrático, depois de um século sem governos de esquerda e muita divisão, até guerrilhas por mais de 50 anos, exército paralelo, produção e tráfico de cocaína, bases militares dos EUA. A seu modo, a eleição que deu a vitória a Petro foi empolgante e revigorante. Mas a coalizão política em torno a Petro não obteve maioria no Congresso. Como Lula, ele soube costurar um apoio parlamentar, compondo um governo amplo. Mas em nove meses, o centro do programa que o elegeu – grandes reformas, especialmente na saúde, no trabalho e na questão agrária – submetido à aprovação no Congresso acabou perdendo. Pior, perdeu com o votos de partidos com ministros no governo. A reforma na saúde, financiado pelo setor público, mas, implementada totalmente por prestadores privados, é a sua proposta mais ousada até agora, mas nem o partido da ministra da saúde apoiou. Assim, Petro apostou numa remodelação total do seu governo, demitindo os ministros de partidos infiéis. Agora está decidido a fazer o que sabe fazer melhor: apelar para a cidadania nas ruas. Sem dúvida, algo ousado, mas caminho possível e virtuoso em democracias para valer. Veremos em breve o resultado (será que ou vai, ou cai?).

Aponto isto tudo que se passa na nossa região (América do Sul) para afirmar que não existe mais espaço para governos de “progressismo neo-liberal”, como formam muitos dos governos de esquerda no Continente Americano (América Latina), sobretudo na primeira década do século, aproveitando o boom das commodities, provocado pela demanda da China, em fantástica expansão capitalista. Hoje a situação é outra e isto o Governo Lula já demonstrou que sabe e está jogando suas cartas, com maestria e reconhecimento, na esfera geo-política (nacional e internacional).

Mas para dentro, para nossas emergências e urgências eco-sociais que demandam cuidado com gente e com conivente com o Centrão e com o fantasma “mercado”? Penso que nós, cidadanias diversas, podemos não ter resposta, porque nem estamos lá de forma a decidir. Mas, sim, podemos influir se assumirmos que uma tarefa nossa e que só nós poderemos desenvolver: a legítima pressão cidadã no chão da sociedade, com eco lá no Planalto (Administração Federal). Acho que, de algum modo, o Governo Lula 3 espera isto, depois de tudo que aprontaram contra ele (prisão de 580 dias)… com a total conivência do Centrão nos governos petistas de 2003-2016. O Golpe contra Dilma e a própria prisão do Lula contaram com o total apoio do Centrão.

[1] Sugiro examinar com atenção a série de postagens do jornalista Jean Mar von der Weid, nestes primeiros meses do Governo Lula. Ele aponta, com muito compromisso e competência de militante histórico, as grandes questões jogadas no colo da Administração Federal (Governo ) Lula, que são também questões para nós, cidadanias ativas.

*Cândido Grzybowski, Acho que não preciso dar detalhes sobre o tamanho e a fortaleza do estreito curral em que nossa democracia se debate para não morrer de vez. Seremos capazes de ruptura?". Quem pergunta é Cândido Grzybowski, presidente do Conselho de Governança do Ibase, em artigo para o Le Monde Diplomatique Brasil.

**Título original no blog Sentidos e Rumos : O Centrão e sua capacidade de encurralar

Publicação em Outras Palavras: 10/05/2023

Fontehttps://outraspalavras.net/movimentoserebeldias/o-governo-lula-precisa-de-muito-mais-pressao/

5.17.2023

Brasil: nos Últimos 15 Anos Grandes Cidades Cresceram, mas Transporte de Pessoas Piorou

Um dado relevante no estudo da CNI (Confederação Nacional da Industria) é que, em geral, as cidades com maiores níveis de renda têm maior demanda por transporte individual

Brasil precisa em torno de R$ 295 bilhões até 2042, para modernizar mobilidade urbana de pessoas nas capitais e principais cidades (acima de 250 mil habitantes)

O estudo da CNI (confederação Nacional da Industria) mostra que 74% dos municípios com mais 250 mil habitantes cumpriram lei e elaboraram planos de mobilidade; entre os que têm de 20 mil a 250 mil, índice é de 13%

por Confederação Nacional da Indústria no Brasil 24/7 – Sociedade, Grandes Cidades Brasileiras e Caos Urbano

 Foto: Rovena Rosa - Agência Brasil

 O Brasil precisa investir  em torno de R$ 295 bilhões até 2042 em infraestruturas de mobilidade urbana nas 15 principais regiões metropolitanas do país. Essa é a quantia necessária para equiparar a infra-estrutura de transportes desses municípios ao estilo das cidades do México e Santiago, referência na oferta de transportes urbanos de pessoas na América Latina. A estimativa está no estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI)Mobilidade Urbana no Brasil: marco institucional e propostas de modernização.

