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9.10.2016

Privilegiar transportes alternativos para substituir automóveis no Brasil

  • Quem ousa enfrentar o automóvel? 

Por Percival Maricato para site GGN - Sociedade e Mobilidade Urbana no Brasil (fonte no final)
O governo interino tem um novo plano para alavancar as montadoras de automóvel: envolver os bancos públicos para financiamento na troca de novos pelos antigos. O programa de renovação de frota deverá ser finalizado até o fim deste ano.
A iniciativa, batizada de "Programa  de Sustentabilidade Veicular", tem o objetivo tirar de circulação veiculo antigos e substituí-los por novos. Os participantes ganharão um credito ao entregar o veiculo antigo, que será aproveitado como sucata. Isso resultaria em um aumento anual de 500 mil unidades no mercado interno. O pretexto a ser usado é que os novos são mais eficientes do ponto de vista energético e preservação de empregos.

O primeiro argumento é ridículo: o automóvel polui o planeta quando da fabricação, no uso e quando são abandonados. O segundo também não pode servir para manter essa atividade eternamente. E hoje em dia churrascarias de médio porte geram tanto emprego quanto uma fábrica de automóveis.

Está claro que o país fabrica mais automóveis do que o mercado necessita. As cidades e estradas estão saturadas de veículos e o correto era, em vez de estimular a produção, reduzi-la, gradualmente, transferindo recursos, mão de obra, tecnologia para a produção de transportes públicos eficientes, limpos, seguros. Pode-se dar prioridade as montadoras, se elas se propuserem a fazer essa  mudança de rumo.

Os automóveis ocupam amplos espaços e são usados para transporte individual ou de poucas pessoas, poluem, matam (são 60 mil mortos por ano no país, 900 mil ocorrências com vítimas), consomem imensa quantidade de energia, custam caro, são considerados obsoletos em poucos anos, exigem fabulosas fatias do orçamento das cidades, estados e da União.

Os governos de FHC, Lula e Dilma não tiveram coragem para começar essa alteração de rumo ou não a enxergaram. Ao contrário, permitiram a multiplicação de montadoras, desoneraram a mão de obra etc. Conter o automóvel muito menos virá do tímido e inseguro presidente interino. É um enfrentamento do qual a mídia quer distância, jamais irá corre o risco de perder a fortuna que as montadoras gastam em publicidade.
Jaime Lerner, ex prefeito de Curitiba e Fernando Haddad, prefeito de São Paulo, estão entre os poucos políticos que ousaram restringir a circulação de veículos e privilegiar transportes alternativos (faixas de ônibus, bicicleta, no caso de Lerner o monotrilho, no de Haddad, aprovação do Uber, etc).

As eleições para prefeito pelas cidades do país, são ótima oportunidade de se exigir dos candidatos um posicionamento claro sobre essa questão: a prioridade na organização do espaço urbano continuará com o automóvel ou, finalmente, passará para os pedestres, a vida comunitária, os transportes públicos.
http://jornalggn.com.br/noticia/quem-ousa-enfrentar-o-automovel-por-percival-maricato