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6.30.2015

Sexo e amor na igreja


Frei Betto -Adital - Sociedade e Sexualidade

A 9 de junho o papa Francisco ordenou a criação do tribunal vaticano para julgar bispos acusados de pedofilia e por acobertarem padres denunciados por violência sexual, o que considerou "abuso de poder.”
O tribunal funcionará dentro da Congregação para a Doutrina da Fé (antigo Santo Ofício), a mais importante instância católica depois do papado.
Ano passado, a ONU acusou a Igreja Católica de não combater a pedofilia e facilitar o acobertamento de denúncias. Francisco instalou, então, uma comissão de 17 pessoas, inclusive representantes das vítimas de abuso sexual, para investigar a ocultação desses crimes.

Adital - Reprodução

Sexo sempre foi tabu nas Igrejas. É o que menos se fala e muito se faz. A começar do fato de todos os papas, cardeais e bispos serem frutos da relação sexual entre um homem e uma mulher.
As influências da teologia do apóstolo Paulo, educado pela escola puritana dos fariseus e, mais tarde, de Santo Agostinho, discípulo de Platão, cuja filosofia antepõe corpo e espírito, induziram os católicos a verem no celibato de Jesus um exemplo a ser universalmente abraçado por sacerdotes. Não se leva em conta que o próprio Jesus não considerava o celibato exigência a seus apóstolos, tanto que escolheu como primeiro papa um homem casado, Pedro, cuja sogra ele curou (Marcos 1, 31).
A virgindade de Maria, mãe de Jesus, passou a ter mais importância que seu hino à justiça social, o Magnificat (Lucas 1, 46-55), e sua fidelidade aos valores evangélicos.
Até meados da década de 1960, a Igreja Católica abrigava adolescentes em seminários, privados de contatos com mulheres, no intuito de cultivar neles a vocação ao celibato exigida pelo sacerdócio. Ali tinham início distorções e perversões, como a prática de pedofilia.
Todo pastor é um homem imbuído do poder de tocar a alma humana. Quem convive com gurus religiosos sabe que precisam estar alertas em relação a certas mulheres que, ao despir a alma, facilmente despem também o corpo... Algo parecido ocorre em consultórios de psicanálise. Daí a importância de uma formação sólida para quem lida com a subjetividade alheia, manipulável pela religião.
Francisco dá passos importantes no sentido de abrir, na Igreja, o debate sobre sexualidade. O tema está interdito entre os católicos desde o século XVI, quando se formulou a doutrina ainda vigente e incompatível com os avanços científicos e morais da modernidade, como a exigência de que toda relação sexual tenha por finalidade a procriação, e a proibição do uso de preservativo.
Para adequar a Igreja aos tempos atuais, Francisco convocou para outubro, em Roma, o Sínodo da Família, que debaterá os novos perfis familiares, e deu um basta na homofobia. A homossexualidade é, agora, reconhecida pela Igreja Católica como tendência natural, merecedora de respeito e direitos.
A pedofilia é uma perversão praticada também no interior de famílias e instituições que lidam com crianças. Porém, outras anomalias são frequentes na Igreja, como a dupla moral (a que se prega e a que se vive), a sedução que cria dependência afetiva, o uso do conceito de pecado e do medo do inferno como diabólica maneira de manipular consciências infantilizadas e privadas de discernimento.
Se sexo fosse pecado, Deus não teria criado uma forma tão prazerosa de gerar vida. Mas não é o sexo que o debate católico deve priorizar. É o amor. Todos os abusos sexuais decorrem da falta de amor. Vale lembrar a escala grega: pornô (o prazer de um é a degradação do outro); eros (ambos se dão prazer); filia (do prazer nasce a cumplicidade); ágape (o supremo prazer é a comunhão de espíritos, que transcende a epiderme).
E convém proclamar o que enfatiza a 1ª. Carta de João (4, 7-8): onde há amor, Deus aí está. E acrescento: inclusive em uma relação homoafetiva.
http://site.adital.com.br/site/noticia.php?lang=PT&cod=85511

6.29.2015

Alemanha tem 80% mais funcionários públicos que no Brasil, e França 47%



Mauro Santayana - Sociedade e Governo


Enquanto em nosso país, o número total de empregados da União, estados e municípios, somados, é de 1,5% da população, na Itália ele passa de 5%, na Alemanha, proporcionalmente, de 80% a mais do que no Brasil, nos EUA, de 47% a mais e na França, também um dos países mais desenvolvidos do mundo, de 24% da população ativa, o que equivale a dizer que praticamente um a cada quatro franceses trabalha para o Setor Público.

