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9.07.2023

Não Queremos só Picanha, mas Também Justiça aos Jovens e Crianças Negras na Periferia

 Nós, os baianos, não queremos só comida, amado Lula, queremos que a Polícia Militar não ataque crianças e jovens negros

Quando a bala da arma de um policial consegue matar mais rápido do que a fome, presidente, quem é negro, de estômago vazio ou cheio, tem pressa

 Jornada dos Movimentos Negros Contra a Violência Policial. Foto Paulo Pinto/Agência Brasil

por Joana Rizério* e Cynara M. Menezes** na Revista Forum – Sociedade e Polícia Militar mata no Brasil

Eu vi na TV, querido Lula, a escalada daquela sua nobre obsessão por matar a fome do brasileiro. De terninho azul de riscas, cabelinho e barba brancos e em dias, você prometeu, em Angola, não medir esforços para colocar comida no prato do mundo inteiro. Bravíssimo plano, meu presidente. Mas você já foi à Bahia?

Um velho samba de Gilberto Gil diz que o baiano “de fome, não morre, porque na Bahia tem mãe Yemanjá e, do outro lado, o Senhor do Bonfim”. Nós, os baianos, não queremos só comida, amado Lula. O desejo mais fundamental do resto do país, e até do mundo, pode ser picanha, arroz e feijão, mas aqui, não.

Você prometeu, em Angola, não medir esforços para colocar comida no prato do mundo inteiro. Bravíssimo plano, meu presidente. Mas você já foi à Bahia? O desejo mais fundamental do resto do país, e até do mundo pode ser picanha, arroz e feijão, mas aqui, não, é a Polícia Militar não atacar crianças e jovens negros...

“O que você quer?” pergunta Caco Barcelos a uma adolescente baiana no programa Profissão Repórter do último dia 16 de agosto de 2023. A violência policial no Estado foi o tema do programa, depois que a Bahia liderou o ranking nacional do último Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

“A gente quer câmeras nas fardas dos policiais”, sentenciou, decidida, a menina. Ela faz parte dos milhões de baianos que perderam o apetite ao saber que a Polícia Militar do Estado matou mil quatrocentas e sessenta e quatro pessoas ano passado (2022).

Aquilo que a entrevistada pede, câmeras corporais no fardamento dos agentes é comprovadamente eficaz na redução de mortes tanto de civis quanto de militares. Em São Paulo, a queda no número de mortes foi de mais de 70% nos últimos anos.

Ter a garantia de comer três vezes por dia é fundamental, meu presidente, mas, pensa aqui comigo: pra precisar de alimento, o corpo tem que estar vivo. Quem tem fome, tem pressa é um slogan que precisa ser adaptado pra funcionar aqui. Quando a bala da arma de um policial consegue matar mais rápido do que a fome, presidente, quem é negro, de estômago vazio ou cheio, é quem tem pressa.

  *Joana Rizério, jornalista, escritora, produtora, faz documentário, é escorpião com ascendente em sagitário, fluente em inglês, conversa em francês e espanhol; é apaixonada pelo ofício da reportagem, é fascinada pela internet, por fotografia, cinema, moda, história, literatura, viagens e gente.

 **Cynara Moreira Menezes (Socialista Morena), (Ipiaú, 1967) é uma jornalista brasileira. Foi repórter em diversos veículos de comunicação, como Folha de S.Paulo, Veja e Carta Capital. Atualmente, trabalha no blog Socialista Morena, que fundou em 2013. Por seu trabalho jornalístico, especialmente na temática política, recebeu em 2013 o Troféu Mulher Imprensa, na categoria "Jornalista de mídias sociais".
Publicado na Revista Forum: 4/set/2023

Fontehttps://revistaforum.com.br/blogs/socialista-morena/2023/9/4/nos-os-baianos-no-queremos-so-comida-amado-lula-143510.html