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11.22.2016

Juízes e Promotores Contra a Democracia Brasileira

Se o Judiciário e o Ministério Público brasileiros fossem perfeitos, não viveríamos em um país em que são assassinadas quase 60.000 pessoas por ano, boa parte delas — em situações polêmicas e controversas — por agentes do próprio Estado.
por Mauro Santayana em seu blog, para site Viomundo - Sociedade e Justiça Brasileira (fonte no final)
Em uma Nação em que, apesar de termos uma das forças de segurança mais violentas do mundo, menos de 6% dos homicídios são elucidados e esclarecidos.
Em que, em alguns estados, quase 60% dos presos se encontram ilegalmente mofando, de forma imoral, há anos, atrás das grades, sem julgamento.
Em que o Conselho Nacional de Justiça eximiu, há poucos meses, juízes e procuradores de declararem, antecipadamente, junto com o endereço e a data, o valor das palestras pagas que estão livres para fazer para instituições de qualquer espécie.
Captura de Tela 2016-11-21 às 20.59.53Ao mesmo tempo em que “pune”, com apenas dois anos de suspensão, remunerada, uma juíza que permitiu que uma adolescente ficasse reclusa, durante semanas, com 30 presos do sexo masculino, em uma cadeia do estado do Pará.
A mesma punição reservada pelo CNJ, no caso, de aposentadoria compulsória também remunerada, para um Juiz que vendia sentenças no Tribunal de Justiça do mesmo Estado.
E para outros magistrados, envolvidos com quadrilhas dedicadas ao mesmo crime, em outras unidades da Federação como o Piauí, a Bahia, Roraima, Pernambuco, etc.
Um país em que dezenas de presos desarmados são metralhados, encurralados dentro de celas e corredores de um presídio, e os responsáveis pelo massacre, com equipamentos de proteção e armados até os dentes na ocasião dos fatos, são absolvidos por “legítima defesa”.
Em que as prisões, como pôde constatar, mais uma vez, a Presidente do STF, Ministra Carmem Lúcia, em visita à Penitenciária da Papuda, em plena capital da República, há alguns dias, são, principalmente pela superlotação, verdadeiras masmorras em que não existe a menor garantia, por parte do Estado, de condições minimamente dignas para o cumprimento, pelo condenado, de sua sentença.
E em que não existe nenhuma possibilidade, e, eventualmente, interesse, de garantir sua incolumidade física durante os longos períodos em que, na maioria dos casos, sem assistência médica ou judiciária, o preso eventualmente “provisório” ficará enclausurado, em condições absolutamente animalescas, à mercê de Deus, das facções e do Sistema.
Muitas vezes, porque foi apanhado com algumas pedras de “crack”, ou alguns papelotes no bolso, na esquina, produzidos à base de querosene ou de comprimidos vencidos de anfetamina, sem nenhum vestígio de cocaína.
Isso, em um planeta no qual, em nações como os EUA, a população acaba de aprovar, em plebiscito, em novos estados, incluído o mais populoso deles, a Califórnia, o uso recreativo da maconha, diante da constatação de que a mera repressão e penas implacáveis, até mesmo para usuários, como ocorre comumente por aqui, não resolvem, de forma alguma, a questão do tráfico de substâncias entorpecentes.
Diante de uma “justiça” assim, todo indivíduo tem o direito moral de tentar escapar da “lei”.
De não produzir provas contra si mesmo.
E de postergar seu julgamento e encarceramento, indefinidamente, porque a justiça que o julga e o condena, com a mão cada vez mais pesada de jovens juízes e procuradores recém-formados que vivem no mundo perfeito de suas gravatas de seda, seus altos salários e seus ternos bem cortados, é a mesma que não consegue garantir que a maioria dos detentos brasileiros passe por julgamento ou possa cumprir sua pena de reclusão em condições de relativa igualdade com apenados de outros países, como já dissemos, minimamente modernos ou civilizados, neste vigésimo-primeiro século da Era Cristã.
Barrar a Operação Lava-Jato?
Como?