Em suas críticas ao tamanho do Estado e na defesa da privatização a qualquer preço, os neoliberais tupiniquins se esforçam por defender a tese de que o poder de algumas das maiores nações do mundo “ocidental”, os EUA à frente, teria como único, principal esteio, o capitalismo, a livre iniciativa e o livre mercado, e defendem, sempre que podem, alegando a existência de “cabides de emprego”, e o grande número de ministérios, a diminuição do setor público no Brasil.
A informação, divulgada na semana passada, de que, com três milhões e duzentos mil funcionários, o Departamento de Defesa dos EUA é o maior empregador do mundo, tendo em sua folha de pagamento, sozinho, mais colaboradores que o governo brasileiro, com todos seus 39 ministérios, mostra como essa gente tem sido pateticamente enganada, e corrobora o fato de que a tese do enxugamento do estado, tão cantada em prosa e verso por certos meios de comunicação nacionais, não é mais, do ponto de vista da estratégia das nações, do que uma fantasia que beira a embromação.
Dificilmente vai se encontrar uma nação forte, hoje - como, aliás, quase sempre ocorreu na história - que não possua também um estado poderoso, decidida e vigorosamente presente em setores estratégicos, na economia, e na prestação de serviços à população.
Enquanto em nosso país, o número total de empregados da União, estados e municípios, somados, é de 1,5% da população, na Itália ele passa de 5%, na Alemanha, proporcionalmente, de 80% a mais do que no Brasil, nos EUA, de 47% a mais e na França, também um dos países mais desenvolvidos do mundo, de 24% da população ativa, o que equivale a dizer que praticamente um a cada quatro franceses trabalha para o Setor Público.
Esses dados derrubam também a tese, tão difundida na internet, de que no Brasil se recebe pouco em serviços, comparativamente aos impostos que se  pagam. Por aqui muitos gostariam de viver como na Europa e nos Estados Unidos, mas ninguém se pergunta quantos funcionários públicos como médicos, professores, advogados, técnicos, cientistas, possuem a mais do que o estado brasileiro, os governos dos países mais desenvolvidos do mundo, para prestar esse tipo de serviços à população.
E isso, sem ter que ouvir uma saraivada de críticas a cada vez que lança um concurso, e sem ter que enfrentar campanhas quase que permanentes de defesa da precarização do trabalho e da terceirização.
Aos três milhões e duzentos mil funcionários, cerca de 1% da população norte-americana, fichados apenas no Departamento de Defesa, é preciso agregar, no esforço de fortalecimento nacional dos Estados Unidos, centenas de universidades públicas e privadas, e grandes empresas, estas, sim, privadas, ou com pequena participação estatal, que executam os principais projetos estratégicos de um país que tem o dobro da relação dívida pública-PIB do Brasil e não parece estar, historicamente, preocupado com isso.
Companhias que, quando estão correndo risco de quebra, como ocorreu na crise de 2008, recebem dezenas de bilhões de dólares e novos contratos do governo, e que possuem legalmente, em sua folha de pagamento, “lobistas”, que defendem seus interesses junto à Casa Branca e ao Congresso, que, se estivessem no Brasil, já teriam sido, neste momento, provavelmente presos como “operadores”, por mera suspeição, mesmo sem a apresentação de provas concretas.
Da estratégia de fortalecimento nacional dos principais países do mundo, principalmente os ocidentais, faz parte a tática de enfraquecimento e desestruturação do Estado em países, que, como o Brasil, eles estão determinados a continuar mantendo total ou parcialmente sob seu controle.
Como mostra o tamanho do setor público na Alemanha, na França, nos Estados Unidos, por lá se sabe que, quanto mais poderoso for o Estado em um potencial concorrente, mais forte e preparado estará esse país para disputar um lugar ao sol com as nações mais importantes em um mundo cada vez mais complexo e competitivo.
Daí porque a profusão de organizações, fundações, “conferencistas”, “analistas” "comentaristas", direta e indiretamente pagos pelos EUA, muitos deles ligados a braços do próprio Departamento de Defesa, como a CIA, e a aliança entre esses “conferencistas”, “analistas”, “filósofos”, “especialistas”, principescos sociólogos - vide o livro “Quem pagou a conta? A CIA na Guerra Fria da Cultura”, da jornalista inglesa Frances Stonor Saunders - etc, com a imprensa conservadora de muitos países do mundo, e mais especialmente da América Latina, na monolítica e apaixonada defesa do “estado mínimo”, praticada como recurso para o discurso político, mas também por pilantras a serviço de interesses externos, e por ignorantes e inocentes úteis.
Em matéria de capa para a Revista Rolling Stone, no final da década de 1970, Carl Bernstein, o famoso repórter do Washington Post, responsável pela divulgação e cobertura do Caso Watergate, que derrubou o Presidente Richard Nixon, mostrou, apresentando os principais nomes, como centenas de jornalistas norte-americanos foram recrutados pela CIA, durante anos, a fim de agir no exterior como espiões, na coleta de informações, ou para produzir e publicar matérias de interesse do governo dos Estados Unidos.
Muitos deles estavam ligados a grandes companhias, jornais e agências internacionais, como a Time Life, a CBS, a NBC, a UPI, a Reuters, a Associated Press, a Hearst Newspapers, e a publicações como o New York Times, a Newsweek e o Miami Herald, marcas que em muitos casos estão presentes diretamente no Brasil, por meio de tv a cabo, ou têm seu conteúdo amplamente reproduzido, quando não incensado e reverenciado, por alguns dos maiores grupos de comunicação nacionais.
Assim como a CIA influenciou e continua influenciando a imprensa norte-americana dentro e fora do território dos Estados Unidos, ela, como outras organizações oficiais e paraoficiais norte-americanas, também treina, orienta e subsidia centenas de veículos, universidades, estudantes, repórteres, em todo o mundo, em um programa que vem desde antes da Guerra Fria, e que nunca foi oficialmente interrompido.
O próprio Departamento de Defesa, o Departamento de Estado, a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional, USAID, o Fundo Nacional para a Democracia, NED, o Conselho Superior de Radiodifusão, BBG, e o Instituto dos EUA para a Paz, USIP, bancam atividades de “desenvolvimento de meios” em mais de 70 países, em programas que mantêm centenas de fundações, ONGs estrangeiras, jornalistas, meios de informação, institutos de “melhoramento” profissional, e escolas de jornalismo, com um investimento anual que pode chegar a bilhões de dólares.
Além deles, são usados, pelo Departamento de Estado, o Bureau de Assuntos Educacionais e Culturais, (Bureau of Educational and Cultural Affairs, BECA), o Bureau de Inteligência e Investigação, (Bureau of Intelligence and Research, INR) e o Bureau de Democracia, Direitos Humanos e Trabalho (Bureau of Democracy, Human Rights, and Labor, DRL), que apenas no ano de 2006 organizou, na Bolívia, por exemplo, 15 diferentes “oficinas” sobre “liberdade de imprensa e expressão”, além do Escritório de Diplomacia e Assuntos Públicos (Office of Public Diplomacy and Public Affaires, OPDPA).
“O que nós estamos ensinando - explica Paul Koscak, porta-voz da USAID - é a mecânica do jornalismo, na imprensa escrita, no rádio ou na televisão. Como fazer uma história, como escrever de forma equilibrada … tudo o que se espera de um verdadeiro profissional de imprensa.”
Isabel MacDonald, diretora de comunicação da Fairness And Accuracy in Reporting (FAIR) - Imparcialidade e Transparência na Informação - um observatório de meios de comunicação de Nova Iorque sem fins lucrativos, não tem, no entanto, a mesma opinião.
Para ela, “esse tipo de operação do governo norte-americano, a despeito de sua alegada defesa das normas da objetividade, trabalha, na verdade, contra a democracia, apoiando a dissensão sufocante, e divulgando informações deliberadamente falsas que são úteis para os objetivos da política exterior dos Estados Unidos.’
Um exemplo clásssico desse tipo de resultado, quanto aos objetivos norte-americanos, foi o envolvimento de Washington, denunciado pela comissão legislativa Church-Pike, no Congresso dos EUA, com o financiamento a jornais de oposição na América Latina, como o grupo “El Mercúrio” do Chile, por exemplo, na conspiração que levou ao golpe militar contra o presidente eleito de orientação nacionalista Salvador Allende, em 1973.
Em abril de 2015, a Associação dos Jornalistas Chilenos decidiu expulsar de seus quadros o dono do Grupo El Mercúrio, Agustín Edwards Eastman, de 87 anos, por violação do código de ética, depois que documentos oficiais revelados nos Estados Unidos mostraram, em 2014, que ele havia recebido dinheiro da CIA para publicar informações falsas contra o governo chileno.
A diferença entre os Estados Unidos, que se dizem “liberais” e “privatistas”, e na verdade não o são, e o Brasil, que cede a todo tipo de pressão, na tentativa de provar, todos os dias, que não é comunista nem estatizante, é que, mesmo quando envolvidas com corrupção - considerada uma espécie de “dano colateral” que deve ser “contornado” e “absorvido”, no contexto do objetivo maior, de permanente fortalecimento do complexo-industrial militar dos EUA - a existência das principais empresas de defesa norte-americanas nunca é colocada em risco.
Apenas como exemplo, a Lockheed Martin, uma das principais companhias de aviação e de defesa dos EUA, pagou, como lembrou André Motta Araújo no Jornal GGN outro dia, entre as décadas de 1950 e 1970, mais de 300 milhões de dólares, ou 3.7 bilhões de dólares em dinheiro de hoje, de propina para autoridades estrangeiras, entre elas - para quem acha que isso só acontece em paises “sub-desenvolvidos” - o então Ministro da Defesa da Alemanha Ocidental, Franz Joseph Strauss, os ministros Luigi Gul, e Maria Tanassi, o Primeiro-Ministro Mariano Rumor e o Presidente da República Italiana, Giovanni Leone, o general Minoru Genda e o Primeiro-Ministro japonês Kakuei Tanaka, e até o príncipe Bernhard, marido da Rainha Juliana, da Holanda.
E alguém acha que a Lockheed foi destruída por isso ? Como também informa Motta Araújo, seus principais dirigentes renunciaram alguns anos depois, e o governo norte-americano, no lugar de multar a empresa, lhe fez generoso empréstimo para que ela fizesse frente, em melhores condições, aos eventuais efeitos do escândalo sobre os seus negócios.
A Lockheed, conclui André Motta Araújo em seu texto, vale hoje 68 bilhões de dólares, e continua trabalhando normalmente, atendendo a enormes contratos, com o poderoso setor de defesa norte-americano.
Enquanto isso, no Brasil, os dirigentes de nossas principais empresas nacionais de defesa, constituídas, nesses termos, segundo a Estratégia Nacional de Defesa, em 2006, para, com sede no Brasil e capital votante majoritariamente nacional, fazer frente à crescente, quase total desnacionalização da indústria bélica, e gerir alguns dos mais importantes programas militares da história nacional, que incluem novos mísseis ar-ar, satélites e submarinos, entre eles nosso primeiro submersível atômico, encontram-se, quase todos, na cadeia.
O Grupo Odebrecht, o Grupo Andrade Gutierrez, o OAS e o Queiroz Galvão têm, todos, relevante participação na indústria bélica e são os mais importantes agentes empresariais brasileiros da Estratégia Nacional de Defesa. Essas empresas entraram para o setor há alguns anos, não por ter algum privilégio no governo, mas simplesmente porque se encontravam, assim como a Mendes Júnior, entre os maiores grupos de engenharia do Brasil, ao qual têm prestado relevantes serviços, desde a época do regime militar e até mesmo antes, não apenas para a União, mas também para estados e municípios, muitos deles governados pela oposição, a quem também doaram e doam recursos para campanhas políticas de partidos e candidatos.
Responsáveis por dezenas de milhares de empregos no Brasil e no exterior, muitos desses grupos já estão enfrentando, depois do início da Operação Lava-Jato, gravíssimos problemas de mercado, tendo tido, para gaúdio de seus concorrentes externos, suas notas rebaixadas por agências internacionais de crédito.
Projetos gigantescos, tocados por essas empresas no exterior, sem financiamento do BNDES, mas com financiamento de bancos internacionais que sempre confiaram nelas, como o gasoduto do Perú, por exemplo, de quase 5 bilhões de dólares, ou a linha 2 do metrô do Panamá, que poderiam gerar centenas de milhões de dólares em exportação de produtos e serviços pelo Brasil, correm risco de ser suspensos, sem falar nas numerosas obras que estão sendo tocadas dentro do país.
Prisões provocadas, em alguns casos, por declarações de bandidos, que podem ser tão mentirosas quanto interesseiras ou manipuladas, que por sua vez, são usadas para justificar o uso do Domínio do Fato - cuja utilização como é feita no Brasil já foi criticada jurídica e moralmente pelo seu criador, o jurista alemão Claus Roxin - às quais se somam a mera multiplicação aritmética de supostos desvios, pelo número de contratos, sem nenhuma investigação, caso a caso, que os comprove, inequivocamente, e por suposições subjetivas, pseudo-premonitórias, a propósito da possível participação dessas empresas em um pacote de concessão de projetos de infra-estrutura que ainda está sendo planejado e não começou, de fato, sequer a ser oficialmente oficialmente estruturado.
O caso Lockheed, o caso Siemens, e mais recentemente, o do HSBC, em que o governo suiço multou esse banco com uma quantia mínima frente à proporção do escândalo que o envolve, nos mostram que a aplicação da justiça, lá fora, não se faz a ferro e fogo, e que ela exige bom senso para não errar na dose, matando o paciente junto com a doença.
Mais uma vez, é necessário lembrar, é preciso combater a corrupção, mas sem arrebentar com a Nação, e com alguns dos principais pilares que sustentam nossa estratégia de desenvolvimento nacional e de projeção nos mercados internacionais.
No futuro, quando se observar a história do Brasil deste período, ao tremendo prejuízo econômico gerado por determinados aspectos da Operação Lava-Jato,  mutíssimo maior que o dinheiro efetivamente, comprovadamente, desviado da Petrobras até agora, terá de ser somado incalculável prejuízo estratégico para a defesa do país e para a nossa indústria bélica, que, assim como a indústria naval, se encontrava a duras penas em processo de soerguimento, depois de décadas de estagnação e descalabro.
No Exército, na Marinha, na Força Aérea, muitos oficiais - principalmente aqueles ligados a projetos que estão em andamento, na área de blindados, fuzis de assalto, aviação, radares, navios, satélites, caças, mísseis, submarinos, com bilhões de reais investidos - já se perguntam o que irá acontecer com a Estratégia Nacional de Defesa, caso as empresas que representam o Brasil nas joint-ventures empresariais e tecnológicas existentes vierem a quebrar ou a deixar de existir.
Vamos fazer uma estatal para a fabricação de armamento, que herde suas participações, hipótese que certamente seria destroçada por violenta campanha antinacional, levada a cabo pelos privatistas e entreguistas de sempre, com o apoio da imprensa estrangeira e de seus simpatizantes locais, com a desculpa de que não se pode “inchar”” ainda mais um estado que na verdade está sub-dimensionado para as necessidades e os desafios brasileiros?
Ou vamos simplesmente entregar essas empresas, de mão beijada, aos sócios estrangeiros, com a justificativa de que os projetos não podem ser interrompidos, perdendo o controle e o direito de decidir sobre nossos programas de defesa, em mais um capítulo de vergonhoso recuo e criminosa capitulação?
Com a palavra, o STF, o Ministério da Defesa, e a consciência da Nação, incluindo a dos patriotas que militam, discreta e judiciosamente, de forma serena, honrosa e equilibrada, no Judiciário e no Ministério Público.
http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2015/06/28/a-operacao-lava-jato-a-defesa-nacional-a-contra-informacao-e-a-espionagem/

6.27.2015

O sistema financeiro vai nos puxar para o buraco ...

