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5.17.2023

Brasil: nos Últimos 15 Anos Grandes Cidades Cresceram, mas Transporte de Pessoas Piorou

Um dado relevante no estudo da CNI (Confederação Nacional da Industria) é que, em geral, as cidades com maiores níveis de renda têm maior demanda por transporte individual

Brasil precisa em torno de R$ 295 bilhões até 2042, para modernizar mobilidade urbana de pessoas nas capitais e principais cidades (acima de 250 mil habitantes)

O estudo da CNI (confederação Nacional da Industria) mostra que 74% dos municípios com mais 250 mil habitantes cumpriram lei e elaboraram planos de mobilidade; entre os que têm de 20 mil a 250 mil, índice é de 13%

por Confederação Nacional da Indústria no Brasil 24/7 – Sociedade, Grandes Cidades Brasileiras e Caos Urbano

 Foto: Rovena Rosa - Agência Brasil

 O Brasil precisa investir  em torno de R$ 295 bilhões até 2042 em infraestruturas de mobilidade urbana nas 15 principais regiões metropolitanas do país. Essa é a quantia necessária para equiparar a infra-estrutura de transportes desses municípios ao estilo das cidades do México e Santiago, referência na oferta de transportes urbanos de pessoas na América Latina. A estimativa está no estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI)Mobilidade Urbana no Brasil: marco institucional e propostas de modernização.

O caminho para que essas regiões metropolitanas brasileiras melhorem o nível de transporte urbano de pessoas, no entanto é longo. É preciso superar a falta de financiamento público e privado, fator apontado pelo estudo da CNI como o maior gargalo para a expansão dos transportes urbanos no Brasil. A CNI defende que sejam viabilizadas fontes de investimentos, com recursos nacionais e estrangeiros, além de participação pública e privada.

“É importante ampliar o número de Parcerias Público-Privadas em um modelo de PPP que agrupe a construção do sistema, da operação e da manutenção, em contratos de concessões de duração relativamente longas, em torno de 30 anos”, destaca o gerente-executivo de Infraestrutura da CNI, Wagner Cardoso.

“Pode-se afirmar que o país sub-investe e sub-financia o transporte coletivo e inversamente privilegia e subsidia o transporte individual motorizado, inclusive na precificação dos combustíveis fósseis (petróleo e gás) utilizados por automóveis e veículos individuais”, acrescenta.

De acordo com o estudo da CNI, as evidências apontam que o Brasil não apenas diverge de experiências internacionais de mobilidade urbana de pessoas sustentável, como também deteriorou sua posição de referência na América Latina. Exemplo disso é que o país aparece entre as economias com a menor parcela de veículos elétricos – somente as cidades de Santiago e Bogotá têm três vezes mais ônibus elétricos em operação no transporte urbano de pessoas em todo território brasileiro.

Alocação dos investimentos e expansão das malhas de transporte urbano de pessoas

Dos R$ 295 bilhões estimados pela CNI para a modernização da mobilidade urbana no país, R$ 271 bilhões poderiam ser destinados para expansão de linhas de metrô. Conforme destaca o estudo, esse montante equivale ao necessário para mais do que dobrar a extensão da malha nas metrópoles (capitais) e grandes cidades (acima de 250 mil habitantes) atualmente implantadas. Em seguida, estão os investimentos para ampliação das estruturas de rede de trens (R$ 15 bilhões) e de BRTs (R$ 9 bilhões).

Exigências da Lei de Mobilidade Urbana de Pessoas no Brasil

O estudo aponta que 74% dos 116 municípios brasileiros com mais de 250 mil habitantes cumpriram os prazos estipulados pela Lei de Mobilidade Urbana atual, que estabeleceu que essas cidades elaborassem e aprovassem um Plano de Mobilidade Urbana (PMU) até abril de 2022, para obtenção de financiamentos. A mesma lei determinou que todos os municípios com população entre 20 mil e 250 mil pessoas apresentassem um PMU até o dia 12 de abril de 2023. 

Entre as 1.908 cidades nessa situação, apenas 13% atestaram – até setembro de 2022 – ter um plano de mobilidade, de forma que, cerca de 87% desses municípios teriam um horizonte pequeno (até abril de 2023) para elaborar e aprovar um plano municipal e, portanto, exigência para garantir o financiamento público e privado de projetos do setor de mobilidade urbana de pessoas.

“É importante assegurar que municípios sem plano não recebam financiamento federal, per capita superior a cidades com planejamento aprovado”, enfatiza Wagner Cardoso da CNI .

O diagnóstico referentes às maiores regiões metropolitanas brasileiras é de que as cidades cresceram, foram amplamente urbanizadas, mas os transportes de pessoas não acompanharam o ritmo de crescimento dessas metrópoles. Entre as recomendações estão investir em transporte coletivo e transporte individual não motorizado. As 15 regiões metropolitanas avaliadas no trabalho da CNI são: Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Belo Horizonte, Goiânia, Belém, Fortaleza, Natal, Salvador, João Pessoa, Maceió, Porto Alegre, Recife e Teresina.

“A urbanização não foi acompanhada por um planejamento voltado à redução das distâncias percorridas pelos cidadãos, para a qual o adensamento das cidades e a melhor distribuição de suas principais funções – moradia, trabalho, serviços e lazer – constituiriam seu alicerce”, diz o estudo da CNI.

Um dado relevante é que, em geral, as cidades com maiores níveis de renda têm maior demanda por transporte individual. Isso pode explicar por que em Curitiba 49% das viagens são feitas de carro ou moto, apesar do reconhecido sistema de BRT (Bus Rapid Transit) e de a cidade apresentar uma boa infraestrutura de transportes urbano de pessoas, comparando as demais cidades brasileiras. 