O caminho para que essas regiões metropolitanas brasileiras melhorem o nível de transporte urbano de pessoas, no entanto é longo. É preciso superar a falta de financiamento público e privado, fator apontado pelo estudo da CNI como o maior gargalo para a expansão dos transportes urbanos no Brasil. A CNI defende que sejam viabilizadas fontes de investimentos, com recursos nacionais e estrangeiros, além de participação pública e privada.

“É importante ampliar o número de Parcerias Público-Privadas em um modelo de PPP que agrupe a construção do sistema, da operação e da manutenção, em contratos de concessões de duração relativamente longas, em torno de 30 anos”, destaca o gerente-executivo de Infraestrutura da CNI, Wagner Cardoso.

“Pode-se afirmar que o país sub-investe e sub-financia o transporte coletivo e inversamente privilegia e subsidia o transporte individual motorizado, inclusive na precificação dos combustíveis fósseis (petróleo e gás) utilizados por automóveis e veículos individuais”, acrescenta.

De acordo com o estudo da CNI, as evidências apontam que o Brasil não apenas diverge de experiências internacionais de mobilidade urbana de pessoas sustentável, como também deteriorou sua posição de referência na América Latina. Exemplo disso é que o país aparece entre as economias com a menor parcela de veículos elétricos – somente as cidades de Santiago e Bogotá têm três vezes mais ônibus elétricos em operação no transporte urbano de pessoas em todo território brasileiro.

Alocação dos investimentos e expansão das malhas de transporte urbano de pessoas

Dos R$ 295 bilhões estimados pela CNI para a modernização da mobilidade urbana no país, R$ 271 bilhões poderiam ser destinados para expansão de linhas de metrô. Conforme destaca o estudo, esse montante equivale ao necessário para mais do que dobrar a extensão da malha nas metrópoles (capitais) e grandes cidades (acima de 250 mil habitantes) atualmente implantadas. Em seguida, estão os investimentos para ampliação das estruturas de rede de trens (R$ 15 bilhões) e de BRTs (R$ 9 bilhões).

Exigências da Lei de Mobilidade Urbana de Pessoas no Brasil

O estudo aponta que 74% dos 116 municípios brasileiros com mais de 250 mil habitantes cumpriram os prazos estipulados pela Lei de Mobilidade Urbana atual, que estabeleceu que essas cidades elaborassem e aprovassem um Plano de Mobilidade Urbana (PMU) até abril de 2022, para obtenção de financiamentos. A mesma lei determinou que todos os municípios com população entre 20 mil e 250 mil pessoas apresentassem um PMU até o dia 12 de abril de 2023. 

Entre as 1.908 cidades nessa situação, apenas 13% atestaram – até setembro de 2022 – ter um plano de mobilidade, de forma que, cerca de 87% desses municípios teriam um horizonte pequeno (até abril de 2023) para elaborar e aprovar um plano municipal e, portanto, exigência para garantir o financiamento público e privado de projetos do setor de mobilidade urbana de pessoas.

“É importante assegurar que municípios sem plano não recebam financiamento federal, per capita superior a cidades com planejamento aprovado”, enfatiza Wagner Cardoso da CNI .

O diagnóstico referentes às maiores regiões metropolitanas brasileiras é de que as cidades cresceram, foram amplamente urbanizadas, mas os transportes de pessoas não acompanharam o ritmo de crescimento dessas metrópoles. Entre as recomendações estão investir em transporte coletivo e transporte individual não motorizado. As 15 regiões metropolitanas avaliadas no trabalho da CNI são: Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Belo Horizonte, Goiânia, Belém, Fortaleza, Natal, Salvador, João Pessoa, Maceió, Porto Alegre, Recife e Teresina.

“A urbanização não foi acompanhada por um planejamento voltado à redução das distâncias percorridas pelos cidadãos, para a qual o adensamento das cidades e a melhor distribuição de suas principais funções – moradia, trabalho, serviços e lazer – constituiriam seu alicerce”, diz o estudo da CNI.

Um dado relevante é que, em geral, as cidades com maiores níveis de renda têm maior demanda por transporte individual. Isso pode explicar por que em Curitiba 49% das viagens são feitas de carro ou moto, apesar do reconhecido sistema de BRT (Bus Rapid Transit) e de a cidade apresentar uma boa infraestrutura de transportes urbano de pessoas, comparando as demais cidades brasileiras. 

Por outro lado, em Salvador e Recife – que possuem uma rede de transporte público menos estruturada –, esse modal representa somente 22,1% e 16,7%, respectivamente. Já no Rio de Janeiro, a baixa participação dos transportes individuais (19,5%) pode estar associada a uma confluência de fatores ligados tanto a um menor nível de renda de amplos setores da população metropolitana, quanto à existência de uma extensa – ainda que precária – rede de transportes urbano de pessoas na metrópole carioca.

Chama a atenção o sub-aproveitamento nas nossas metrópoles da bicicleta como um modal de transportes. De fato, em todas as redes de mobilidades (RMs) brasileiras, a participação da bicicleta oscilava entre 0,8% e 2,4%, em contraposição a cerca de 4% em Santiago, 7% em Bogotá e 13% na capital da Alemanha.