Nunca teve uma aula sobre dinheiro? Neste artigo você pode entender como o sistema finnceiro, com seus juros altíssimos, faz vazar o seu bolso. 

5 pontos para você entender como o sistema financeiro leva nossa economia para o buraco

Ladislau Dowbor - Sociedade e Economia

 

Créditos da foto: blog Carta Maior

reprodução
Quando foi a sua última aula sobre dinheiro? Há muito tempo? Mais precisamente nunca? Não se incomode, ninguém nunca teve uma única aula sobre dinheiro, a não ser que tivesse estudado economia, e ainda assim terá ficado na dimensão assexuada chamada elegantemente de Moeda. Eventualmente moeda e crédito. Mas não se preocupe, trata-se apenas do principal estruturador da sociedade: papéis ou sinais magnéticos que dão direito ao que o mundo produz. Não iríamos ensinar uma coisa destas na escola. O resultado prático é que muito poucos 
entendem do dinheiro, e a imensa maioria da população não entende como o sistema faz vazar o seu bolso. São processos modernos e sofisticados, hoje resumidos no conceito de financeirização.

A financeirização nos toca a todos e diretamente. As pessoas tendem a imaginar a complexidade da “alta finança”, mas se trata prosaicamente da forma moderna de apropriação do produto por quem pouco ou nada produz. Com um patrão explorador se apropriando da mais valia era até mais simples. Hoje é vital, para os equilíbrios da sociedade, que muito mais gente entenda os novos mecanismos. Daí a importância do exercício que Carta Maior vem desenvolvendo, no sentido de não só destrinchar o funcionamento dos sistemas financeiros, como de generalizar a sua compreensão.

No plano internacional temos avanços importantes, com os trabalhos do Piketty sobre a financeirização, a armadilha da dívida pública e a concentração da riqueza no planeta; os estudos da Tax Justice Network sobre os paraísos fiscais; da Global Financial Integrity sobre a finança ilegal; da Oxfam sobre a articulação da desigualdade de renda e da desigualdade de patrimônio acumulado; do Crédit Suisse sobre as grandes fortunas; do Instituto Federal Suiço de Pesquisa Tecnológica sobre a rede mundial de controle corporativo, e em particular dos grandes bancos. Não somos um caso isolado, fazemos parte de um processo mundial. É vital entendermos como se dão estes processos no Brasil.

Juros: Os números aqui são estarrecedores. No plano aparentemente mais prosaico dos crediários, encontramos por exemplo juros médios para “artigos do Lar” da ordem de 100%, quando o equivalente em redes comerciais europeias é de 13%. Aqui temos a opção do crédito consignado, buscando no banco para comprar à vista no comércio com juros da ordem de 25%, enquanto o equivalente na França é de 3,5% ao ano. Juntando as diversas modalidades de crédito ao consumidor, incluindo aqui o uso do cartão de crédito, constatamos um imenso dreno sobre a capacidade de compra do consumidor, por parte de intermediários. Segundo o Banco Central, em março de 2005 a família brasileira destinava 19,3% da sua renda ao pagamento de dívidas, enquanto em abril de 2015 destinava 46,5%.

Demanda: Impacto econômico? Quando a massa da população, que constitui os que mais compram a prazo, gasta quase a metade da sua renda para pagar dívida, naturalmente não irá estimular a economia com mais demanda. O principal motor da economia trava. E quando a demanda trava, mais ainda trava o investimento empresarial, pois suspende toda ideia de expansão, até o horizonte clarear. E como ademais os juros para pessoa jurídica são da ordem de quatro vezes maiores do que nos países concorrentes, o investimento também aqui fica travado. A demanda e o investimento são os dois principais motores da economia. Ambos são hoje em boa parte asfixiados, em que pesem os esforços do governo de fornecer alternativas.

Taxas de juros sobre a dívida pública: O terceiro motor é a atividade do setor público. A perda da imensa fonte de enriquecimento dos intermediários financeiros que era a hiperinflação foi compensada, a partir de 1996, com o sistema atualmente vigente de elevadas taxas de juros sobre a dívida pública. Os bancos, mas também muitos empresários produtivos, têm a alternativa de ganhar 13,75% sobre os títulos, com liquidez e garantia total, sem precisar se envolver no processo trabalhoso de identificar, financiar e seguir investimentos produtivos. Isto trava tanto a iniciativa dos bancos buscarem fomento da economia, como trava a capacidade do governo expandir investimentos em infraestruturas e políticas sociais, tão necessárias ao país. Como ordem de grandeza, são mais de 300 bilhões de reais drenados dos nossos impostos para intermediários financeiros.

Inflação: O grande argumento aqui é que se trata de proteger a população da inflação. O que é curioso pois na maioria das economias o equivalente da taxa Selic é da ordem de 1% ou menos, e no entanto a inflação é baixíssima. E se queremos reduzir a demanda para reduzir a pressão sobre os preços, isto já foi conseguido pelos mecanismos que vimos acima, tanto assim que as empresas estão com estoques acumulados. Paul Singer diz com bom senso que são os juros que estão inflando os preços ao consumidor. Mas encher os bolsos em nome de proteger o povo da inflação, frente ao desconhecimento geral dos mecanismos, funciona.

O resultado geral é esta situação curiosa de uma economia travada pelo lado da demanda, do investimento empresarial e do investimento público, com o PIB praticamente parado, mas lucros declarados dos bancos que aumentaram entre 20% e 30% em um ano. E estão pedindo mais.

Paraísos Fiscais: Para onde vai tanto dinheiro que lucram, sem financiar a economia, sem fomentar atividades econômicas que seria o papel maior dos intermediários financeiros? Aqui vem a dimensão internacional do processo, o nosso link com a financeirização mundial. O TJN mencionado estima em 519 bilhões de dólares, equivalentes a cerca de 28% do nosso PIB, o estoque de recursos que tem o Brasil em paraísos fiscais. Portanto não só não sem reinvestidos em termos produtivos, como são alocados de forma a não pagar impostos. Só em fraudes em notas fiscais no comércio internacional, as empresas situadas no Brasil drenam, segundo o GFI, cerca de 2% do PIB ao ano.

Abrimos aqui sumariamente este leque de mecanismos, para dar uma ideia da dimensão dos desafios. A iniciativa consiste em retomar os numerosos artigos que já foram apresentados em diversas etapas de discussão, organizando para o leitor um tipo de “dossiê” destinado a facilitar a compreensão de como a financeirização funciona no Brasil.  

http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/5-pontos-para-voce-entender-como-o-sistema-financeiro-leva-nossa-economia-para-o-buraco/7/33841

Garotas de propaganda nas altas esferas sociais e comerciais

por Marsílea Gombata - Sociedade e Gênero
 
Algumas recepcionistas de feiras e eventos são contratadas para prestar serviços sexuais para determinados clientes; o recrutamento das chamadas fichas rosa é feito nas redes sociais 
 
Leandro Chemalle (Flickr / CC BY-SA 2.0) // Imagens meramente ilustrativas
ficha-rosaAlgumas das moças contratadas para feiras e eventos acabam prestando serviços sexuais

