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10.08.2018

Como a extrema direita utiliza os “fake news” ?


Se você pode controlar as informações a que uma pessoa tem acesso, você pode controlar a maneira com que ela percebe o mundo e, com isso, pode influenciar a maneira como se comporta e age
por Rafael Azzi para Revista Forum – Sociedade e Luta Democrática Brasileira
Figura fake news (internet)
Sua tia não é fascista, ela está sendo manipulada
Você se pergunta como um candidato com tão poucas qualidades e com tantos defeitos pode conseguir o apoio quase que incondicional de grande parte da população?
Você já tentou argumentar racionalmente com os eleitores deles, mas parece que eles estão absolutamente decididos e te tratam imediatamente como inimigo no mais leve aceno de contrariedade?
Até sua tia, que sempre foi fofa com você, agora ataca seus posts sobre política no facebook?
Pois bem, vou contar uma história.
O principal nome dessa história é um sujeito chamado Steve Bannon. Bannon tinha uma visão de extrema direita nacionalista. Ele tinha um site no qual expressava seus pontos de vista que flertavam com o machismo, com a homofobia, com a xenofobia, etc. Porém, o site tinha pouca visibilidade e seu sonho era que suas ideias se espalhassem com mais força no mundo.
Para isso, Bannon contratou uma empresa chamada Cambridge Analytica. Essa empresa conseguiu dados do facebook de milhões de contas de perfis por todo mundo. Todo tipo de dado acumulado pelo facebook: curtidas, comentários, mensagens privadas. De posse desses dados e utilizando algoritmos, essa empresa poderia traçar perfis psicológicos detalhados dos indivíduos.
Tais perfis seriam então utilizados para verificar quais indivíduos estariam mais predispostos a receber as mensagens: aqueles com disposição de acreditar em teorias conspiratórias sobre o governo, por exemplo, ou que apresentavam algum sentimento de contrariedade difuso ao cenário político atual.
A estratégia seria fazer com que esse indivíduo suscetível a essas mensagens mudasse seu comportamento, se radicalizasse. Como as pessoas passaram a receber as notícias e a perceber o mundo principalmente através das redes sociais, não é difícil manipular essas informações. Se você pode controlar as informações a que uma pessoa tem acesso, você pode controlar a maneira com que ela percebe o mundo e, com isso, pode influenciar a maneira como se comporta e age.
Posts no facebook podem te fazer mais feliz ou triste, com raiva ou com medo. E os algoritmos sabem identificar as mudanças no seu comportamento pela análise dos padrões das suas postagens, curtidas, comentários.
Assim, indivíduos com perfis de direita e seu tradicional discurso “não gosto de impostos” foram radicalizados para perfis paranóicos em relação ao governo e a determinados grupos sociais. A manipulação poderia ser feita, por exemplo, através do medo: “o governo quer tirar suas armas”. Esse tipo de mensagem estimula um sentimento de impotência e de não ser capaz de se defender. Estimula também um sentimento de “somos nós contra eles”, o que fecha a pessoa para argumentos racionais.
Sites e blogs foram fabricados com notícias falsas para bombardear diretamente as pessoas influenciáveis a esse tipo de mensagem. Além disso, foi explorado também um sentimento anti-establishment, anti-mídia tradicional e anti “tudo isso que está aí”. Quando as pessoas recebiam várias notícias de forma direta, e não viam essas notícias repercutirem na grande mídia, chegavam à conclusão de que a grande mídia mente e esconde a verdade que eles tem.
Se antes a mídia tradicional podia manipular a população, a manipulação teria que ser feita abertamente, aos olhos de todos. Agora, todos temos telas privadas que nos mandam mensagens diretamente. Ninguém sabe que tipo de informação a pessoa do lado está recebendo ou quais mensagens estão construindo sua percepção de realidade.
Com esse poder nas mãos, Bannon conseguiu popularizar a alt right (movimento de extrema direita americana) entre os jovens, que resultou nos protestos “unite de right” no ano passado em Charlottesville, Virgínia que tiveram a participação de supremacistas brancos. Bannon trabalhou na campanha presidencial de Donald Trump e foi estrategista de seu governo. A Cambridge Analytica trabalhou também no referendo do Brexit, que foi vencido principalmente por argumentos originados de fakenews.
