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8.18.2016

O Ministério Público se Esconde Atrás da Corrupção, com a Justificativa de Matar Pobres Jovens?


  • Não são 10 medidas contra a corrupção do Ministério Público, mas outra Constituição autoritária e destrutiva!

Do site Conversa Afiada republica brilhante artigo do jornalista Breno Tardelli, extraído do site da revista Carta Capital:


A guinada autoritária do Ministério Público (publicado 17/08/2016) Sociedade e Jovens Injustiçados




A única consequência possível de um povo que vibra com sangue e ódio é o adoecimento de suas instituições. Uma delas é o Ministério Público, o qual, em tese, fala pela sociedade brasileira supercampeã em desigualdade social, discriminação racial, de gênero e outras mais variadas formas.

Como porta-voz dessa sociedade nas relações processuais, o MP tem prestado um excelente serviço em todos escalões – de Cabrobó em Pernambuco até Brasília, o posicionamento da instituição caminha no sentido de ser o mais reacionário possível, inclusive em respostas exigidas nos concursos públicos para ingresso na carreira.

Há exceções, claro. Basta acompanhar o trabalho dos promotores e promotoras compromissados com a Constituição Federal. Ocorre que, além de serem cada vez mais raros, são perseguidos dentro da própria carreira no Ministério Público (MP) e servem como prova de que a regra é outra dentro do MP.

Cada vez mais o Ministério Público opta pelo senso comum que repudia a diferença. Um exemplo foi quando no julgamento da descriminalização das drogas, o procurador-geral do MP, Rodrigo Janot, naturalizou o choro de comentários na rede social e foi além de todos, que se posicionaram contra: passou a inventar dados falsos.

Disse, entre outras desinformações, que 90% daqueles que fumam maconha se viciam; não satisfeito, segundo ele, basta fumar uma vez para que a pessoa se torne dependente química. Parece brincadeira de péssimo gosto, mas foi o argumento encontrado pela autoridade máxima da instituição (MP).

Pela unidade da nação, que entrega sua liberdade em nome de um bem maior, a existência de um inimigo interno é a melhor coisa que uma instituição que descambou para o fascismo ou excesso de autoridade poderia desejar. Atualmente, além do jovem pobre, o inimigo atende pelo nome de político corrupto.

O termo é uma pegadinha, na verdade. Não são corruptos todos os políticos que percebem uma vantagem financeira indevida, mas especificamente políticos de um determinado partido – o PT.

É curioso que o partidarismo do MP seja sempre rebatido por analistas simpáticos à instituição, toda vez que um cacique do PSDB sofre um processo judicial. "Tá vendo?", desafiam. Para eles, digo que falta o recorte de classe na análise: promotores e promotoras de justiça vêm de famílias elitizadas (ricas), além de perceberem um salário de classe média alta. São pessoas que reproduzem a opinião política majoritária na elite econômica, filiada no país ao PSDB, o partido dos ricos.

Por isso promotores são tão vorazes contra "corruptos" do PT e políticos de demais partidos populares que representem a imagem e o voto do pobre, do evangélico, do incauto; em parceria com a magistratura, que sofre do mesmo mal, conseguem a liminar para prejudicar os planos do partido em um dia (alguém lembra do pedido de prisão baseado em Marx e Hegel?).

Contudo, quando um helicóptero cheio de cocaína é descoberto, bem, aí não acontece nada mesmo – há outras razões para o partidarismo, além do recorte de classe. Processo em face de tucanos rende menos mídia e menos tapinha nas costas nas confraternizações, por exemplo.

Político corrupto é uma categoria bem específica, mas é capaz de "unir" o País a ponto de milhares ocuparem as ruas nas mais variadas cidades e aplaudirem quem está combatendo esse inimigo do povo. No caso do Judiciário, Sérgio Moro e os procuradores do Ministério Público Federal ganharam tamanho poder e capital político a ponto de reunir dois milhões de assinaturas pelas 10 medidas contra a corrupção.

Um pouco diferente da batalha contra o jovem periférico, a guerra contra a corrupção esconde outra motivação preocupante: o sequestro da política pelo poder Judiciário – entendidos nesse contexto como magistratura e ministério público. A judicialização da política é ainda mais preocupante quando os juristas não escondem uma preferência partidária, muito menos o gosto agridoce do poder.

Quando a desinformação e o autoritarismo rendem aplausos, as prioridades mudam. Como exemplo muito claro do autoritarismo do Ministério Público no Brasil, analisar a forma como os jovens das periferias pobres das grandes cidades brasileiras são tratados pelo judiciário brasileiro, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro. Em tempos de chacina de 19 cidadãos pela polícia, o ouvidor da corporação paulista elencou alguns motivos para que a Polícia Militar assassinasse tanta gente com tamanha naturalidade. É a polícia que mais mata no mundo. Um deles: policiais acusados de matarem são sistematicamente alvos de pedidos de absolvição pelo Ministério Público.

A mesma conclusão foi da Human Rights Watch, maior órgão e mais atuante de direitos humanos no mundo, que analisou a atuação policial no Rio de Janeiro e percebeu que “há má vontade do Ministério Público em investigar esses casos e que normalmente as investigações só avançam quando há interesse social e pressão por parte da mídia”.