Nome, idade, telefone, endereço, altura, manequim, medidas do busto e do quadril. Tem tatuagem? Onde? Disponibilidade para viagens? Valor cobrado pelo período de uma a duas horas? Aceita homens mais velhos? E mais novos? Transa com casais? Topa anal? Dupla penetração? Oral finalizado ou sem camisinha (caso o cliente tenha higiene)? E beijo na boca? O longo e incomum questionário poderia ser o cadastro a ser preenchido por uma candidata a emprego em uma casa de prostituição. Mas, com a promessa de uso exclusivo pela agência e manutenção das informações em sigilo, trata-se de um recrutamento das chamadas modelos ficha rosa, ou seja: aquelas que além do trabalho em feiras e eventos topam esticar o expediente para acompanhar clientes.
Com um cachê que pode chegar a 1.000 reais por duas horas, as meninas ficha rosa participam de eventos pequenos – como despedidas de solteiro –, a grandes produções – como salões de carros, feiras de corridas automobilísticas e exposições voltadas à indústria agropecuária. O mercado se baseia na ideia tradicional de que um corpo bonito é capaz de atrair mais clientela.
Tudo começou, reza a lenda, em meados dos anos 1990, quando a Shell colocou em seu estande uma modelo vestida com um macacão branco colado ao corpo e notou um aumento expressivo de visitas a seu setor. Desde então, é comum ver em grandes eventos Brasil afora “gostosas” que têm o papel de atrair mais visitantes e potenciais consumidores do produto à venda. Para a modelo ali ser considerada ficha rosa, no entanto, ela tem de topar também acompanhar os empresários que visitam essas feiras, seja em festas pós-evento ou mesmo para oferecer “favores sexuais” em troca de um cachê maior do que o previsto para trabalhar no estande.
A partir de um falso perfil no Facebook, a revista CartaCapital buscou se informar sobre os detalhes de um trabalho ficha rosa. Fazendo-se passar por uma garota de 24 anos interessada nesse tipo de atividade, muitas agências, agenciadores e comunidades explicaram os requisitos para uma mulher bonita vir a se tornar ficha rosa, assim como as condições de pagamento.
Em uma das respostas, o perfil de uma agência de fichas rosa contou que a demanda parte do contratante. “O cliente nos passa o perfil da garota que ele deseja para um atendimento VIP ou evento. Nós indicamos as meninas ao cliente, mostramos as fotos das garotas conforme o perfil solicitado. O cliente informa qual foi a modelo escolhida, e nós entramos em contato com você para confirmar a disponibilidade, cachê, data, local e detalhes dos trabalhos”, explicou.
Em relação às condições de pagamento, neste caso, a comissão que cabe à agência gira em torno de 10% sobre o total do cachê. “Nossa comissão nos é repassada por você. Em alguns casos, onde temos um acordo com o cliente, ele paga nossa comissão por fora quinzenalmente ou mensalmente”, acrescentou.
Em um anúncio feito no mural de um grupo aberto, uma outra agência seleciona meninas ficha branca e ficha rosa, ou seja, as interessadas em apenas trabalhar como recepcionista em eventos e também as dispostas a “acompanhar clientes VIPs” e “fazer atendimento em hotéis e pousadas”. Com o título “Job Campos do Jordão – 8 vagas ficha rosa e 10 vagas ficha branca”, a agência pede envio de material fotográfico sem maquiagem ou alterações feitas pelo photoshop e lembra que os cachês para fichas rosa começam em 1.500 reais.
Outros agenciadores pedem, ainda, modelos ficha rosa para um trabalho de dois dias com disponibilidade para viajar para o interior paulista, com passagem, alimentação e hospedagem pagas em troca de um cachê de 3.000 reais. Há quem ofereça também 1.000 reais por duas horas para um “novo cliente em São Paulo”, sem a necessidade de experiência prévia e sob a promessa de ser “tudo bem discreto, seguro e sigiloso”.
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Ficha rosa na tela da Globo
O assunto tomou fôlego recentemente com a novela Verdades Secretas, da Globo, na qual o autor Walcyr Carrasco aborda a prostituição de luxo no mundo da moda. O mundo das tops, por sua vez, está urrando com o enredo e quer traçar uma linha divisória entre o trabalho em passarelas e eventos e a atividade exercida por quem faz parte do famoso “book rosa”, cardápio de modelos que fazem as vezes de acompanhantes e garotas de programas.
As fichas rosa, no entanto, não se consideram prostitutas, mas, sim, modelos que prestam serviços VIPs. O termo ficha rosa parece, portanto, dar certo status ao trabalho da meretriz. Além disso, muitas são meninas com curso superior, que revelam em seus perfis do Facebook terem estudado em universidades, em geral particulares, de prestígio ou não.
 O mesmo vale para homens modelos, que quando topam fazer além de eventos e recepções são chamados de ficha azul e acabam compondo o “book azul”.
No Brasil, explica o promotor de justiça Everton Luiz Zanella, a prostituição não é crime, mas facilitá-la é. “A pessoa que pratica o comércio do corpo de forma habitual não comete crime. Comete quem induz, atrai ou submete alguém à prostituição, impedindo essa pessoa de abandonar a atividade e se beneficiando dela”, observou o coordenador do centro de apoio criminal do Ministério Público de São Paulo.
O Código Penal prevê pena de dois a cinco anos para quem induzir ou atrair alguém para a prostituição (artigo 228), um a quatro anos se uma pessoa tirar proveito da atividade de prostitutas (artigo 230), dois a cinco anos para quem mantiver um estabelecimento destinado à prostituição (artigo 229), dois a seis anos para quem promover o deslocamento de alguém com esses fins dentro do País ou uma punição de três a oito anos de prisão quando se tratar de um deslocamento internacional (artigo 231).
Assim, em uma situação onde uma modelo ficha rosa é recrutada por uma agência para realizar um trabalho em outra cidade ou estado e ainda é obrigada a repassar parte de seu cachê como comissão, o agenciador estará sujeito à soma das penas referentes aos três tipos de crime: induzir à prostituição, tirar proveito dela e promover o tráfico interno de pessoas.
Zanella explicou, no entanto, que a prostituta em si nunca é punida. “Essas modelos ficha rosa, por exemplo, são consideradas vítimas do crime, uma vez que são exploradas. O crime seria contra a dignidade sexual delas”, afirmou. “Não se pune autoprostituição. Portanto, se a própria prostituta anunciar seus serviços não estará cometendo crime.”
Apesar de se mostrarem facilitadores, ferramentas como o Facebook ou sites que recrutam e anunciam modelos ficha rosa, raramente são punidos. É preciso comprovar que os administradores ou responsáveis por esses meios têm ciência de que estão sendo negociados ali serviços envolvendo a prostituição de terceiros.
O mesmo vale para os responsáveis por ceder o espaço onde ocorrem grandes feiras e exposições com modelos fichas rosa. Questionada sobre fichas rosa nos eventos realizados no Anhembi, em São Paulo, a responsável SPTuris diz desconhecer o tema e deixa claro que “a organização deve ser feita pela empresa locatária”, responsável pela mão de obra contratada. Organizadores de eventos nacionais de renome, por sua vez, responsabilizam os expositores de cada estande pelas contratações – do buffet a garçons, atendentes e recepcionistas –, alegando não ter como interferir nelas.
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/ficha-rosa-2690.html

Em 2014 oito escolas da área rural fecharam por dia no Brasil

Ao todo, 4.084 instituições de ensino rurais encerraram as atividades no último ano, prejudicando pelo menos 83 mil alunos. Estado que mais fechou escolas foi a Bahia (872)
 
por Sarah Fernades, da RBA - Sociedade e Educação Rural 
 
Odair Leal/ Folhapress
Educação no campoNos últimos 15 anos, 37 mil unidades educacionais no campo fecharam suas portas
 
São Paulo – Ao todo, 4.084 escolas do campo foram fechadas em 2014 no Brasil, o que totaliza oito instituições de ensino das zonas rurais que deixaram de funcionar por dia, em todo o país, de acordo um levantamento feito pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), com dados do Censo Escolar, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Pelo menos 83 mil alunos foram prejudicados.
A região Nordeste lidera o ranking: só em 2014 foram 872 escolas fechadas na Bahia, seguida pelo Maranhão (407) e pelo Piauí (377). “Esses números revelam o fracasso da atual política de educação no campo”, afirmou a professora da Universidade de Brasília (UnB), Clarice Santos, em entrevista ao portal do MST. “Se por um lado existe um esforço do governo federal em ampliar o transporte escolar rural, por outro, esse esforço não é o mesmo para evitar o fechamento das escolas.”
Para o responsável pelo setor de educação do MST, Erivan Hilário, o fechamento destas escolas representa um atentado a um direito social. "O fechamento das escolas no campo não pode ser entendido somente pelo viés da educação. O que está em jogo é a opção do governo por um modelo de desenvolvimento para o campo, que é o agronegócio”, disse, em matéria do site do movimento. “O agronegócio pensa num campo sem gente, sem cultura e, portanto, um campo sem educação e sem escola”.
Nos últimos 15 anos, o país soma 37 mil unidades educacionais no meio rural cujas portas foram fechadas para os alunos. “O fechamento das escolas do campo contribui para o êxodo rural, além de consolidar o papel do agronegócio nessas regiões com a priorização dos lucros”, ressaltou Hilário.
A falta de investimento das prefeituras locais é um dos principais fatores apontados pelos especialistas como motivo para o fechamento das escolas. As prefeituras, por sua vez, alegam que o número de alunos matriculados não é o suficiente para manter novas unidades educacionais.
Outro problema é a precariedade das instituições de ensino. Das 70.816 escolas rurais registradas no MEC em 2013 (uma década antes eram 103.328), muitas não possuem infraestrutura adequada, biblioteca, internet ou laboratório de ciências. O material didático também não é elaborado tendo em vista a realidade do campo, para se aproximar dos alunos.

 Fonte fig. ao lado: Censo escolar/INEP/2014
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Falta de fiscalização

A Lei 12.960, de 2014, tinha como objetivo fazer alterações na Diretrizes e Bases da Educação (LDB) para aumentar o grau de exigência para que escolas fossem fechadas. Porém, de acordo com Hilário, isso não ocorreu na prática.
“O MEC institui as portarias, as leis são sancionadas, mas, na prática, quem tem o poder de fechar as escolas é o município. Se o município alega falta de alunos e de verbas, as escolas acabam sendo fechadas”, diz. "Não faz sentindo investir na formação de professores se não tem escolas, por exemplo. Por isso, bato na tecla de que a questão central é a articulação política do governo com os municípios – que são os responsáveis diretos pelos fechamentos –, e também um pacote que contemple as demandas prioritárias", diz Santos.
http://www.redebrasilatual.com.br/educacao/2015/06/em-2014-oito-escolas-do-campo-fecharam-por-dia-no-brasil-7520.html

EEUA financia jovens latinos para combater governos populares nas Américas


Rede de think tanks conservadores dos EUA financia jovens latino-americanos para combater governos de esquerda da Venezuela ao Brasil e defender velhas bandeiras com um nova linguagem

por Marina Amaral
Na Agência Pública -
“O corpo é a primeira propriedade privada que temos; cabe a cada um de nós decidir o que quer fazer com ele”, brada em espanhol a loirinha de voz firme, enquanto se movimenta com graça no palco do Fórum da Liberdade, ornado com os logotipos dos patrocinadores oficiais – Souza Cruz, Gerdau, Ipiranga e RBS (afiliada da Rede Globo). O auditório de 2 mil lugares da PUC-RS, em Porto Alegre, completamente lotado, explode em risos e aplausos para a guatemalteca Gloria Álvarez, 30 anos, filha de pai cubano e mãe descendente de húngaros.
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Gloria Alvarez, a estrela da direita jovem latino-americana. 
Foto: Fernando Conrado