Transporte e impacto no desempenho da(o) trabalhadora(or) brasileira(o)

Para o setor industrial, um sistema eficiente de mobilidade urbana é relevante em múltiplos sentidos, na medida em que o tempo de deslocamento dos trabalhadores, o desgaste do usuário, além dos custos diretos envolvidos no movimento casa-trabalho-casa, afeta diretamente o desempenho e os gastos associados ao transporte urbano de pessoas. Há que se levar em conta os setores comercial, serviços, construção civil, educação, entre outros.

“Esse desgaste diário afeta não apenas a concentração e capacidade da(o) funcionária(o), mas sua assiduidade e probabilidade de afastamento por doenças ou outros motivos. Nesse sentido, a modernização do sistema de transporte de pessoas  seria essencial para melhorar a o trabalho na indústria, comércio, serviços, construção civil, educação e os demais, além de estimular toda a cadeia economica que depende do deslocamento através do transporte público de média e alta capacidade”, pontua o estudo.

Ao longo das últimas décadas, o Brasil empreendeu importantes avanços de natureza institucional no aperfeiçoamento da mobilidade urbana de pessoas, de modo que o país dispõe de um moderno ordenamento jurídico que disciplina não apenas o planejamento, mas também a execução de políticas públicas no setor.

No entanto, uma mudança mais profunda da estrutura e organização das cidades brasileiras, deve caminhar paralelamente ao desenvolvimento de um sistema de transportes de pessoas, capaz de encurtar o tempo de deslocamento, prover menor desgaste as(os) usuárias(os) e integrar os diversos modais de transporte urbano de pessoas, de forma a não penalizar aquelas(es) que, por falta de alternativas econômicas, viram-se forçadas(os) a residir distantes dos centros de serviços, empregos, escolas ou outros locais que necessita-se deslocar.

Nos últimos 15 anos o país priorizou o transporte privado de pessoas

Os dados analisados pelo estudo mostram que o preço da gasolina é um balizador da escolha modal de transporte de pessoas. Nos últimos 15 anos, excluindo o período mais recente, o aumento do preço da gasolina foi inferior ao aumento das tarifas de transporte público coletivo, o que, na prática, sinaliza um barateamento relativo das viagens com transporte privado em detrimento das viagens com meios de transporte públicos.

Home office após a pandemia de covid-19 reduziu a demanda no transporte urbano de pessoas

O estudo aponta também que mudanças significativas nos padrões de deslocamento urbano estão em andamento, particularmente com o aumento do trabalho sob a forma de home office e do comércio digital – processo que foi acelerado com a pandemia de covid-19 –, e do advento do transporte por aplicativo (uber, 99, entre outros) – ainda não captado em sua magnitude por boa parte das pesquisas de transporte urbano de pessoas.

Nas duas maiores metrópoles brasileiras, por exemplo, a demanda por transportes coletivos ainda se encontra bastante abaixo ao último ano pré-pandemia: em São Paulo, as viagens de metrô e de ônibus em 2022 estão cerca de 25% abaixo dos níveis de 2019; no Rio de Janeiro, a queda da demanda por metrô é de mais de 30% e a de ônibus, da ordem de 15%.

Algumas sugestões para melhoria, ampliação e modernização dos sistemas de mobilidade urbana de pessoas nas capitais e cidades maiores de 250 mil habitantes:

  • Assegurar instrumentos mais efetivos para a modernização dos sistemas de mobilidade, com o planejamento, aperfeiçoamento institucional e de governança no âmbito dos municípios, e implantar lei municipal como ferramenta de efetivação dos planos de mobilidade;
  • Dotar as regiões metropolitanas de estruturas de governança mais efetivas e práticas, transferindo as atribuições da gestão da mobilidade urbana de pessoas para uma secretaria ou instituição de natureza metropolitana voltada exclusivamente à mobilidade; 
  • Viabilizar fontes para o financiamento de investimentos de infra-estrutura de mobilidade urbana, estimados para as 15 maiores regiões metropolitanas em torno de R$ 295 bilhões até 2042. Nesse sentido, é importante ampliar o número de Parcerias Público-Privadas em um modelo de PPP que agrupe o planejamento,  a construção do sistema de transporte urbano de pessoas, operação e manutenção, em contratos de concessão de duração relativamente longas (em torno de 30 anos ou mais); 
  • Ampliar as fontes de financiamento para investimentos em mobilidade, inclusive pela criação de “fundos de equilíbrio econômico-financeiro das operadoras de transporte coletivo”, administrados em âmbito das regiões metropolitanas e alimentando com recursos arrecadados de receitas não tarifárias diversas, proporcional aos municípios que compõem a metrópole.

Publicado Brasil 24/7: 15 de maio de 2023

Fonte: https://www.brasil247.com/reindustrializacao/brasil-precisa-de-r-295-bilhoes-para-modernizar-mobilidade-urbana-nas-principais-cidades