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8.27.2015

Brasileiros (as) rejeitam melhorias sociais, disse Mujica, ex-presidente do Uruguai













  • “Quem disse que para ser feliz é preciso comprar um telefone novo a cada quatro meses? Por que trocar o carro a cada dois anos? Pagar cotas e cotas e cotas para o resto da vida? Isso é felicidade? O que está em jogo é a felicidade humana, e ela está em poucas coisas: na juventude, no amor. Entre ser desenvolvido e ser feliz, mais vale não ser desenvolvido”.
  • Mujica: “Brasileiros não reconhecem melhorias sociais”

  • No Rio, ex-presidente uruguaio disse que políticos têm que viver como a maioria

Eduardo Miranda para o Jornal do Brasil
Em um diálogo sobre política e coletividade, o ex-presidente uruguaio Jose “Pepe” Mujica disse, após receber homenagem da Federação de Câmaras de Comércio e Indústria da América do Sul (Federasur), que o Brasil mudou muito positivamente, mas que a população, em geral, não reconhece os ganhos sociais e atribui o progresso exclusivamente ao esforço individual.
“Muita gente que melhorou não se dá conta de que a melhora é resultado de medidas que foram tomadas ao longo dos anos. Muita gente crê que melhorou apenas pelo seu esforço individual e não vê que lhe deram a oportunidade. Isso se passa não apenas no Brasil, mas em todos os lugares, em outras sociedades modernas”, apontou Mujica, na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no centro do Rio.
O ex-presidente se recusou a fazer críticas à presidente Dilma Rousseff e disse que é preciso ter habilidade diplomática e carinho com o povo brasileiro. Ao ser informado sobre a ocorrência de manifestações de rua que pedem a volta dos militares no poder, Mujica foi enfático: “As pessoas que clamam por isso são loucas! Loucas! Qualquer democracia, por pior que seja, é melhor que uma ditadura”, disse ele, que passou 14 anos encarcerado no período ditatorial do Uruguai.
Mujica, que abriu mão de 90% de seu salário enquanto esteve no comando de seu país, argumentou que não prega voto de pobreza, mas alertou para o fato de que a ganância de homens públicos pelo dinheiro está matando a confiança na política. O uruguaio foi aplaudido de pé quando defendeu que os políticos devem viver como a maioria da população.
“Eles têm que viver como a maioria, e não como a minoria privilegiada. Se o político se acostuma a comer na mesa e a ir à casa dos muito ricos, ele pensará que é muito rico também. Se ele faz isso, ele afeta a confiança, e o homem precisa confiar em algo. Aquele que só gosta de dinheiro não deve ter lugar dentro da política.”, concluiu o senador uruguaio.
 Em seu discurso, que durou trinta minutos, o ex-presidente disse que não vive sem utopia, que “só a multidão pode mudar a realidade”, que “não há homens imprescindíveis, há causas imprescindíveis” e criticou os imperativos do capitalismo.
“Quem disse que para ser feliz é preciso comprar um telefone novo a cada quatro meses? Por que trocar o carro a cada dois anos? Pagar cotas e cotas e cotas para o resto da vida? Isso é felicidade? O que está em jogo é a felicidade humana, e ela está em poucas coisas: na juventude, no amor. Entre ser desenvolvido e ser feliz, mais vale não ser desenvolvido”.
http://www.jb.com.br/pais/noticias/2015/08/27/mujica-brasileiros-nao-reconhecem-melhorias-sociais/

Frei Betto: pensamos que o ter é mais importante que o ser pessoa ...


“Hoje, somos vítimas de nossos próprios erros”
                                                          frei Betto

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Frei Fernando, Frei Betto, Frei Ivo e Frei Tito (da esquerda para a direita), durante julgamento dos dominicanos em 1971

Do Site da SMetal

O Dominicano tem mais de 60 livros publicados. Entre eles, os clássicos “Batismo de Sangue” e “Nos subterrâneos da história”.

O frade concedeu entrevista exclusiva para o setor de imprensa da SMetal:


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Imprensa SMetal: O comportamento de selfies, que se espalha pela internet, aponta para uma sociedade egocêntrica que não consegue visualizar o entorno?

Frei Betto: Antes, muitos protestavam contra a invasão de privacidade. Hoje, milhares promovem a evasão de privacidade… Havia um muro que separava os territórios da vida pública e da vida doméstica. Agora, o muro ruiu, graças às novas tecnologias eletrônicas. E muitas pessoas se mostram em redes sociais como são de fato na vida privada: egocêntricas, agressivas, vaidosas, preconceituosas… Em suma, frutos do capitalismo neoliberal, cujo valor supremo é a competitividade. Ou seja, suba pisando no próximo, reduzindo-o a seus degraus de ascensão.