Gloria ou @crazyglorita (55 mil seguidores no Twitter e 120 mil em sua fanpage do Facebook) ascendeu ao estrelato entre a juventude de direita latino-americana no final do ano passado, quando um vídeo em que ataca o “populismo” na América Latina durante o Parlamento Iberoamericano da Juventude em Zaragoza (Espanha) viralizou na internet. No principal fórum da direita brasileira, Gloria e o ex-governador republicano da Carolina do Sul David Bensley são os únicos entre os 22 palestrantes, brasileiros e estrangeiros, escalados para os keynote – palestras-chave que norteiam os debates nos três dias do evento, batizado de “Caminhos da Liberdade”.
“O discurso do ódio estava presente desde 2010, se viu nas eleições municipais e voltou com força em 2014”
Radialista há dez anos, hoje com um programa na TV, Gloria é uma show-woman cativante. Conduz com desenvoltura a plateia formada majoritariamente por estudantes da PUC gaúcha, uma das melhores e mais caras universidades do Sul do país. “Quem aqui se declara liberal ou libertarista que levante a mão?”, pede ao público, que responde com mãos erguidas. “Ah, ok”, relaxa. Sua missão é ensinar a seus pares ideológicos como “seduzir e enamorar os públicos de esquerda” e vencer “os barbudos de boina de Che”, explica a jovem líder do Movimiento Cívico Nacional (MCN), uma pequena organização que surgiu em 2009 na Guatemala na esteira dos movimentos que pediam – sem êxito – o impeachment do presidente social-democrata Álvaro Colom.
A primeira lição é utilizar nas redes sociais o hashtag criado por ela, “república x populismo”, para superar “a divisão obsoleta entre direita e esquerda”. “Um esquerdista intelectualmente honesto tem de reconhecer que a única saída é o emprego, e um direitista do século 21, que já se modernizou, tem de reconhecer que a sexualidade, a moral, as drogas são um problema de cada um; ele não é a autoridade moral do universo”, continua, sob uma chuva de aplausos. Nada de culpa, nem moral nem social, ensina. A mensagem é liberdade individual, “empoderamento” da juventude, impostos baixos, Estado mínimo – a plataforma da direita liberal (em termos econômicos) no mundo todo: “A riqueza não se transfere, senhores, a riqueza se cria a partir da cabecinha de cada um de vocês”, diz. Da mesma maneira, Gloria rebate programas sociais de assistência aos mais pobres, política de cotas para mulheres, negros, deficientes e até mesmo a existência de minorias: “Não há minorias, a menor minoria é o indivíduo, e a ele o que melhor serve é a meritocracia”.
“Há uma verdade que todo ser humano deve alcançar para ter paz, se não quiser viver como um hipócrita. Todos nós, 7 bilhões e meio de seres humanos que habitamos este planeta, somos egoístas. É essa a verdade, meus queridos amigos do Brasil, todos somos egoístas. E isso é ruim? É bom? Não, é apenas a realidade”, diz, definitiva. “Há pessoas que não aceitam essa verdade e saem com a maravilhosa ideia: ‘Não! [imita a voz de um homem], eu vou fazer a primeira sociedade não egoísta’. Cuidem-se, brasileiros; cuide-se, América Latina! Esses espertinhos são como Stálin, na União Soviética, como Kim Jong-il, Kim Jong-un, na Coreia do Norte, Fidel Castro, em Cuba, Hugo Chávez, na Venezuela.” E por que “seguimos como carneirinhos” atrás desses “hipócritas”? Porque [faz careta e vozinha de velha] “nos ensinam que é feio ser egoísta e que pensar em nós mesmos é pecado. Quantos de vocês já não viram alguém dizer ‘ah, necessitamos de um homem bom, que não pense só em si”, diz, encurvando-se à medida que fala para em seguida recuperar a postura altiva: “Mira, señores, a menos que seja um marciano, esse homem não existe, nunca existiu, nem existirá jamais”. Aplausos frenéticos.
Mas, explica, os “defensores da liberdade” também tem sua parcela de responsabilidade. Eles não sabem comunicar suas ideias, usar a tecnologia para “empoderar os cidadãos” e “libertar” a América Latina. “Se ficarmos discutindo macroeconomia, PIB etc., vamos perder a batalha. Temos que aprender com os populistas a falar o que as pessoas entendem, fazer com que se identifiquem”, ela diz. “E aqui vou lhes dar outro conselho porque dizem que nós, os liberais, somos malditos exploradores”, ironiza. “Encontrei um maneira muito bonita de definir o conceito de propriedade privada. E com esse conceito de propriedade privada os esquerdistas fazem assim: Ôooooo! [inclina o corpo para trás].” A propriedade privada, diz, é o que acumulamos em toda uma vida, a partir de nossas primeiras propriedades: corpo e mente. O passado, afirma, não é igual para ninguém, esse acúmulo é pessoal. “Isso nos humaniza, dá um coraçãozinho a nós, liberais, tão desgraçados.”
Risos. Aplausos.
“Há pessoas que querem o direito à saúde, à educação, ao trabalho, à moradia. A ONU agora quer até o direito universal à internet”, desdenha, embora tenha acabado de dizer que a tecnologia é a chave para mudar o mundo. “Imaginem que, nesse auditório, alguns queiram o direito à educação, outros o direito à saúde, outros o direito à moradia. Então, se eu dou a vocês a educação, todos aqui vão pagar por isso, e vocês vão ser VIPs, e eles, cidadãos de segunda categoria. Se eu dou a eles a saúde, todos neste auditório vão pagar pela saúde deles, e eles vão ser VIPs. Se eu dou a esses as moradias, vou ter que tirar de todos vocês para dar moradia a eles, e eles vão ser esses VIPs. Isso não é justiça social, é desigualdade perante a lei”, conclui, novamente sob risos e aplausos.
“Se cada um na América Latina tiver direito à vida, liberdade e propriedade privada, então cada um que vá atrás da educação que queira, da saúde que queira, da casa onde quer morar, sem precisar de super-Chávez, super-Morales, super-Correa”. Ovação. Assobios. Antes de encerrar os 40 minutos de exposição, Gloria convida os presentes a contrapor a visão de mundo que “vitimiza os latino-americanos”, “joga a culpa nos ianques”, mina a “autoestima” e a coragem de assumir riscos que exige o espírito empreendedor. A plateia aplaude de pé.
Para ler a reportagem completa, acesse no site da A Publica.
http://www.ocafezinho.com/2015/06/24/tio-sam-financia-jovens-latinos-para-combater-governos-de-esquerda/

O Supremo Tribunal Federal é Favorável a Regulação da Mídia Brasileira

Para o ministro do STF Luiz Fux, concentração dos meios traz riscos à circulação de ideias e intervenção estatal pró-democratização é constitucional e fundamental para garantir a diversidade cultural e informativa 
 
Intervozes - Por Helena Martins* -  Sociedade e Justiça
 
Nelson Jr./SCO/STF
Luiz Fux
Luiz Fux se posicionou a favor da regulação da mídia

O julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4679, 4747, 4756 e 4923, ajuizadas contra a Lei do Serviço de Acesso Condicionado (12.485/2011) teve nesta quinta-feira 25 um capítulo importante, não só para os atores diretamente envolvidos no mercado de TV por assinatura, mas para a defesa da regulação democrática dos meios de comunicação como um todo.