Quando a manipulação veio à tona, Mark Zuckerberg foi chamado ao senado americano para depor. Pra quem entendeu o que houve, ficou claro que a democracia da nação mais importante do mundo havia sido hackeada. Mas os congressistas pouco entendimento tinham de mídia social; e quem estaria disposto a admitir que a democracia pode ser hackeada através da manipulação dos indivíduos?
Zuckerberg estava apenas pensando em estabelecer um modelo de negócios lucrativo com a venda de anúncios direcionados. A coleta de dados e a avaliação de perfil psicológico das pessoas tinham a intenção “inocente” de fazer as pessoas clicarem em anúncios pagos. Era apenas um modelo de negócios. Mas esse mesmo instrumento pode ser usado com finalidade política.
Ele se deu conta disso e sabia que as eleições brasileiras podiam estar em risco também. Somos uma das maiores democracias do mundo. O facebook tomou medidas ativas para evitar que as campanhas de desinformação e manipulações ocorressem em sua rede social. Muitas contas fake e páginas que compartilhavam informações falsas foram retiradas do facebook no período que antecede as eleições.
Mas não contavam com a capilarização e a popularização dos grupos de whatsapp. Whatsapp é um aplicativo de mensagens diretas entre indivíduos; por isso, não pode ser monitorado externamente. Não há como regular as fakenews, portanto. Fazer um perfil fake no whatsapp também é bem mais fácil que em outras redes sociais e mais difícil de ser detectado.
Lembram do Steve Bannon, que sonhou com o retorno de uma extrema direita nacionalista forte mundialmente? Que tinha ideias que são classificadas como anti minorias, racistas e homofóbicas? E que usou um sentimento difuso anti “tudo que está aí”, e um medo de os homens se sentirem indefesos para conquistar adeptos?
Pois bem, ele se encontrou em agosto com Eduardo Bolsonaro. Bolsonaro disse que o Bannon apoiaria a campanha do seu pai com suporte e “dicas de internet”, essas coisas. Bannon é agora um “consultor eventual” da campanha. Era o candidato ideal pra ele, por compartilhava suas ideias, no cenário ideal: um país passando por uma grave crise econômica com a população desiludida com a sua classe política.
Logo depois de manifestações de mulheres nas ruas de todo o Brasil e do mundo contra Bolsonaro, o apoio do candidato subiu, entre o público feminino, de 18 para 24 por cento. Um aumento de 6 pontos depois de grande parte das mulheres se unir para demonstrar sua insatisfação com o candidato.
Isso acontece porque, de um lado, a grande mídia simplesmente ignorou as manifestações e, por outro, houve um ataque preciso às manifestações através dos grupos de whatsapp pró-Bolsonaro. Vídeos foram editados com cenas de outras manifestações, com mulheres mostrando os seios ou quebrando imagens sacras, mas utilizadas dessa vez para desmoralizar o movimento #elenão entre as mais conservadoras.
Além disso, Eduardo Bolsonaro veio a público logo após a manifestação e declarou: “As mulheres de direita são mais bonitas que as de esquerda. Elas não mostram os peitos e nem defecam nas ruas. As mulheres de direita têm mais higiene.” Essa declaração pode parece pueril ou simplesmente estúpida mas é feita sob medida para estimular um sentimento de repulsa para com o “outro lado”.
Isso não é nenhuma novidade. A máquina de propaganda do nazismo alemão associava os judeus a ratos. O discurso era que os judeus estavam infestando as cidades alemãs como os ratos. Esse é um discurso que associa o sentimento de repulsa e nojo a uma determinada população, o que faz com que o indivíduo queira se identificar com o lado “limpo” da história. Daí os 6 por cento das mulheres que passaram a se identificar com o Bolsonaro.
Agora é possível compreender porque é tão difícil usar argumentos racionais para dialogar com um eleitor do Bolsonaro? Agora você se dá conta do nível de manipulação emocional a que seus amigos e familiares estão expostos? Então a pergunta é: “o que fazer?”
Não adiante confrontá-los e acusá-los de massa de manobra. Isso só vai fazer com que eles se fechem e classifiquem você como um inimigo “do outro lado”. Ser chamado de manipulado pode ser interpretado como ser chamado de burro, o que só vai gerar uma troca de insultos improdutiva.