Por outro lado, em Salvador e Recife – que possuem uma rede de transporte público menos estruturada –, esse modal representa somente 22,1% e 16,7%, respectivamente. Já no Rio de Janeiro, a baixa participação dos transportes individuais (19,5%) pode estar associada a uma confluência de fatores ligados tanto a um menor nível de renda de amplos setores da população metropolitana, quanto à existência de uma extensa – ainda que precária – rede de transportes urbano de pessoas na metrópole carioca.

Chama a atenção o sub-aproveitamento nas nossas metrópoles da bicicleta como um modal de transportes. De fato, em todas as redes de mobilidades (RMs) brasileiras, a participação da bicicleta oscilava entre 0,8% e 2,4%, em contraposição a cerca de 4% em Santiago, 7% em Bogotá e 13% na capital da Alemanha.

Transporte e impacto no desempenho da(o) trabalhadora(or) brasileira(o)

Para o setor industrial, um sistema eficiente de mobilidade urbana é relevante em múltiplos sentidos, na medida em que o tempo de deslocamento dos trabalhadores, o desgaste do usuário, além dos custos diretos envolvidos no movimento casa-trabalho-casa, afeta diretamente o desempenho e os gastos associados ao transporte urbano de pessoas. Há que se levar em conta os setores comercial, serviços, construção civil, educação, entre outros.

“Esse desgaste diário afeta não apenas a concentração e capacidade da(o) funcionária(o), mas sua assiduidade e probabilidade de afastamento por doenças ou outros motivos. Nesse sentido, a modernização do sistema de transporte de pessoas  seria essencial para melhorar a o trabalho na indústria, comércio, serviços, construção civil, educação e os demais, além de estimular toda a cadeia economica que depende do deslocamento através do transporte público de média e alta capacidade”, pontua o estudo.

Ao longo das últimas décadas, o Brasil empreendeu importantes avanços de natureza institucional no aperfeiçoamento da mobilidade urbana de pessoas, de modo que o país dispõe de um moderno ordenamento jurídico que disciplina não apenas o planejamento, mas também a execução de políticas públicas no setor.

No entanto, uma mudança mais profunda da estrutura e organização das cidades brasileiras, deve caminhar paralelamente ao desenvolvimento de um sistema de transportes de pessoas, capaz de encurtar o tempo de deslocamento, prover menor desgaste as(os) usuárias(os) e integrar os diversos modais de transporte urbano de pessoas, de forma a não penalizar aquelas(es) que, por falta de alternativas econômicas, viram-se forçadas(os) a residir distantes dos centros de serviços, empregos, escolas ou outros locais que necessita-se deslocar.

Nos últimos 15 anos o país priorizou o transporte privado de pessoas

Os dados analisados pelo estudo mostram que o preço da gasolina é um balizador da escolha modal de transporte de pessoas. Nos últimos 15 anos, excluindo o período mais recente, o aumento do preço da gasolina foi inferior ao aumento das tarifas de transporte público coletivo, o que, na prática, sinaliza um barateamento relativo das viagens com transporte privado em detrimento das viagens com meios de transporte públicos.

Home office após a pandemia de covid-19 reduziu a demanda no transporte urbano de pessoas

O estudo aponta também que mudanças significativas nos padrões de deslocamento urbano estão em andamento, particularmente com o aumento do trabalho sob a forma de home office e do comércio digital – processo que foi acelerado com a pandemia de covid-19 –, e do advento do transporte por aplicativo (uber, 99, entre outros) – ainda não captado em sua magnitude por boa parte das pesquisas de transporte urbano de pessoas.

Nas duas maiores metrópoles brasileiras, por exemplo, a demanda por transportes coletivos ainda se encontra bastante abaixo ao último ano pré-pandemia: em São Paulo, as viagens de metrô e de ônibus em 2022 estão cerca de 25% abaixo dos níveis de 2019; no Rio de Janeiro, a queda da demanda por metrô é de mais de 30% e a de ônibus, da ordem de 15%.

Algumas sugestões para melhoria, ampliação e modernização dos sistemas de mobilidade urbana de pessoas nas capitais e cidades maiores de 250 mil habitantes:

  • Assegurar instrumentos mais efetivos para a modernização dos sistemas de mobilidade, com o planejamento, aperfeiçoamento institucional e de governança no âmbito dos municípios, e implantar lei municipal como ferramenta de efetivação dos planos de mobilidade;
  • Dotar as regiões metropolitanas de estruturas de governança mais efetivas e práticas, transferindo as atribuições da gestão da mobilidade urbana de pessoas para uma secretaria ou instituição de natureza metropolitana voltada exclusivamente à mobilidade; 
  • Viabilizar fontes para o financiamento de investimentos de infra-estrutura de mobilidade urbana, estimados para as 15 maiores regiões metropolitanas em torno de R$ 295 bilhões até 2042. Nesse sentido, é importante ampliar o número de Parcerias Público-Privadas em um modelo de PPP que agrupe o planejamento,  a construção do sistema de transporte urbano de pessoas, operação e manutenção, em contratos de concessão de duração relativamente longas (em torno de 30 anos ou mais); 
  • Ampliar as fontes de financiamento para investimentos em mobilidade, inclusive pela criação de “fundos de equilíbrio econômico-financeiro das operadoras de transporte coletivo”, administrados em âmbito das regiões metropolitanas e alimentando com recursos arrecadados de receitas não tarifárias diversas, proporcional aos municípios que compõem a metrópole.

Publicado Brasil 24/7: 15 de maio de 2023

Fonte: https://www.brasil247.com/reindustrializacao/brasil-precisa-de-r-295-bilhoes-para-modernizar-mobilidade-urbana-nas-principais-cidades