Movidas pelo DEM e por associações comerciais como a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a Associação Brasileira de Radiodifusores (Abrae a Associação Brasileira de Televisão por Assinatura em UHF (ABTVU), as ações questionam principalmente dois aspectos da lei, que em 2011 colocou em vigor um novo marco legislativo para todos os serviços de TV paga no País: o impedimento de que uma mesma empresa seja produtora e distribuidora de conteúdo, e a determinação de cotas de conteúdo nacional na programação dos canais.
O relator da matéria, ministro Luiz Fux, não apenas invalidou praticamente todas as alegações das autoras, considerando a quase totalidade dos artigos da lei como constitucionais, como proferiu um voto que mostra, de forma inequívoca, a validade – e mesmo a necessidade – da regulação da mídia para a garantia da liberdade de expressão, diversidade e pluralidade no sistema de comunicação do País.
Algumas passagens do voto merecem ser rememoradas, pois lançam luz sobre um debate feito em geral de forma enviesada pela própria mídia brasileira. Segundo Fux, os dispositivos da lei “respaldam, a toda evidência, uma postura não meramente passiva do Estado na regulação da TV por assinatura, viabilizando (e porque não dizer: reclamando) verdadeira atuação positiva do Poder Público na promoção dos valores constitucionais pertinentes ao setor”.
Indo, inclusive, além do debate sobre a estruturação do mercado de tevês pagas, o ministro do Supremo destacou a necessidade de se estabelecer mecanismos que garantam a diversidade nos meios de comunicação. Referindo-se às cotas para conteúdo nacional e independente garantidas na lei, afirmou que “o mercado audiovisual – deixado por si próprio – é incapaz de promover a diversidade de conteúdo e o pluralismo que se espera dos meios de comunicação de massa” – conforme previsão da Constituição Federal de 1988.
Ratificou, ainda, que a lei ora questionada atende à concretização não apenas do que dispõe a Constituição, mas também a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, promulgada pela Unesco e ratificada pelo Brasil. O tratado internacional diz que “cada parte poderá adotar medidas destinadas a proteger e promover a diversidade das expressões culturais em seu território”. Entre as medidas, a convenção cita aquelas destinadas a “fornecer às indústrias culturais nacionais independentes e às atividades no setor informal acesso efetivo aos meios de produção, difusão e distribuição das atividades, bens e serviços culturais.”
O posicionamento de Fux, como ele mesmo afirmou, considerou o papel crucial da comunicação social e sua enorme capacidade de influenciar a opinião da população.
Contra o abuso de poder
Durante a quase uma hora de apresentação de seu voto, Luiz Fux defendeu a lei, diante dos olhares inquietos dos representantes das empresas – que esperavam encontrar ali acolhida para seus argumentos contrários à legislação e a marcos regulatórios equivalentes estabelecidos nos mais diferentes países do mundo. O ministro do STF foi categórico ao afirmar que a 12.485 contribui para a diversificação do conteúdo e “tende a evitar que o mercado de TV por assinatura se feche, ampliando as fontes de informação disponíveis e o espaço para a manifestação de novos entrantes”.
A afirmação encontra eco nos dados apresentados pela Advocacia-Geral da União (AGU) no julgamento da quinta 25. Segundo o órgão, após sua entrada em vigor, com a previsão de reserva de 3 horas e meia por semana nos canais de espaço qualificado para conteúdos brasileiros (dos quais metade é produzida por produtoras independentes), o mercado de TV por assinatura deu um salto significativo.
O número de canais que veiculam mais de 21 horas de programação nacional passou de 7 em 2010, para 22 em 2015. A quantidade de séries produzidas e veiculadas no País também cresceu. Eram 73 em 2011 e, no ano passado, somaram 506 produções.
Os advogados do mercado repetiram o mantra habitual do setor empresarial. Consideram a lei inconstitucional porque, a seu ver, ela fere a livre iniciativa, a “propriedade intelectual dos canais” e a liberdade de expressão.
O argumento foi questionado por Bráulio Araújo, representante do Intervozes, que participou do julgamento na figura de amicus curiae. Ele sustentou que a livre iniciativa e a livre concorrência não são normas absolutas e que, ao Estado, é necessário atender ao interesse público e aos princípios constitucionais em sua ação – tanto no estabelecimento de limites à concentração dos meios quanto em relação às normas de promoção da diversidade, por meio do incentivo à produção regional e independente.
“A eficiência dessa técnica e sua adequação ao ordenamento jurídico é comprovada pela experiência internacional, haja vista que uma série de países – tais como França, Alemanha, Itália, Reino Unido, Holanda, Austrália, EUA e Argentina – adotam regras que impõem limites fixos à concentração de poder econômico sobre os meios de comunicação”, destacou o Intervozes.
“A comunicação é o único setor econômico em que a Constituição Federal proíbe expressamente o monopólio e o oligopólio, porque ela reconhece que os meios de comunicação não são apenas bens econômicos; são espaços fundamentais para a democracia", afirmou Araújo. Nesse sentido, o prejuízo à democracia causado pela concentração midiática é maior do que qualquer benefício econômico que essa situação passa vir a gerar.
O julgamento das ações foi paralisado logo após a leitura do voto do relator Luiz Fux. Além de Fux, nenhum ministro se manifestou sobre o caso, que deve voltar ao plenário do STF no segundo semestre. Até lá, fica a esperança de que seja aberto, no Judiciário, um novo capítulo do debate sobre as comunicações no País, hoje marcado pela desinformação e pela manipulação do discurso.
É hora de o Brasil se alinhar aos demais países democráticos que reconhecem a centralidade de uma comunicação plural e diversa para as sociedades contemporâneas. E, com isso, romper com o histórico de omissão do Estado em sua regulação e de privilégio do exercício da liberdade de expressão por poucos, com o total silenciamento das maiorias sociais.
*Helena Martins é jornalista, doutoranda pela Universidade de Brasília e integrante do Conselho Diretor do Intervozes. 
http://www.cartacapital.com.br/blogs/intervozes/ministro-do-stf-regulacao-da-midia-e-necessaria-a-liberdade-de-expressao-1816.html

6.21.2015

Ações socioeducativas são as saídas para jovens em conflito com a lei no Brasil

Medidas socioeducativas em meio aberto, como a liberdade assistida ou a prestação de serviço para a comunidade, com acompanhamento de profissionais e sem romper o vínculo com a comunidade, previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), são as possibilidades reais de ressocialização de adolescentes em conflito com a lei.

Marcela Belchior - Agência Adital - Sociedade e Juventude

A conclusão é do estudo "O adolescente em conflito com a lei e o debate sobre a redução da maioridade penal”, publicado esta semana, em Brasília, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O estudo aparece num momento decisivo em torno da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 171/1993, que tramita no Congresso Nacional e propõe a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos de idade. A Comissão Especial da Câmara dos Deputados sobre maioridade penal aprovou nesta quarta-feira, 17 de junho, por 21 votos favoráveis e seis contrários, o relatório do deputado Laerte Bessa (Partido Republicano – PR – Distrito Federal) que reduz a idade penal para crimes considerados hediondos.
reproducao                                          Lei para redução da maioridade penal. Foto:Adital
De autoria das pesquisadoras da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais (Disoc) Enid Rocha Andrade Silva e Raissa Menezes de Oliveira, o estudo do Ipea argumenta com dados e reflexões na tentativa desconstruir o "mito da impunidade” atribuído aos adolescentes. As autoras defendem que, para combater a violência e a criminalidade, é necessária a promoção dos direitos fundamentais, como o direito à vida e os direitos sociais de educação, profissionalização, saúde, esporte, cultura, lazer e da vida em família, preconizados na Constituição Federal de 1988 e no ECA.
A pesquisa pretende contribuir para as discussões em torno da PEC 171, que vem ganhando a adesão dos setores mais conservadores da sociedade brasileira e vai de encontro aos direitos humanos do público adolescente. "Desde 2012, há um arcabouço institucional do Sistema Único de Assistência Social (Suas), montado para a aplicação de medidas socioeducativas em meio aberto. Essas medidas existem para criarem condições de reconstrução de projetos de vida, para darem acesso aos serviços de assistência social”, explica Enid Rocha, na defesa da efetiva aplicação do ECA.
Segundo a pesquisa, em 2013, 95% dos adolescentes em conflito com a lei que cumpriam restrição de liberdade eram do sexo masculino e 60% deles tinham idade entre 16 e 18 anos. Dados de 2003 indicam que mais de 60% dos adolescentes cumprindo pena naquele ano eram negros, 51% não frequentavam a escola e 49% não trabalhavam quando cometeram o delito. 66% deles viviam em famílias consideradas extremamente pobres.
Nos últimos três anos, roubo, furto e envolvimento com o tráfico de drogas foram as infrações mais comuns praticadas pelos adolescentes, de acordo com o estudo. Em 2013, cerca de 40% deles respondiam pela infração de roubo, 3,4% por furto e 23,5% por tráfico. Considerado um delito grave, o homicídio correspondia a 8,75%, latrocínio (roubo seguido de morte) contabilizava 1,9%, lesão corporal correspondia a 0,9% e estupro era a causa em 1,1% das ocorrências. Os estados brasileiros com maior número de adolescentes privados de liberdade, em 2012, foram São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco e Ceará.

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Movimentos sociais protestam contra redução da maioridade penal. Foto:Adital
Também no ano de 2013, havia um total de 23,1 mil adolescentes privados de liberdade no Brasil. Desses, 64% (15,2 mil) cumpriam a medida de internação, a mais severa de todas. Segundo as autoras, a aplicação das medidas não corresponde à gravidade dos atos cometidos.
"Para o Estatuto da Criança e do Adolescente, as medidas de internação devem respeitar os princípios da brevidade e da excepcionalidade. Quando olhamos esses dados, observamos que os princípios não são seguidos. Se fossem cumpridos, os adolescentes internos seriam aqueles que cometeram infrações graves, como homicídios, estupros e latrocínios, apenas 3,2 mil do total, e não 15 mil, como encontramos”, explicou Enid Rocha.
Para o secretário Nacional de Juventude, Gabriel Medina, o Brasil é um país que encarcera além do necessário, abrigando a quarta população carcerária do mundo em termos de quantidade de pessoas. Segundo ele, desde 2005, o número de presos cresceu 77%. "Esse dado desconstrói os mitos de que encarceramento vai resolver o problema da violência. Quando internamos o adolescente, misturamos jovens com diferentes níveis de envolvimento com o crime. Vamos resolver a violência com prevenção, expansão de direitos e inclusão dos adolescentes em políticas públicas”, defendeu Medina.
http://site.adital.com.br/site/noticia.php?lang=PT&cod=85437

6.20.2015

O ódio e a guerra aos meninos pobres do Brasil

Os meninos jovens e pobres não preocupam as elites políticas, apoiadas numa opinião pública envenenada pela manipulação da mídia privada.


Carta Maior - Sociedade e Juventude


Emir Sader

por Emir Sader

De volta ao Brasil depois de muitos anos fora – que incluíram toda a década de 1970, portanto grande parte da ditadura –, o que mais me impactou foi uma cena que vi na televisão. Não me lembro se era uma propaganda ou um ficção. Uma mulher caminhava por uma rua deserta, à noite, com pouca iluminação, quando na direção oposta vem um menininho negro.

À reação espontânea de se debruçar sobre o menino, perguntando onde ele mora, onde ele estava indo naquela hora, como se ele chama, etc, se contrapôs um atitude nova. A mulher se apressa  em cruzar a rua e se distanciar do menino, com evidente medo e pânico mesmo de ser assaltada.

Me dei conta ali que algo de muito profundo tinha mudado no Brasil com a ditadura. Ao invés de gerar piedade, atenção, cuidado, o menino pobre era sinal de perigo. Os meninos pobres do Brasil estavam incorporados às classes perigosas, aquelas que representam risco para a propriedade, para a integridade física dos que possuem bens e se sentem vítimas possíveis de assaltos.

A aprovação, numa comissão da Câmara, da diminuição da idade de maioridade penal, é uma continuação e consolidação daquela atitude. Neste caso, a maioria dos deputados ouve falar de menino pobre e não cruza a rua, mas saca o revolver.