Se, em resposta a uma longa sucessão de desmandos, em que a delação, como nos regimes autoritários mais abjetos da História, tornou-se o maior instrumento de investigação de uma justiça que se mostra incapaz de correr atrás de provas claras, irrefutáveis, incontestáveis, o Judiciário insiste em aumentar o casuísmo ?
Se, com o intuito de institucionalizar-se essa nova nova ordem judiciária, blindando-a contra iniciativas que possam restaurar o direito e possibilitar a defesa de quem está sendo acusado, em mais uma decisão que implica em novo passo rumo à fascistização, de facto, do país, transformando-nos, também no aspecto judicial, em uma ditadura, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu nesta semana ser inviável que cidadãos delatados por terceiros questionem acordos de delação celebrados por quem os está acusando?
Se essa absurda determinação — que precisa ser contestada no STF — mais uma no sentido de restringir os direitos cidadãos que estão teoricamente consubstanciados na Constituição, afirma que as pessoas citadas ou acusadas nas delações, não poderão, doravante, questionar as circunstâncias, as condições em que tal delação foi obtida — se por pressão sobre o réu, eventualmente já aprisionado e sob o arbítrio de seus carcereiros e interrogadores, se sob tortura ou eventual ameaça ou chantagem, em um país em que todos sabem, existe uma das polícias mais violentas do mundo ?
Se poderão, no máximo, os delatados, que — a partir da declaração de um desafeto, de alguém que está procedendo assim em troca de uma eventual promessa de soltura — correm o risco de ser presos e acusados de qualquer crime, mesmo que não haja provas; contestar o teor das acusações, sem entrar no mérito de como foi obtida a tal “delação” pela “justiça” ?
Se o STF acaba de aceitar institucionalizar a prisão após condenação em segunda instância, restringindo ainda mais a possibilidade de defesa do réu, neste perfeito — justo, equilibrado, em nada arbitrário — sistema judiciário em que vivemos?
Como no caso da possível aprovação da validação de provas “ilícitas”, obtidas de “boa fé” por agentes do Estado, em exame pelo Congresso, estamos vivendo uma fase da vida nacional que só pode ser comparada ao período de ascensão do nazismo, quando, uma após outra, medidas de restrição do Estado de Direito e dos direitos individuais foram aprovadas pelo regime, até que a máscara de uma suposta legalidade caiu, com a imposição do ignominioso arcabouço “jurídico” das Leis de Nuremberg.
Nesse contexto, não pode restar, àqueles que defendem a liberdade e a democracia, duramente reconquistadas por nossa geração, mais do que cerrar fileiras e combater, decididamente, até mesmo em benefício da própria consciência, se não do futuro de seus descendentes, em todos os foros, cada casuísmo que possa estar sendo implementado nesse sentido, mesmo que muitas vezes eles sejam adotados sob o manto hipócrita da defesa de um país mais “honesto” e menos corrupto, até mesmo porque não há regime autoritário, sangrento e assassino da História que tenha chegado ao poder sem essas bandeiras.
Por outro lado, a emblemática absolvição de João Vaccari Neto, do fantástico desvio — tão propalado pela mídia — de 100 milhões de reais, quando presidia a Bancoop, pela juíza Cristina Balbone Costa, da Quinta Vara Criminal de São Paulo, mostra que ainda existe justiça neste país, fora do âmbito da Operação Lava-Jato, com suas ilações, sua seletividade, suas arbitrariedades, a pressão sobre os presos para a imposição, dirigida e premeditada de “delaçoes” “premiadas” e uma longa série de acusações que não se sustentam.
Mesmo que essa operação viesse a trabalhar com provas absolutamente irrefutáveis e sem pressões e arbitrariedades sobre presos e testemunhas, ainda seria necessário provar à opinião pública que seus principais integrantes não estão apenas se esforçando para encontrar algum prêmio político-eleitoral — em 2018, quem sabe — no fim do arco-íris, ou não têm a intenção de se transformar, de fato, e permanentemente, em um quarto poder oculto dentro da estrutura do Estado Brasileiro.
Não se espera que boa parte dos juízes e procuradores que dividem privilégios e vantagens, abandone, como se vê pelo comportamento de suas associações de classe, seu arraigado corporativismo, ou deixem de buscar — mesmo sem voto — como estão fazendo constante e açodadamente neste momento, aumentar o seu quinhão de poder — cada vez maior, aliás — com relação a outros segmentos, como os representantes eleitos do Executivo e do Legislativo, no contexto da sociedade brasileira.