E foi um delegado de polícia que pesquisou em Universidade que isto está acontecendo. Não foram pessoas ligadas aos direitos humanos no Brasil.

O delegado de polícia Orlando Zaccone percebeu a mesma coisa e foi na sua tese de doutorado pesquisar, como promotores e promotoras fundamentavam o pedido de arquivamento de casos em que quem está no banco dos réus não é um dos pês (pobre, preto e puta), mas um policial. Em entrevista ao site Justificando, ele esclareceu, basicamente, os porquês dessa benevolência:

"O fundamento basicamente tem a grande pergunta do auto de resistência (prisão seguida de morte): não como a polícia agiu, mas quem ela matou. Então, completada a figura do inimigo, isto é, o traficante de drogas, e esse fato ocorrendo dentro de bairros pobres, favelas, guetos, isso é colocado na escrita dos promotores de justiça como elementos a justificar a morte." (ou seria assassinato?)

Então é o seguinte: o Ministério Público é benevolente apenas e tão-somente com policiais militares, pois entende que por trás de cada assassinato há algo que o justifique, ou, ainda que não haja, "matar bandido" é necessário, como não se cansam de falar os programas policiais na televisão brasileira.

Uma das premissas fascistas é o arbítrio e a naturalidade com as quais as instituições lidam com a violação maciça de direitos humanos (torturas e assassinatos), em especial, se o alvo for um inimigo público (imaginário ou inventado?). E em um país desigual e racista como o Brasil, não há inimigo maior do que o jovem negro da periferia.

Se esses jovens não são violados pela omissão do Ministério Público no controle da polícia que mais mata no mundo, são enviados para nossos presídios (na maioria dos casos, sem julgamento), a masmorra contemporânea, muito por conta de uma lei de drogas racista, cuja principal razão de existir é encarcerá-los, sob o protagonismo do Ministério Público de acusar e brigar pela prisão a todo custo, contra qualquer forma de liberdade desses jovens humildes.

Voltando, 10 medidas contra a corrupção que o Ministério Público Federal está defendendo no Brasil é, de fato, um ótimo nome para um projeto de lei. Quem seria oposição a 10 medidas contra a corrupção? O procurador que percorre o País na defesa delas é bem arrumado, usa um dos perfumes mais caros do país, tem gel no cabelo penteado para o lado e sorriso bobo. Verdadeiro menino bom e vistoso.

Ocorre que por trás de tanta bondade, reside um projeto de lei que rebaixa o habeas corpus, legaliza prova ilícita, reduz a prescrição, cria crimes cuja prova deve ser feita pelo réu e demais arbítrios que destroem a Constituição. A crítica não é apenas ao promotor federal do MP Deltan Dallagnol (operação lava-jato) por exemplo, mas sim, a toda carreira de promotor do ministério público, ante o simbolismo e representatividade de sua atuação (ou autoritarismo em excesso no Brasil).

"Contra o político corrupto vale tudo, o que não aguentamos mais é impunidade", dirá o mantra da nação, empunhando suas bandeiras por um Brasil melhor contra-tudo-o-que-está-aí, bem ao estilo que é divulgado na televisão. Todavia, o procurador do ministério público de sorriso bobo e o próprio órgão Ministério Público são incapazes de fazer, por terem submergido ao fascismo ou excesso de autoridade , a constatação de que estamos no pódio de países que mais prendem no mundo (dado comprovado no judiciário).

Impunidade aqui é piada como constatou o delegado de São Paulo Orlando Zaccone no exemplo acima e qualquer projeto, qualquer um mesmo, que venha a arrancar mais garantias das pessoas, endurecer mais uma instituição já autoritária e empoderada (MP). Vai piorar o que já está péssimo. Vai prender o político corrupto? Vai, mas vai prender muitos jovens pobres também – fora que, convenhamos, violar a Constituição Federal para cumprir a lei é um contrassenso tão grande que não vale nem adentrar no assunto.

Tatue na testa para não esquecer: quem vai pagar essa conta de oba-oba contra a corrupção é o pobre, o negro, o jovem, a mulher, o político corrupto, o honesto, ou quem mais não os agrade (judiciário) na sociedade brasileira. Por isso, muita gente séria tem se levantado contra a perda dos direitos e garantias individuais, pela Constituição e se opondo a olhar no cárcere ou prisão injusta a solução para o que quer que seja.

É a lógica do anti-punitivismo, que, infelizmente, não vende jornal, nem passa na tela da Globo. Para quem quiser conhecer a opinião de renomados estudiosos de todo país desconstruindo, medida a medida, esse absurdo de propaganda institucional, sugiro a leitura do boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.

Pelos aplausos e pelo poder de investigar e por serem a salva-guarda da nação, o Ministério Público  rebaixa o Estado de Direito no País – já tão baixo. Para quem ainda não entendeu, o problema não é ser contra ou a favor da corrupção – acredito que é até idiota imaginar alguém a favor da corrupção. O cenário complica quando alguém, ou alguma instituição, acredita ser a personificação da moral e da ética, mas apenas representa a escalada autoritária mesmo e fica livre para matar.

http://www.conversaafiada.com.br/brasil/o-mp-e-fascista