Assim as “elites” políticas, eleitas com o financiamento das grandes empresas privadas, tratam os meninos pobres do Brasil – a grande maioria da infância e da juventude, a maioria da população brasileira. Trata-se de desatar uma guerra aberta, agora com cobertura legal, contra os meninos e jovens pobres. De usar o aparelho legal, além do policial, para condena-los às sórdidas prisões, pelas quais nenhum desses deputados se interessa – porque não são filhos dos seus eleitores, nem parentes dos seus financiadores.

Os meninos e jovens pobres não suscitam atenção e preocupação da grande maioria das elites políticas, apoiadas numa opinião pública envenenada pela manipulação da mídia privada. Suscitam posturas de encerramento nas masmorras, das quais só sairão, se saírem, diplomados pelo crime organizado. Porque nem o Judiciário se ocupa de que a função oficial de recuperação social seja minimamente cumprida. A condenação às prisões é a condenação à morte social. A isso querem condenar agora também os jovens de entre 16 e 18 anos.

A forma como uma sociedade trata dos meninos e dos jovens é a forma como pensa seu futuro. Neste caso, se está excluindo a grande maioria do futuro, reservado apenas aos que se deixam levar pela mentalidade de ódio e de guerra contra os meninos e os jovens pobres do Brasil.
http://contrapontopig.blogspot.com.br/2015/06/contraponto-17031-o-odio-e-guerra-aos.html

6.19.2015

Deputados federais machistas proibem que 10% das mulheres sejam deputadas

Deputados impedem que mulheres garantam 10% de vagas no CongressoDeputados federais impedem que mulheres garantam 10% de vagas no Congresso
Os deputados brasileiros impediram nesta terça-feira a criação de um mecanismo que garantiria a maior presença de mulheres nas casas legislativas brasileiras. Em uma votação permeada por observações machistas, eles não aprovaram uma emenda que incluiria na Constituição a reserva de 10% das vagas para deputadas, senadoras e vereadoras. A regra não traria mudanças bruscas. Apenas transformaria em lei a representatividade que já existe atualmente na Câmara, por exemplo, aumentando gradativamente, pelos próximos 12 anos, a proporção para 15%.

Como foi a votação

O Brasil, onde 52% dos eleitores é mulher, ocupa hoje o posto número 156 em um ranking de 188 países que considera a representação feminina no Parlamento feito pela União Interparlamentar. Está atrás até de países onde as mulheres têm menos direitos do que homens. Nas eleições do ano passado, 51 mulheres foram eleitas, mas uma está afastada para ocupar cargo executivo. São, portanto, apenas 50 deputadas atuantes dentre os 513 deputados –uma taxa que, arredondada para mais, consegue alcançar 10% das cadeiras. O número, apesar de baixo, traz um aumento em relação à legislatura anterior, onde havia 45 mulheres. Não há, entretanto, nenhuma garantia de que ele não voltará a cair nas próximas eleições, por isso a aprovação da emenda era importante.
A bancada feminina, que neste ano mudou sua estratégia e decidiu votar em um bloco único para as questões mais importantes, não conseguiu o apoio dos 308 deputados necessários. Faltaram apenas 15 votos para que a emenda, discutida durante a reforma política, fosse aprovada.
O texto votado nesta terça era uma concessão. Era a versão de um acordo feito entre as lideranças partidárias e a bancada feminina. Inicialmente, a intenção delas era de que 30% das vagas de cada coligação partidária fossem preenchidas por mulheres, mas a proposta enfrentava muita resistência dos partidos maiores, que seriam os mais afetados. Após o acordo, o texto mudou a proporção para 10% das vagas que cada Estado tem direito no Congresso federal. A Bahia, por exemplo, com 39 vagas, deveria ter quatro deputadas –hoje tem três. Há cinco Estados que não conseguiram eleger nenhuma deputada mulher (Alagoas, Espírito Santo, Mato Grosso, Paraíba e Sergipe).
A cota, se aprovada, também valeria para os legislativos municipais e estaduais. A proposta aumentaria ainda participação feminina de forma gradativa. Na segunda legislatura depois de sua aprovação (iniciada em 2023, no caso federal), o número subiria para 12%; na terceira (a partir de 2027), para 15%. Depois, a regra deixaria de existir sob o argumento de que as mulheres teriam criado uma base para conseguir manter a representação sem a ajuda.
Entre muitos dos discursos feitos no Plenário, argumentava-se que o que se pedia era muito pouco. Nada além da representação que já existe. Mas a votação na noite desta terça foi marcada em muitos momentos por discursos que flertaram com o machismo, mesmo entre os deputados defensores da regra. Um deputado chegou a dizer que era a favor da proposta “porque o Plenário ficaria mais bonito”. Outro, defendeu a aprovação por ser “importante dar um voto de confiança às mulheres”. Mas houve quem afirmou que a cota era “injusta” porque não considerava o mérito dos eleitos. “O artigo quinto da Constituição diz que todos são iguais independentemente de sexo e cor. Não há injustiça na disputa sadia. O que não é justo é que uma minoria, pequena e de pouco trabalho, conquiste uma cadeira que não é fácil”, discursou o delegado Edson Moreira (PTN-MG). “Se passar essa norma, todos estarão fazendo cirurgias para mudar de sexo”, completou.
Nenhum partido orientou seus deputados a votarem contra, por temerem associar suas siglas à derrota feminina. Mas apenas oito dos 16 blocos partidários orientaram a favor. Os outros oito liberaram seus deputados, incluindo o do PMDB e o PSDB, que estão entre os maiores. Votaram contra 14 dos 54 peemedebistas e 12 dos 51 tucanos (17, entretanto, preferiram se abster).
Pouco antes de a votação ser encerrada, as deputadas se concentraram atrás do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que anunciaria o resultado, na expectativa de comemorarem juntas. Elas sabiam, entretanto, que a votação seria apertada. Ao anunciar que haviam sido dados apenas 293 votos favoráveis à proposta, 15 a menos do que o necessário, elas desceram do palanque, em silêncio, resignadas. Uma faixa que pedia a paridade foi baixada.

Vagas eleitorais

O país aprovou em 2009 uma lei que estipula que ao menos 30% das vagas dos candidatos nas eleições devem ser de mulheres. As deputadas afirmam, entretanto, que a regra não garantiu a paridade porque muitas candidatas são preteridas em relação aos homens nos financiamentos de campanha ou no tempo gratuito que têm na televisão. Com isso, elas acabam tendo menos chance de vencer por terem menos visibilidade na disputa. “Essa regra se mostrou ineficiente. É preciso que se garanta a presença das mulheres em todos os níveis para que se possa construir as bases. É uma questão cultural, mas mulheres são 52% do eleitorado do país”, disse ao EL PAÍS a deputada Soraya Santos (PMDB-RJ).
Apesar da derrota, Santos comemorou a quantidade de votos conseguida nesta terça-feira e disse que o objetivo agora é trabalhar para convencer os senadores a aprovarem a emenda. Caso isso aconteça, o projeto tem que voltar novamente para a Câmara, para uma segunda votação.
Para a deputada Jô Moraes (PCdoB-MG), militante feminista, foi uma conquista reverter a opinião de tantos deputados em um Congresso tão conservador. Com isso, acredita ela, seria possível arriscar apresentar uma nova Proposta de Emenda à Constituição no ano que vem, que trate apenas da cota para mulheres.
jornal El País / http://www.gazetadejoinville.com.br/portal/2015/06/17/deputados-impedem-que-mulheres-garantam-10-de-vagas-no-congresso/

6.13.2015

Paises em desenvolvimento buscam a independência econômica e a própria autonomia

"A luta de classes explica o mundo"

Por Cláudio Bernabucci, na revista CartaCapital:
Historiador da filosofia e professor emérito da Universidade de Urbino, na Itália, Domenico Losurdo está em São Paulo em junho para um seminário intitulado Cidades Rebeldes e para o lançamento, pela Editora Boitempo, de seu Luta de Classes. Na entrevista a seguir, o acadêmico, um dos estudiosos italianos mais traduzidos no mundo, fala do novo livro, da ascensão dos emergentes e do marxismo, e contesta o historiador britânico Niall Ferguson, expoente liberal.


Vivemos em uma época em que o neoliberalismo é hegemônico e age sem fronteiras. A política, ao contrário, continua presa às estreitas visões nacionais. A escassez de concepções globais da história que aflige o pensamento contemporâneo depende desse limite?

Temos de considerar que, no fim do século passado, com a derrota das experiências socialistas na União Soviética e na Europa Oriental, assistimos a uma colossal mudança histórica. Ao mesmo tempo, a afirmação dos países emergentes e em particular da China como potência mundial representa um choque que é normal não ser imediatamente sistematizado no pensamento. Meu trabalho consiste na tentativa de superar esses limites.

Como o senhor definiria, de um ponto de vista histórico-político, a atual situação internacional?

Nos principais países de capitalismo avançado ocorre um enorme processo de redistribuição de renda a favor das classes privilegiadas. Ao mesmo tempo, de um ponto de vista global, podemos observar uma redistribuição a favor das nações emergentes, aquelas que completam a revolução anticolonialista. Nesse duplo processo, quem coerentemente apoia um projeto de emancipação da humanidade deveria agir para contrastar, em nível nacional, a concentração de riqueza em mãos privilegiadas e, em nível global, favorecer a redistribuição a favor dos países menos favorecidos.

O senhor lê tais processos como umas das várias configurações da luta de classes. É correto?

Exatamente. Para entender minha leitura, temos de lembrar que Marx fala de lutas de classe, sempre no plural. A forma de luta de classes na qual se prestou mais atenção é aquela entre burguesia e proletariado, mas é preciso evidenciar que, sobretudo Engels, mas também Marx, indicou na opressão da mulher a primeira forma de luta de classes. Uma terceira forma é a continuidade da batalha anticolonialista. Na segunda metade do século passado, ela tomou a forma de disputa pela libertação nacional e agora persiste como um embate econômico entre países que querem realizar plenamente sua própria autonomia.

