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7.07.2021

Mas afinal, o que é o Cooperativismo Solidário?

O diferencial é a crença no casamento entre o cooperativismo e a economia solidária, como alternativa estratégica na promoção de um desenvolvimento com sustentabilidade, equidade e justiça social. Isso porque o cooperativismo solidário estimula o crescimento econômico ao mesmo tempo em que são diminuídos os níveis de desigualdade social, ao atuar diretamente junto às populações em situação de maior vulnerabilidade social

Por Francisco Dal Chiavon* no Jornal GGN – Sociedade e Economia Social


Ser uma alternativa ao modelo de produção que emergiu durante a Revolução Industrial, em que ferramentas foram substituídas por máquinas, a energia humana pela energia motriz e o modo de produção artesanal pelas fábricas. Época em que produzir passou a ser mais barato e acessível. Sem levar em conta milhares de pessoas que ficaram sem emprego, às consequências severas para o meio ambiente que ao longo do tempo trouxe a depredação do planeta, a regra que prevalecia – e ainda prevalece – é produzir e produzir.

Na época, a saída encontrada pelas trabalhadoras e pelos trabalhadores da Europa, em especial, foi se organizarem em pequenos grupos. Nestes espaços, as pessoas deixavam de ser patrões ou empregados e todos passavam a ser sócios(as) do empreendimento. Diferente do modelo praticado pela Revolução Industrial, o foco não era o lucro e tudo o que aquele grupo de pessoas faturava com o trabalho coletivo, era dividido igualmente entre todas e todos.

Nascia ali a essência do cooperativismo, mais especificamente no interior da Inglaterra. Os moradores de Rochdale, em Manchester, sem trabalho, não conseguiam comprar o básico para sobreviver. Foi quando um grupo de 28 pessoas se juntou para montar o próprio armazém. O objetivo era realizar compras conjuntas em grande quantidade e dividir tudo de forma igual. No Brasil, a primeira cooperativa que se tem registro foi criada no ano de 1889, em Minas Gerais.

Atualmente, no país existem inúmeras experiências cooperativistas, muitas inclusive, já transformadas em grandes empresas, infelizmente que caminham nos moldes de produção capitalista.

Mas também existem aquelas que se organizaram em cooperativas e associações por necessidade, assim como fizeram os trabalhadores de Rochdale, que juntos, se tornaram mais atuantes com múltiplas diversidades. São agricultoras e agricultores familiares, assentadas e assentados da reforma agrária, indígenas, ribeirinhos, quilombolas e extrativistas. São catadoras e catadores de materiais recicláveis, artesãs e artesãos, trabalhadoras e trabalhadores de empresas recuperadas e re-estruturadas, integrantes de empreendimentos econômicos solidários.

Por ser um cooperativismo feito por trabalhadores para trabalhadores, esses grupos carregam consigo os princípios da economia solidária auto-gestionada, com cooperação, solidariedade, centralidade no ser humano, valorização da diversidade, do saber local da aprendizagem, justiça social na produção e cuidados com o meio ambiente. Por isso, elas e eles se reconhecem enquanto movimento do cooperativismo solidário.

Do ponto de vista normativo, ainda vigora a Lei 5.764, que define a Política Nacional do Cooperativismo, ou Lei Geral do Cooperativismo, criada durante o período da ditadura civil-militar, no ano de 1971. Mesmo com a re-democratização do Brasil e o estabelecimento da Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, a legislação do cooperativismo permanece praticamente intacta na forma como foi criada.

Foi para fortalecer e expandir esse cooperativismo feito por trabalhadores e para trabalhadores, que a Unicopas (União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias) juntou as principais centrais do cooperativismo e da economia solidária do país: a Unicafes Nacional (União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária), a Unisol Brasil (Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários), a Concrab (Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil) e a Unicatadores (União Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis do Brasil ). Uniram-se mais de 2.500 cooperativas e associações, congregando mais de 800 mil trabalhadoras(es) do campo e da cidade.

O diferencial é a crença no casamento entre o cooperativismo e a economia solidária, como alternativa estratégica na promoção de um desenvolvimento com sustentabilidade, equidade e justiça social. Isso porque o cooperativismo solidário estimula o crescimento econômico ao mesmo tempo em que são diminuidos os níveis de desigualdade social, ao atuar diretamente junto às populações em situação de maior vulnerabilidade social.

E são muitas experiências espalhadas pelo Brasil (veja no site unicopas.org.br).

As Cooperativas Solidárias se organizam, porque enquanto 1% das pessoas mais ricas do país concentra aproximadamente 50% das nossas riquezas, segundo dados do Relatório Sobre a Riqueza Global; elaborado pelo Banco Credit Suisse, o trabalho cooperativista busca gerar mais atividades econômicas, para distribuir renda e para que mais pessoas possam ter vida digna. Valorização das lutas políticas contra a desigualdade social, as experiências e formas de organização locais e a cultura e história da população, em cada região brasileira.

Enquanto 55% dos lares brasileiros (116,8 milhões de pessoas) convivem com algum grau de insegurança alimentar e outros 9% (19 milhões) passam fome – dados da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) de 2020. A luta cooperativista é por políticas públicas que fortalecem a agricultura familiar e camponesa, responsáveis por colocar comida no prato das famílias brasileiras. Enquanto parte da sociedade extrai a riqueza natural e explora o trabalho humano para atender à lógica do mercado, o foco é a solidariedade partilhando a produção do campo, com os empobrecidos das cidades.

Não há maneira de se concordar ou aceitar com os mais de 60 milhões de brasileiras e brasileiras, que se encontram em situação de desemprego ou subemprego. Fica claro que a realidade é o resultado do modo de produção capitalista. Quem colocou essas pessoas na informalidade foi a própria iniciativa privada. 

Por isso, a união e fortalecimento das práticas de cooperação e solidariedade, em todo o percurso da atividade econômica, porque é sabido que a solução para essas trabalhadoras(es) está na economia solidária. A saída não é individual. Para que o país possa retomar a geração de trabalho digno e renda, uma das saídas, sem dúvida, é investir no sistema cooperativo, o cooperativismo solidário. 

*Francisco Dal Chiavon, presidente da Unicopas – União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias

Publicado no GGN:

Fonte:  https://jornalggn.com.br/destaque-secundario/mas-afinal-o-que-e-o-cooperativismo-solidario-por-francisco-dal-chiavon/

 

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