Uma auditoria do Tribunal Superior do Trabalho acaba de constatar que todos os tribunais regionais descumpriram normas legais em relação a férias de juízes e desembargadores entre 2010 e 2014.
Nos casos mais graves, segundo a Folha de São Paulo, cinco TRTs pagaram a 335 magistrados o total de R$ 23,7 milhões a título de indenização, ou seja, da “venda” teoricamente ilegal – a Lei Orgânica da Magistratura Nacional não prevê a possibilidade de conversão de férias não gozadas em remuneração – de descanso remunerado em troca de dinheiro.
O TRT de São Paulo lidera a lista, com 872 pagamentos irregulares a 290 magistrados, no total de R$ 21,6 milhões.
No Rio de Janeiro, em que se pretende diminuir os salários dos servidores públicos da base da administração, para fazer com que eles dividam com o governo a contribuição para a aposentadoria, um relatório sobre a folha de pagamentos de agosto deste ano informa que só seis dos 861 magistrados do estado ganham abaixo do teto constitucional de R$ 33.763, e que há desembargadores que, com os “penduricalhos”, recebem mais de 70.000 por mês.
“Apenas em dezembro de 2015, cada magistrado estadual do Paraná recebeu R$ 103,6 mil brutos, em média, de remuneração. Ao todo, o Tribunal de Justiça (TJ) gastou só no último mês do ano passado R$ 94,4 milhões com os vencimentos de juízes e desembargadores. Isso significa praticamente o triplo do que foi gasto, em média, entre os meses de fevereiro e novembro de 2015– R$ 32,2 milhões. No mês de janeiro de 2015, os gastos também foram atípicos: R$ 72,1 milhões.”
O parágrafo acima é do jornal Gazeta do Povo.
Por causa dessa matéria, 45 juízes do Estado do Paraná, atingidos em sua “honra”, moveram ações cruzadas contra os responsáveis pelo jornal, a ponto de a questão ter chegado ao STF, instância em que a Ministra Rosa Weber suspendeu, liminarmente, a perseguição contra a publicação e cinco profissionais de sua equipe (três jornalistas, um infografista e um webdesigner).
No Ministério Público do Paraná — assim como ocorre na maioria das unidades da Federação — a situação também não é diferente.
A diferença entre o que foi pago aos membros do órgão e o teto constitucional custou R$ 70 milhões – 74% dos R$ 94,5 milhões ganhos a mais em 2015 com a inclusão do FPE.
E no Tribunal de Justiça, os gastos com pagamentos acima do teto constitucional custaram R$ 108 milhões – 49% dos recursos.
Se o leitor acha altos esses “proventos”, que espere que incida sobre eles o aumento recentemente concedido pelo governo federal ao Judiciário em plena “crise”, que será de 47% nos próximos dois anos.
Basta que parem de agir como vestais, e de querer posar de santos, e espetacularmente, de impolutos e messiânicos Cavaleiros da Justiça, porque, como mostram os casos de São Paulo, do Rio de Janeiro, do Pará, do Paraná, de Roraima, do Piauí, da Bahia, de Pernambuco, do Espírito Santo, e de outros, muitíssimos outros lugares, nas capitais e no interior, eles não o são, como não são, também, nem impecáveis nem perfeitos.
Não o são e não estão acima dos Deputados e Senadores que pretendem “exemplar”, nem de nós, comuns mortais, que neles votamos, com nossos muitos defeitos e eventuais qualidades.
Essa é uma perspectiva que a Câmara dos Deputados precisa levar em consideração nesta semana, a não ser que queira cometer mais um suicídio político — como se não bastasse a PEC 241 que retirará poder do Estado e do Congresso — e um novo erro histórico de enormes proporções.
E é uma constatação que está começando a ser feita, e a ser melhor entendida, pela população brasileira.
http://www.viomundo.com.br/denuncias/santayana-antipolitica-de-juizes-e-promotores-e-antidemocratica-e-fascista.html