IS: Vivemos um processo de intolerância na sociedade. O ser humano está perdendo a capacidade de se relacionar?

FB: Não. É que, antes, os territórios estavam bem delimitados: o plebeu não invade o terreno do nobre; o escravo, do senhor; o negro, do branco; a mulher, do homem; o pobre, do rico. Agora, com o avanço da consciência de direitos humanos (friso: consciência, e não vivência) e dos direitos civis, as barreiras se romperam, e isso provoca intolerância. Os do andar de cima se sentem sumamente incomodados de terem que dividir o espaço com os do andar de baixo… Ou seja, séculos de castas, estamentos, desigualdades sociais estão impregnados em cada um de nós, o que nos faz reagir atavicamente, como um animal diante de seu predador.

IS: Gostaria que o senhor comentasse sobre o repúdio dos manifestantes às instituições e entidades, ignorando a trajetória e contribuições delas, como é o caso da própria CNBB, que assina o projeto pela reforma política.

FB: Essa gente “pensa” com o fígado, e não com a razão. E sem memória histórica. Mas a culpa não é só deles. É do governo, que promoveu inclusão econômica e deixou de lado a inclusão política. E da educação, que não forma os educandos com consciência histórica.

IS: Na visão do senhor há algum movimento que esteja pensando em um novo projeto de sociedade para o país?

FB: Muitos movimentos sociais, como o MST e o MTST, estão na linha de pensar um novo projeto para o Brasil. Mas, infelizmente, órfãos de um partido que transforme isso em projeto político viável a curto prazo. Há tentativas louváveis de formação de frente de esquerdas. Costura que não é fácil, pois não há um alvo inimigo concreto, como na ditadura e, apesar de tudo, ruim com Dilma, pior sem ela…

IS: Nessas manifestações da direita diversos cartazes são exibidos pedindo retorno dos militares no poder. Falta arte e utopia aos jovens?

FB: Convém na confundir as viúvas da ditadura com os jovens, embora haja jovens entre elas. Mas faltam arte e utopia a muitos jovens. Infelizmente o PT no governo criou uma nação de consumistas, e não de cidadãos.Porque não se dedicou à sua proposta mais original: organizar a classe trabalhadora.

IS: Não é difícil encontrar depoimentos de trabalhadores fazendo discurso contra trabalhadores (pessoas pobres). A identidade do Brasil sempre foi tema estudado pelos intelectuais como Darcy Ribeiro e Sérgio Buarque de Holanda. O consumismo atrapalha o sentimento de pertencimento de classe?

FB: Sim, o consumismo é a ideologia do neoliberalismo. Forma de acelerar a apropriação privada do capital. Por isso, todos os produtos têm prazo de validade muito curto. Tudo é reciclável ou descartável. Até as relações humanas… A consciência de classe é algo muito difícil de se formar. Exige um trabalho político muito intenso, que raros movimentos sociais e sindicatos fazem. Penso nos camponeses alemães incorporados ao Exército Nazista. Sentiam-se orgulhosos de lutar por uma Alemanha hitlerista…

IS: Em 1998, o senhor escreveu o artigo “Para que votar?”, no qual afirmou que a ‘apatia coletiva é grave sintoma para a saúde da democracia. A indiferença do eleitor inviabiliza a diferença na política’. Hoje, o que se percebe é uma hostilização a qualquer movimento/mobilização que defenda os desvalidos e assalariados. O contexto dos dias atuais é de uma ‘partidarização’ elitista?

FB: Enfim, a direita “saiu do armário”. Eu mesmo fui agredido por ela nos lançamentos, no Rio e em Belo Horizonte, de meus livros PARAÍSO PERDIDO – VIAGENS AOS PAÍSES SOCIALISTAS e UM DEUS MUITO HUMANO – UM NOVO OLHAR SOBRE JESUS.
Todos os que, historicamente, defenderam os direitos dos pobres sofrem todo tipo de violência da parte dos que não abrem mão de serem os unidos de posse da riqueza social.

IS: O senhor foi preso na ditadura civil militar. Pode-se fazer alguma comparação com 1964, em relação à caça aos militantes da época – com a ajuda da imprensa?

FB: O velho Marx já dizia que a ideologia de uma sociedade é a ideologia da classe que domina esta sociedade. O que lamento é o PT, em mais de uma década de governo, não ter feito a regularização da mídia. Hoje, somos vítimas de nossos próprios erros.

IS: Ainda está longe um Brasil soberano? Quais são as expectativas do senhor?

FB: Minha expectativa é que o que resta de esquerda – e resta muito pouco – se reorganize melhor em função da defesa dos direitos dos pobres e das mudanças estruturais de que o Brasil tanto necessita.

http://negrobelchior.cartacapital.com.br/frei-betto-hoje-somos-vitimas-de-nossos-proprios-erros/