A luta de classes, sobretudo após a derrota do socialismo real, foi recusada como possível interpretação da história contemporânea. Qual é sua resposta a esse tipo de argumentação?

Nesse aspecto, eu polemizo abertamente com Niall Ferguson, considerado hoje o historiador de referência do Ocidente liberal. Ele afirma que no século XX a luta racial teve importância central, enquanto a luta de classes não teve relevância alguma. Vejamos os acontecimentos principais do século passado na Europa e na Ásia. Como demonstram os seus chamados discursos secretos, Heinrich Himmler, um dos principais chefes do nazismo, manifestou com total clareza a vontade do Terceiro Reich de realizar um novo regime escravista. A derrota da União Soviética era a premissa para recrutar escravos, no sentido literal do termo, que, afirmou Himmler, poderiam “encontrar ali e dos quais precisamos para trabalhar e servir a nossa raça”. É correto então afirmar que a luta contra a tentativa de escravizar as chamadas raças inferiores foi uma luta de classes. Um processo análogo aconteceu na Ásia, com a tentativa do império japonês de submeter e escravizar os chineses, imitando assim os alemães no escravismo, maneira mais brutal de colonialismo. 
Mao Tsé-tung, em torno de 1938, com muita lucidez, afirmou que naquelas condições a luta de classes coincidia com a luta nacional. Tal coincidência se verificou obviamente também na Europa contra Hitler. Muitos historiadores, não só eu, afirmam hoje que a resistência da União Soviética contra a Alemanha nazista na Europa e a resistência chinesa na Ásia contra o imperialismo japonês foram as maiores guerras coloniais da história. Como tais, elas foram os maiores exemplos de luta de classes no século XX, uma batalha que sempre assume características novas e peculiares. A história do século passado é a confirmação da leitura marxista da história como luta de classes.

A luta de classes resulta útil para interpretar e transformar a realidade contemporânea?

Na época atual, não existem mais as colônias no sentido clássico, pois é evidente que a luta anticolonial chegou ao fim em nível planetário. Esse avanço é, sem dúvida, o resultado de um processo iniciado com a Revolução de Outubro, quando Lenin conclamou “os escravos das colônias a quebrarem o jugo da dominação colonial”. O mundo era propriedade de poucas grandes potências colonialistas, da Ásia à América Latina. Hoje o quadro é outro, mas ela continua como luta anticolonialista: não é mais pela independência nacional, mas assume a forma de disputa econômica. Uma citação de Mao Tsé-tung torna-se útil outra vez. 
Na véspera da proclamação da República Popular da China, em 1949, ele avisou: “Se, depois da conquista do poder, não tivermos em conta que os Estados Unidos querem que a China continue dependendo do trigo americano, a China continuará sendo substancialmente uma colônia no plano econômico. Nesse caso, a independência política será meramente formal”. Mao entendeu claramente que o processo de libertação do colonialismo passou da fase político-militar para a político-econômica. Dessa maneira, podemos entender o que acontece nos dias de hoje com a China: uma das formas da luta de classes vigente é a tentativa de quebrar o monopólio ocidental da alta tecnologia. Isso vale também para a América Latina, que se liberou definitivamente da Doutrina Monroe, mas continua a batalha pela independência econômica e pelo desenvolvimento autônomo.

Ilustres prêmios Nobel de Economia evidenciaram que também nos países emergentes o processo de bifurcação entre ricos e pobres aumenta. Como o senhor avalia essa contradição?

Em nível mundial, o capitalismo continua dominante. Portanto, também nos países emergentes vê-se uma acumulação de riqueza a favor dos setores privilegiados, e quase sempre a distância econômica e social entre riqueza e pobreza se acentua. No Brasil como na China, as três formas de luta de classes estão contemporaneamente ativas, não existe só a forma clássica entre burgueses e trabalhadores. É sempre preciso fazer a análise concreta da situação concreta. Cada momento histórico é caracterizado pelo entrelaçamento entre as três diferentes lutas de classes e, a depender dos contextos específicos, determina-se a prevalência de uma forma sobre as outras.

Como definir a experiência chinesa, que adotou um sistema de partido único e a economia capitalista?

Se por capitalismo entendemos o sistema em que o poder é exercido pela burguesia, certamente a China não é um país capitalista, pois o poder está estritamente nas mãos do Partido Comunista. A expropriação política da burguesia foi realizada completamente, enquanto a econômica não, pelo fato de suas capacidades empreendedoras terem sido consideradas úteis, nessa fase histórica, para perseguir os objetivos de interesse geral. Portanto, sugiro aceitar a autodefinição que os dirigentes locais adotaram: a China se encontra no estágio primário do socialismo, que acabará em 2049, centenário da República Popular. 
Admito ter compartilhado as ilusões do passado, quando as certezas alimentadas pela filosofia da história garantiam a inevitável vitória do socialismo. Agora não acredito mais nisso, mas afirmar que na China o capitalismo venceu para sempre é uma colossal besteira. Palavra de historiador.
http://altamiroborges.blogspot.com.br/2015/06/a-luta-de-classes-explica-o-mundo.html

Cientísta britânico sugere abrir espaços nas cidades para população se manifestar

David Harvey sugere a prefeito de São Paulo abrir espaço para movimentos revolucionários

‘Sem esses espaços, o aparato repressivo do Estado cresce’, argumenta o geógrafo britânico ao prefeito, no encerramento do Seminário Cidades Rebeldes, em São Paulo
por Sarah Fernandes, da RBA - Sociedade e Cidades
 
facebook/sesc
david.jpgHarvey: "O acúmulo de capital depende cada vez mais da urbanização como forma primária de acúmulo"
São Paulo – O geógrafo David Harvey, considerado um dos cientístas sociais mais influentes da atualidade, não precisou ser questionado para deixar uma sugestão ao prefeito de São Paulo, durante debate em que participaram juntos na noite de ontem (12/jun), na capital paulista. A dica, permeada pelas influências mais à esquerda da academia, valeria para qualquer município: “Se alguém me perguntasse que conselho eu dou para o prefeito, diria: ‘Abra o maior número possível de espaços onde movimentos revolucionários possam acontecer'”.
“A revolução não ocorrerá amanhã. O processo vai ser demorado e a tarefa que pode ser feita é dar a oportunidade de se criar esses movimentos revolucionários. Sem esses espaços, o aparato repressivo do Estado cresce”, explicou. “Eu sou um anticapitalista por motivos racionais. Qualquer pessoa que olhe objetivamente para a situação que estamos pode pensar o mesmo.”
Haddad, Harvey e o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, Guilherme Wisnik, participaram do encerramento do seminário Cidades Rebeldes, promovido pela editora Boitempo e pelo Sesc em São Paulo, entre terça-feira (9/jun) e ontem. Mediados pelo professor de Literatura Brasileira da USP, Flávio Aguiar, eles discutiram o tema “Da Primavera dos Povos às cidades rebeldes: para pensar a cidade moderna”.
“O que me parece urgente é explorar as possibilidades, porque não está claro como alianças de classe podem se forjar dentro das cidades e dos Estados para que se criem alternativas emancipatórias que possam se firmar numa perspectiva anticapitalista”, disse Haddad. “Em muitas abordagens você vê que os conceitos não estão sólidos em relação a essa questão: qual o papel do Estado diante das transformações na nossa sociedade e quais são seus limites.”
Em tom muito acadêmico, ambos concordaram que as cidades são elementos cada vez mais decisivos no processo de acumulação capitalista, o que, para Harvey, reforça a necessidade de criar espaço para movimentos de resistência, que tornem as cidades mais humanas, mais democráticas e mais inclusivas. Isso porque a lógica das políticas urbanas privilegia cada vez mais os interesses do mercado imobiliário e os grandes empreendimentos e não a qualidade de vida dos habitantes.
“O acúmulo de capital depende cada vez mais da urbanização como forma primária de acúmulo. A urbanização que vemos é motivada pela dinâmica e pelas necessidades do capital. Tudo é pensado para que se possa acumular mais”, diz Harvey. “Quando as pessoas perdem suas casas nas crises imobiliárias é uma imensa transferência de riqueza de uma população vulnerável para organizações que estão especulando no mercado. O futuro do capital vai ser definido pela batalha de classe, articulada ao processo de urbanização.”
“Não há acumulação sem urbanização. De certa maneira, estamos concebendo as cidades como mercadoria e é dentro desse cenário que temos que pensar o Estado e as classes sociais”, disse Haddad. “O processo de produção não se dá só no chão da fábrica, mas nas cidades também. Quando o trabalhador não está na fábrica, vendendo sua força de trabalho, está repondo suas energias para trabalhar no dia seguinte. Essa órbita do trabalhador podemos chamar de cidadania. Quando se discute transporte e moradia estamos discutindo metabolismo das cidades para repor as forças do trabalhador.”
Para conseguir mobilizar os trabalhadores, Harvey defende que, além da militância sindical nas fábricas, é preciso fortalecer as organizações de bairro, em um movimento típico do anarquismo, já que os bairros concentram todos os tipos de trabalhadores, dos mais diversos setores.
“Vai ser uma organização que entende a condição de toda a classe operária, não importa onde ela é empregada: se é taxista, se trabalha em um restaurante, se conserta telefones...”, exemplificou. “Eu acho que o futuro da esquerda depende muito de reunir o melhor da anarquia e o melhor do marxismo. Se essas duas correntes não capitalistas não conseguirem se unir em um processo político, a esquerda vai falhar. Para mim, é um momento muito positivo porque essa nova forma de fazer política pode dar certo. Mas a esquerda, muito curiosamente é muito conservadora, ela não quer largar duas ideias.”
http://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2015/06/eu-pediria-ao-prefeito-para-abrir-espaco-para-movimentos-revolucionarios-diz-harvey-a-haddad-6784.html