Tenha empatia. Essas pessoas não são tolas ou malvadas; elas estão tendo suas emoções manipuladas e estão submetidas a uma percepção da realidade bastante diferente da sua.
Tente trazê-las aos poucos para a razão. Não ofereça seus argumentos racionais logo de cara, eles não vão funcionar com essas pessoas. A única maneira de mudar seu pensamento é fazer com que tais pessoas percebam sozinhas que não há argumentos que fundamentem suas crenças e as notícias veiculadas de maneira falsa.
Isso só pode ser feito com uma grande dose de paciência e de escuta. Peça para que a pessoa defenda racionalmente suas decisões políticas. Esteja aberto para ouvi-la, mas continue sempre perguntando mais e mais, até ela perceber que chegou num ponto em que não tem argumentos para responder.
Pergunte, por exemplo: “Por que você decidiu por esse candidato? Por que você acha que ele vai mudar as coisas? Você acha que ele está preparado? Você conhece as propostas dele? Conhece o histórico dele como político? Quais realizações ele fez antes que você aprova?”
Em muitos casos, a pessoa tentará mudar o discurso para falar mal de um outro partido ou do movimento feminista. Tal estratégia é esperada porque eles foram programados para achar que isso representa “o outro lado”, os inimigos a combater.
Nesse caso, o caminho continua o mesmo: tentar trazer a pessoa para sua própria razão: “Por que você acha que esse partido é tão ruim assim? Sua vida melhorou ou piorou quando esse partido estava no poder? Como você conhece o movimento feminista? Você já participou de alguma reunião feminista ou conhece alguém envolvido nessa luta?”
Se perceber que a pessoa não está pronta para debater, simplesmente retire-se da discussão. Não agrida ou nem ofenda, comportamento que radicalizaria o pensamento de “somos nós contra eles”. Tenha em mente que os discursos que essa pessoa acredita foram incutidos nela de maneira que houvesse uma verdadeira identificação emocional, se tornando uma espécie de segunda identidade. Não é de uma hora pra outra que se muda algo assim.
Duas das mais importantes democracias do mundo já foram hackeadas utilizando tais técnicas de manipulação. O alvo atual é o nosso país, com uma das mais importantes democracias do mundo. Não vamos deixar que essas forças nos joguem uns contra os outros, rasgando nosso tecido social de uma maneira irrecuperável.
https://www.revistaforum.com.br/guru-da-ultra-direita-mundial-e-ex-assessor-de-trump-atua-na-campanha-das-redes-sociais-de-bolsonaro/

Boaventura de Sousa Santos: Democratas brasileiros, uni-vos!


A vitória de Jair Bolsonaro no segundo turno significará a detonação simultânea de três bombas-relógio que estão descritas abaixo, e dificilmente a democracia brasileira sobreviverá à destruição que causarão

por Boaventura de Souza Santos para Midia Ninja – Sociedade e Luta Democrática Brasileira

29.09.2018 – #EleNão em São Paulo. Fotos: Márcia Zoet /foto do illumina
A democracia brasileira está à beira do abismo. O golpe institucional que se iniciou com o impeachment da Presidente Dilma e prosseguiu com a injusta prisão do ex-presidente Lula da Silva está quase consumado. A consumação do golpe significa hoje algo muito diferente do que foi inicialmente pensado por muitas das forças políticas e sociais que o protagonizaram ou dele não discordaram.
Algumas dessas forças agiram ou reagiram no convencimento genuíno de que o golpe visava regenerar a democracia brasileira por via da luta contra a corrupção; outros entendiam que era o modo de neutralizar a ascensão das classes populares a um nível de vida que mais tarde ou mais cedo ameaçaria não apenas as elites mas também as classes médias (muitas delas produto das políticas redistributivas contra as quais agora se viravam).
Obviamente, nenhum destes grupos falava de golpe e ambos acreditavam que a democracia era estável. Não se deram conta de que havia três bombas-relógio construídas em tempos muito diversos mas podendo explodir simultaneamente. Se tal ocorresse, a democracia revelaria toda a sua fragilidade e possivelmente não sobreviveria.
A primeira bomba-relógio foi construída no tempo colonial e no processo de independência, foi acionada de modo particularmente brutal várias vezes ao longo da historia moderna do Brasil mas nunca foi eficazmente desativada. Trata-se do DNA de uma sociedade dividida entre senhores e servos, elites oligárquicas e povo ignaro, entre a normalidade institucional e a violência extra-institucional, uma sociedade extremamente desigual em que a desigualdade socioeconômica nunca se pôde separar do preconceito racial e sexual. Pese embora todos os erros e defeitos, os governos do PT foram os que mais contribuíram para desativar essa bomba, criando políticas de redistribuição social e de luta contra a discriminação racial e sexual sem precedentes na história do Brasil. Para a desativação ser eficaz seria necessário que essas políticas fossem sustentáveis e permanecessem por várias gerações a fim de a memória da extrema desigualdade e crua discriminação deixar de ser politicamente reativável. Como tal não aconteceu, as políticas tiveram outros efeitos mas não o efeito de desativar a bomba-relógio. Pelo contrário, provocaram quem tinha poder para a ativar e a fazê-lo quanto antes, antes que fosse tarde de mais e as ameaças para as elites e classes médias se tornassem irreversíveis. A avassaladora demonização do PT pelos média oligopolistas, sobretudo a partir de 2013, revelou a urgência com que se queria pôr fim à ameaça.
A segunda bomba-relógio foi construída na ditadura militar que governou o país entre 1964 e 1985 e no modo como foi negociada a transição para a democracia. Consistiu em manter as Forças Armadas (FFAA) como último garante da ordem política interna e não apenas como garante da defesa contra uma ameaça estrangeira, como é normal nas democracias. “Último” quer dizer em estado de prontidão para intervir em qualquer momento definido pelas FFAA como excepcional. Por isso, não foi possível punir os crimes da ditadura (ao contrário da Argentina mas na mesma linha do Chile) e, pelo contrário, os militares impuseram aos constituintes de 1988 28 parágrafos sobre o estatuto constitucional das FFAA. Por isso, também muitos dos que governaram durante a ditadura puderam continuar a governar como políticos eleitos no congresso democrático. Apelar à intervenção militar e à ideologia militarista autoritária ficou sempre latente, pronta a explodir. Por isso, quando os militares começaram a intervir mais activamente na política interna nos últimos meses (por exemplo, apelando à permanência da prisão de Lula) isso pareceu normal dadas as circunstâncias excepcionais.
A terceira bomba-relógio foi construída nos EUA a partir de 2009 (golpe institucional nas Honduras) quando o governo norte-americano se deu conta de que sub-continente estava a fugir do seu controlo mantido sem interrupção (com excepção da “distração” em Cuba) ao longo de todo o século XX. A perda de controlo continha agora dois perigos para a segurança dos EUA: o questionamento do acesso ilimitado aos imensos recursos naturais e a presença cada vez mais preocupante da China no continente, o país que, muito antes de Trump, fora considerado a nova ameaça global à unipolaridade internacional conquistada pelos EUA depois da queda do Muro de Berlim.
A bomba começou então a ser construída, não apenas com os tradicionais mecanismos da CIA e da Escola Militar das Américas, mas sobretudo com novos mecanismos da chamada defesa da “democracia amiga da economia de mercado”. Isto significou que, além do governo dos EUA, a intervenção poderia incluir organizações da sociedade civil vinculadas aos interesses econômicos dos EUA (por exemplo, as financiadas pelos irmãos Koch). Portanto, uma defesa da democracia condicionada pelos interesses do mercado e por isso descartável sempre que os interesses o exigissem. Esta bomba-relógio mostrou que já estava operacional no Brasil a partir dos protestos de 2013. Foi melhorada com a oportunidade histórica que a corrupção política lhe ofereceu. O grande investimento norte-americano no sistema judicial vinha do início dos anos de 1990, na Rússia pós-soviética e também na Colômbia, entre muitos outros países.
Quando a questão não é de “regime change”, a intervenção tem de ser despolitizada. A luta contra a corrupção é isso. Sabemos que os dados mais importantes da operação Lava-Jato foram fornecidos pelo Departamento de Justiça dos EUA. O resto foi resultado da miserável “delação premiada”.
O juiz Sergio Moro transformou-se no agente principal dessa intervenção imperial. Só que a luta contra a corrupção por si só não seria suficiente no caso do Brasil. Era suficiente para neutralizar a aliança do Brasil com a China no âmbito dos BRICS, mas não para abrir plenamente o Brasil aos interesses das multinacionais. É que, em resultado das políticas dos últimos quarenta anos (e algumas vindas da ditadura), o Brasil teve até há pouco imensas reservas de petróleo fora do mercado internacional, tem duas importantes empresas públicas e dois bancos públicos, e 57 universidades federais completamente gratuitas. Ou seja, é um país muito longe do ideal neoliberal, e para dele o aproximar é preciso uma intervenção mais autoritária, dada a aceitação das políticas sociais do PT pela população brasileira. E assim surgiu Jair Bolsonaro como candidato “preferido dos mercados”.
O que ele diz sobre as mulheres, os negros ou os homossexuais ou a tortura pouco interessa aos “mercados”, desde que a sua política econômica seja semelhante à do Pinochet no Chile. E tudo leva a crer que será porque o seu economista-chefe tem conhecimento direto dessa infame política chilena. O político de extrema-direita norte-americano Steve Bannon apoia Bolsonaro, mas é apenas o balcão da frente do apoio imperial. Os analistas do mundo digital estão surpreendidos com a excelência da técnica da campanha bolsonarista nas redes sociais. Inclui micro-direcionamento, marketing digital ultra-personalizado, manipulação de sentimentos, fake ews, etc. Para quem assistiu na semana passada na televisão pública norte-americana (PBS) ao documentário intitulado “Dark Money”, sobre a influência do dinheiro nas eleições dos EUA, pode concluir facilmente que as fakenews (sobre crianças, armas e comunismo, etc.) no Brasil são tradução em português das que o “dark money” faz circular nos EUA para promover ou destruir candidatos. Se alguns dos centros de emissão de mensagens estão sediados em Miami e Lisboa é pouco relevante (apesar de verdadeiro).
A vitória de Jair Bolsonaro no segundo turno significará a detonação simultânea destas três bombas-relógio. Dificilmente a democracia brasileira sobreviverá à destruição que causarão.
Por isso, a segunda volta é uma questão de regime, um autêntico plebiscito sobre se o Brasil deve continuar a ser uma democracia ou passar a ser uma ditadura de tipo novo. Um livro meu muito recente circula hoje bastante no Brasil. Intitula-se “Esquerdas do Mundo, uni-vos!” Mantenho tudo o que digo aí, mas o momento obriga-me a um outro apelo mais amplo: Democratas brasileiros, uni-vos! É certo que a direita brasileira revelou nos últimos dois anos um apego muito condicional à democracia ao alinhar com o comportamento descontrolado (mas bem controlado noutras paragens) de parte do judiciário, mas estou certo de que largos sectores dela não estarão dispostos a suicidar-se para servir “os mercados”. Têm de unir-se ativamente na luta contra Bolsonaro. Sei que muitos não poderão recomendar o voto em Haddad, tal é o seu ódio ao PT. Basta que digam: não votem em Bolsonaro. Imagino e espero que isso seja dito publicamente e muitas vezes por alguém que em tempos foi um grande amigo meu, Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente do Brasil e, antes disso, um grande sociólogo e doutor Honoris Causa pela Universidade de Coimbra, de quem eu fiz o elogio. Todos e todas (as mulheres não vão ter nos próximos tempos um papel mais decisivo para as suas vidas e a de todos os brasileiros) devem envolver-se ativamente e porta-a-porta. E é bom que tenham em mente duas coisas. Primeiro, o fascismo de massas nunca foi feito de massas fascistas, mas sim de minorias fascistas bem organizadas que souberam capitalizar nas aspirações legítimas dos cidadãos comuns a viverem com um emprego digno e em segurança. Segundo, ao ponto que chegamos, para assegurar uma certo regresso à normalidade democrática não basta que Haddad ganhe, tem de ganhar por uma margem folgada.
*  Boaventura de Sousa Santos - professor e sociólogo português, pensador crítico da esquerda mundial.
http://midianinja.org/boaventurasousasantos/democratas-brasileiros-uni-vos/